Acórdão nº 1116/18.2T8BCL-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Dezembro de 2018
Magistrado Responsável | JOS |
Data da Resolução | 06 de Dezembro de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães *1 – RELATÓRIO A. R.
, actualmente emigrado em Angola e quando em Portugal residente na Rua …, freguesia de ..., concelho de Barcelos, intentou a presente ACÇÃO(1) TUTELAR COMUM com referência ao menor G. S.
, nascido em …, residente na Rua …, freguesia de ..., concelho de Barcelos, tendo aduzido, em síntese, os seguintes factos: - o menor G. S. é filho do requerente e de P. C.; - os pais do menor divorciaram-se no âmbito do processo de divórcio por mútuo consentimento n.º ... que correu termos na Conservatória do Registo Civil, por decisão de 21 de Setembro de 2017; - no âmbito do processo de divórcio foram reguladas, por acordo, as responsabilidades parentais relativamente ao menor e à irmã A. C., que entretanto atingiu a maioridade a 2-03-2018, tendo os mesmos ficado entregues à guarda e cuidados da mãe com quem residiriam, exercendo esta as responsabilidades parentais relativas a actos de vida corrente dos filhos, já que o progenitor trabalhava em Angola; - tendo a mãe do menor falecido a 16-12-2017, por decorrência legal, as responsabilidades parentais passaram a ser exercidas, exclusivamente, pelo requerente; - após o casamento, o requerente e a progenitora do menor fixaram residência na casa da mãe desta, A. M., na actual Rua … já referida, sendo que após o divórcio, o menor, a irmã e a mãe mantiveram a sua residência na casa da avó materna; - o menor, desde o seu nascimento, sempre conviveu diariamente com a avó materna estabelecendo-se entre eles laços de afecto; - trabalhando o requerente em Angola e não tendo intenção de regressar definitivamente a Portugal, até porque nunca conseguiria aqui e com um salário médio que se pratica no país, suportar as despesas inerentes a poder proporcionar uma vida condigna ao menor e à irmã que, embora tenha atingido a maioridade, mantém intenção de continuar a estudar e seguir o ensino superior, entende o requerente que levar o menor para residir consigo em Angola não defende os seus interesses, a sua saúde e educação, pois implicaria um afastamento das suas rotinas, do meio social onde se encontra integrado, da sua escola, amigos e toda a família; - manter o menor à guarda da avó materna, como já vem acontecendo de facto, uma vez que é esta que tem vindo a acompanhar a sua actividade escolar e a prover às suas necessidades, para o que dispõe de condições, é o que melhor salvaguarda os interesses do menor, a sua saúde, educação e desenvolvimento físico, intelectual e social; - desde o falecimento da mãe, o menor, por vontade de todos (requerente e avó) tem estado de facto confiado à avó materna e todos desejam que esta situação se mantenha, por todos entenderem que é o que melhor para o interesse do menor; - o requerente, conjuntamente com a avó materna do menor, submeteram junto da Conservadora do Registo Civil uma alteração ao acordo sobre o exercício das responsabilidade parentais (2), que não foi homologado por haver oposição do Digno Magistrado do Ministério Público junto do Juízo de Família e Menores de Barcelos por entender que a Conservatória do Registo Civil não é competente para a prática de tal ato de alteração, sendo o meio próprio a presente Ação Tutelar Comum.
Termina requerendo que se decrete que o menor G. S. fique entregue à guarda e cuidados da avó materna já identificada, regulando-se no mais as responsabilidades parentais nos termos supra referidos e anteriormente submetidos junto da Conservatória.
Ouvido o Ministério Público, pronunciou-se em 8-05-2018 nos seguintes termos: -Visto: promovo se indefira liminarmente o peticionado por ilegitimidade activa do aqui Autor que – segundo o desenho e configuração que, no petitório, o mesmo faz da causa de pedir e do concreto pedido que formula em corolário respectivo na mesma petição inicial – deve e tem que figurar, antes como Réu, no lado passivo da acção, devendo figurar como Autora a ali referida Avó materna: na verdade a presente acção, assim por ele configurada, não é mais que uma acção de Limitação do Exercício das Responsabilidades Parentais, responsabilidades essas de que (por decesso da progenitora) o pai é o único actual titular (cfr.artº1904º do Cod. Civil) sendo, ele próprio, a pedir que tal poder-dever por ele titulado, seja comprimido e limitado, nos termos peticionados: nítido é que, perante tal pedido, só pode o mesmo figurar como Réu…sendo, aliás, bem sintomático que a presente Acção foi desenhada como uma Acção sem Réus…ou, melhor, com um “réu” “inventado” por mera necessidade de preenchimento do formulário electrónico: o menor, seu filho…: é que o mesmo progenitor apesar de, artificialmente, se ter colocado na inusitada posição processual de “Autor”, não conseguiu “inventar” um melhor Réu ou Ré pois a própria “natureza das coisas” ónticamente a isso o impediu: tendo, no entanto, caído no absurdo de, perante o mencionado objecto da acção, demandar o próprio filho…e, até, sem indicar curador “litis” para este.
------------------------------------------------------------------------------------------ Tendo sido cumprido o contraditório relativamente à promoção do Ministério Público, veio o requerente esclarecer não haver litígio entre a avó materna e o pai do menor, recordando estarem ambos de acordo sobre a pretensão, tendo já anteriormente submetido para homologação na Conservatória do Registo Civil uma alteração ao acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais nos termos do qual o menor ficaria à guarda da avó, tendo, porém, o MP então entendido que tal questão deveria ser objecto de decisão judicial. Não estando em causa uma inibição do exercício das responsabilidades parentais, pretende a regularização de uma situação de facto, que deriva do progenitor estar emigrado, havendo consenso de todos relativamente a tal situação, que pretende tenha cobertura legal. Reconhecendo não ser o menor Réu nos autos, como resulta da exposição dos factos, mas a ter que haver um, será a avó materna a ser chamada aos presentes autos. Entendendo não ser caso de indeferimento liminar, como é próprio do processo tutelar cível e tratando-se de jurisdição voluntária, sempre pode o tribunal, se assim o entender, convolar a presente acção ou convidar ao suprimento de qualquer excepção dilatória, com vista ao prosseguimento dos fins pretendidos.
Em 26-06-2018, é então proferido o seguinte despacho liminar: A presente acção de processo tutelar comum foi proposta pelo progenitor contra o próprio filho G. S..
Com efeito, pese embora na petição inicial não se faça sequer referência a qualquer parte, do lado passivo da acção, no formulário apresentado consta efectivamente como requerido o menor acima identificado, o que certamente decorrerá de lapso.
Ora, conforme é referido pelo Digno magistrado do Ministério Público tal não é legalmente admissível.
Porém, conforme decorre da petição inicial, dos elementos juntos com esta e do requerimento de fls. 18 a 20, não existe qualquer dissídio entre o A. e a avó a quem este alegadamente quer confiar a guarda do menor, dado o decesso da mãe deste e à circunstância de o progenitor ter de se ausentar para o estrangeiro a fim de trabalhar e não ser aconselhável levar o menor consigo.
Acresce que o requerente já tentou proceder a diligências no sentido de formalizar a sua pretensão junto da CRC de Barcelos, sendo que aí e dado Parecer pelo Digno Magistrado do Ministério Público no qual foi aconselhado a intentar uma acção tutelar comum, o que efectivamente fez.
Acresce que nos termos do art.º 1907.º é possível por acordo ou decisão judicial (…) confiar o filho à guarda de terceira pessoa.
Ora, não obstante, se nos afigurar ser isso o pretendido, a verdade é que não foi identificado uma parte para figurar no lado passivo da acção, designadamente a avó, como requerida, sendo-lhe então concedida a possibilidade de alegar ou apresentar prova, relativamente à pretensão expressa pelo progenitor ou até em sede de conferência obter acordo que vá de encontro à pretensão do requerente.
Assim, e porque a nosso ver estamos perante uma situação de ilegitimidade passiva, que constitui uma excepção dilatória – cfr. art.º 577.º, al. e), a qual é de conhecimento oficioso – art.º 578.º do Código de Processo Civil (CPC), ao abrigo do dever de gestão processual do juiz – cfr. art.º 6.º e 590.º, n.º 2, al. a) do Código de Processo Civil (CPC), notifique-se o A. para, em 10 dias, querendo, regularizar a instância e fazer intervir como Ré nesta Acção a identificada avó materna do menor, deduzindo também contra estes o pedido formulado, com a cominação prevista no art.º 576.º do mesmo diploma legal.
Logo que teve conhecimento de tal despacho, inconformado com o mesmo, veio o MP em 11-09-2018 apresentar recurso de apelação contra o mesmo, finalizando as suas alegações com a apresentação das seguintes conclusões: 1.
– O actual Cod. Procº Civil (aqui aplicável ex vi o disposto no artº33º nº1 do Regime Geral do Procº Tutelar Cível) confere, na verdade, ao juiz um poder autónomo de gestão activa e efectiva do processo: a nova tramitação processual impõe, pois, ao juiz um novo “poder-dever”: este passa a ter o dever de direcção, de impulso, de simplificação e agilização processual, bem como o dever de sanação de actos meramente dilatórios e da falta de pressupostos processuais, devendo determinar a realização de todos os actos necessários a regularizar a instância; 2.
– Também, aqui, com a consagração deste princípio da gestão processual há uma clara adesão do direito processual civil português à regra anglo-saxónica do “active case management”: a gestão inicial do processo encontra assento no artigo 590º do Cod. Procº Civil, e implica a possibilidade do juiz, logo após a recepção da petição inicial, “indeferir a mesma quando o pedido seja manifestamente improcedente ou ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias insupríveis e de que o juiz deva conhecer oficiosamente”: 3.
– Nomeadamente a incompetência absoluta...
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