Acórdão nº 667/18.3T8GMR-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução17 de Dezembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO Nos autos em que foi declarado insolvente José, pediu este que lhe fosse concedida a exoneração do passivo restante.

Sobre tal questão, o Administrador Judicial, bem como diversos credores, pronunciaram-se negativamente, nos termos do relatório e requerimentos juntos para que se remete, destacando-se daquele a conclusão de que “…o devedor se desfez de forma «leviana» com o único objectivo de afastar dos seus credores os bens de que era proprietário”.

Por decisão de 24-09-2018, indeferiu-se liminarmente o requerimento.

O devedor não se conformou e apelou a que esta Relação a revogue, alegando e concluindo: “A.

A questão que se coloca no presente recurso é a verificação - ou não – de fundamento legal para indeferir liminarmente o pedido de exoneração do passivo do Recorrente, com fundamento no art. 238º, 1, e) do CIRE.

B.

Dos factos constantes dos autos não constam elementos que indiciem, com toda a probabilidade, a existência de culpa do Insolvente na criação ou agravamento da situação de insolvência, nos termos do artigo 186º do CIRE C.

Junto o relatório do artigo ...

5.º do CIRE, o Juiz a quo não decidiu declarar aberto o incidente de qualificação da insolvência, nos 10 dias subsequentes, como previsto no art. 188º, nº 1 do referido diploma, isto é, aventou não existirem nos autos factos ou informações que importassem declarar aberto o incidente de qualificação da insolvência.

D.

Não tendo sido proferida decisão a qualificar a insolvência como culposa tal deve, de per si, obstar a que se indefira liminarmente o pedido de exoneração justamente com o fundamento (para poder considerar-se a insolvência culposa) que, no próprio processo, até à data, se julgou inexistir ou, pelo menos, existir ao ponto de se justificar a abertura do incidente de qualificação da insolvência – cfr. Acórdãos da Relação de Coimbra de 29.02.2012 e de 24.04.2012.

E.

O pedido de exoneração do passivo restante não pode ser indeferido nos termos do art.º 238.°, n.º 1, al. e), do CIRE, quando não haja decisão judicial a declarar, face aos elementos carreados para os autos, sequer aberto o incidente de qualificação da insolvência, F.

A admissão liminar do pedido de exoneração do passivo restante apenas assegura o prosseguimento desta instância, sem constituir efeito de caso julgado quanto à consistência substancial do mérito da pretensão, que culminará na prolação da decisão de cessação antecipada do procedimento ou do despacho final de exoneração.

G.

Pelo que, ao decidir como decidiu, fez o Mmo Juiz a quo errada interpretação e aplicação do disposto no art. 238°, nº1, al. e) do CIRE. Sem prescindir, H.

A preocupação do Recorrente sempre foi a de pagar, todos os meses, os salários das centenas de trabalhadores. E note-se que na insolvência da sociedade insolvente “X, SA” não havia créditos dos Trabalhadores, o que foi reconhecido por todos os Trabalhadores. Trata-se de uma insolvência colectiva que embora com um passivo elevado, apresentava um activo elevado em que os trabalhadores foram sempre pagos, e NADA foi alienado!!! I.

Tal só foi possível porque o Recorrente decidiu alienar os seus bens, de outra forma não existiria dinheiro para pagamento dos salários.

J.

A doutrina e jurisprudência têm sido unânimes em afirmar que não é qualquer incumprimento, nem qualquer irregularidade que configura a definição prevista no art. 186º do CIRE; é necessário que tenha havido uma conduta do devedor que: a) tenha criado ou agravado a situação de insolvência; b) essa conduta seja dolosa ou com culpa grave; c) tenha ocorrido nos três anos anteriores ao início do processo.

K.

Para a insolvência ser qualificada como culposa impõe-se ainda que tal actuação (ou omissão) tida como dolosa ou com culpa grave do devedor seja causal na criação ou no agravamento da situação de insolvência – o que não se verifica nestes autos! L.

A situação sócio-económica do Recorrente não se agravou ou alterou antes ou depois do pedido de insolvência, porquanto as restantes dívidas que são apenas a título pessoal, são irrisórias.

TERMOS EM QUE deve o despacho recorrido ser revogado substituindo-se por outro que receba liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante, assim se fazendo JUSTIÇA!!” Foi admitido o recurso como de apelação, com subida imediata, em separado e efeito meramente devolutivo.

  1. QUESTÕES A RESOLVER Pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, sem prejuízo dos poderes oficiosos do tribunal, se fixa o thema decidendum e se definem os respectivos limites cognitivos.

    Assim é por lei e pacificamente entendido na jurisprudência – artºs 5º, 608º, nº 2, 609º, 635º, nº 4, 637º, nº 2, e 639º, nºs 1 e 2, do CPC.

    No caso, importa apreciar e decidir se não se verificam os pressupostos da alínea e), do nº 1, do artº 238º, do CIRE – culpa – e, por isso, deve ser revogada a decisão e deferido liminarmente o pedido.

  2. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO O tribunal recorrido, nesta sede, decidiu, dar como provados, considerando-se desde já fixados, uma vez que não impugnados, os seguintes factos, além dos supra relatados: “1º O Requerente contraiu matrimónio com E. S. em 26 de Março de 1988 com convenção antenupcial, no regime de comunhão geral de bens.

    2º Vindo a existir o decretamento do divórcio por mútuo consentimento a 4 de Novembro de 2008.

    3º Após o decretamento do divórcio, os menores ficaram aos cuidados da mãe, passando a residir apenas com ela.

    4º O Requerente pagava aos menores a quantia mensal de 500,00€ (quinhentos euros) a título de pensão de alimentos.

    5º Actualmente, todos os filhos do Requerente são maiores.

    6º Contudo, a filha Maria, não obstante se encontrar aos cuidados da mãe, sofre de incapacidade de 90%, necessitando de cadeira de rodas para se deslocar, pelo que, apesar de já ter atingido a maior idade (23 anos), continua a necessitar de cuidados acrescidos, nomeadamente, fraldas e acompanhamento permanente de um terceiro.

    7º o requerente contribui todos os meses com aproximadamente 300,00€ (trezentos euros) mensais para ajuda das despesas da filha, nomeadamente, para a compra de fraldas, medicamentos e outras despesas que esta possa ter.

    8º O Requerente como Sócio-gerente da sociedade “X de Lopes & Filhos, S.A”, com sede no Lugar …, e com o NIPC …, que se dedicava à extracção de saibro, areia e pedra britada, auferia mensalmente a quantia de €1.000,00 (mil euros).

    9º O Requerente vive, actualmente, nuns anexos de um imóvel pertencente à Insolvente X.

    10º No entanto, todos os imóveis pertencentes à Insolvente X estão a ser vendidos no âmbito do processo de Insolvência, pelo que terá o Requerente de arrendar em breve um local para viver.

    11º O devedor foi accionista desta sociedade, tendo assumido também as funções de Presidente do Concelho de Administração; 12.

    Em 2012 esta empresa deu início a um Processo Especial de Revitalização (PER), que correu termos sob o nº 5699/12.2TBBRG do Tribunal Judicial de Guimarães, 5º Juízo Cível de Guimarães; 13.

    Em Janeiro de 2013 foi aprovado um Plano de Recuperação com vista à revitalização desta sociedade; 14.

    Contudo, por sentença datada de 6 de Março de 2017, foi proferida a sentença de insolvência, no âmbito do processo com o nº 820/17.7T8GMR3, que corre termos na Comarca de Braga, Juízo de Comércio de Guimarães - Juiz 1; ...

    .

    Tendo já sido deliberado o encerramento e liquidação da sociedade; 16.

    A favor desta sociedade o devedor avalizou diversos contractos de crédito celebrados com entidades bancárias e financeiras e cujo valor em dívida ascende actualmente a mais de 2,4 MILHÕES de Euros; 17.

    Na sua qualidade de administrador e responsável subsidiário, o devedor encontra-se igualmente demandado pela Fazenda Nacional num passivo que ascende a mais de Euros 340.000,00 por dividas de IUC, IMI, IRC, IRS e IVA dos anos de 2009 a 20...

    ; 18.

    Granitos Y, Lda.

    – NIPC ...

    : Esta sociedade foi constituída em Dezembro de 2002 e tem por objecto social a exploração de pedreira, comércio de pedra e de outras massas minerais extraídas, transformação de pedra e afins; 19.

    Tem a sua sede no Ed.

    ..

    ., freguesia e concelho de Vila Pouca de Aguiar; 20.

    O devedor detém três quotas nesta sociedade, uma no valor de Euros 1.000,00, outra no valor de Euros 500,004 e uma terceira no valor de euros 23.500,005; 21.

    Após consulta efectuada no Portal da Finanças, foi possível verificar que esta sociedade cessou a actividade para efeitos de IVA em 28 de Fevereiro de 20...

    .

    1. W-Granito Natural, Lda.

      – NIPC …: Esta sociedade foi constituída em Junho de 1988 e tem por objecto social a indústria e comércio de granitos e rochas naturais; 23.

      Tem a sua sede na Rua …, freguesia de …, e concelho de Guimarães; 24.

      O devedor foi sócio e gerente desta sociedade, tendo renunciado à gerência em 9 de Janeiro de 20...

      e vendido as quotas de que era titular em 19 de Janeiro de 2013; 25.

      Actualmente a gerente desta sociedade é a filha do devedor, “S. L.”; 26.

      Na sua qualidade de gerente e responsável subsidiário, o devedor encontra-se igualmente demandado pela Segurança Social num passivo que ascende a mais de Euros 84.000,00 e reporta-se a contribuições em dívida vencidos entre os anos de 2007 e 2014 27.

      Na sociedade F. N., S.A.

      – NIPC ...

      (anteriormente designada A. L. & Filhos S.A.

      ), a qual se encontra sediada na Rua …, freguesia de ...

      , concelho da Maia, o devedor foi Presidente do Concelho de Administração entre, pelo menos 04 de Setembro de 2009 e 29 de Setembro de 2016. Por ser uma sociedade anónima, desconhece-se se o devedor detém alguma participação social nesta sociedade.

    2. Face ao cargo desempenhado nas sociedades acima melhor identificadas, o insolvente responde como devedor solidário ou subsidiário perante diversas entidades bancárias e financeiras, bem como perante a Fazenda Nacional e a Segurança Social por um passivo que ascende, actualmente, a mais de 2,5 MILHÕES de Euros.

    3. O insolvente é ainda devedor, a título pessoal, pelo passivo constituído...

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