Acórdão nº 263/16.0T8CSC.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ ANTÓNIO MOITA
Data da Resolução24 de Janeiro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes na 8ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa no seguinte: I – Relatório A, casado e B , casada , ambos residentes na Rua do Aldeamento das Encostas , lote --- , nº ---- , intentaram a presente acção declarativa de simples apreciação , com processo comum , contra C [ Município de Cascais ] , sito na Praça 5 de Outubro , 2754 – 501 , Cascais , pedindo que o Tribunal declare que adquiriram “ a parcela de terreno de 125m2, que faz parte integrante do prédio urbano descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o nº 12713 , livro nº 56 , sito na Urbanização da Quinta das Encostas , Sassoeiros , parcela esta confrontando a Norte com acesso ao condomínio do Aldeamento das Encostas e ribeira, a Sul, consigo Autores, a Este com a Rua do Aldeamento das Encostas e a Oeste com a ribeira , com a área total de 140,01 m2. “ Alegaram , em suma , que utilizam a parcela em causa como área de recreio e lazer desde 24/07/1998 , pois a mesma está abrangida pela área de jardim e logradouro afecta ao prédio onde constituíram a sua casa de morada de família na referida data e devidamente delimitada através de vedação própria desde 1986 , acrescentando que deram continuidade à utilização que desde 1982 tem sido dada à dita parcela pelos anteriores proprietários do prédio de que ora são donos , convencidos que toda a área delimitada pertencia ao seu prédio , invocando terem-na adquirido pelo instituto da usucapião , por exercerem sobre tal parcela uma posse pública , pacífica , de boa fé e sem oposição de terceiro.

Citado o Réu, o mesmo contestou a acção por impugnação pugnando pela improcedência da mesma e sua consequente absolvição do pedido formulado pelos Autores por , em suma , considerar não existir o direito que aqueles invocam, deduzindo ainda , em sede de reconvenção , o seguinte pedido: “ - Declarar o Município de Cascais dono e legítimo proprietário da parcela do prédio identificado no artigo 6º da presente Contestação.

- Condenar os Autores a reconhecerem ao aqui demandado o direito de propriedade sobre o prédio identificado no artigo 6º da presente contestação e ocupado por Aqueles.

- Condenar os Autores a restituir ao Município de Cascais a parte do prédio que ilicitamente ocupam , entregando-lhe livre de pessoas e bens e no estado de conservação físico e topográfico em que se encontrava antes da ocupação indevida e realização das obras , ou , Condenar-se os Autores a restituir ao R. o citado prédio livre de pessoas e bens e a pagarem ao R. uma indemnização correspondente à quantia necessária para proceder à demolição da obra , repondo assim o terreno na situação de conservação física e topográfica em que se encontrava , o que deverá ser liquidado em execução de sentença nos termos do artigo 609º do CPC “ Para tanto alegou , em síntese , ser proprietário de três parcelas de terreno , cuja aquisição lhe adveio por doação realizada em 18 de Fevereiro de 1982 , que identificou no artigo 6º da sua contestação, estando os Autores a ocupar parte de uma dessas parcelas de terreno, dessa forma violando o seu direito de propriedade , impossibilitando que o Reconvinte dê à mesma a utilização para que foi doada , fins unicamente públicos.

Os Autores replicaram , pugnando pela improcedência das pretensões do Réu manifestadas em sede de pedido reconvencional, por considerarem o mesmo completamente destituído de fundamento jurídico. Foi dispensada a realização de audiência prévia , tendo sido proferido despacho saneador e agendada data para a audiência final.

Realizada a mesma foi proferida sentença julgando-se a acção “ improcedente por não provada “ , com a consequente absolvição do Réu da totalidade do pedido formulado pelos Autores , julgando-se a reconvenção “ procedente por provada “ , declarando-se o Réu “ dono e legítimo proprietário da parcela de terreno em causa nestes autos , com a área de 125m2 , terreno este ocupado pelos AA “, mais se condenando os Autores “ a restituírem ao R. essa mesma parcela , que ocupam ilegitimamente , livre de pessoas e bens e no estado físico e topográfico em que se encontrava antes da ocupação indevida e realização de obras “.

* Inconformada , veio a Autora apresentar requerimento de recurso para este Tribunal da Relação de Lisboa , alinhando as seguintes conclusões: 1º A sentença ora recorrida é nula em virtude de ter decidido de questão que não podia conhecer – declaração de uma parcela de terreno como domínio público municipal, em virtude de tal questão nunca ter sido colocado pelas partes ao Tribunal para que dela pudesse conhecer – artigo 615º, nº1, alínea d), do CPC; 2º Com efeito, nos presentes Autos discutia-se a definição da titularidade do direito de propriedade privada sobe um parcela de terreno de 125 m2 integrado numa parcela mais vasta registada na 2ª Conservatória do Registo Predial de Cascais em nome do Município de Cascais – prédio descrito sob o nº 12713, livro nº 56; 3º Assim, do lado dos ora Recorrentes, foi invocado que tendo dado continuidade a um posse pacífica, pública e de boa fé exercida na parcela desde 1986, os mesmos adquiriram o direito de propriedade da parcela por via da usucapião, pois sempre estiveram convictos que a mesma lhes pertencia por estar fisicamente integrada no lote onde está construída a moradia que adquiriram em 1998 e onde constituíram a casa de morada de família, desconhecendo, por isso, que estariam a lesar o direito de propriedade de outrem ; 4º Deste modo, foi peticionado que o Tribunal declarasse que os Recorrentes tinham adquirido tal parcela por via da usucapião; 5º Do lado do Recorrido Município de Cascais, este, na sua Contestação, afirmou não existir tal posse mas mera tolerância da sua parte na ocupação da parcela, pelo que, 6º Deduziu pedido reconvencional para que fosse declarado pelo Tribunal ser o Município dono e legítimo proprietário da parcela, com a condenação dos ora Recorrentes a reconhecerem o seu direito de propriedade sobre a parcela em causa; 7º Assim sendo, a questão a discutir e a resolver nos Autos era se a posse exercida sobre a parcela em causa, parcela inscrita no registo predial em nome do Município de Cascais, era ou não era uma posse boa para efeitos de usucapião dos ora Recorrentes; 8º Se fosse, o Tribunal declararia que os ora Recorrentes tinham adquirido a propriedade da mesma por via da usucapião; 9º Se não fosse, o Tribunal declararia ser o Município de Cascais o dono e legítimo proprietário da parcela; 10º Porém, nunca na ação alguma vez foi colocada a questão perante o Tribunal de a parcela ser do domínio público municipal, pois, quer os ora Recorrentes nos seus articulados quer o recorrido Município na sua Contestação/Reconvenção, sempre aceitaram que, tal parcela, estava inscrita no registo predial de Cascais em nome do Município de Cascais, conforme aliás resulta da matéria dada como provada na sentença recorrida -ponto 24; 11º Mais concretamente, no que toca à Contestação/Reconvenção do Município de Cascais, o Recorrido Município sempre invocou ter o direito de propriedade sobre a parcela com base no registo predial em seu nome – artigos 15º, 16º, 21º e 35º, da Contestação, sendo um bem que integraria o seu domínio privado – artigo 36º da Contestação; 12º Daí que, coerentemente, tenha deduzido um pedido reconvencional contra os ora Recorrentes pedindo que estes fossem condenados a reconhecerem o seu direito de propriedade, não que estes fossem condenados a reconhecer que a parcela era um bem do domínio público municipal; 13º É por isso totalmente inexplicável para os Recorrentes como é que a sentença recorrida veio dizer algo que nunca foi dito pelo Recorrido Município na sua Contestação/Reconvenção, ou seja, que a parcela dos Autos era um bem do domínio público municipal, quando o Recorrido Município disse exactamente o contrário; 14º Assim, assumido expressamente pelo então R. Reconvinte Município de Cascais estarmos na presença de um bem do seu domínio privado, pedindo, por isso, que o Tribunal declarasse ser ele o legítimo proprietário do bem em causa, o Tribunal acabou por conhecer de uma questão – domínio público municipal, que nunca lhe foi colocada pelas partes para que dela pudesse conhecer; 15º Deste modo, ao conhecer de uma questão – parcela do domínio público municipal, a qual nunca lhe foi colocada por nenhuma das partes e ao ter decidido sobre objecto diverso do pedido na Reconvenção do Recorrido Município – declarar ser o Município de Cascais o dono e legítimo proprietário da parcela, a sentença recorrida incorreu num excesso de pronúncia, sendo assim nula nos termos da alínea d), do nº1, do artigo 615º, do CPC, nulidade que deve ser declarada por V. Exas; 16º Para além da nulidade por excesso de pronúncia, a sentença recorrido é também nula por os fundamentos de facto e de Direito estarem em contradição com a respectiva decisão; 17º Tendo ficado provado na matéria de facto que a parcela em causa é uma parcela que faz parte de uma parcela maior registada na conservatória do registo predial de Cascais em nome do recorrido Município e tendo sobre ela sido exercido desde 1986 uma posse de boa fé, pública e pacífica por parte do anterior proprietário do lote 9 como por parte dos ora Recorrentes, a lógica impunha que a decisão a proferir fosse uma decisão que decidisse ter sido adquirida a propriedade da parcela por via da usucapião por parte dos Recorrentes e não, como acabou por fazer a sentença recorrida, dizer que a parcela afinal é um bem do… domínio público; 18º Sabendo-se que os bens do domínio público não estão sujeitos a registo predial por que fora do comércio jurídico, a sentença recorrida é completamente contraditória com a fundamentação fáctico-jurídica na qual assenta, sendo por isso, nos termos da alínea c), do nº1, do artigo 615º, do CPC, nula, nulidade esta que também deve ser declarada por V. Exas; 19º Sem prejuízo das invocadas nulidades, a realidade é que a sentença recorrida cometeu erros...

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