Acórdão nº 257/18.0T8SRT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Janeiro de 2019
Magistrado Responsável | VASQUES OS |
Data da Resolução | 09 de Janeiro de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO Por decisão do Subinspector-Geral da Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, a arguida …, Lda., com os demais sinais nos autos, foi condenada, pela prática de uma contra-ordenação ambiental muito grave, p. e p. pelos arts. 9º, nº 1 e 32º, nº 1, a) do Dec. Lei nº 173/2008, de 26 de Agosto – actualmente prevista pelos arts. 11º, nº 1, 34º e 111º, nº 1, a) do Dec. Lei nº 127/2013, de 30 de Agosto – e 22º, nº 4, a) da Lei nº 50/2006, de 29 de Agosto (na redacção da Lei nº 114/2015, de 28 de Agosto), na coima especialmente atenuada de € 12.000.
Inconformada com a decisão, a arguida interpôs recurso de impugnação judicial.
Por despacho de 10 de Julho de 2018 [depositado a 118 de Julho de 2018], proferido pela Mma. Juíza do Tribunal Judicial da Comarca de Castelo Branco – Juízo de Competência Genérica da Sertã, foi decidido «(…) declarar a nulidade da decisão administrativa proferida pela Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, proferida no processo de contra-ordenação CO/001124/12, contra a arguida e aqui recorrente …, Lda., e, em consequência, determinar, após trânsito, a remessa do processo àquela Autoridade, para os fins tidos por convenientes.
».
* Inconformada com a decisão, recorreu a Digna Magistrada do Ministério Público para esta Relação, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: 1. A Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território decidiu condenar a arguida, …, Lda, pela prática de uma contra-ordenação ambiental muito grave, prevista no artigo 9.º, n.º 1 e alínea a) do n.º 1 do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 173/2008, de 26 de Agosto, actualmente prevista no artigo 11.º, n.º 1, conjugado com o artigo 34.º e alínea a) do n.º 1 do art. 111.º do Decreto-Lei n.º 127/2013, sendo sancionável nos termos da alínea a), do n.º 4 do artigo 22.º da Lei n.º 114/2015, de 28 de Agosto, na coima de 12.000,00 €.
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A arguida, …, Lda, impugnou judicialmente aquela decisão administrativa.
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O Tribunal a quo proferiu decisão, por despacho, considerando que a decisão administrativa não cumpre os requisitos formais previstos no art. 58.º do R.G.C.O., designadamente na descrição dos factos no que ao elemento subjectivo concerne, concluindo, em consequência, que a decisão administrativa padece de nulidade ao não incluir os factos que suportam o elemento subjectivo do tipo contra-ordenacional em causa, ao nível do comportamento negligente do agente/arguida, nomeadamente por dela não constarem factos concretos de onde se possa extrair que a arguida tenha agido com culpa, ainda que na modalidade da negligência, pelo que incorreu a douta sentença a quo em erro na interpretação do direito aplicável.
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A Decisão da Autoridade Administrativa não padece de qualquer nulidade, antes tendo indicado correctamente a atuação, ao nível do dolo, com que o agente, a sociedade arguida, atuou.
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A decisão da Autoridade Administrativa contém todos os elementos de facto e de direito, conforme estipula, aliás, o art. 58.º do RGCO, fazendo uma clara alusão à atuação negligente da sociedade …, Lda, quando refere: «[n]o que toca à culpa com que a Arguida atuou, considera-se que esta não agiu com a diligência necessária para cumprir com as suas obrigações legais, não se descortinando qualquer facto que retire a censurabilidade à infracção por si praticada».
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Efetivamente, a decisão da Autoridade Administrativa explicita perfeitamente os factos em que se baseia, mormente, ao nível da conduta subjectiva, dos elementos do tipo subjectivo em causa – veja-se o que ali (decisão administrativa) é referido que «[t]endo presente o explanado no Capítulo VII, bem como na análise de facto e de direito anteriormente efectuada, tendo ainda presente toda a documentação constante dos presentes autos, nomeadamente o Auto de Notícia n.º 237/2012 desta Inspeção-geral, o relatório de inspeção n.º 740/2012, que faz parte integrante do mesmo, considera-se ter ficado demonstrado que a Arguida agiu negligentemente, modalidade de culpa legalmente admitida para a infracção em questão» (negrito e sublinhado nossos).
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A alegação e concretização de tal facto, incluindo por remissão para os constantes do Capítulo VII da decisão administrativa, é suficiente para se considerar preenchido o elemento do dolo (in casu, negligência) com que o agente atuou, e, bem assim, a inerente concretização factual, tornando perfeitamente perceptível ao visado, …, Lda, o motivo da decisão administrativa, os factos que a fundamentaram, e a forma como atuou.
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A decisão administrativa ora em causa não padece de qualquer vício ou nulidade que lhe possa ser de assacar, conforme concluiu o Tribunal a quo, porquanto da mesma resulta suficientemente descrita a factualidade integradora dos fundamentos de facto e de direito do ilícito contra-ordenacional em causa, designadamente os elementos do tipo subjetivo.
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A decisão condenatória da autoridade administrativa, Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, encontra-se fundamentada de acordo com o disposto no art. 58.º, n.º 1 do R.G.C.O. (Decreto-Lei 433/82, de 27 de Outubro), não estando incompleta a descrição factual ao nível do tipo de ilícito subjectivo ou omissa de molde a não permitir à arguida compreender a razão da sua condenação administrativa e compreender o seu objecto e exercer todos os seus direitos de defesa.
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Porém, mesmo que assim não fosse (ou seja, que a decisão administrativa não contém todos os factos atinentes ao dolo) nunca seria de exigir o mesmo rigor formal que se exige para uma sentença judicial, pelo que a decisão administrativa, também por esta via, não padeceria de qualquer nulidade.
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É que o elemento subjectivo mostra-se susceptível de direta apreensão, retirando-se a forma/motivação como o agente atuou dos factos objectivos.
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Efetivamente, a culpa, nas contra-ordenações, portanto, no ilícito de mera ordenação social, baseia-se na violação de um certo comportamento imposto ao agente, bastando-se, por isso, com a imputação do respectivo facto ao agente, o qual se encontra perfeitamente descrito.
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Ora, tal como foi decidido no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 03.10.2012 (Processo n.º 14/12.8TBSEI.C1, «no processo de contraordenação, em sede de fundamentação da decisão administrativa não é de exigir o rigor formal nem a precisão descritiva que se exige numa sentença judicial».
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É efectivamente suficiente a fundamentação que justifique as razões pelas quais é aplicada esta ou aquela sanção ao arguido de modo a que este, lendo a decisão, se possa aperceber, de acordo com os critérios da normalidade de entendimento, das razões pelas quais é condenado e, consequentemente, impugnar os factos, sendo que o que deve resultar claro para a arguida são as razões de facto e de direito que levaram à sua condenação por forma a que a mesma possa fazer um juízo de oportunidade quanto a eventual interposição de impugnação judicial.
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O elemento subjetivo na modalidade de culpa negligente resulta da violação do dever respectivo, pois que decorre da natureza da infracção levada a cabo pela arguida que esta tem o dever de conhecer e respeitar as normas jurídicas em causa e que se não o fizer incorre em culpa negligente, por violação do dever de cuidado a que está adstrita.
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Como tal, a alegada fundamentação e concretização factual constante da decisão administrativa era /é suficiente para que a arguida tenha exercido todos os seus direitos de defesa, não sendo omissa em qualquer facto integrante do elemento do tipo subjectivo e, por consequência, não padece de qualquer nulidade.
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Tão pouco, a arguida, na impugnação judicial apresentada sequer colocou em causa a imputação subjectiva formulada pela autoridade administrativa, tendo sido, portanto, perfeitamente perceptível o seu teor.
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Pelo que, o despacho recorrido conheceu de nulidade da decisão administrativa sem que esta tivesse sido arguida.
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Ora, as nulidades das decisões da autoridade administrativa que aplicaram a coima não são de conhecimento oficioso. O seu conhecimento pelo Tribunal decorre...
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