Acórdão nº 71/16.8T8PTS.L1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelPEDRO MARTINS
Data da Resolução06 de Dezembro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados: N, interessada num inventário para separação de meações subsequente a divórcio, em que é cabeça-de-casal o seu ex-marido, F, veio interpor recurso da sentença que homologou a partilha.

Termina as alegações de recurso com as conclusões que se transcrevem, no essencial, ipsis verbis - corrigindo embora alguns dos mais evidentes erros -, e na íntegra, apesar da sua extensão, para possibilitar futuras remissões e assim evitar repetições: 1. O processo de inventário deu entrada no Cartório Notarial de X no dia 30/04/2014, pela interessada.

  1. Tendo o cabeça-de-casal feito o auto de compromisso de honra e declarações no dia 23/06/2014.

  2. Foi o mesmo informado, nessa data de que dispunha do prazo de 30 dias, para apresentar a relação de bens, nos termos do artigo 27 da Lei 23/2013, de 05/03 [= regime jurídico do processo de inventário = RJPI].

  3. Cabe ao cabeça-de-casal nos termos do art. 23 do RJPI, fornecer os elementos necessários para o prosseguimento do inventário.

  4. Acontece que o cabeça-de-casal não entregou no prazo estipulado, a relação de bens.

  5. Violando a disposição legal.

  6. Pelo que a interessada no dia 16/10/2014, requereu nos termos do art. 22/2 do RJPI, por este não fornecer os dados necessários para prosseguir o processo de inventário.

  7. Tendo o cabeça-de-casal respondido em 29/10/2014, dizendo que não havia bens a relacionar.

  8. Pelo que a interessada reclamou em 24/11/2014, juntando os bens que deviam ser relacionados. 10. Dispunha de 20 dias para responder nos termos do art. 32, tendo o cabeça-de-casal respondido seis meses depois em 06/05/2015, alegando que não devia juntar os bens próprios, atendendo a sua interpretação do art. 1790 do CC.

  9. Tendo a interessada respondido em 26/05/2015 a dita reclamação.

  10. Atendendo aos motivos invocados pela interessada, veio o Cartório Notarial, em 23/06/2015, realizar um pedido de aperfeiçoamento, solicitando ao cabeça-de-casal que juntasse a relação de bens no prazo de 15 dias.

  11. Novamente o cabeça-de-casal não respeitou dito prazo, tendo sido destituído em 29/09/2015.

  12. Após ter conhecimento da sua destituição veio o cabeça-de-casal alegar, não ter sido notificado do despacho de 23/06/2015.

  13. Ora resulta do sistema informático que tal notificação foi efectuada na referida data.

  14. Mesmo assim e após grosseira e constante negligência do cabeça-de-casal e apesar das provas de notificação, o Cartório Notarial voltou atrás na sua decisão de destituição e voltou a nomear o cabeça-de-casal.

  15. Da nova relação do cabeça-de-casal, a interessada foi notificada em 05/10/2015, tendo reclamado na mesma em 28/10/2015, tendo o cabeça-de-casal respondido e juntado um novo documento em 16/11/2015.

  16. Não tendo sido respeitado o estipulado no art. 427 do CPC, pois nunca foi a interessada notificada de dito documento.

  17. Tendo inclusive[,] durante o prazo que dispunha a interessada [para] alegar sobre a junção de dito documento, [sido] proferi[da] decisão do incidente de reclamação em 25/11/2015.

  18. Ao se aperceber de dita irregularidade que podia influir na decisão do incidente de reclamação invocou a mesma nos termos do art. 195/2 do CPC.

  19. Mais grave ainda no requerimento apresentado pela interessada em 28/10/2015, requereu avaliação de todos os bens, nos termos do art. 33/2, sendo que o Cartório Notarial não mandou realizar a avaliação e prossegui[u] com o agendamento imediato da conferencia preparatória.

  20. Deixando a interessada sem margem de manobra de tudo o que tinha sido realizado.

  21. Estabelece o art. 47/1, que a conferência deverá ser agendada quando o processo se ache devidamente saneado.

  22. Ora, até esta data tal não acontecia, pelo que nunca poderia ter sido agendada dita conferencia uma vez que existiam irregularidade processuais, ainda corriam prazos (art. 427 do CPC) e não foi mandado realizar avaliação conforme requerido pela interessada.

  23. Foi assim violado o princípio da celeridade processual e economia processual e até da igualdade.

  24. Devido à falta de avaliação a conferência foi suspensa.

  25. Veio a interessada apresentar durante o início da continuação da conferência preparatória, reclamação por falta de bens em 04/01/2016.

  26. Tendo o Cartório Notarial recusado a dita reclamação por considerar intempestiva.

  27. O processo de inventário destina-se a pôr termo a uma comunhão patrimonial, a partilhar o património que integra essa massa comum, isto é, o património comum do casal quando se trata, como é o caso dos autos, de inventário para partilha dos bens do casal subsequente ao divórcio.

    30/31. Estabelece o art. 32/5 da Lei 23/2013, que as reclamações contra a relação de bens podem ainda ser apresentadas até ao início da conferência preparatória, sendo o reclamante condenado em multa, com a excepção prevista na lei.

  28. Sobre esta norma refere o Inspector Fernando Neto Ferreirinha, p. 205, anotação 72: “Parece lógico que a reclamação por omissão de bens também possa ser efectuada depois de começar a conferência, desde que, como é evidente, o seja antes da decisão definitiva da partilha”.

  29. Assim sendo, a reclamação apresentada pela interessada no início da audiência preparatória agendada para o dia 04/01/2016, é tempestiva, pelo que dito despacho deverá ser revogado e aceite a reclamação apresentada.

  30. Podia ainda atendendo ao princípio da celeridade processual ter mandado suprir os bens em falta nos termos do artigo 590/4 do CPC.

  31. Não o fez pelo que se considera que existe uma nulidade processual nos termos do art. 195 do CPC.

    36. Foi interposto recurso do despacho de 18/01/2016, ao qual o cabeça-de-casal apresentou alegações sem ter pago a correspondente taxa de justiça.

  32. Tal facto foi informado e não foi mandado desentranhar ditas alegações ou suprir a falta de pagamento de taxa de justiça.

  33. Taxa de justiça que ao longo de todo o processo de inventário não tem sido paga nos valores devidos. Nada é feito quanto a dita irregularidade.

  34. Em 10/10/2016, veio o Cartório Notarial requerer a interessada se ainda tinha interesse na avaliação dos bens.

  35. Ao que a interessada se pronunciou em 20/10/2016, a dizer que sim e que atendendo ao princípio da celeridade processual e, para evitar um aditamento ao processo, que fosse realizada avaliação dos bens moveis e imóveis.

  36. Tal foi recusado, agendando-se nova conferencia.

  37. A interessada teve conhecimento de que o cabeça-de-casal, já procedeu à venda do imóvel ora em questão, daí a presa em despachar o processo de partilha.

  38. Está provado no processo que existem benfeitorias a reclamar pela interessada.

  39. Foi contraído empréstimo, cujo documento comprova as ditas benfeitorias.

  40. O dito empréstimo faz parte do passivo, não tendo sido aceites as benfeitorias.

  41. As despesas materiais feitas pelo casal com dita construção da moradia é um bem comum do casal, nos termos do art. 1724/-b e 1733/2 do CC.

  42. Esse valor deve ser relacionado como crédito do património comum do casal.

  43. Consta ainda da decisão do Tribunal da Comarca da Madeira – Ponta do Sol, em 10/11/2017, a seguinte informação: “Salvo melhor opinião, a alteração do despacho determinativo da forma à partilha, só poderá ser obtido, por via de recurso judicial, a interpor da decisão homologatória da partilha, onde a interessada poderá pôr em causa também a decisão interlocutória referente à não admissão da sua segunda reclamação, nos termos do artigo 66/3 do RJPI, que, a ser aceite, implicará eventualmente a alteração da relação de bens, caso essa reclamação seja procedente, e, consequentemente, caso o seja, determinará nova e diversa forma à partilha”.

  44. Durante todo o processo o cabeça-de-casal agiu sempre de ma fé, foi sempre favorecido em todo o processo.

  45. Existem inúmeras irregularidades em todo o processo que não foram corrigidas.

  46. Caso ditas irregularidades não sejam sanadas e atendendo que existe uma redução das garantias das partes atento a tudo o exposto, deverá o processo nos termos do art. 17/2 ser remetido para os meios judiciais comuns.

    O cabeça-de-casal contra-alegou, dizendo, em síntese que: (i) nas alegações de recurso não é mencionado qualquer defeito ou vicio à decisão recorrida; (ii) a interessada não interpõe recurso por meio de requerimento dirigido ao Tribunal Judicial da Comarca, indicando a espécie, o efeito e o modo de subida do recurso interposto, violando o art. 637 do CPC, o que determina o indeferimento liminar do recurso; (iii) a interessada nas alegações não enuncia e sintetiza nas conclusões a indicação das normas jurídicas violadas; (iv) nem a ter existido erro na determinação das normas aplicáveis a indicação das que, no seu entender, deveriam ter sido aplicáveis; (v) a interessada não alega nem sintetiza a final o que efectivamente pretende obter com o recurso, se a revogação, anulação ou modificação da decisão recorrida; (vi) as razões de queixa da interessada incidem tão-só sobre despachos e decisões proferidos pelo notário e o art. 76 do RJPI não contempla recurso de qualquer decisão proferida pelo notário, mas apenas recursos de decisões judiciais (arts. 76 nºs 1 e 2 e 66/1 do RJPI); (vii) as decisões judiciais interlocutórias, proferidas em consequência das muitas reclamações e impugnações apresentadas e deduzidas pela interessada no decorrer do processo de inventário encontram-se decididas e já transitadas em julgado (cfr. as decisões juntas a fls. 204 a 208; 287 a 290; 321 a 323).

    *Dado o conteúdo [que merece as críticas que lhe são dirigidas pelo cabeça-de-casal] das alegações e das suas conclusões - que delimitam necessariamente o objecto do recurso (arts. 635/4 e 639/1 do CPC) -, apenas pouco a pouco é que se irá vendo qual é o objecto do recurso e, por isso, quais as questões a decidir e os factos que importam à decisão dessas questões.

    *As questões prévias levantadas pelo cabeça-de-casalIVer-se-á à frente que a interessada está a recorrer directamente de despacho de não admissão de uma reclamação contra a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT