Acórdão nº 1422/11.7TJPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Setembro de 2018
Magistrado Responsável | PAULO DIAS DA SILVA |
Data da Resolução | 13 de Setembro de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Recurso de Apelação - 3ª Secção Processo n.º 1422/11.7TJPRT.P1 Comarca do Porto Porto - Juízo Local Cível - J4 Relator: Paulo Dias da Silva 1.º Adjunto: Des. Teles de Menezes 2.º Adjunto: Des. Mário FernandesAcordam no Tribunal da Relação do Porto 1. RelatórioB… e C…, residentes na Rua …, …, Habitação …, …. - … Porto, foram declarados insolventes por sentença proferida em 17.08.2011, tendo sido proferido despacho inicial de concessão da exoneração do passivo restante em 17.11.2011.
*Em 04.04.2018 o Sr. Juiz a quo recusou a exoneração do passivo restante ao abrigo do disposto no artigo 243.º, n.º 1, alínea a) do CIRE.
*Não se conformando com a decisão proferida, os recorrentes “B…” e “C…” vieram interpor o presente recurso de apelação em cujas alegações concluem da seguinte forma: I. O art.º. 243.º, n.º 1, al. a) do CIRE exige que o devedor tenha violado os seus deveres com dolo ou negligência grave.
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Da mera leitura dos requerimentos, do relatório do fiduciário e da decisão recorrida, decorre que a punição aplicada aos insolventes configura uma verdadeira responsabilidade independente de culpa, sendo omissos em relação ao elemento volitivo.
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Não tendo o fiduciário cumprido os seus deveres previstos no art.º. 241º n.º 1 do CIRE, nem auxiliado os insolventes a evitar o incumprimento (designadamente avisando-os), o incumprimento imputado aos insolventes é meramente negligente, não sendo, assim, nem doloso nem grosseiramente negligente.
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Se é verdade o que é dito no despacho recorrido - que as obrigações do fiduciário não têm nada a ver com a obrigação do insolvente - a verdade é que não se pode dissociar o incumprimento do fiduciário do incumprimento dos insolventes, uma vez que um é causa do outro.
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A conduta dos insolventes, sendo legalmente leigos e desconhecedores dos trâmites processuais, corresponde a um grau de negligência meramente ligeira, sendo bem mais censurável a conduta do fiduciário, que não auxiliou os leigos a cumprir as suas obrigações.
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O incumprimento da obrigação dos insolventes, podendo, nos termos legais, provocar a cessação antecipada da exoneração, não deve, especialmente em situações onde não existe recusa activa de pagamento, levar a que, antes de ser declarada a cessação, não seja dada aos insolventes a possibilidade de regularizar o incumprimento, sob pena de violação do art.º. 18º nº 2 da CRP.
*Não foram apresentadas contra-alegações.
*Colhidos que se mostram os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir.
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Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar: Das conclusões formuladas pelos recorrentes as quais delimitam o objecto do recurso, tem-se que a questão a resolver no âmbito do presente recurso prende-se com saber do mérito da decisão que determinou a cessação antecipada do procedimento de exoneração.
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Conhecendo do mérito do recurso 3.1 - Factos assentesCom relevância para o conhecimento do recurso mostram-se assentes os seguintes factos: - B… e C…, residentes na Rua …, …, Habitação …, …. - … Porto, foram declarados insolventes por sentença proferida em 17.08.2011 tendo sido proferido despacho inicial de concessão da exoneração do passivo restante por despacho proferido a 17.11.2011.
- Os insolventes não procederam às entregas a que estavam obrigados, estando em falta quantia não inferior a €10.669,84.
- Em 04.04.2018 o Sr. Juiz a quo recusou a exoneração do passivo restante ao abrigo do artigo 243.º, n.º 1, alínea a) do CIRE, proferindo o seguinte despacho: “Informou o Sr. Fiduciário que os insolventes não procederam às entregas a que estavam obrigados, estando em falta quantia não inferior a €10.669,84.
Os credores D… e Banco E… requereram o indeferimento antecipado do pedido de exoneração do passivo restante.
Responderam os insolventes alegando apenas não ter sido efetuada a notificação prevista no art. 241.º do CIRE.
*No caso dos autos, os insolventes não impugnam a falta de entrega de rendimentos alegada pelo fiduciário; apenas ensaiam justificar o seu comportamento com ocorrência de uma causa impeditiva do cumprimento da sua obrigação imposta pelo tribunal.
A obrigação do fiduciário de informar a entidade patronal do insolvente – entre outros devedores de rendimentos ao insolvente – sobre a existência de uma decisão de cessão de rendimentos (art. 241.º do CIRE) nada tem a ver com a obrigação do insolvente de entregar ao fiduciário a parte do seu rendimento resultante do despacho inicial de exoneração do passivo restante (art. 239.º, n.º 4, al. c), do CIRE).
O despacho inicial é claro - e a lei também é clara. O insolvente tem uma obrigação própria, não tendo esta obrigação própria ficado condicionada à satisfação de qualquer outra obrigação que, eventualmente, impendesse sobre outrem.
A putativa omissão de efetivação da notificação prevista no n.º 1 do art. 241.º do CIRE não tem por efeito justificar o incumprimento do dever resultante do disposto no art. 239.º, n.º 4, al. c), do CIRE.
*Dispõe o art.º. 243.º, n.º 1, do CIRE que: «1 − Antes ainda de terminado o período da cessão, deve o juiz recusar a exoneração, a requerimento fundamentado de algum credor da insolvência, do administrador da insolvência, se estiver ainda em funções, ou do fiduciário, caso este tenha sido incumbido de fiscalizar o cumprimento das obrigações do devedor, quando: a) O devedor tiver dolosamente ou com grave negligência violado alguma das obrigações que lhe são impostas pelo artigo 239.º, prejudicando por esse facto a satisfação dos créditos sobre a insolvência; b) Se apure a existência de alguma das circunstâncias referidas nas...
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