Acórdão nº 618/17.2T8FIG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Setembro de 2018
Magistrado Responsável | JORGE MANUEL LOUREIRO |
Data da Resolução | 14 de Setembro de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 6.ª secção social do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório A autora propôs contra a ré a presente acção com a forma de processo comum e emergente de contrato de trabalho, deduzindo os pedidos seguidamente transcritos: “I- Ser declarado ANULADO o “ACORDO DE REVOGAÇÃO DE CONTRATO DE TRABALHO” assinado pela Autora em 29 de julho de 2016, em consequência do Erro- vicio da A. acerca das circunstancias que motivaram tal acordo, nos termos do artigo 251.º; 247.º e 289.º do Código Civil, com as legais consequências; II- Ser a Ré condenada reintegrar a A. no posto de trabalho e na função que esta detinha à data do despedimento e a pagar à A. todas as retribuições vencidas e vincendas até à efetiva reintegração da A.
III- Ser a Ré condenada a pagar à A. as retribuições vencidas e não pagas desde 7/07/2014 a 24/11/2015, incluindo subsídio de férias e subsídios de Natal, uma vez que a A. não esteve a trabalhar porque a Ré não o permitiu; IV- Ser a Ré condenada finalmente a pagar à Segurança social todas as contribuições em falta, desde julho de 2014 até à data da reintegração da A. na empresa, como é de lei.
”.
Alegou, em resumo, que sendo trabalhadora da ré, celebrou com esta um acordo de cessação do contrato de trabalho, anulável, por erro essencial em que foi induzida pela ré com vista à celebração desse acordo que, assim, deve ser anulado; por consequência da anulação, a ré deve reintegrar a autora, pagar-lhe as retribuições devidas por causa da anulação, assim como outras retribuições que a ré lhe não pagou relativas a períodos anteriores à data do acordo de cessação e que identifica na petição inicial.
A ré contestou, pugnando pela improcedência da acção.
Alegou em resumo, que não se verifica a anulabilidade invocada pela autora e que a mesma não é titular de nenhum dos créditos a que se arroga.
O processo prosseguiu os seus regulares termos, acabando por ser proferida sentença de cujo dispositivo consta o seguinte: “Pelos fundamentos expostos, julgo a presente ação parcialmente procedente, por provada e, em consequência: a) Declaro anulado o “acordo de revogação de contrato de trabalho” assinado pela A. A... e pela R. “ B..., Lda.” em 29 de julho de 2016, devendo a A. A... devolver à R. “ B..., Lda.” a quantia recebida em resultado da assinatura desse “acordo” a título de “compensação pecuniária de natureza global pela cessação do contrato de trabalho”; b) Condeno a R. “ B..., Lda.” a reintegrar a A. A... no posto de trabalho e na função que esta detinha à data referida em a) e a pagar à A. A... todas as retribuições vencidas e vincendas desde essa data e até à efetiva reintegração da A., bem como as retribuições vencidas e não pagas desde 7/7/2014 a 24/11/2015, incluindo subsídio de férias e subsídios de Natal, tudo a liquidar futuramente; c) Absolvo a R. “ B..., Lda.” do demais peticionado pela A. A....
* * Custas, provisoriamente (a corrigir depois de um eventual incidente de liquidação) e na proporção de ½, a cargo de A. e R., (Art. 527º, n.os 1 e 2 e 528º, n.º 1 do Novo Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente por força do disposto no Art. 1º, n.º 2, al. a) do Código de Processo do Trabalho, aderindo-se à posição expressa no Acórdão da Relação do Porto de 27 de junho de 1996, CJ III, p. 243, e por ABRANTES GERALDES, Temas Judiciários I, Coimbra, 1998, p. 240-242, uma vez que ambas as partes devem ser consideradas, neste momento, como parcialmente vencidas), sem prejuízo do benefício de proteção jurídica conferido à A., fixando-se o valor da presente ação, nos termos do Art. 306º, n.os 1 e 2 do Novo Código de Processo Civil e à falta também de elementos para o fixar num montante diverso, no valor indicado pela A. para a ação, atento o disposto nos Arts. 296º, 297º, n.os 1 e 2 e 299º do mesmo diploma legal.
”.
Não se conformando com o assim decidido, apelou a ré, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas: “I Salvo o devido e merecido respeito, não nos parece correcta a apreciação e determinação de certos factos dados provados na douta sentença recorrida, assim como não concordamos com a interpretação realizada pelo Tribunal a quo, nomeadamente no sentido de que a recorrente actuou de forma consciente e reprovável, induzindo em erro a autora, levando assim à anulação do acordo celebrado entre ambas, nos termos dos artigos 251.º e 247.º do Código Civil.
II Assim, consta do facto provado 6 que “A A. apresentou-se ao trabalho, como ordenado pela “ C...”, e não conseguiu exercer a sua função habitual e por isso a R. mandou-a embora, por entender que a mesma não podia trabalhar, mantendo-se a A. sem trabalhar e estando de baixa, tendo entregue na R. os atestados e certificados médicos juntos aos autos (e aqui dados por reproduzidos na sua totalidade), recebendo o subsídio por doença da Segurança Social, até 6/7/2014. (Respostas aos Artigos 14º a 16º da Petição Inicial e aos Artigos 16º e 17º da Contestação)”.
III Ora, os referidos certificados médicos (CIT) entregues à recorrente compreendem os períodos temporais de 30/01/2014 a 23/10/2014 e de 26/08/2015 a 05/11/2015, sendo que não consta dos autos, mormente em qualquer prova documental, assim como não se fundamenta na sentença recorrida a razão que levou a considerar-se como provado que o respectivo subsídio de doença devido à autora apenas lhe tenha sido pago até 06/07/2014, e muito menos que a recorrente tivesse conhecimento de tal situação, ou seja, não se provou ou sequer se demonstrou que a recorrente sabia que a autora não recebia subsídio de doença desde a referida data; muito pelo contrário, consta do Documento 13 junto pela autora na sua petição inicial que a 06/07/2014 ainda subsistia a sua incapacidade temporária para o trabalho, pelo que naturalmente se deve concluir que a autora continuou a receber o respectivo subsídio por doença.
IV Não se encontra, portanto, suficientemente fundamentada a decisão que levou a considera-se como provado que a autora apenas recebeu subsídio de doença da parte da Segurança Social até 06/07/2014 e, pelo contrário, provando-se antes que a autora recebeu tal subsídio durante todo o período temporal correspondente às baixas entregues à recorrente, deveria o Tribunal a quo ter antes dado este facto como provado, em detrimento daquele.
V Para além disso, consta ainda do facto provado 8 que “Durante todo o período em que correu o processo referido no número anterior e até dezembro de 2015, a A. esteve sem trabalhar e sem receber qualquer salário ou subsídio por doença, à exceção dos meses de fevereiro, março, abril, maio, junho e seis dias do mês de julho de 2014, nos quais recebeu da Segurança Social, subsídio de Doença. (Resposta ao Artigo 19º da Petição Inicial)”.
VI Ora, no facto provado 15, o Tribunal a quo dá como provado o artigo 25.º da contestação, o qual refere que “não obstante, durante o tempo em que esteve nas instalações da ré sem uma actividade laboral atribuída e definida, designadamente entre 26 a 30 de Novembro de 2015, a autora foi devidamente remunerada (vide Doc. 25, que ora se junta (…)”; não tendo o referido Doc. 25 (recibo de vencimento da autora de Novembro de 2015) sido por esta impugnado.
VII Assim, deveria o Tribunal a quo igualmente ter dado como provado que a autora recebeu efectivamente salário entre os dias 26 e 30 de Novembro de 2015.
VIII É ainda referido no facto provado 19 que “A A. aceitou a sugestão da R. de deixar de trabalhar na R., indo para o desemprego e recebendo o subsídio de desemprego até atingir a idade da reforma, tendo a R. comunicado à A. que a Ré lhe pagaria uma indemnização e lhe daria todos os papéis para receber o subsídio de desemprego, tendo a A. aceite essa proposta na convicção de que receberia a indemnização devida, todas as retribuições em divida e que iria receber o subsídio de desemprego, como lhe foi garantido pela R., sendo que a R. sabia que se a A. soubesse que não tinha direito a receber as prestações de desemprego, nunca aceitaria tal acordo. (Respostas aos Artigos 44º a 48º e 56º a 58º e 61º da Petição Inicial)” e no facto provado 24 que “A R. sabia que a A. não iria receber quaisquer contribuições de desemprego, uma vez que, durante os meses que a A. esteve impedida de trabalhar por ordem da R. esta não fez quaisquer descontos para a Segurança Social. (Resposta ao Artigo 55º da Petição Inicial)”.
IX Ora, não se demonstrou ou provou no decorrer do julgamento que a recorrente garantiu à autora que esta receberia subsídio de desemprego, pois que nem sequer tem legitimidade ou poder para conferir tal subsídio, sendo que nunca a autora comunicou à recorrente que não se encontrava a receber da Segurança Social o subsídio de doença.
X Por sua vez, a autora também não podia ignorar que, se realmente não havia recebido subsídio de doença durante a totalidade do período em que lhe foi conferida baixa médica (de 30/01/2014 a 23/10/2014 e de 26/08/2015 a 05/11/2015), então não teria preenchido o prazo de garantia necessário para ter acesso ao subsídio de desemprego, nos termos do artigo 22.º do Decreto-Lei nº 220/2006.
XI Assim, e por falta de fundamentação, não podia o Tribunal a quo ter dado como provado que a recorrente sabia que a autora não tinha direito a receber as prestações de desemprego, por não ter feitos quaisquer descontos para a Segurança Social no período em que esta não trabalhou, e que, ainda assim, garantiu à recorrente o pagamento das mesmas (factos provados 19 e 24).
Assim, XII Não obstante o conhecimento da essencialidade do elemento sobre o qual incidiu o erro para o declarante (a necessidade de acesso ao subsídio de desemprego), a verdade é que a recorrente laborou igualmente em erro quando celebrou o negócio jurídico em questão, porquanto estava convencida – convencimento este provocado pela referida actuação da autora – que esta tinha o prazo de garantia necessário, previsto no citado normativo legal.
XIII Nestes termos, não se verifica qualquer erro – ou sequer dolo – da...
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