Acórdão nº 478/17.3T8PBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelFALC
Data da Resolução05 de Junho de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de CoimbraSegue-se a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, respeitando-se, em caso de transcrição, a grafia do texto original.

: I - A) – F…, nascido em 05/12/1957, filho de D…, intentou, em 7/2/2017, a presente acção contra M…, pedindo que, na procedência da acção, seja declarado que é filho do réu, ordenando-se o correspondente averbamento no seu assento de nascimento.

[…] Alegou, para tanto e em suma, que nasceu em consequência de relações sexuais com cópula completa que a sua mãe, nos primeiros 120 dias dos 300 que precederam o seu nascimento, estabeleceu com o réu, no contexto da relação amorosa que mantinham.

2. Regulamente citado, o réu contestou, defendendo-se por excepção e impugnação. Recordou que o autor, em 1969, nessa altura representado pelo Ministério Público, intentou contra o réu uma acção também para reconhecimento da paternidade e com base nos mesmos factos, a qual foi julgada improcedente, por não provada, por sentença já transitada em julgado, para afirmar que, existindo identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir entre as duas acções, estão preenchidos os requisitos do caso julgado.

Excepcionou a caducidade do direito de o autor investigar a paternidade por ter intentado a presente acção decorridos mais de 10 anos desde a sua maioridade e não se verificar nenhuma das circunstâncias que, nos termos do artigo 1817.º, n.º 3, do Código Civil, poderiam alargar o prazo para a sua propositura.

Refutou a exclusividade do relacionamento sexual entre a mãe do autor e o réu no período legal de concepção.

Por fim, sustentou que, caso o autor, na procedência da acção, venha a ser reconhecido como filho do réu, o mesmo deverá ser excluído dos efeitos patrimoniais de tal declaração, designadamente do direito a quinhoar na herança do réu, por agir em manifesto abuso de direito.

3. O autor respondeu pugnando pela improcedência das excepções deduzidas.

Para tanto, invocou, por um lado, o disposto no artigo 1813.º do Código Civil, aplicável, no seu entender, não só às acções oficiosas de investigação de paternidade, mas também às intentadas pelo Ministério Público em representação do menor, bem como a prevalência do direito, constitucionalmente consagrado, à identidade pessoal, na sua dimensão de conhecimento da ascendência biológica, sobre o princípio da intangibilidade do caso julgado e, por outro, a inconstitucionalidade do prazo de investigação previsto no artigo 1817.º, n.º 1, do Código Civil, na redacção introduzida pela Lei n.º 14/2009, de 01.04.

Terminou negando ter agido com abuso de direito.[…]

Transcrição do relatório da sentença ora sob recurso.

.

B) – Em saneador-sentença proferido em 22/06/2017, o Juízo de Família e Menores de Pombal (Juiz 2), da Comarca de Leiria, declarando verificada a excepção dilatória do caso julgado, prevista na alínea i) do artigo 577.º do (novo) Código de Processo Civil Aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho e que se designará como “NCPC”, só se usando a sigla “CPC” para referir o código pretérito, ou, excepcionalmente, nos casos em que transcrevemos texto onde essa sigla foi já utilizada para identificar o novo Código de Processo Civil.

, absolveu o réu da instância, nos termos dos artigos 576.º, nºs 1, e 2, 577.º, alínea i), e 578.º, todos desse mesmo código.

C) - Desta sentença apelou o Autor, que, a finalizar a sua alegação de recurso, apresentou as seguintes conclusões: … O Réu, respondendo à alegação de recurso, pugnou pela improcedência do mesmo e pela manutenção da sentença ora impugnada.

C) - As questões: Em face do disposto nos art.ºs 635º, nºs 3 e 4, 639º, nº 1, ambos do novo Código de Processo Civil Aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26/6.

(doravante, NCPC), o objecto dos recursos delimita-se, em princípio, pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo do conhecimento das questões que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art.º 608º, n.º 2, “ex vi” do art.º 663º, nº 2, do mesmo diploma legal.

Não haverá, contudo, que conhecer de questões cuja decisão se veja prejudicada pela solução que tiver sido dada a outra que antecedentemente se haja apreciado, salientando-se que, “questões”, para efeito do disposto no n.º 2 do artº 608º do NCPC, são apenas as que se reconduzem aos pedidos deduzidos, às causas de pedir, às excepções invocadas e às excepções de que oficiosamente cumpra conhecer, não podendo merecer tal classificação o que meramente são invocações, “considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes” Acórdão do STJ, de 06 de Julho de 2004, Revista nº 04A2070, embora versando a norma correspondente da legislação processual civil pretérita, à semelhança do que se pode constatar, entre outros, no Ac. do STJ de 13/09/2007, proc. n.º 07B2113 e no Ac. do STJ de 08/11/2007, proc. n.º 07B3586, todos estes arestos consultáveis - tal como os demais do STJ, que, sem referência de publicação, vierem a ser citados -, em “http://www.dgsi.pt/jstj.nsf?OpenDatabase”.

e que o Tribunal, embora possa abordar para um maior esclarecimento das partes, não está obrigado a apreciar.

Assim, o que cumpre saber é se foi correcto julgar procedente a excepção do caso julgado e, por via disso, absolver o Réu da instância.

II - Fundamentação: A) - Na sentença sob recurso considerou-se o seguinte, em termos de matéria de facto: «Com interesse para a apreciação da excepção, está provado, com base na certidão junta a fls. 75-83 e na consulta destes autos, o seguinte: 1. No dia 05.12.1957 nasceu o autor, F…, em cujo assento de nascimento consta apenas a indicação de que é filho de D…, solteira, e a avoenga materna a favor de J… e M…, sem menção da paternidade e avoenga paterna.

2. O Ministério Público, em representação do aqui autor, então menor, instaurou contra o ora réu, M…, acção de investigação de paternidade, pedindo que o primeiro fosse reconhecido como filho do segundo, com fundamento no relacionamento sexual deste com a mãe daquele no período legal de concepção.

3. A acção referida em 2, a que correspondeu o Processo n.º … do então Juízo da 1.ª Secção do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, foi julgada improcedente, porque não provada, e o réu foi absolvido do pedido, por sentença proferida em 02.12.1969, já transitada em julgado.

4. Na presente acção, o autor invoca, como fundamento do pedido do seu reconhecimento como filho do réu, a prática de relações sexuais da sua mãe com este, no período legal de concepção, no contexto da relação amorosa que mantinham.

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  1. - Na óptica do Apelante - que não coloca em causa, no recurso, a existência da tríplice identidade prevista no artº 581º do NCPC -, não se pode invocar o caso julgado para obstar, “in casu”, ao prosseguimento da acção, pois que, desde logo, se deve entender extensível à acção de reconhecimento de paternidade instaurada pelo Ministério Público, em representação do menor, pretenso filho, o que (“ex vi” do artº 1868º do Código Civil) está previsto no artº 1813º do CC para a acção oficiosa de investigação de paternidade, até porque, o entendimento contrário a esse viola o...

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