Acórdão nº 13427/16.7T8LSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelCRISTINA NEVES
Data da Resolução21 de Junho de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO MM instaurou acção especial de inquérito judicial a sociedade, ao abrigo do disposto no art. 1048 do Código do Processo Civil contra Araújo, Sanchez & C.A, sociedade em nome colectivo, e AM, invocando para tanto a qualidade de sócia da sociedade, juntamente com o 2.º requerido, e a falta de prestação de informações pelo 2º requerido, gerente da 1ª requerida.

Citados, os requeridos contestaram, por excepção, invocando a ilegitimidade activa da requerente, nos termos do art. 30/1 do CPC, pela natureza contitular e indivisa da quota da qual a requerente também participa, não tendo esta alegado ter a natureza de representante comum, e por impugnação, invocando que o pedido é infundado por a sociedade prestar mensalmente informações aos detentores de participações sociais, bem como das decisões tomadas e actos praticados (conforme documentos juntos com a PI).

Mais alegam que, além destas informações mensais, foram prestadas informações solicitadas pela requerente em reuniões tidas entre os advogados desta e do 2º requerido, mais alegando que, pretendendo o 2º requerido agendar com a requerente visita ao escritório a fim de permitir a consulta de documentos e prestar os esclarecimentos solicitados, esta não acedeu.

* Afinal foi proferida sentença, na qual se considerou procedente a excepção de ilegitimidade activa da requerente, mas, considerando que poderia esta, em tese, ser suprida mediante convite à intervenção dos demais co-titulares da quota, prosseguiu-se com o conhecimento do mérito da causa, considerando-se afinal, o pedido de inquérito judicial improcedente, dele se absolvendo os requeridos.

* Não conformada com esta decisão, impetrou a requerente recurso da mesma, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem: “Conclusões: I-O pressuposto processual da legitimidade encontra-se regulado no artigo 30º do CPC, que dispõe, na parte que nos importa, que “o autor é parte legítima quando tem interesse directo em demandar” (nº1) e que tal interesse se exprime “pela titularidade derivada da procedência da acção” (nº2), acrescentando-se que, na falta de indicação da lei em contrário, “são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida tal como é configurada pelo autor.” (nº3) II-A Autora, aqui Recorrente é sócia da sociedade Araújo, Sanchez & Ca.

III-O artigo 181º, nº1, do CSC, estabelece que os gerentes de uma sociedade em nome colectivo devem prestar a qualquer sócio, que o requeira, informação verdadeira, completa e elucidativa sobre a gestão da sociedade e, bem assim, facultar-lhe na sede social a consulta da respectiva escrituração, livros e documentos.

(sublinhado nosso) IV-A consulta da escritura, livros ou documentos deve ser feita pessoalmente sócio, que pode fazer-se assistir de um revisor oficial de contas ou de outro perito, como resulta do nº 3 do mesmo artigo 181º do CSC.

  1. Apesar de inúmeras diligências para a obtenção de respostas a várias questões relacionadas directamente com a vida da sociedade, não foi possível obter, pela aqui recorrente, respostas verdadeiras, completas e elucidativas.

  2. Nos termos do artigo 1048 do C.P.C., o interessado que pretenda a realização de inquérito judicial à sociedade, nos casos em que a lei o permita, alega os fundamentos do pedido de inquérito, indica os pontos de facto que interessa averiguar e requer as providências que repute conveniente.

  3. O direito do sócio requerer inquérito judicial releva, não apenas quanto ao não fornecimento de informações, como, também, em caso de recusa do direito de consulta ou de informação sobre a vida da sociedade, nomeadamente, quando lhe é negado o direito de obter informação sobre um específico assunto respeitante à gestão da sociedade.

  4. O inquérito à sociedade é o meio próprio da recorrente lançar mão, porquanto se trata de uma faculdade jurídica instrumental do direito á informação, lato sensu, isto é, do direito do sócio a ser informado da vida e do giro da sociedade.

  5. A autora aqui recorrente colocou 46 pontos de facto, ou seja, 46 questões que estão por responder.

  6. Ficou provado que o gerente da sociedade Araújo, Sanchez & Ca. envia a todos os detentores de participações sociais, uma folha A4 denominada “Folha de Caixa” com informação sobre algumas situações relacionadas com a vida da sociedade.

  7. Todavia, a informação enviada não é completa nem elucidativa, sobre a gestão da sociedade.

  8. Não responde às 46 questões que fazem parte do pedido, e que a sócia, aqui recorrente, pretende ver esclarecidas! XIII. A considerar válida a posição assumida na decisão de que se recorre, seria afastar a sócia, aqui recorrente, das informações da vida da sociedade.

  9. Sendo que a recorrente assume uma responsabilidade acrescida, resultante das características das sociedades em nome colectivo.

  10. Nos termos do artº 1049º CPC, é referido que o “…juiz decidirá se há motivos para proceder ao inquérito…”, situação que tem de ser entendida no âmbito da natureza do processo em que nos encontramos – jurisdição voluntária, sendo-lhe por isso aplicável o disposto nos artigos nºs 986 e 988 do CPC.

  11. Ora, no seio de tais processos, o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, podendo ser proferido um juízo de oportunidade ou conveniência face aos interesses em causa.

  12. Como referia o Professor Alberto dos Reis, Processos Especiais, Vol. III, pág. 400, “…o julgador não está vinculado à observância rigorosa do direito aplicável à espécie vertente; tem liberdade de se subtrair a esse enquadramento rígido e de proferir a decisão que lhe pareça mais equitativa.

    ” XVIII. É por via disso que o tribunal “pode investigar livremente os factos, coligira as provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações convenientes.” Artigo 896º, nº2, do Código Civil.

  13. No caso em apreço, a decisão que determinou a não procedência da acção, não valorou todo o comportamento dos requeridos – quer fora do processo, quer no seu seio- e, com o devido respeito, faz uma apreciação não abrangente de todos os elementos conhecidos.

  14. Pois que a conduta reiterada do gerente da sociedade requerida, foi sempre no sentido de não facultar à requerente as informações por ela pedidas, o que aconteceu, aliás, na pendência da acção aqui recorrida.

    Pelo exposto, À Autora, ora Recorrente, não restar outra alternativa senão a de submeter o presente Recurso à apreciação de Vossas Excelências, afim de que a decisão recorrida seja substituída por outra, determinando o Inquérito Judicial à Sociedade, seguindo-se os ulteriores termos, o que é de absoluta Justiça.” * Pelos Requeridos foram interpostas contra alegações, formulando afinal as seguintes conclusões: “1 – o art. 222º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais, prescreve que em caso de contitularidade de uma participação social os direitos a ela inerentes devem ser exercidos através de representante comum; 2 – a génese deste dispositivo encontra-se no potencial de conflitualidade que o exercício de direitos por um dos contitulares de uma participação social pode gerar na vida societária; 3 – a recorrente MM não é representante comum da quota de que é contitular; 4 – o art. 222º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais, consagra uma norma específica de representação que afasta a aplicação do art. 30º do C.P.C., do que resulta a sua ilegitimidade para o exercício do direito de pedir inquérito judicial; 5 - o pedido de inquérito judicial a uma sociedade apenas é admissível nos de falta de apresentação das contas do exercício, de recusa de apresentação de contas do exercício, de deliberação ilícita de distribuição de bens aos sócios, de recusa, incompletude ou falsidade de...

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