Acórdão nº 1985/17.3T8VNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelCARLOS GIL
Data da Resolução13 de Junho de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Sumário do acórdão proferido no processo nº 1985/17.3T8VNG-P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil: ..............................................................

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*** * ***Acordam os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório Em 07 de março de 2017, no Juízo Cível da Instância Central de Vila Nova de Gaia, Comarca do Porto, com o benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, B...

e C...

instauraram a presente ação declarativa, que seguiu sob forma comum[1], contra D..., Sucursal em Portugal pedindo a condenação da ré a pagar-lhes a quantia de € 116.197,20, a título de perda de alimentos, a quantia de € 80.000,00, a título de compensação pela perda do direito à vida de E..., a quantia de € 35.000,00, a título de dano “ante mortem” e a quantia de € 25.000,00, a cada um dos autores, a título de danos não patrimoniais que sofreram com o padecimento e falecimento do companheiro e pai, respetivamente.

Em síntese, para fundamentar as suas pretensões, os autores alegaram que no dia 07 de março de 2015, pelas 22h05, no Posto de Abastecimento F... sito na Rua ..., nº ..., em ..., Vila Nova de Gaia, após a ocorrência de um assalto, E... saía a caminhar do referido posto, tendo sido embatido pela frente esquerda do veículo de matrícula ..-FM-.., que circulava a velocidade não inferior a sessenta quilómetros por hora, passando-lhe por cima com a roda esquerda da frente; mais alegaram que em consequência desse atropelamento E... veio a falecer no dia 08 de março de 2015, pelas 14h10, deixando a autora, sua companheira desde há vinte e cinco anos e o autor, seu filho e resultando desse sinistro os danos que pretendem ver ressarcidos com a procedência desta ação; a responsabilidade civil emergente de acidente com intervenção do veículo de matrícula ..-FM-.. estava transferida para a ré.

Citadas a ré e o Instituto de Segurança Social, I.P.

veio este instituto aderir à descrição do sinistro feitas pelos autores, pedindo a condenação da ré ao pagamento da quantia de € 2.337,98, a título de pensões e despesas de funeral por si pagas, acrescida das pensões que se vencerem e forem pagas na pendência da ação, até ao limite da indemnização a conceder, bem como dos juros legais contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.

D..., Sucursal em Portugal contestou referindo, em síntese, que o sinistro aconteceu na sequência de um assalto, sendo o assaltante o peão atropelado e que depois do assalto surgiu a correr, da direita para a esquerda, atento o sentido de marcha do veículo, com a pistola apontada na direção do condutor do veículo FM; face à ameaça da pistola, o condutor do veículo FM iniciou a sua marcha, a velocidade inferior a vinte quilómetros por hora, desviando-se para a esquerda, colocando-se o assaltante na frente do veículo, no sentido de o imobilizar, sendo em consequência atropelado; impugnou os danos invocados pelos autores e concluiu pela total improcedência da ação, em virtude do sinistro ser exclusivamente imputável ao falecido E... e pedindo a condenação dos autores como litigantes de má-fé em multa não inferior a dez unidades de conta e em indemnização a fixar com o prudente arbítrio do tribunal.

Os autores responderam à contestação da ré negando litigarem de má-fé e afirmando que quem litiga de má-fé é a ré, pedindo a sua condenação a tal título em multa e indemnização não inferior a quinze mil euros.

A ré contestou o pedido de reembolso deduzido pelo Instituto de Segurança Social, IP, pugnando pela sua total improcedência.

Dispensou-se a audiência prévia, fixou-se o valor da causa no montante de € 283.535,18, proferiu-se saneador tabelar, identificou-se o objeto do litígio e enunciaram-se os temas de prova, admitindo-se as provas oferecidas pelas partes, com exceção da inspeção judicial requerida pelos autores, sugerindo-se datas para realização da audiência final.

Os autores reclamaram contra a enunciação dos temas de prova, requerendo a realização de audiência prévia.

Realizou-se a audiência prévia requerida pelos autores, respondendo estes à exceção de legítima defesa alegadamente invocada pela ré, qualificação que o tribunal a quo enjeitou, bem como os temas de prova propostos pelos autores, mantendo integralmente o já anteriormente decidido por escrito.

Os autores alteraram as provas oferecidas nos articulados, provas que foram admitidas, mantendo-se a data designada para realização da audiência final.

O Instituto de Segurança Social, IP veio requerer a ampliação do pedido para o valor total de € 7.597,22.

A audiência final realizou-se em duas sessões.

Em 18 de dezembro de 2017 foi proferida sentença[2] que julgou a ação totalmente improcedente.

Em 12 de fevereiro de 2018, inconformados com a sentença, B...

e C...

interpuseram recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: “1 - Não podem os Autores concordar com a matéria de facto dada por provada, e com a imputação à própria vítima atropelada e falecida em consequência do acidente dos autos.

2 - A conjugação dos depoimentos (tanto das testemunhas como das partes) produzidos em sede de julgamento conjugado com os documentos juntos aos autos e com as regras da experiência comum não permitem concluir que o E... “… teve um comportamento temerário e imprudente ao se colocar na frente da dita viatura.” 3 - A dinâmica do acidente relatado pelas testemunhas, G... e H..., assim como os depoimentos do condutor atropelante e da sua mulher, encontram-se eivados de contradições insanáveis que não permitem concluir que a culpa pela ocorrência do atropelamento possa ser imputada à vítima, E....

4 - A douta sentença, lavra em erro de avaliação da matéria de facto, na medida em que em nenhum momento do julgamento nenhuma das testemunhas ouvidas conseguiu justificar os danos verificados no veículo e enquadrá-los com a dinâmica referida na douta Sentença.

5 - O veículo de matrícula ..-FM-.. apresenta danos decorrentes do atropelamento – cfr. doc. fls.(…) dos presentes autos – e que manifestamente não coincidem nem corroboram a tese da dinâmica dada por provada.

6 - O Digníssimo Tribunal dá por provado no ponto 5 dos factos provados – “… o veículo de matrícula ..-FM-.. conduzido por I... embateu com a frente esquerda contra o E..., passando-lhe por cima com a roda esquerda da frente e imobilizando-se de imediato….” 7 - Conclui o Digníssimo Tribunal que o E... surgiu a correr da direita para a esquerda, atento o sentido do FM, e que este, ainda, se desviou para a esquerda, e que o E... se colocou à frente do veículo, para onde se atirou, no sentido de o imobilizar, mas foi logo atropelado, e que com o impacto o assaltante caiu para a frente do veículo, o qual logo passou por cima do seu corpo.

8 - A ser assim como a douta sentença descreve a dinâmica do acidente como é que os danos ocorridos no veículo de matricula ..-FM-.. se verificam na frente lateral esquerda.

9 - A tarefa do julgador, fazendo apelo às regras da experiência, seria de tentar apurar em concreto e de facto se a tese apresentada pelas partes, se os depoimentos prestados pelas testemunhas presenciais corroboram os elementos objectivos apurados durante averiguação oficiosa do acidente.

10 - E, na presente situação o elemento objectivo é o local da verificação dos danos no veículo FM (parte do veículo que embate contra o E...), e a os factos dados por provados pelo Digníssimo Tribunal não explicam, nem esclarecem, atrevemo-nos até a dizer que contrariam esse elemento objectivo.

11 - Mas para além desse facto (essencial, dizemos nós, para se compreender a dinâmica do acidente) subjazem nos depoimentos prestados incoerências que não permitiriam ao Digníssimo Tribunal dar por provados factos que acabou por dar por provados.

12 - Depoimento da testemunha – G... (T1) – Acta de Audiência de Discussão e Julgamento – 25 de Setembro de 2017 – gravação através do sistema integrado de gravação digital, com início de gravação: 11.11.41/ Fim da gravação: 11.40.41 horas. Ficheiro de áudio 20170925111140_14871993_2871606, com início de gravação: 00.00/ Fim da gravação: 28.20.

13 - No seu depoimento o Sr. G..., nunca refere que o E... saiu a correr das bombas de gasolina, nem que o E... surge a correr à frente do FM.

14 -Diz sempre que seguia a passo, e depois a passo acelerado e que o viu a travessar, que não faz ideia se ele, E..., foi para cima do veículo. Que não viu o embate. Não sabe até se tropeçou. Com isso não justifica a verificação dos danos no veículo FM.

15 - Mas diz que o seu colega H... ficou à porta da loja de conveniência.

16 - E, diz mais o Sr. G..., que o condutor do veículo atropelante saiu das bombas de combustível, e ficou parado na Rua ..., em segurança, que tinha visibilidade total para o exterior das bombas, e que este viu a mulher K... a sair (que esta tinha tempo para “fugir” do local), e só nessa altura o condutor do FM resolveu entrar, novamente, nas bombas, tendo ficado aí parado algum tempo.

17 - Disse inclusivé, que o condutor quando está parado na entrada das bombas podia ter efectuado manobra de marcha atrás, em vez de decidir arrancar e atropelar o E....

18 - Depoimento da testemunha – H... (T2) – Acta de Audiência de Discussão e Julgamento – 25 de Setembro de 2017 – gravação através do sistema integrado de gravação digital, com início de gravação: 11.45.24/ Fim da gravação: 12.19.59 horas. Ficheiro de áudio 20170925114522_14871993_2871606, com início de gravação: 00.00/ Fim da gravação: 34.30.

19 - O Depoimento desta testemunha é o mais contraditório e incoerente de todos, pois diz tudo e o seu contrário. E, não se compreende, pois, encontrava-se à porta da loja de conveniência, facto confirmado por si e pelo colega G....

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