Acórdão nº 203/14.0TBPDL-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelRUI ANT
Data da Resolução06 de Novembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam em conferência do Tribunal da Relação de Lisboa: I - RELATÓRIO J…, com sede na Rua …, intentou em 28 de Janeiro de 2014 acção de processo de jurisdição voluntária para fixação judicial de prazo contra A..., com sede … , alegando para tanto, e em síntese, o seguinte: - Em 3 de Janeiro de 2005 a Requerente e a Requerida firmaram entre si um acordo escrito pelo qual a Requerida prometeu vender à Requerente, e esta prometeu comprar à Requerida, quatro fracções autónomas, denominadas por lotes ou pavilhões nºs 3.16, 3.17, 3.18 e 3.19, correspondentes a prédios urbanos destinados a comércio ou indústria ligeira, sitos na Estrada Velha do Pico da Pedra, freguesia de Rosto de Cão, S. Roque, concelho de Ponta Delgada, integrantes do processo de loteamento nº 555-lote-570/04 da Câmara Municipal de Ponta Delgada e omissos na respectiva Conservatória do Registo Predial (doc. 1).

- Foi também estipulado que a compra e venda então prometida se realizaria pelo preço global de 570.000,00 € (quinhentos e setenta mil euros), a pagar através das seguintes seis entregas: a) 57.000,00 € na data de assinatura do contrato-promessa, com a natureza de sinal e princípio de pagamento; b) 57.000,00 € até 90 dias após a assinatura do contrato-promessa, com a natureza de reforço de sinal; c) 85.500,00 € até 180 dias após a assinatura do contrato-promessa, com a natureza de reforço de sinal; d) 85.500,00 € até 270 dias após a assinatura do contrato-promessa, com a natureza de reforço de sinal; e) 85.500,00 € até 360 dias após a assinatura do contrato-promessa, com a natureza de reforço de sinal; f) 199 500,00 € na outorga da escritura pública de compra e venda, aprazada para 30 de Junho de 2006 (doc. 1).

- Dessas seis entregas a Requerente efectuou as primeiras quatro, as quais totalizaram um valor de 285.000,00 € (duzentos e oitenta e cinco mil euros).

- Por carta de 30 de Janeiro de 2006, a Requerente solicitou à Requerida a "rescisão" do referido contrato-promessa (doc. 2).

- E, por carta de 31 de Janeiro de 2006, dirigida ao gerente da Requerente, a Requerida aceitou essa "rescisão por mútuo acordo na aquisição dos pavilhões nº 3.16, 3.17, 3.18 e 3.19" (doc. 3).

- E nessa carta acrescentou o seguinte: “Desta forma, vamos dar início às diligências necessárias à colocação dos mesmos no mercado, bem como, na sequência do resultado destas, proceder à devolução das importâncias a singelo por si pagas a título de sinal” (doc. 3).

- Todavia, até hoje, a Requerida não devolveu à Requerente a quantia de 285.000,00 €, não obstante haver sempre reconhecido que é devedora da Requerente por aquele montante, o que fez, designadamente, em carta de 26 de Janeiro de 2010, na qual pediu à Requerente que, no âmbito de uma auditoria realizada pelos seus revisores oficiais de contas, confirmasse junto destes o valor em causa (doc. 4).

- Mais, em documento escrito de 28 de Março de 2012, tornou a Requerida a reconhecer-se devedora para com a Requerente pelo referido valor, a cuja devolução voltou a vincular-se, declarando "que irá proceder à devolução do montante de 285.000,00 € à empresa J..." (doc. 5).

- Na mesma declaração acrescentou ainda "que a concretização da referida devolução aguarda apenas a formalização de escritura de compra e venda com o Município de Ponta Delgada relativo à venda dos referidos pavilhões, o qual se realizará no presente ano de 2012" (doc. 5).

- Ora, nos meses imediatos à "rescisão por mútuo acordo" do contrato-promessa, a Requerida procedeu à venda dos lotes ou pavilhões nºs 3.18 e 3.19. Volvidos 8 anos, porém, a Requerida não vendeu ainda os lotes ou pavilhões nºs 3.16 e 3.17.

- Privada ao longo desse tempo de uma soma que lhe pertence e que nem a própria Requerida questiona ser-lhe devida, a Requerente vem insistindo pela devolução em singelo do sinal entregue, como fez na carta que endereçou à Requerida em 10 de Abril de 2013, em que aludiu à circunstância de, há muito, se estar perante um "lapso de tempo suficiente para o cumprimento da obrigação de restituição do sinal” (doc. 6).

- A Requerente não pode mais condescender com a passividade da Requerida em relação àquela venda, nem, muito menos, lhe pode ser exigido que aguarde indefinidamente pela iniciativa da Requerida para cumprir com a sua obrigação de devolução em singelo do valor do sinal.

- Não tendo sido estipulado, na "rescisão por mútuo acordo", um prazo certo dentro do qual a Requerida devesse realizar aquelas vendas e devolver à Requerente o sinal em singelo, torna-se urgente e necessário estabelecer tal prazo.

- Em abono da sua pretensão cita o judicado no Ac. do ST J de 15.05.2013, que dirimiu um caso semelhante ao presente, segundo o que "colocar o momento de vencimento da obrigação dos réus no momento em que estes procederem à venda do imóvel em causa sem limitação temporal para o fazer, seria permitir que estes se pudessem prevalecer de uma obrigação sem qualquer sanção, ou seja, permitira que aqueles cumprissem quando quisessem, sem qualquer limite temporal e sem possibilidade de a autora poder exigir o respectivo cumprimento" (in dgsi.pt).

- Na esteira do entendimento seguido pelo mencionado acórdão, é de concluir que o cumprimento da obrigação, por parte da Requerida, de devolver em singelo o sinal que recebeu, exige uma fixação judicial de prazo (CC, art. 777°, nºs 2 e 3).

- O facto de haverem sido vendidos dois dos quatro lotes ou pavilhões, o longo tempo entretanto decorrido e a afirmação, por parte da própria Requerida, de que a venda dos dois últimos lotes ou pavilhões se ia realizar ainda no ano de 2012, tornam suficiente e razoável um prazo não superior a 30 dias, contados do trânsito em julgado da decisão, para a devolução dos 285.000,00 €.

Conclui pedindo que na sequência da procedência da acção seja fixado à Requerida o prazo de 30 dias, contados do trânsito em julgado da decisão proferida nos presentes autos, para a devolução em singelo do sinal entregue pela Requerente no âmbito do contrato-promessa de 3 de Janeiro de 2005 no montante duzentos e oitenta e cinco mil euros.

Citada, respondeu a Requerida, dizendo, em suma: - Aceita o alegado nos artigos 1 a 7, 11 e 12 do requerimento inicial.

- Confessa que, como resulta do teor da carta junta com o requerimento inicial como doc. 3, a Requerida aceitou a "rescisão por mútuo acordo" associada à condição de "proceder à devolução das importâncias a singelo pagas a título de sinal" após as diligências necessárias à colocação dos pavilhões no mercado, e "na sequência do resultado destas" (diligências).

- Entende que a devolução das importâncias pagas a título de sinal em singelo ficou sujeita a duas condições: a venda dos pavilhões 3.16, 3.17, 3.18 e 3.19 e o resultado dessa venda.

- Não aceita que a Requerida alguma vez tenha reconhecido que era devedora à Requerente do montante de 285.000,00€, nem esse facto resulta dos documentos juntos com o requerimento inicial sob os nos. 4 e 5. Justifica.

- A Requerida mantém a intenção de cumprir a obrigação assumida no "acordo de rescisão" do contrato-promessa - ocorrendo a venda prevista, devolveria o sinal. Diz que por razões adiante explicitadas, a venda prevista não se concretizou. Explicita as razões.

- Argumenta ter a Requerente omitido no seu requerimento vários factos relevantes para a decisão da causa.

- Diz que foi recordado à Requerida que o Município tinha dado a conhecer verbalmente à Requerida e à Requerente, no final do ano de 2011, a sua intenção de adquirir os referidos pavilhões, sendo tal aquisição a concretizar no ano seguinte. Essa intenção fora, pois, formada e comunicada quando as novas condicionantes legais não existiam. A Requerida informou ainda que ficava a aguardar outro potencial interessado na aquisição do referido espaço.

- Ou seja, a única oportunidade que a Requerida teve de vender os dois pavilhões pelo preço pretendido pela Requerente não se concretizou por impossibilidade legal.

- A Requerida já explicou à Requerente a razão por que não se tinha concretizado a compra por...

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