Acórdão nº 5792/12.1TDLSB.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelGRA
Data da Resolução05 de Novembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, em conferência, neste Tribunal: I – Relatório: Por despacho de 10/03/2014, proferido pelo Juiz de Instrução, foi declarada a nulidade do despacho de folhas 191 a 198 dos autos e de todo o processado subsequente.

*** Os arguidos A e B recorreram do supra referido despacho, concluindo as alegações nos termos que se transcrevem: «-I - O inquérito é da exclusiva titularidade do Ministério Público e só permite a intervenção pontual do juiz nos casos expressamente tipificados na lei; -II- Por seu turno, encerrado o inquérito e aberta a instrução, abre-se uma fase autónoma do processado cuja direção radica doravante no juiz de instrução, que, com total autonomia ordena as diligências que tenha por necessárias ao fim dessa fase eventual: proferir decisão instrutória; - III - Do regime legal resulta, pois, que é autónoma a intervenção do Ministério Público no inquérito e do juiz de instrução na fase eventual que se lhe segue; - IV - E se existe autonomia de atuação, não tem fundamento legal qualquer «ordem», nomeadamente do juiz de instrução, para ser cumprida no âmbito do inquérito por quem não deve obediência institucional, nem hierárquica a tal injunção: - V- O juiz de instrução não pode devolver o processo ao Ministério Público para eventual suprimento de uma nulidade de inquérito, como a da falta de constituição de arguidos, e isto muito menos quando o mesmo inquérito foi arquivado por absoluta inexistência de indícios da prática de qualquer crime; - VI - No caso referendado, a Assistente dos autos poderia ter reagido contra o arquivamento, não através de requerimento para abertura da instrução, mas suscitando intervenção hierárquica, o que não fez; - VII - O despacho ora recorrido, ao ter interpretada e aplicada a lei de forma desconforme à que resulta das conclusões supra apontadas, violou, pois, entre outras, as normas jurídicas presentes nos arts. 219°-1 e 32°-5 da CRP; 1º, 2°, 3°-1-c) h) do EMP, aprovado pela L. 60/98 de 27.8; 48°. 53°. 1200-2-d), 122°, 241º, 262°, 263°, 267° a 269°, 278°, 286° e 287°-3, todos do CPP.

Termos em que: Devem Vs. Exas. conceder total provimento ao recurso dos ora Arguidos, devendo, em consequência, ser revogado o despacho de fls. 335 a 337 dos autos, datado de 10/03/2014, com todas as consequências legais».

*** Contra-alegou o Ministério Público, concluindo as respectivas alegações no sentido da procedência do recurso, com fundamento em que «tendo-se concluído pela inexistência desta ofensa, não havia fundada suspeita para se prosseguir com um Inquérito contra as pessoas denunciadas como incertas na queixa e mais tarde no requerimento de abertura de instrução, ou seja, as que ocupavam o cargo de director-geral, director-adjunto, sub-director, editor, quer da estação televisiva ..., quer da publicação ...».

*** A assistente contra-alegou também, pugnando pela manutenção da decisão recorrida, com fundamento em que o arquivamento, que se fundou no entendimento de que os factos não constituem crime, é sindicável em termos de instrução, para cuja produção de efeitos é essencial a expurgação da nulidade emergente da não identificação e constituição como arguidos dos co-responsáveis pela prática dos factos.

*** Nesta instância, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer declarando a inteira concordância com os termos da contra-motivação apresentada pelo MP.

*** *** II- Questões a decidir: Do artº 412º/1, do CPP resulta que são as conclusões da motivação que delimitam o objecto do recurso e consequentemente, definem as questões a decidir em cada caso ([1]), exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso ([2]).

As questões colocadas pelos recorrentes, arguidos, são: - Ilegalidade do despacho, por violação dos princípios autonomia do MP na direcção do inquérito e da separação de poderes entre Juiz e MP, nessa precisa fase e mormente, quanto ao despacho de arquivamento; - Ilegalidade da invocação da nulidade em sede de instrução, pois deveria e poderia ter sido arguida em sede de intervenção hierárquica do MP.

O MP coloca a questão da inutilidade da prática dos actos omitidos, uma vez que quando a questão se colocou já havia sido proferido despacho de arquivamento, por se ter entendido que os factos denunciados não constituem crime.

*** *** III- Fundamentação de facto: 1- C apresentou queixa, pela prática do crime de difamação, p. e p. pelos artºs 180º, 183º/2 e 184º, do CP, contra A, B, e «incertos, a identificar em sede de inquérito que, no exercício das funções de Director Geral, Director-adjunto, subdirector, editor do ..., do Jornal ... e da Edição da Noite da ..., ou quem concretamente os tenha substituído e que, tendo tomado conhecimento do teor das noticias em causa, e podendo, não se tenha oposto à sua emissão», Miguel ..., António ... e «incertos, a identificar em sede de inquérito que, no exercício das funções de Director- adjunto, subdirector, editor da revista ..., ou quem concretamente os tenha substituído e que, tendo tomado conhecimento do teor das notícias em causa, e podendo, não se tenha oposto à sua publicação».

2- Terminou a queixa pedindo que «recebida esta queixa, se digne ordenar as diligências necessárias para instauração do respectivo procedimento criminal contra os denunciados, - A, pela prática de um crime de difamação agravado, p. e p. pelos art. 180.º, 183.º n.º 2 e 184.º por remissão para o art. 132.º, n.º 2 j), todos do Código Penal bem como dos artigos 30º e 31º da Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro com as alterações introduzidas pela Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho (Lei de Imprensa).

- B, pela prática de um crime de difamação agravado, p, e p. pelos art. 180.º, 183.º n.º 2 e 184.2 por remissão para o art. 132.2, n.º 2 j), todos do Código Penal, bem como do artigo 30º da Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro com as alterações introduzidas pela Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho (Lei de Imprensa); - Incertos, a identificar em sede de inquérito que, no exercício das funções de Director Geral, Director-adjunto, subdirector, editor do ..., do Jornal ... e da Edição da Noite da ..., ou quem concretamente os tenha substituído e que, tendo tomado conhecimento do teor das noticias em causa, e podendo, não se tenha oposto à sua emissão pela prática de um crime de difamação agravado, p. e p. pelos art. 180.º, 183.º n.º 2 e 184.º por remissão para o art. 132.º, n.º 2 j), todos do Código Penal, bem como dos artigos 30º e 31º da Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro com as alterações introduzidas pela Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho (Lei de Imprensa).

- MIGUEL ..., pela prática de um crime de difamação agravado, p, e p. pelos art. 180.º, 183.º n.º 2 e 184.º por remissão para o art. 132.º, n.º 2 j), todos do Código Penal, bem como do artigo 30º da Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro com as alterações introduzidas pela Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho (Lei de Imprensa); - ANTÓNIO ... pela prática de um crime de difamação agravado, p. e p. pelos art. 180.º, 183.º n.º 2 e 184.º por remissão para o art. 132.º, n.º 2 j), todos do Código Penal, bem como do artigo 30º da Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro com as alterações introduzidas pela Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho (Lei de Imprensa).

- Incertos, a identificar em sede de inquérito que, no exercício das funções de Director Geral, Director-adjunto, subdirector, editor da Revista "..." ou quem concretamente os tenha substituído e que, tendo tomado conhecimento do teor das noticias em causa, e podendo, não se tenha oposto à sua emissão pela prática de um crime de difamação agravado, p. e p. pelos art. 180.º, 183.º n.º 2 e 184.º por remissão para o art. 132.º, n.º 2 j), todos do Código Penal, bem como dos artigos 30º e 31º da Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro com as alterações introduzidas pela Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho (Lei de Imprensa)».

3- Foram constituídos arguidos, nos autos, Miguel …, B, A e António ….

4- A 01/05/2013 foi proferido despacho de arquivamento, pelo MP, onde consta, dentre o mais, que (asteriscos retirados): «Com a queixa foram juntos relevantes elementos de prova, como sejam a transcrição de reportagem da SIC, fotograma da queixosa recolhido em fonte aberta, bem como cópia da parte relevante da Revista ..., e ainda 2 Cd,s.

Foi inquirida a denunciante a fls 58, a qual reiterou a queixa e fez alusão a todo o processo que levou à constituição de um sociedade civil, sendo mandatária de Raquel … uma das herdeiras, tendo mesma afirmado que não corresponderia à verdade o facto da ofendida ser suspeita de fraude e burla, ao contrário do que passou na TV durante o todo o dia, afirmando ainda que na reportagem se afirmava que a ofendida teria sido alvo de buscas o que não foi verdade.

O mesmo sucedendo em relação à Revista "..." onde tal afirmação foi feita bem como a de que teria sido constituída como arguida nos respectivos autos.

Foram ainda inquiridos Roberto ..., Ana ..., Maria ....

Foi interrogado o denunciado Miguel ...... na qualidade de arguido não tendo prestado declarações, o mesmo sucedendo a fls 107 com o arguido António ....

Por sua vez B interrogado afirmou estar seguro de todo o conteúdo da reportagem e efectuada e possuir documentação pública que sustenta o conteúdo afirmando que tentou por diversas vezes contactar a queixosa sem o conseguir, o que fez para cumprimento do contraditório, mas sem sucesso.

Por sua vez A afirmou ter conhecimento da reportagem e não tendo acompanhado os pormenores da notícia, tanto mais que mesma estava entregue a uma equipa de repórteres sénior nos quais tem confiança absoluta, considerando o trabalho feito como exemplar e de verdadeiro serviço público.

Mais tarde a fls 108 veio o arguido B apresentara defesa por escrito juntando documentação relativa à reportagem, o que fez nos termos do art.98 nº1 do C.P.P. concluindo que o trabalho jornalístico não imputa à queixosa qualquer juízo de valor, directa ou indirectamente pois a mesma apenas é visada genericamente, conforme descreve a fls 174, rejeitando assim o...

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