Acórdão nº 2186/10.7IDLSB.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelNUNO RIBEIRO COELHO
Data da Resolução29 de Outubro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Lisboa: I. RELATÓRIO Nestes autos foram (1) José Manuel de Almeida...

e (2) “... – Distribuição e Comércio Alimentar”, Ld.ª, condenados nos seguintes moldes: - a mencionada sociedade “... – Distribuição e Comércio Alimentar”, Ld.ª, pela prática do crime de fraude fiscal, p. e p. pelo Art.º 103.º, n.º 1, do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/01, de 05 de Junho, na pena de 230 (duzentos e trinta) dias de multa, à taxa diária de € 10 (dez euros), o que perfez o valor global de € 2.300 Euros (dois mil e trezentos euros); e - o identificado arguido José Manuel ..., pela prática de um crime de fraude fiscal, p. e p. pelo Art.º 103.º, n.º 1, do RGIT, aprovado pela Lei n 15/01, de 05 de Junho, na pena de 230 dias de multa à taxa diária de € 8 (oito euros), o que perfez a multa no valor global de € 1.840 (mil oitocentos e quarenta euros).

Na mesma sentença foram ambos os arguidos absolvidos da pronúncia da prática, de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelo Art.º 105.º , n.º 1, do RGIT, aprovado pela Lei nº 15/01, de 05 de Junho.

O arguido (1) José Manuel ..., inconformado com esta sentença condenatória, apresentou recurso da mesma, concluindo a sua motivação nos seguintes moldes: 1.ª A sentença em causa, ao ter condenado os arguidos pelo crime de fraude fiscal atinente a omissão de declaração tributária respeitante a rendimentos que se encontram documentados em "facturas" que ela própria coloca em crise enferma de erro de Direito no que se refere à interpretação e aplicação do artigo 103.º, n.º 1, b) do RGIT, porque assume essa norma como sendo aplicável a situações em que os rendimentos sociais se encontram em dúvida até pela forma como se evidenciaram documentalmente, 2.ª A sentença em causa, ao ter condenado os arguidos pelo crime de fraude fiscal atinente a omissão de declaração tributária respeitante a alegados rendimentos sociais que decorrem de negócio jurídico que pela sua natureza de trespasse de uma sociedade que, tendo cessando, viu a sua laboração continuar sob o comando de outra sociedade, que fruiu a sua existência, equipamento e instalações, não tendo o recorrente qualquer contacto com ela desde o acto jurídico pelo qual se exonerou da mesma, enferma de erro de Direito no que se refere à interpretação e aplicação do artigo 103.º, n.2 1, b) do RGIT, porquanto a obrigação declarativa atinente a esses rendimentos sociais, a caber, pertenceria aos novos donos que dela passaram a ter a posse útil.

O Ministério Público, nas suas alegações de resposta a este recurso da sentença final, pronunciou-se pela sua improcedência, concluindo nos seguintes termos: 1 - Não foram respeitados os requisitos legais expressos no art. 412.º , n.º s 3 e 4 do C.P.P. quanto à impugnação da matéria de facto, nem se verifica qualquer um dos vícios expressos no art.410°, n°2 do C.P.P.; 2 - Não se pode dizer, que a matéria fáctica é insuficiente para a condenação do arguido, pelo facto de a omissão da declaração tributária respeitar a rendimentos que assentam nas facturas 1005 e 1006, as quais suscitaram duvidas e que portanto não há lugar à verificação do crime de fraude fiscal; 3 - Este ilícito consubstancia um crime de perigo, pelo não se exige a obtenção da vantagem patrimonial em prejuízo do fisco, mas apenas a conduta tipificada que vise essa vantagem; 4 - Assim, o crime de fraude fiscal, consuma-se quando o agente, com a intenção de lesar patrimonialmente o Fisco, atenta contra a vontade e transparência exigidos na relação fisco-contribuinte, através de qualquer das modalidades de falsificação previstas na respectiva norma; 5 - O resultado lesivo, não integra a factualidade típica, o crime consumar-se-à mesmo que nenhum dano ou enriquecimento indevido venha a ter lugar, não sendo necessário uma relação tributária verdadeira para que ocorra o crime fiscal, bastando comprovar-se que o agente quis as acções ou omissões e que elas eram adequadas à obtenção das pretendidas vantagens patrimoniais e à consequente diminuição das receitas tributárias; 6 - Isso sem duvida que se comprovou, pelo que, a conduta do arguido integra a pratica do crime de fraude fiscal, estando preenchidos todos os elementos deste tipo legal de crime; 7 - Pelo que, não assiste qualquer razão ao recorrente.

8 - No que respeita, ao erro notório na apreciação da prova, a situação é a mesma, pois que também não se verifica.

9 - De certo, não reparou o recorrente, que na sentença a fls 463, é dado como provado que: - as tais facturas foram efectivamente entregues à sociedade, na pessoa do arguido; que o montante global dos rendimentos obtidos, no montante aí indicado diz respeito ao ano de 2006, ano esse que o arguido era o sócio gerente da Sociedade e que como legal representante da mesma tinha a obrigatoriedade de proceder à apresentação dos elementos contabilísticos perante a administração fiscal para apuramento do montante colectável em sede de IRC relativo ao ano de 2006; - que foi dado como provada a emissão de outras facturas referidas nos pontos 3,4 e 5; - bem como que com a omissão deliberada da entrega da declaração de IRC, modelo 22 e consequentemente do valor das receitas obtidas, conseguiu o arguido esconder da Administração Fiscal a correspondente matéria colectável e, por consequência não ser, nessa parte, a sociedade arguida tributada em IRC, logrando para si os benefícios correspondentes aos valores dos impostos que assim, deixou de pagar; que o fez no interesse e por conta da Sociedade com o propósito de inviabilizar o apuramento do rendimento colectável e desse modo não pagar o imposto devido, obtendo a correspondente vantagem patrimonial, sendo certo que, como já referimos não se exige a obtenção da vantagem patrimonial em prejuízo do Fisco, mas apenas a conduta tipificada que vise essa vantagem, essa conduta sem duvida existiu e consta dos factos provados na sentença.

10 - Na sentença, é referido de modo inequívoco que ao agir do modo descrito, o arguido sabia que com a sua conduta, determinava que não fossem entregues ao Estado impostos devidos pela sociedade arguida, com o que logrou causar ao Estado e á comunidade contribuinte, um prejuízo patrimonial o que quis e fez.

11 -Acresce ainda que, mesmo excluindo-se as tais facturas 1005 e 1006, constam dos factos provados várias outras facturas em que a soma dos seus montantes ultrapassa os 15.000.00 euros, verificando-se igualmente quanto a essas o crime de fraude fiscal.

12 - Assim, tais factos são suficientes para o preenchimento do tipo.

Assim, estão preenchidos não só os elementos do tipo, como para a verificação do requisito da vantagem patrimonial ilegítima ser superior a 15.000.000 euros (mesmo na hipótese, que não se concorda, de se excluir as facturas 1005 e 1006) e por conseguinte, a sua punição, pois que, abaixo de tal valor os factos não seriam puníveis (Ac. da R.C. de 9/05/07, proc.n° 11/04:7IDCBR.CI).

13 -Deste modo, a conduta em apreço, preenche o tipo legal de crime de fraude fiscal, sendo a mesma punível, pelo que, bem decidiu a Mma Juiz ao condenar o arguido, nos termos em que o fez.

14 - É dado como provado que o arguido emitiu diversas facturas nos montantes globais que aí se indicam, bem como todos os factos concernentes ao IVA.

15 - Ora, uma vez que, como já referimos não se exige a obtenção da vantagem patrimonial em prejuízo do Fisco, mas apenas a conduta tipificada que vise essa vantagem, essa conduta sem duvida existiu e consta dos factos provados na sentença, nomeadamente nos pontos 2,3,4,5,9,12,13,14 e 15, sendo tais factos suficientes para o preenchimento do tipo; 16 -Deste modo, a condenação do arguido assentou com tinha que ser, nos factos dados como provados na sentença e foi este condenado pelo crime de fraude fiscal, do qual vinha acusado, por se verificarem as condutas descritas na acusação; 17 - Pelo que, bem decidiu a Mm-. Juiz, ao condenar o arguido nos termos em que o fez, não violando qualquer norma legal.

Nestes termos e pelos fundamentos expostos deverão V. Ex.as. considerar improcedente o presente recurso mantendo-se inteiramente a decisão recorrida.

Contudo V. Ex.as. farão como sempre Justiça.

No decurso do processo o mesmo arguido (1) José Manuel ... veio recorrer de um despacho judicial de 8/6/2012, que indeferiu a arguição parcial da acusação, a fls. 284-292, apresentando alegações com as seguintes conclusões: A. Nestes autos, foi deduzida contra o Recorrente douta acusação, «como autor material, nos termos dos artigos 6.º, n.º 1, [7.º , n.º s 1 e 3,] da Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, e em concurso efectivo, nos termos do artigo 30.º , n.º 1, do Código Penal, na prática de um crime consumado de fraude fiscal, previsto e punido pelo 103.º , n.º s 1, al. b), da Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho e de um crime consumado de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo art.º 105.º , n.º 1, da Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho; B. O recorrente foi constituído arguido, tendo-lhe sido, nesse acto, comunicado que deveria considerar-se "arguido nestes autos de inquérito, instaurado contra ... -Distribuição e Comércio Alimentar. Lda., por indícios da prática de ilícitos criminais fiscais p.p. pelo art.º 105.º do RGIT. Lei n.º 15/2001 [Abuso de confiança, ou seja, em concreto, a não entrega nos Cofres do Estado do IVA referentes aos período(s) de 2006/09T. nos valores de 35.983.36 € respectivamente .........)", C. Sem, portanto, referência alguma ao crime de fraude fiscal ou, sequer, ao artigo 103.º do RGIT, que o prevê e pune.

  1. Aliás, a tal crime, de fraude fiscal, não existe qualquer referência nos autos até à promoção de fls. 185, de 13 de Julho de 2007 (já depois de o Recorrente ter sido constituído arguido, de lhe terem sido comunicados os factos da sua arguição e ouvido como tal, de a investigação ter sido encerrada e produzido o correspondente relatório), não se encontrando qualquer referência a tal crime no ofício de 11 de...

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