Acórdão nº 3450/07.8TALRS.L1 -9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelALMEIDA CABRAL
Data da Resolução09 de Outubro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, os Juízes da 9.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: 1 – No 2.º Juízo Criminal da Comarca de Loures, Processo Comum Singular n.º 3450/07.8TALRS, onde é arguido/recorrente J..., foi este julgado e condenado, como autor de um crime de “descaminho”, p. p. nos termos do art.º 355.º do Cód. Penal, na pena de cinco meses de prisão, substituída por 150 dias de multa, à taxa diária de 5,00 €uros.

Inconformado com a referida decisão, da mesma interpôs o arguido o presente recurso, o qual sustentou no incorrecto julgamento da matéria de facto, com violação do disposto no art.º 127.º do C.P.P., na violação do P.º ne bis in idem, no dever de rejeição da acusação, que considera manifestamente infundada, no não preenchimento dos elementos típicos do art.º 355.º do Cód. Penal e na inexistência de dolo.

Da respectiva motivação extraiu as seguintes conclusões: “(…) 1) - O presente recurso tem por objecto a violação do disposto no art. 355.º de C. Penal, dos arts. 127.º, do C.P.P., do art. 29.º, n.º 5 da CRP, do disposto no art. 410.º, n.º 2, al. a e c), de C. de Processo Penal e de disposto no art.º 311.º, n.º 3, alínea n) e c) do C.P.P.

2) - O artigo 29.º, n.º 5 da CRP, deve ser interpretada extensivamente no sentido de que o Estado não pode submeter uma pessoa a inquéritos-crime sucessivos pelos mesmos factos se os anteriores resultaram em sucessivos arquivamentos, sem que tenham sido carreados para o processo novas provas que justificassem a reabertura do inquérito.

3) - Existe uma clara violação do princípio ne bis in idem, se os factos em questão já foram apreciados e arquivados em dois processos crime diferentes os quais correram os seus termos nos serviços do Ministério Público do mesmo Tribunal (ainda que em Secções diferentes) sob os n.º 1025/04.2TALRS e 983/09.5TALRS, da 2.ª e 1.ª Secção respectivamente.

4) - Tal terá que ser visto também como um corolário do princípio ne bis in idem ou non bisin, sendo indiferente qual a instância ou a fase processual em que os mesmos são apreciados, se pelo Magistrado do Ministério Público que conclui pela ausência de crime e consequente arquivamento, se pelo Juiz que condena ou absolve.

5) - Consequentemente, no caso sub judice, deveria ter relevado para efeitos de boa decisão da causa, a circunstância de os factos em causa já terem sido objecto de dois arquivamentos sucessivos, já transitados em julgado, devendo proceder a excepção de trânsito em julgado invocada.

6) - Não existe no processo qualquer carta devolvida nem a cópia de alguma carta enviada ao arguido que demonstre de forma inequívoca que este haja sido notificado para proceder à entrega dos bens.

7) Pelo que, não se encontrando o arguido regularmente notificado para entregar os bens, não se encontra preenchido a tipo de crime previsto no art.º 355.º do C.P.

8) - Consequentemente, não existindo no processo qualquer prova documental de alguma notificação ao arguido para entrega dos bens, resulta evidente a manifesta impossibilidade de lhe ter sido comunicado em algum momento que não o fazendo, incorreria em responsabilidade criminal 9) - É essencial que o destinatário tenha conhecimento da ordem ou mandado a que fica sujeito, através de um processo regular e capaz de transmissão, por forma a que seja sabedor do que lhe é imposto ou exigido.

10). Não identificando a acusação o número de processo de onde foi efectuada a dita penhora de bens, nem identificando em que data e por que modo teve lugar a comunicação do encarregado de venda e/ou Tribunal para que o arguido entregasse os bens e a comunicação em caso de não entrega, nomeadamente qualquer procedimento criminal em caso de incumprimento da ordem, a mesma deveria ter sido rejeitada liminarmente pelo Meritíssimo Juiz, nos termos do art. 311.º, n.º 3, b) do C.P.P.

11) - A simples não entrega dos bens penhorados ao encarregado da venda não integra o crime de descaminho previsto e punido no artigo 355.º do Código Penal, pois resulta daquele dispositivo legal que para o preenchimento daquela tipicidade é essencial que o agente destrua, danifique, inutilize ou subtraia o objecto que se encontrar naquela precisa situação (arrestado, apreendido ou objecto de providência cautelar).

12) - pelo que não tendo sido apurado em sede de inquérito nos presentes autos qual o destino dado aos bens pelo arguido, resulta a impossibilidade de afirmação de que houve destruição, danificação, inutilização ou subtracção, indispensável à afirmação de que se demonstrou o tipo objectivo desse crime.

13) - Consequentemente, não se mostram preenchidos os elementos objectivos do crime de descaminho ou destruição de objectos colocados sob o poder público, da previsão do art. 355.º do Código Penal.

14) - Se num auto de penhora apenas é lavrado que “Dos bens penhorados constituímos fiel depositário o Sr. J..., portador do b.i. n.º 4609798 de 21.10.1996 Lisboa, que é pessoa de abonação suficiente a quem declaramos que os bens ficam à sua guarda e que deve apresentá-los quando isso lhe for exigido”, daí não resulta qualquer cominação legal, nomeadamente a de que o se o arguido não apresentasse os bens o mesmo incorreria num crime de desobediência ou de descaminho.

15) - Omitindo o auto de penhora a notificação prevista no art. 854.º, n.º 2 do C.P.C. Em vigor à data dos factos, tal significa que neles são também omitidas as consequências do incumprimento de um futura ordem de entrega dos bens, nomeadamente em sede criminal.

16) - Para a realização do tipo de crime do art. 355.º do Código Penal exige-se, para além da demonstração de que o arguido foi notificado regularmente para entregar os bens, que ocorra a frustração definitiva da finalidade da custódia da coisa, e que essa frustração seja alcançada através de uma acção directa sobre essa coisa que a destrua, inutilize ou impeça a sua entrega, e ainda o dolo do agente, em qualquer das formas previstas no art. 14.º do Código Penal.

17) - Tendo o arguido agido no convencimento de que o processo executivo já se encontrava extinto, e tendo pago as custas do processo através de depósito autónomo, não resulta desse convencimento, qualquer censurabilidade da conduta do agente, nomeadamente a título de culpa e ou/ dolo.

18) - O descaminho um tipo de crime doloso, é ainda exigível (art. 13.º do Código Penal) que qualquer dessas condutas seja praticada com dolo, cobrindo todos os elementos objectivos do tipo, sob qualquer das formas previstas no art. 14.º do Código Penal.

19) - A matéria de facto provada é insuficiente para permitir a conclusão de que o arguido praticou um crime de descaminho, previsto pelo artigo 355.º do C.P. na medida em que dela não consta como...

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