Acórdão nº 4213/13.7TBFUN.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 04 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelJORGE MANUEL LEIT
Data da Resolução04 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO Por requerimento autuado em 25.10.2013, Cais, Lda instaurou no Tribunal Judicial do Funchal procedimento cautelar comum contra João.

A requerente alegou que enquanto entidade patronal do requerido, que era Diretor de um hotel pertencente à requerente, havia entregue a este um automóvel ligeiro de passageiros, de que este fazia uso para fins pessoais e profissionais. Sucede que em dezembro de 2012 o requerido denunciou o contrato de trabalho que celebrara com requerente, e pese embora a insistência da requerente, não restituiu a esta o aludido veículo, que esta adquirira no âmbito de um contrato de locação financeira e cuja propriedade se encontra registada a favor da requerente. O veículo não tem seguro de responsabilidade civil válido, carece de ir à inspeção, sendo certo que o respetivo documento único automóvel está na posse da requerente, o seu valor comercial decresce, sem que a requerente dele frua, pode causar acidentes de cujas consequências a requerente poderá ser responsabilizada, pode ser danificado ou ocultado.

A requerente terminou pedindo que, sem audição prévia do requerido, o requerido fosse condenado a restituir à requerente a posse do veículo automóvel supra referido, com todas as suas chaves e elementos, no bom estado de conservação em que se encontrava, e igualmente:

  1. Que o requerido fosse condenado numa sanção pecuniária, no valor que o tribunal melhor considerasse, no seu critério, indicando-se a quantia de 150,00 euros, por cada dia de atraso na restituição do veículo automóvel, contados desde a data em que fosse citado com a decisão a proferir, até entrega efetiva do automóvel.

  2. Que, nos termos do n.º 4 do artigo 369º do CPC, na decisão que viesse, eventualmente, a decretar a providência, fosse a requerente dispensada do ónus da propositura da ação principal, por se mostrarem reunidos os pressupostos para o efeito.

    O tribunal a quo decidiu ordenar a citação do requerido, tendo este apresentado oposição, na qual arguiu a exceção de litispendência do procedimento cautelar com ação declarativa que havia sido proposta pelo ora requerido contra a ora requerente, tendo por objetivo obter o reconhecimento do direito de propriedade do ora requerido sobre o dito automóvel. Por impugnação, o requerido alegou que o dito automóvel fora por si adquirido a 11.02.2008, tendo para esse efeito entregue para retoma um outro veículo a si pertencente, acrescido de € 7 000,00 em dinheiro, e os restantes € 21 000,00, necessários para perfazer o preço do automóvel, no valor de € 39 000,00, sido subscritos pelo requerido por meio de um contrato de leasing celebrado com o Banco A. Atendendo a que o sócio e gerente da requerente à data tinha emprestado ao requerido parte do capital por este utilizado para a entrada inicial do valor do veículo, foi acordado entre ambos que o veículo ficaria registado em nome da requerente, como forma de garantia, passando a titularidade da propriedade para o requerido quando ocorresse o pagamento integral. Entretanto o requerido usaria o veículo. Todas as prestações do contrato de leasing foram pagas pelo requerido, incluindo o valor residual do automóvel. Porém, após os primitivos sócios da requerente terem cedido a outrem as suas quotas na sociedade requerente, a requerente tem-se recusado a formalizar a transmissão da propriedade do automóvel para o requerido.

    O requerido terminou pedindo que fosse julgada procedente a exceção de litispendência e por via disso fosse absolvido da instância; subsidiariamente, pediu que o requerido fosse absolvido do pedido; mais pediu que a requerente fosse condenada em multa e indemnização como litigante de má fé.

    Procedeu-se a audiência final, com inquirição de testemunhas, e em 03.02.2014 foi proferida sentença em que, após se ter considerado improcedente a exceção de litispendência arguida pelo requerido e bem assim a invocada litigância de má-fé por parte da requerente, julgou-se o procedimento cautelar improcedente.

    A requerente apelou desta decisão, tendo apresentado motivação em que formulou as seguintes conclusões: I- A matéria de facto contida no artigo 8º dos factos provados, pela sua sistematização e sequência, diz respeito ao contrato de locação financeira celebrado entre a requerente e a locadora BANCO A e, entre outras disposições, à sua forma de pagamento.

    II- Do contrato em causa, reproduzido no documento número 13 da requerente, que inclui o anexo denominado “autorização de débito em conta”, consta que a requerente, então com a firma CAMACHO, era titular de uma conta da CGD com o NIB 00. Em lugar algum surge referido no contrato que o pagamento seria feito por “débito automático na conta n.º 00 da Caixa Geral de Depósitos” e bem menos que a mesma era “titulada pelo requerido”.

    III- A matéria de facto julgada provada do artigo 8º, na parte que identifica o número da conta foi incorrectamente julgada, devendo a mesma ser substituída pela NIB da conta que figura no contrato de leasing, conforme documento 13 da requerente.

    IV- Por outro lado, não tendo o requerido juntado prova, como lhe competia, que a conta com o NIB 00 lhe pertencia e em exclusivo, foi também incorrectamente julgada a parte final do mencionado artigo 8º, onde consta que a identificada conta é “titulada pelo requerido”.

    V- O douto tribunal a quo apesar ter revelado “estranheza pelo contornos do negócio” invocado pelo requerido, valorou e credibilizou o depoimento da testemunha LUÍS, mesmo que este tenha afirmado ter juntamente com o requerido participado num alegado engano intencional nas declarações prestadas no contrato de leasing e não tivesse conseguido explicar que vantagens, decorrente de “um favor”, pudessem resultar desse acordo para o requerido.

    VI- De igual modo o douto tribunal a quo não sindicou as motivações subjacentes ao negócio, nem questionou a objectividade e interesse da referida testemunha em depor, não obstante ter sido junto aos autos documentos que comprovam, nomeadamente, a qualidade da testemunha como ex-sócio da sociedade requerente e do requerido como ex-trabalhador desta, que coincidem temporalmente na cessão de quotas e cessão de funções, bem como no interesse e ganhos pessoais resultantes do negócio, em prejuízo da sociedade requerente.

    VII- Além da falta de credibilidade do depoimento e incoerência de interesses, a invocação da fraude e falsidade não aproveita os participantes do “concilium fraudis”, razão que deveria ter levado o douto tribunal a quo a dar como não provada a matéria do artigo 9º.

    VIII- A resposta dada aos artigos 10º e 11º dos factos provados trata de igual forma e com notória confusão o que é “pagamento do preço” com o “pagamento de rendas”.

    IX- Os documentos apresentados pelo requerido, putativos extractos bancários, nos quais são alegadamente efectuadas transferências de diversas quantias, não comprovam quaisquer pagamentos do mencionado contrato de leasing ou mesmo qualquer compra do veículo.

    X- Sem conceder, a entrega de um valor em nome de um terceiro não torna o eventual cumpridor da obrigação parte no contrato de locação ou de venda, já que a prestação pode ser feita tanto pelo devedor como por terceiro, interessado ou não no cumprimento da obrigação, sem que isso retire àquele a qualidade de contratante (cfr. artigo 767º n.º 1 do Código Civil).

    XI- Para prova dos pagamentos que efectuou, no âmbito do mencionado contrato de leasing, a requerente juntou aos autos os documentos 20 e 21, extractos contabilísticos das conta de Leasing e de sócio, bem como as facturas/recibos emitidos em seu nome pela locadora BANCO A.

    XII- O douto tribunal a quo não atendeu aos únicos documentos que comprovam o pagamento e quitação do recebimento das rendas do contrato de Leasing, emitidos pela entidade competente, organizados segundo as regras legalmente estabelecidas para as sociedade com contabilidade organizada, como é o caso da requerida, pelo que errou no...

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