Acórdão nº 420/10.2TBTVD-A.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 04 de Dezembro de 2014
Magistrado Responsável | ONDINA CARMO ALVES |
Data da Resolução | 04 de Dezembro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I. RELATÓRIO MANUEL ------- e MARIA -------- , residentes na Rua -----, vieram deduzir oposição, em 17.05.2010, contra ALBERTO -----, residente na Avenida ------, em Lisboa, e ARTUR ------ , residente em ------, por apenso ao processo executivo para pagamento de quantia certa, que estes deduziram contra aqueles, tendente a obter a respectiva extinção do pedido executivo.
Fundamentaram os opoentes, no essencial, a sua pretensão, da seguinte forma: § Os exequentes, na qualidade de herdeiros de Antero ----, falecido em 27.02.2007, deram à execução como título executivo, um cheque emitido pelos executados, no valor de € 206.215,00, alegando que tal quantia corresponde à restituição do capital que lhes foi emprestado por Antero ---- através dum contrato de mútuo que é inválido por vício de forma.
§ Os executados nunca assinaram o aludido contrato de mútuo, que o mesmo é uma montagem com assinatura retirada doutro contrato, que o contrato sempre seria nulo por vício de forma, que o cheque dado à execução foi entregue a Antero ---- para garantia de pagamento de futuros empréstimos e que nunca recebeu o empréstimo em causa, inexistindo qualquer relação subjacente que motivasse a emissão do cheque, o qual não pode assim constituir título executivo.
Por despacho de 16.06.2010, foi rejeitada a oposição, no que respeita à opoente, por extemporânea e ordenada a notificação dos exequentes.
Notificados, vieram os exequentes deduzir contestação, pugnando pela veracidade do contrato e que o cheque foi emitido para restituição do capital efectivamente emprestado, reiterando assim a exposição de factos efectuada no requerimento executivo.
Foi proferido o despacho saneador, abstendo-se o Exmo. Juiz a quo de fixar, quer a matéria assente, quer a base instrutória.
Apresentados os meios de prova, veio o opoente requerer a realização de perícia à letra e assinatura do cheque dado à execução, pretensão que foi rejeitada, por despacho de 09.02.2011, por se entender que: (…) os executados assumem que assinaram o cheque junto aos autor, sendo que o cheque foi passado em branco, não se vislumbra a pertinência da perícia requerida. Por outro lado foi rejeitada a oposição à execução no que respeita à executada Maria ----- e atento o cheque junto aos autos verificamos que o mesmo é emitido sobre uma conta solidária, desta forma é totalmente desnecessária a perícia requerida relativamente ao cheque. Nestes termos, indefiro o requerido.
Iniciada a audiência de discussão e julgamento, em 02.03.2011, foi, no decurso da mesma, ordenada a junção do original do contrato, conforme já havia sido determinado no despacho de 09.02.2011, o que os executados cumpriram, juntando o aludido original, conforme requerimento de 11.03.2011.
Notificado o executado, veio este, por requerimento de 30.03.2011, invocar a falsificação da assinatura constante do contrato, nunca tendo aposto a sua assinatura do aludido documento, insistindo na realização da perícia à assinatura constante do contrato.
Na sessão de julgamento, realizada em 6 de Abril de 2011, o Exmo. Juiz do Tribunal a quo proferiu o seguinte despacho: "Na sequência do anterior despacho e nada mais tendo sido requerido quanto ao objecto da perícia determino se proceda à realização da perícia à assinatura que consta do contrato junto aos autos a fls. 99 tendo a mesma por objecto avaliar o grau de probabilidade da assinatura que aí consta em nome do executado Manuel ------, ter sido efectuado pelo seu próprio punho, sendo a perícia solicitada ao Núcleo de Ciências Forenses.
Para a realização da perícia além do original do cheque que consta a fls. 40 dos autos na qual consta a assinatura do executado reconhecido pelo próprio na oposição, deverá o executado juntar aos autos o original da procuração que consta a fls. 10 dos autos emitida em 13 de Maio de 2010, bem como o original do contrato que junta como documento nº 1 da oposição constante a fls. 11 dos autos, documento esse que foi junto pelo próprio e onde também consta a sua assinatura.
Mais se determina, aproveitando a presença do executado a imediata recolha de autógrafos ao mesmo.
Em 09.06.2011, foi junto aos autos o relatório pericial remetido pelo Núcleo de Ciências Forenses, no qual se concluiu como provável, a verificação da hipótese de a escrita da assinatura contestada aposta no documento em causa ser do punho de Manuel ------.
Foi dada prossecução à audiência de julgamento, após o que o Tribunal a quo proferiu decisão, constando do Dispositivo da Sentença o seguinte: Pelo exposto julgo a oposição improcedente, porque não provada, e, em consequência, determino o prosseguimento da execução.
Inconformado com o assim decidido, o opoente interpôs recurso de apelação, relativamente à sentença prolatada.
São as seguintes as CONCLUSÕES do recorrente: i.
Deverá ser atribuído efeito suspensivo ao presente Recurso.
ii.
A matéria de facto relativa às alíneas A); B); C) e D) foram incorrectamente julgadas, porquanto os elementos de prova existentes nos autos impunham que os mesmos fossem julgados Não Provados.
iii.
A análise do cheque indicia que o mesmo foi entregue assinado em branco e posteriormente preenchido abusivamente.
iv.
Confrontando a experiencia comum, os usos e costumes e os restantes contratos juntos aos autos é absolutamente inverosímil que o falecido pai dos Exequentes tivesse celebrado um contrato sem cobrar quaisquer juros porquanto nos anteriores sempre cobrou juros usurários.
v.
É inverosímil e contrario aos empréstimos anteriores o valor do empréstimo de 206.215,00 Euros, ainda mais sem a cobrança de quaisquer juros, ou seja os valores dos empréstimos serão sempre arredondados ao algarismo do milhares de euros e não como pretendem os exequentes à unidade de euros.
vi.
O cheque dado à execução foi entregue apenas como garantia dos anteriores e para eventuais futuros empréstimos.
vii.
A perícia realizada à assinatura do Executado não indicou um grau de certeza conclusiva que permita ao Tribunal "a quo" basear a decisão da matéria de facto no seu resultado. Devendo ser renovada este meio de prova por forma a permitir obter outro grau de certeza.
viii.
O Tribunal "a quo" não atendeu a todos os meios de prova que tinha aos eu dispor, nomeadamente aos contratos anteriormente celebrados entre o falecido pai dos Exequentes e o Executado, e concretamente quanto à forma de escrita dos mesmos.
ix.
O Tribunal "a Quo" decidiu incorrectamente a matéria de direito aplicável ao tipo de título executivo dado à execução, quando decidiu que o cheque poderia valer como documento particular mesmo que a obrigação alegadamente subjacente ao mesmo não estivesse vencida e portanto não fosse exigível.
x.
A execução deveria ter sido indeferida por falta de título executivo Pede o apelante que a sentença recorrida seja revogada, e se ordene a renovação do meio de prova produzido quanto à autenticidade da assinatura do executado no contrato dado à execução, nomeadamente a perícia a realizar preferencialmente pelo Laboratório de Policia Científica e que o recurso de apelação seja julgado procedente e, em consequência, alterada a decisão da matéria de facto julgando-se como não provada a matéria de factos das alíneas A); B); C); e D) e consequentemente julgar procedente a Oposição do Executado e Indeferir a Execução.
Pede ainda, o recorrente, subsidiariamente, que a execução seja indeferida por falta de título executivo em virtude de não estar vencida e não ser exigível a obrigação subjacente ao documento particular — cheque – dado à Execução.
Os recorridos não apresentaram contra-alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
*** II. ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO Importa ter em consideração que, de acordo com o disposto nos artigos 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do Código de Processo Civil (artigo 635º, nº 4 do NCPC), é pelas conclusões da alegação do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Assim, e face ao teor das conclusões formuladas a solução a alcançar pressupõe a análise das seguintes questões: i. DA REAPRECIAÇÃO DA PROVA E DOS ESPECÍFICOS ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO IMPOSTOS AO RECORRENTE.
ii. A VERIFICAÇÃO DE ERRO DE JULGAMENTO NA SUBSUNÇÃO JURÍDICA ADUZIDA, TENDO EM CONSIDERAÇÃO OS FACTOS APURADOS.
III . FUNDAMENTAÇÃO A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Foi dado como provados na sentença recorrida o seguinte: 1.
Os exequentes, na qualidade de herdeiros de Antero -----, falecido em 27.02.2007, deram à execução como título executivo, um cheque do Banco Millennium BCP, com o n.° ----521, datado de 30.04.2007, no valor de € 206.215,00, com assinaturas apostas pelos executados — cujo original consta de fls. 40 destes autos; 2.
Antero -----, na qualidade de primeiro outorgante, celebrou com os aqui executados — na qualidade de segundos outorgantes - um contrato escrito, datado de 15.04.2006, no qual fixaram as seguintes cláusulas: 1ª O primeiro outorgante empresta aos segundos outorgantes a quantia de € 206.215,00 (duzentos e seis mil duzentos e quinze euros); 2ª Os segundos outorgantes declaram ter recebido do primeiro outorgante, por empréstimo, a quantia supra referida e dela se confessam, solidariamente entre si devedores.
-
O empréstimo é feito pelo prazo de 12 meses, com início em 15 de Abril de 2006, renovando-se por sucessivos períodos de igual prazo, salvo se os segundos outorgantes forem interpelados, por qualquer meio, pelo primeiro outorgante para que a dívida seja paga no termo do prazo.
Parágrafo único: A interpelação para pagamento terá de ser feita com pelo menos seis meses de antecedência.
4º Se e quando interpelados os segundos outorgantes não pagarem pontualmente a quantia em dívida, este...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO