Acórdão nº 3014/12.4TJLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelJORGE VILA
Data da Resolução11 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa I – Relatório Henrique e Maria Instauraram acção declarativa sob a forma de processo comum sumário, a correr termos pelo 5º Juízo Cível da Comarca de Lisboa, contra: BS, Lda.

Alegando, em síntese, o seguinte: · O Autor entregou junto do balcão da loja da Ré, situada na avenida..., em Lisboa, duas bobinas de 120 metros com imagens previamente obtidas através de uma máquina de filmar para “Super 8”, com vista à transposição/conversão do seu conteúdo para DVD, vindo, posteriormente, a pagar à Ré o preço de € 60,00.

· Tais filmes reportavam-se a ocasiões de significado especial para o Autor e sua família: aniversários, festas, eventos relacionados com a atividade estudantil e profissional do filho dos Autores, férias no País e no estrangeiro, praias, etc., mostrando familiares e amigos, alguns entretanto já falecidos.

· Eram, de resto, as únicas imagens em movimento que a família possuía.

· Em maio de 2011, tendo sido informado pela Ré de que podia levantar o trabalho de transposição para DVD, encomendado em inícios de abril de 2011, o Autor dirigiu-se ao balcão da AV. ..., onde lhe foram entregues duas bobinas e um DVD.

· No dia 4 de junho de 2011 (sábado), numa festa com família e amigos, foi o DVD visionado pela primeira vez.

· Nessa mesma altura, foram também visionadas as duas bobinas de filme, tendo todos os presentes constatado que as bobinas haviam sido trocadas, pois não eram as dos Autores e correspondiam às imagens do referido DVD.

· Apesar das posteriores insistências do Autor, tanto junto da Ré como do laboratório encarregado do serviço pela Ré, esta desinteressou-se de resolver a questão, perdendo as duas bobinas originais dos Autores.

· O desaparecimento das bobinas provocou e provoca nos Autores um sofrimento e dor intensos, por se verem desapossados da única memória gravada em movimento da vida familiar, ao longo de anos, incluindo a evolução do crescimento do seu filho.

· Sentem profunda tristeza quando se lembram da perda das referidas imagens.

· Para a compensação do sofrimento moral dos Autores, julgam como adequada uma indemnização a fixar pelo Tribunal em quantia não inferior a € 10 000,00.

Concluíram pedindo a condenação da ré na restituição aos Autores da quantia de € 60,00 referente ao pagamento pelo trabalho que a Ré não lhes entregou, bem como no pagamento de uma indemnização não inferior a € 10 000,00, por danos não patrimoniais.

Citada regularmente, a ré apresentou contestação, pugnando pela improcedência da acção ou, quanto muito, pela procedência parcial, defendeu-se por excepção e por impugnação, alegando, em suma, o seguinte: · Para a hipótese (não admitida) de se considerar que houve troca e/ou extravio das bobinas em causa, aquando da entrega das bobinas originais, no canhoto do talão de entrega fornecido ao Autor pela Ré constava uma nota com o teor seguinte: “A responsabilidade de películas extraviadas ou estragadas pelo laboratório ou por revendedores, limita-se à sua substituição por igual metragem de película virgem”.

· Esta limitação de responsabilidade constitui um dos termos e condições do contrato firmado entre as partes, sendo tal limitação lícita e permitida, à luz do preceituado no artigo 800.º, n.º 2, do Código Civil.

· A Ré deu a conhecer ao Autor a nota atrás transcrita, aquando da sua primeira deslocação à loja da AV. ....

· De todo o modo, as duas bobinas originais foram entregues à Ré em inícios de dezembro de 2010 e levantadas pelo Autor a 14 de dezembro de 2010, com o DVD com a sua transposição, altura em que procedeu ao pagamento mencionado de € 60,00, pelo que as bobinas que a Ré entregou ao Autor correspondem, efetivamente, às que recebeu deste.

· Assim, a Ré cumpriu integralmente a prestação a que estava vinculada para com o Autor.

· Sem prejuízo do atrás exposto, mostra-se manifestamente exagerada e desproporcionada, atendendo aos factos aqui em presença e ao preço do serviço em causa, a indemnização peticionada pelos Autores a título de danos não patrimoniais (€ 10 000,00).

Os autores responderam à matéria de excepção.

No despacho saneador foi afirmada a validade e regularidade da instância e foi fixada a matéria de facto assente e elaborada base instrutória.

Procedeu-se a julgamento, tendo sido fixada a matéria de facto.

Foi proferida sentença julgando improcedente a excepção peremptória invocada na contestação e parcialmente procedente a acção, condenando “ Não se conformando com aquela sentença, dela interpôs recurso a ré, que nas suas alegações formulou as seguintes “CONCLUSÕES”: 1ª – O meritíssimo Juiz “a quo” decidiu mal a matéria de facto dada por assente nos presentes.

  1. - No ponto 5 dos Factos provados, o Tribunal a quo deu por provado que: ““No ano de 1972 nasceu o único filho do Autor, pelo que este comprou uma máquina de filmar para “Super 8”, com a qual, durante cerca de doze anos, fez pequenos filmes fixando imagens do seu crescimento”. No entanto, o Tribunal a quo deveria ter dado por não provado este facto, pois os factos “nascimento” e “filiação” só podem ser provados por certidão de nascimento e não por testemunhas, conforme disposto nas normas conjugados dos arts. 1º, n.º 1 – als, a) e b), 4º e 211º, todos do CRC, e ainda do disposto no art. 364º, n.º 1 do CC. Não o tendo feito violou a douta sentença recorrida as supra referidas normas e ainda o disposto no nº 2 do art. 653º, do CPC.

  2. - No ponto nº 7 dos Factos provados, o Tribunal a quo deu por provado que: “Nos finais da década de 80 (oitenta), o Autor procedeu à colagem dos vários filmes, agregando-os em duas bobinas, cada uma com a duração de cerca de trinta minutos de projeção.”. No entanto, o Tribunal a quo deveria ter dado por não provado este facto. Assim, ao decidir pela forma como decidiu o meritíssimo Juiz “a quo” violou o disposto no nº 2 do art. 653º, do CPC, por não ter analisado de forma criticamente todos os depoimentos gravados na audiência de julgamento.

  3. - No ponto nº 8 dos Factos provados, o Tribunal a quo deu por provado que: “Eram essas as únicas imagens em movimento que a família possuía;”. No entanto, o Tribunal a quo deveria ter dado por não provado este facto. Assim, ao decidir pela forma como decidiu o meritíssimo Juiz “a quo” violou o disposto no nº 2 do art. 653º, do CPC, por não ter analisado de forma criticamente todos os depoimentos gravados na audiência de julgamento.

  4. - No ponto 9 dos Factos provados, o Tribunal a quo deu por provado que: “Durante anos, aqueles filmes, individualmente ou depois de colados em duas bobinas, foram muitas vezes visionados em ambiente familiar e/ou com pessoas amigas.” No entanto, o Tribunal a quo deveria ter dado por não provado este facto. Assim, ao decidir pela forma como decidiu o meritíssimo Juiz “a quo” violou o disposto no nº 2 do art. 653º, do CPC, por não ter analisado de forma criticamente todos os depoimentos gravados na audiência de julgamento.

  5. - Nos pontos 10 e 11 do Factos provados, o Tribunal a quo deu, respectivamente por provado que: “Em maio de 2011, tendo sido informado pela Ré de que podia levantar o trabalho de transposição para DVD, encomendado em inícios de abril de 2011, o Autor dirigiu-se ao balcão da AV. ..., onde lhe foram entregues duas bobinas e um DVD;” e “ (…) Altura em que procedeu ao pagamento mencionado em 1.;”. No entanto, o Tribunal a quo deveria ter dado por não provado estes factos, e, por contraponto, deveria ter dado por provado os quesitos 18 e 19 da Base Instrutória, nos seguintes termos: “As duas bobines originais foram entregues à Ré em inícios de Dezembro de 2010 e levantadas pelo Autor a 14 de Dezembro de 2010, com o DVD com a sua transposição” e “(…) Altura em que procedeu ao pagamento mencionado em 1.”Assim, ao decidir pela forma como decidiu o meritíssimo Juiz “a quo” violou o disposto no nº 2 do art. 653º, do CPC, por não ter analisado de forma criticamente toda prova (testemunhal e documental) produzida na audiência de julgamento.

  6. - Entre a fundamentação e a decisão do Tribunal a quo para dar por provado os pontos 10. e 11. dos Factos Provados existe uma notória e manifesta oposição, o que importa a nulidade da sentença, que desde já se invoca e requer seja declarado, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 668º, n.º 1 – al. c), do CPC.

  7. - No ponto 13 dos Factos provados, o Tribunal a quo entendeu dar por provado que: “Tanto os Autores como a sua família ficaram então estupefactos, porque as imagens do DVD representavam, além do mais: 1.ª Bobina: Paris: Vedettes Paris Tour (bateaux mouches); senhora com cerca de trinta anos com vestidos vermelhos pelo joelho, Tour Eiffel, automóvel de matrícula portuguesa (LG-30-49), Pilier Est, Piscine Royal, Estátua da Liberdade; viatura Citröen Sapo, um aeroporto (Paris?), Gibraltar, Tarifa(?); 2.ª Bobina (nota-se a colagem): Portugal (mesma senhora), norte (Porto?), praia (Sesimbra?), Lisboa vista da ponte 25 de abril, uma tourada (Campo Pequeno), parque das Caldas da Rainha, Estoril, vistas de Lisboa tiradas de avião;”.

    Ora, neste ponto deverá ser expurgada a expressão “estupefactos” por a mesma ter natureza conclusiva, pelo que este ponto deverá ter antes a seguinte redacção: “As imagens do DVD representavam, além do mais:1.ª Bobina: Paris: Vedettes Paris Tour (bateaux mouches); senhora com cerca de trinta anos com vestidos vermelhos pelo joelho, Tour Eiffel, automóvel de matrícula portuguesa (LG-30-49), Pilier Est, Piscine Royal, Estátua da Liberdade; viatura Citröen Sapo, um aeroporto (Paris?), Gibraltar, Tarifa(?);2.ª Bobina (nota-se a colagem): Portugal (mesma senhora), norte (Porto?)...

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