Acórdão nº 52/12.0PEPDL.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelANA PAULA GRANDVAUX
Data da Resolução10 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


I – RELATÓRIO 1 – O arguido A foi acusado pelo M.P da prática de factos em 29.3.2012 que integram a autoria material na qualidade de reincidente ao abrigo do artº 75º e artº 76º do C.P de três crimes de roubo na forma tentada p.p no artº 210º/1, artº 22º e artº 23º com referência ao artº 204º/4 todos do C.P e ainda de um crime de roubo na forma consumada, p.p no artº 210º/1, com referência ao artº 204º/4 do C.P, na pessoa de B.

Uma vez sujeito a julgamento no 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Ponta Delgada, foi entendido por este Tribunal que os factos imputados ao arguido na acusação pública e que resultaram provados eram susceptíveis de integrar a prática de 4 crimes de ameaças agravadas p.p no artº 153º/1 do C.P e no artº 155º/1 a) do C.P, em vez dos referidos crimes de roubo que constam da acusação pública.

Assim antes da prolação da sentença final, por despacho proferido em 15.1.2014 pelo Sr. Juiz que presidiu ao julgamento, foi alterada a qualificação jurídica dos factos imputados ao arguido e oportunamente efectuada a notificação a que alude o artº 358º/3 do C.P.P (fls 260).

Nesse mesmo despacho foi ainda entendido, que os autos apenas poderiam prosseguir e o arguido ser responsabilizado criminalmente por um só desses crimes de ameaça agravada, exactamente por aquele em relação ao qual a ofendida C apresentou queixa, não podendo ser responsabilizado em relação aos restantes 3 ilícitos por não ter sido oportunamente deduzida queixa pelas ofendidas (fls 260 dos autos).

Em consequência foi o arguido A aí condenado, por sentença lida e depositada no dia 15.01.2014, como autor material de um crime de ameaça agravado p.p no artº 153º e artº 155º alínea a) do C.P na pena de 5 meses de prisão.

2- Não se conformando com o referido despacho proferido em 15.1.2014, veio o M.P interpor recurso do mesmo, concluindo as suas alegações com as seguintes (transcritas) conclusões: 1ª Vem o presente recurso interposto do despacho proferido a 15/01/2014, constante de fls. 260 e 261, que considerou que o procedimento criminal pelos crimes de ameaça agravada, previstos e punidos pelos artigos 153°, nº 1, e 155°, nº1, al. a), do Código Penal, depende de queixa, bem como da sentença proferida nos autos, constante de fls. 261 e seguintes, na medida em que, atenta a factualidade dada como provada, e em consequência daquele entendimento, não condenou o arguido por quatro crimes de ameaça agravada, previstos e punidos pelos artigos 153° nº1 e 155°, n° 1, al. a), do Código Penal.

  1. Com o devido respeito por outro entendimento, a nosso ver, os crimes de ameaça agravada, previstos e punidos pelos artigos 153°, nº 1, e 155°, nº 1, al a), do Código Penal, revestem natureza pública, pelo que, num caso como o dos autos em que, face à prova produzida em julgamento, os quatro crimes de roubo por que o arguido foi acusado foram convolados em quatro crimes de ameaça agravada -, a não apresentação de queixa por três das ofendidas não obsta ao prosseguimento dos autos relativamente aos crimes de ameaça agravadas levados a cabo pelo arguido contra as suas pessoas.

  2. Com efeito, a lei n° 59/2007, de 4 de Setembro, autonomizou o crime até ar previsto no artigo 153°, nº2 do Código Penal, inserindo-o, a par com outras circunstâncias que traduzem um grau de ilicitude mais elevado, no nº 1 do artigo 155°, nº 1, do mesmo diploma - até então referente apenas ao crime de coacção-, unificando quer os fundamentos da agravação das penas dos crimes de ameaça e de coacção, quer os pressupostos procedimentais por tais crimes.

  3. Ora, nem o próprio artigo, nem qualquer outra norma, estabelece que o crime de ameaça agravada previsto e punido pelo artigo 155° nº 1, aI. a), do Código Penal depende de queixa (ou de acusação particular).

  4. Consequentemente, e salvo melhor entendimento, a outra conclusão não se pode chegar que não a que o referido crime reveste natureza pública.

  5. Pelo que, e face ao disposto no artigo 48° e nos artigos 49°,50° e 51°, nº 1, estes interpretados a contrario, todos do Código de Processo Penal, a instauração e/ou prosseguimento do procedimento criminal não depende da apresentação de queixa pelos ofendidos.

  6. Assim, e ao contrario do decidido no despacho recorrido, o Tribunal a quo deveria ter determinado que os autos prosseguiriam para apreciação de quatro crimes de ameaça agravada, previstos e punidos pelos artigos 153°, nº1, e 155°, nº 1, al a), do Código Penal, e, em consequência, tendo em conta a factualidade dada como provada na sentença, deveria o arguido ter sido condenado pela prática não de um, mas de quatro crimes de ameaça agravada.

  7. Ao não decidir do modo descrito, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 153°, nº 1 e 155°, nº 1, aI. a) do Código Penal - nas suas actuais redacções - e artigo 48º do Código de Processo Penal.

Nestes termos, e nos demais de Direito que V.as Ex.as doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência: a) o despacho recorrido deverá ser revogado e substituído por outro que determine que os autos prosseguirão para apreciação de quatros crimes de ameaça agravada, previstos e punidos pelos artigos 153°, nº 1 e 155°, nº 1 aI. a), do Código Penal; e b) a sentença recorrida deverá ser revogada e substituída por outra que condene o arguido por quatros crimes de ameaça agravada, previstos e punidos pelos referidos preceitos.

Vªs Exª farão, como sempre, JUSTIÇA! 3 – Esse recurso foi admitido por despacho de fls. 280.

4 – Neste Tribunal, o Sr. procurador-geral-adjunto, quando o processo lhe foi com vista nos termos e para os efeitos do artº 416º do C.P.P, emitiu o parecer de fls 286, no sentido de ser dado integral provimento ao recurso do M.P na 1ª instância, cuja motivação acompanha.

5 – Foi oportunamente cumprido o artº 417º do C.P.P.

6 – Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, foi o processo à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO 1- Delimitação do objecto do recurso ou questões a decidir: Do artº 412º/1 do C.P.P resulta que são as conclusões da motivação que delimitam o objecto do recurso e consequentemente definem as questões a decidir em cada caso, exceptuando aquelas questões que sejam do conhecimento oficioso.

- A questão colocada pelo M.P recorrente para ser apreciada por este Tribunal ad quem, é apenas uma: - qual a natureza do crime de ameaças agravado p.p no artº 155º/1/a) do C.Penal na redacção dada pela Lei nº 59/2007 de 4 de Setembro - tem natureza pública ou semi-pública? 2. A Decisão recorrida No início da sessão de julgamento que teve lugar no 1º Juízo do Tribunal de Ponta Delgada, no dia 15.1.2014 foi proferido o seguinte despacho pelo Mmº Juiz que presidia ao julgamento: “Realizada a audiência de discussão e julgamento, constata-se que os factos imputados ao arguido na acusação pública, e que resultaram provados, são susceptíveis de enquadrar a prática de quatro crimes de ameaça agravado, previsto no artº 153º/1 do C.P e artº 155º/1/a) do C.P e não, como lhe vem imputado do crime de roubo.

Contudo apenas foi apresentada queixa por C, pelo que dependendo o procedimento criminal de queixa, os presentes autos...

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