Acórdão nº 3485/12.9TBFUN.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelTOME RAMI
Data da Resolução27 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: *** I- Relatório: Companhia de Seguros ...

com sede ...

intentou a presente ação declarativa condenatória, na forma sumária, contra V..., com sede ..., pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de € 10 449,15, acrescida de juros de mora vincendos à taxa legal, até integral pagamento.

Para o efeito alegou, em resumo, que celebrou com C... um contrato de seguro, do ramo automóvel, tendo por objeto o veículo automóvel de matrícula 76-DT-26, e no dia 20/12/2010, entre o km 2.3 e o km 2.2 da Via Rápida 1, sentido este – oeste, ocorreu um acidente de viação em que interveio o referido veículo, sendo que a sua condutora se deparou com a via em que circulava impedida, encontrando-se imobilizado o veículo com a matrícula 86-36-XS, pelo que acionou de imediato os mecanismos de travagem, sem sucesso, por falta de aderência ao piso, e deslizou pela faixa de rodagem, invadindo a hemifaixa da esquerda, indo embater no veículo 89-87-DQ, que ali se encontrava parado, em face do trânsito existente. Após o embate constatou a presença de uma enorme quantidade de óleo na estrada, que surgia desde o km 2.3 e se estendia para além do km 2.2, o que levou à perda de aderência ao piso da faixa de rodagem e à impossibilidade de controlo da direção e movimentação do veículo DT. A presença de tal substância não estava sinalizada, pelo que o acidente se ficou a dever à presença daquela substância líquida no piso. Do acidente resultaram estragos no veículo DT, cuja reparação teve um custo de € 10.467,76, tendo pago a quantia de € 9.967,76 euros, considerando a dedução da franquia de € 500,00 paga pela proprietária do veículo.

Mais alegou que a responsabilidade da Ré reside no facto de ter celebrado um contrato de concessão com o Estado, no âmbito do qual se comprometeu a assegurar permanentemente, em boas condições de segurança e operacionalidade, a circulação na via concessionada, devendo fiscalizar e prevenir a ocorrência de quaisquer acidentes, tanto mais que dispõe de um sistema de video-vigilância permanente.

Citada a Ré, defendeu-se por exceção, invocando a sua ilegitimidade processual, e por impugnação, sustentando que o veículo DT seguia a uma velocidade superior à permitida no local, que a condutora estava desatenta e que o óleo existente na estrada não teve qualquer influência no acidente. Mais sustentou que assegura a segurança da via e durante o dia estiveram dois operadores especializados no centro de controlo, celebrou com o A... um contrato segundo o qual esta entidade faz patrulhamento e presta assistência aos utentes da VR1, que o A... tem ao serviço da Ré três viaturas durante o dia e uma durante a noite e que em média cada uma das viaturas passa 12 vezes por dia no mesmo local da VR1 e às 7h:45m não havia óleo no piso. Às 8h31m passou no local um veículo pesado de passageiros que deixou um rasto de uma substância estranha, sendo impossível nos 7 minutos que separaram este momento e o despiste proceder à limpeza da via.

E requereu a intervenção principal de A …, anteriormente denominada Companhia de Seguros ..., por ter celebrado com esta um contrato de seguro no âmbito do qual transferiu a responsabilidade civil.

Por despacho de fls. 74 a 76 foi admitida a intervenção principal (provocada) da A..., ao lado Ré, e citada veio deduzir contestação, defendendo que o acidente se deveu à ação da condutora do veículo seguro na Autora.

Em sede de despacho saneador foi julgada improcedente a exceções dilatória, decidindo-se pela legitimidade da Ré, seguindo-se a fixação da matéria de facto assente e elaboração da base instrutória.

Realizado o julgamento foi proferida a competente sentença que julgou a ação parcialmente procedente e condenou as Rés V..., e A... a pagarem solidariamente à Autora a quantia de € 9.967,76 euros, acrescida de juros de mora, à taxa legal, a contar da citação, até efetivo e integral pagamento.

Apelaram as Rés V..., e A..., alegando e concluindo: RÉ V... (extraindo o essencial): 1. A sentença é nula, por falta de fundamentação, segundo o preceituado no art.

615.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil, uma vez que o tribunal não apreciou a existência ou não de nexo causal entre o dano e o facto ilícito e culposo.

  1. Segundo o Tribunal a quo nos presentes autos está em causa a responsabilidade civil extracontratual (“No caso concreto, tomando como premissa a inexistência do pagamento de portagens, deverá o caso vertente ser decidido por apelo às regras da responsabilidade civil extracontratual, emergindo os artigos 483º e 493º do CC como primaciais nesta reflexão.

    ”) 3. Na sentença agora em apreço, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo nem uma palavra dedicou ao nexo causal entre o dano e o facto ilícito e culposo.

  2. No número 2 da Base Instrutória, perguntava-se: “o que fazia a uma velocidade de 50-60 Km/hora”? 5. O Tribunal a quo considerou provado que a condutora do veículo sinistrado (DT) circulava a uma velocidade de cerca de 60 Km/hora – cf. facto provado n.º 14.

  3. Entende-se que a prova testemunhal produzida nos autos não permitia essa decisão pois que não poderia ter sido considerada provada a velocidade a que o referido veículo circulava.

  4. À matéria constante do referido número depuseram 2 testemunhas – C... e A... – arroladas pela Autora.

  5. Compulsado o registo sonoro dos respetivos depoimentos, verifica-se que deles não resulta com certeza a velocidade a que o veículo circulava.

  6. A testemunha C... era a condutora do veículo sinistrado (DT) e a testemunha Avelino da Silva era o passageiro desse veículo.

  7. Sucede que o Tribunal não poderia ter valorado o depoimento desta testemunha nos termos em que o fez.

  8. Isto porque o depoimento da testemunha A... (cujo depoimento se encontra registado no ficheiro n.º 20131202152259_314781_64408, com a duração de 00:15:00) o contradiz, não permitindo conclusão sobre a que velocidade circulava o veículo sinistrado.

  9. Assim, a resposta dada ao número 2 da Base Instrutória nunca poderia ter sido a que foi dada, pelo contrário, deveria o Tribunal a quo ter concluído que não ficou provada a velocidade que o veículo sinistrado (DT) circulava.

  10. No número 15 da Base Instrutória (facto provado n.º 27), perguntava-se: “Às 08.31horas passou no local e no mesmo sentido do veículo XS, um veículo pesado de passageiros que deixou um rasto de uma substância estranha na VR1?” 14. Não obstante os depoimentos prestados sobre esta questão e o constante do CD junto como documento n.º 4 com a Contestação da Ré, ora Recorrente, o Tribunal apenas deu como provado que: “No local do acidente, mesmo sentido do veículo XS, passou um veículo pesado de passageiros que deixou um rasto de uma substância estranha na VR1” .

  11. Saliente-se que da visualização do CD junto como documento n.º 4 com a Contestação resulta claro e inequívoco que até às 08:31 não havia qualquer substância na via no local onde ocorreu o sinistro e que após a passagem do veículo pesado de passageiros é que a mesma substância apareceu no local tendo sido “largada” por aquele (substância que não foi nem é possível determinar o que seja).

  12. Mas mais. À matéria constante do referido número 15 depuseram 2 testemunhas – P... e J... – arroladas pela Ré, ora Recorrente.

  13. Consequentemente, e quanto ao n.º 15 da Base Instrutória o mesmo deveria na íntegra ter sido dado como provado, ou seja, deveria ser dado como provado que às 08.31horas passou no local e no mesmo sentido do veículo XS, um veículo pesado de passageiros que deixou um rasto de uma substância estranha na VR1.

  14. Salvo o devido respeito, a Ré entende que o Tribunal a quo laborou em manifesto equívoco na aplicação da lei ao caso concreto, seguramente induzido pelas posições assumidas nos acórdãos e na doutrina citados, sem se ter apercebido que os casos em apreço em cada um dos acórdãos e no artigo daquele autor são distintos do caso sub judice.

  15. Além do mais, e tal como a R. V... defendeu logo na sua contestação, o artigo 493.º, n.º 1, do CC, não tem sequer aplicação no caso em apreço.

  16. Caso tivesse sido determinada substância a provocar o acidente (o que não sucedeu), sempre se dirá que esta não era pertença ou parte integrante da coisa (Via Rápida 1), mas sim de um veículo que a derramou.

  17. Em face do exposto, não tendo sido a coisa (Via Rápida 1) que a R. V... teria de vigiar a provocar os alegados danos na viatura acidentada.

  18. Nunca poderia ter sido aplicado aos presentes autos o disposto no n.º 1 do artigo 493.º do Código Civil! 23. Porém, mesmo que, como foi entendimento do Tribunal a quo, este preceito se aplicasse para a responsabilização da R. V... (no que não se concede), sempre ficaria por provar que a mesma praticou um ato ilícito, como se demonstrará.

  19. Mais, deveria ter-se concluído pela exclusão da culpa da R. V....

  20. Na medida em que a R. V... desenvolveu, naquele dia e momento em concreto, a sua atividade de vigilância in loco e vídeo permanente, sem deteção de substâncias na via (cf. pontos 6, 7, 10 e 22 a 32 da matéria de facto dada como provada), 26. Ou seja, a substância na estrada apenas surgiu na via, como se demonstrou, no momento imediatamente anterior ao da passagem das viaturas acidentadas, o que sempre significaria – parece-nos óbvio – que a R. V..., mesmo que não tivesse agido da forma descrita, nada teria podido fazer para evitar os factos em discussão nos presentes autos.

  21. Assim, e apesar de se considerar inaplicável aos presentes autos a presunção de culpa do artigo 493.º do Código Civil, fica provada a inexistência de culpa da R. V..., e ilidida, aliás, qualquer presunção.

  22. De todo o modo, mesmo afastada a aplicação do artigo 493.º, n.º 1, do Código Civil, ter-se-á de analisar se, porventura, poderia a R. V... ser responsabilizada nos termos do disposto no artigo 483.º do Código Civil.

  23. Ora, não se tendo verificado qualquer facto ilícito, nomeadamente por não ter existido qualquer violação dos deveres da R. V..., não...

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