Acórdão nº 1160/13.6PFAMD-A.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelANTERO LU
Data da Resolução17 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Nos presentes autos de recurso acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

I Relatório Nos autos de Processo de Inquérito supra identificado, que correm termos nos Serviços do Ministério Público junto da Comarca da Grande Lisboa Noroeste, Amadora, o Exmo. Juiz de Instrução Criminal, sob promoção do Ministério Público, a fls. 94 a 96 dos presentes autos, proferiu o seguinte despacho: (transcrição) “O Ministério Público requereu a prestação de declarações para memória futura de J..., ofendidas nestes autos.

Indicou para o efeito que a ofendido é jovem e foi já sujeita a diversos actos processuais, o que constitui um motivo para a realização de tal diligência porque nos autos se investiga a prática de um crime de violação.

No entanto, não é possível concordar com o promovido.

Na realidade, a regra em vigor no processo penal português é a de que toda a prova deve ser produzida ou examinada em audiência perante o tribunal de julgamento (art. 355.° do Código de Processo Penal), sendo excepcional o aproveitamento de prova produzida anteriormente.

De resto, o legislador não permite a alteração, ainda que parcial, da composição do tribunal de julgamento que aprecia a prova, sendo que a prova produzida se encontra necessariamente registada (de forma idêntica às declarações para memória futura), e impõe uma concentração dessa mesma produção de prova (art.º 328.° do Código de Processo Penal).

Por isso, é imperioso considerar como verdadeiramente excepcional a prestação de declarações para memória futura com validade no julgamento.

Por outro Iodo, tal excepcionalidade ainda se mostra mais reforçada durante o inquérito, num momento em que ainda não foi deduzida acusação e o arguido não sabe, com precisão, do que se está a defender.

Tirando os casos previstos no art.º 271.°, nº 2, do Código de Processo Penal (e outros legalmente previstos) em que o legislador impõe a prestação de declarações para memória futura por entender verificados sempre os pressupostos de que aquelas depende (de forma, por vezes, só aparentemente fundado, pois as testemunhas acabam muitos vezes por serem novamente chamadas a prestar depoimento em audiência de julgamento, não só para apreciação da sua credibilidade mas também porque a acusação e os seus desenvolvimentos criam e definem novas questões não ponderadas anteriormente), há que apreciar de forma muita clara e restritiva a possibilidade de inversão da regra legal.

Note-se que esta questão revela uma especial particularidade dentro do actual regime processual penal; é que os depoimentos prestados em inquérito perante o Ministério Público podem ser tomados em consideração em julgamento nos termos do disposto no art.º 356.°, nº 3, b) do Código de Processo Penal. O que a prestação de declaração para memória futura visa é afastar de forma global o essencial da produção de prova nestes autos, resultado que nos parece contrário à estrutura do processo em vigor.

Alega o Ministério Público que a ofendida é jovem e foi já sujeita a diversos actos processuais.

Mas esta alegação é inconsequente.

Na realidade a ofendida tem já 20 anos de idade e todos os actos processuais em que teve alguma intervenção (exames, reconhecimento e inquirição) ocorreram em Outubro de 2013, portanto há mais de 8 meses.

Por isso, a sua prestação de declarações para memória futura actualmente (com a possibilidade de ainda prestar esclarecimentos em julgamento) não só não permitiria atingir a finalidade indicada pelo Ministério Público, como ainda seria particularmente...

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