Acórdão nº 2351/12.TVLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelEZAGUY MARTINS
Data da Resolução15 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam neste Tribunal da Relação I - A, intentou acção declarativa, com processo comum, sob a forma ordinária, contra B, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe € 57.434,00, a título de danos patrimoniais, acrescidos de juros (de mora) desde a citação, à taxa legal, até efetivo e integral pagamento.

Alegando, para tanto e em suma, que: Por contrato de 19-04-2010, mas com efeitos a partir de Janeiro de 2010, A. e Ré acordaram que a primeira prestaria à segunda serviços de transporte de mercadorias, incluindo operações auxiliares e complementares do transporte.

Para cumprimento das obrigações assumidas a A. efetuou despesas e contraiu encargos com pessoal, equipamentos, seguros, inspeções, rendas e impostos.

Ora por carta recebida pela A. em final de Janeiro de 2012, comunicou-lhe a Ré proceder à rescisão unilateral do dito contrato, com efeitos a partir de 27 de Fevereiro de 2012, invocando a sua decisão de encerrar as suas instalações de ..., comprometendo, de forma definitiva, a subsistência e continuidade da relação contratual existente.

Porém já desde o dia 10 de Fevereiro de 2012 que a A. é impedida pela R. de entrar nas suas instalações e continuar a prestação da sua atividade.

A rescisão do contrato – durante a vigência do qual, e por força do acordado, a A. se encontrou impossibilitada de prestar serviços para qualquer outro cliente – sendo sem justa causa, acarretou assim prejuízos vários para a A., que discrimina.

E nos quais inclui o montante de uma coima aplicada em sede de processo de contraordenação, por auto levantado em face do excesso de peso que o veículo da A., e por determinação da Ré transportava na ocasião.

Citada, contestou a Ré, por impugnação, ao longo de 130 artigos…mas considerando “extensa” a petição inicial de 114 artigos… Sustentando que foi observado o prazo de pré-aviso para a livre rescisão do contrato – estabelecido em benefício de ambas as partes – e ter sido a A. quem decidiu deixar de prestar os seus serviços antes do decurso daquele prazo.

O processo seguiu seus termos – sendo dispensada a realização de audiência preliminar – com saneamento e condensação.

Vindo, realizada que foi a audiência final, a ser proferida sentença que julgando a ação parcialmente procedente, condenou a “Ré a pagar à A. a quantia indemnizatória global de 56.970,00 (…) acrescida de juros moratórios, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, no mais se absolvendo a Ré do pedido.”.

Inconformada, recorreu a Ré.

E, apresentadas que foram contra-alegações pela A./recorrida, foi proferido despacho, pelo relator, a folhas 390-391, consignando – face ao por aquela suscitado – não ter deduzido a Recorrente impugnação da decisão da 1ª instância quanto à matéria de facto, que recondutível seja aos quadros do art.º 640º, n.ºs e 2 do Código de Processo Civil.

Mais convidando a Recorrente a sintetizar as conclusões apresentadas.

Ao que aquela correspondeu nos termos que de folhas 408-418 se alcançam, e, assim, formulando nas suas alegações – e “sintetizadas” em nove páginas – as seguintes conclusões: “

  1. Vem o presente recurso de apelação interposto da sentença datada de 3 de Outubro de 2013, na parte em que condenou a ora Recorrente no pagamento à ora Recorrida da quantia indemnizatória global de EUR 56.970,00, acrescida de juros moratórios, à taxa legal, desde a citação até integral e efectivo pagamento.

    Da condenação da Recorrente no pagamento à Recorrida de EUR 1.240,00 b) Nos termos do artigo 30.°, da CRP, a responsabilidade contra-ordenacional é intransmissível e não pode, por isso, a Recorrente ser responsabilizada pelo pagamento de uma coima resultante de uma contra-ordenação que não cometeu.

  2. Nenhuma Cláusula do Contrato permite sustentar que a Recorrente assume responsabilidade pelas infracções praticadas.

  3. Não ficou provado que a Recorrente assumiu responsabilidade pelas infracções praticadas pela Recorrida.

  4. A Recorrida não logrou provar que procedeu ao pagamento da quantia de EUR 1.240,00.

  5. A satisfacção de um crédito é condição sine qua non da aplicação do instituo da sub-rogação.

  6. Assim, ao condenar a Recorrente a pagar à Recorrida a supra referida quantia, o douto tribunal a quo violou o art. 30.°, da CRP, e os arts. 592.° e 593.°, do CC, pelo que deve a decisão recorrida ser revogada neste ponto.

    Da condenação da Recorrente no pagamento à Recorrida de EUR 55.730,00 Do Contrato por tempo determinado h) No que respeita à condenação no pagamento do montante de EUR 55.730,00 o Tribunal a quo qualificou o Contrato como sendo de prestação de serviços de transporte por tempo determinado (um ano) e considerou que a Recorrente procedeu à sua revogação unilateral pelo que deveria indemnizar a Recorrida nos termos do art. 1172°, al. c), do CC.

  7. Na determinação do montante indemnizatório o Tribunal a quo recorreu à equidade para determinar o valor dos lucros cessantes.

  8. As Partes celebraram o Contrato ao abrigo dos princípios da autonomia privada e da liberdade contratual positivados no art. 405.°, do CC.

  9. As Partes convencionaram uma relação contratual de prestação de serviços de transporte tão flexível quanto possível, conforme resulta das Cláusulas 1.4, 3., 23.1 e 23.3, do Contrato.

    [cfr. Pontos S), T), e 1), da matéria de facto provada] l) O Tribunal a quo desconsiderou e interpretou de forma errada as Cláusulas do Contrato.

  10. A interpretação deve ser feita de acordo com o critério do declaratário normal e atender ao circunstancialismo do negócio.

  11. As Partes não contrataram uma remuneração fixa e estabeleceram um regime ágil de desvinculação contratual bilateral que permitia a qualquer uma delas pôr termo ao contrato com um pré-aviso de 30 dias.

  12. Estabeleceram tal prazo porque consideraram que era suficiente para que Recorrida e Recorrente encontrassem alternativas à decisão unilateral da respectiva contraparte.

  13. A Cláusula 23.1., do Contrato, não é uma mera expressão contratual do direito de revogação do mandato pois neste último caso tal faculdade é conferida exclusivamente ao mandante.

  14. Com a referida Cláusula 23.1. as Partes vieram regular as regras da revogação do Contrato, devendo este ser tido em conta aquando da opção por um determinado regime indemnizatório.

  15. Não podia o Tribunal a quo ignorar a vontade das Partes nem o facto de estas atenderem às directrizes contratualmente estabelecidas para determinar a sua forma de actuação na relação com a sua contraparte contratual.

  16. Lendo as referidas Cláusulas, o declaratário normal percepciona que se "rescindir" o Contrato, desde que seja observada a antecedência contratualmente prevista de 30 dias, terá actuado de acordo com a previsão contratual e com as expectativas da contra-parte. Não podendo, por isso, ser sancionado.

  17. A validade e sentido interpretativo do clausulado contratual nunca foi posto em causa pela Recorrida.

  18. Errou o Tribunal a quo quando considerou que o Contrato havia sido celebrado por tempo certo (um ano) e que este cessou por revogação unilateral da ora Recorrente, quando faltavam ainda 10 meses para o termo do contrato. Considerou ainda o Tribunal a quo que seria adequado fixar uma indemnização que considerasse a frustração dos ganhos da Recorrida.

    Vejamos v) Caso qualquer uma das Partes se tivesse oposto à renovação do Contrato até ao dia 5 de Dezembro de 2011 parece incontestável que nenhuma indemnização seria devida.

  19. A relação Contratual cessou, por força da atitude da ora Recorrente (mandante) no dia 10 de Fevereiro de 2012. Ou seja, 17 dias antes do prazo de 30 dias estipulado no Contrato.

  20. É com referência aos 30 dias de pré-aviso estipulados no Contrato que deve ser aferida a conduta da ora Recorrente e os eventuais danos sofridos pela Recorrida.

    1. Nenhum dos danos invocados pela Recorrida decorre do facto de a ora Recorrente não ter respeitado o prazo convencionado de 30 dias de pré-aviso para fazer cessar a relação contratual.

  21. Deste prisma, a Recorrida não sofreu qualquer dano, logo, nada haverá a indemnizar.

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  22. Mesmo à luz do art. 1172.°, do CC, que considerou ser de aplicar o douto Tribunal a quo, não haverá qualquer obrigação de a Recorrente indemnizar a Recorrida.

    bb) Até ao dia 5 de Dezembro de 2010 o Contrato poderia ter cessado por oposição à renovação. O que, como vimos, não sucedeu mas, se assim fosse, não haveria lugar a qualquer indemnização.

    cc) Mesmo que se considerasse que o contrato se renovou por um ano e cessou com 10 meses de antecedência em relação aquele que seria o seu termo final, antes de atribuir uma indemnização haverá que analisar quais as legitimas expectativas da ora Recorrida e quais os prejuízos eventualmente sofridos por esta em virtude da conduta da Recorrente.

    dd) O facto de a Recorrente ter revogado o Contrato extemporaneamente não causou qualquer prejuízo à Recorrida.

    ee) O facto de a Recorrente ter revogado o Contrato sem respeitar a antecedência acordada (dita conveniente) era susceptível de gerar um dever de indemnizar o prejuízo causado, se algum prejuízo houvesse.

    ff) No entanto, tal indemnização não passa por obrigar a Recorrente a pagar o montante correspondente às prestações que seriam devidas até ao final do Contrato.

    [cfr. Jurisprudência citada nos pontos 86, 87 e 89, das presentes alegações] gg) Com o art. 1172°, al. e), do CC, na parte aplicável ao contrato celebrado por tempo determinado, o legislador quis assegurar a protecção da confiança depositada pelo mandatário na execução do mandato, nas despesas que faz por causa do mandato e confiando na execução do mesmo. E não a de vir a receber um determinado montante (mesmo quando o mandato seja conferido por tempo determinado).

    hh) Quando se renovou o Contrato, a Recorrida não adquiriu um direito, nem sequer uma expectativa legítima, de ser remunerada de determinadas quantias nem de ter determinado volume de serviço.

    ii) Uma indemnização por lucros cessantes da Recorrida pressuporia um direito desta a um ganho que se frustrou, o que não acontece no...

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