Acórdão nº 142/12.0TELSB.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelNUNO RIBEIRO COELHO
Data da Resolução24 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, neste Tribunal da Relação de Lisboa: I. RELATÓRIO Nos autos de inquérito supra identificados, Rafael ..., assistente constituído, veio requerer a abertura de instrução, após notificação do despacho proferido pelo Ministério Público de arquivamento do inquérito, com vista a se “declarar aberta a instrução e, em consequência, proferido despacho de pronúncia dos Denunciados pelo crime de Branqueamento de Capitais (…)”.

A instrução não foi admitida pelo senhor Juiz de instrução, por legalmente inadmissível, já que o requerente não tinha legitimidade para intervir nos autos na qualidade de assistente, relativamente ao crime de branqueamento de capitais, que constituía o novo objecto dos autos.

Inconformado com esta decisão, da mesma recorreu o identificado Rafael de Morais, o qual, da sua motivação, extraiu as seguintes conclusões: I. O Tribunal a quo decidiu indeferir o requerimento de abertura de instrução requerida pelo ora Assistente, com fundamento do ora Recorrente não tem legitimidade para intervir nos autos na qualidade de Assistente, relativamente ao crime de branqueamento de capitais, que constitui o novo objecto dos autos, está-lhe igualmente vedada a possibilidade de requerer a abertura de instrução.

  1. Tal fundamentação merece a impugnação do Recorrente, na medida em que este tem legitimidade para intervir nos presentes autos na qualidade de Assistente, na medida em que o despacho que admitiu a sua constituição de Assistente transitou em julgado quanto a essa legitimidade - Ac. do STJ de 11-07-1991, relator foi Sá Nogueira; III. Atribuída legitimidade processual ao Recorrente na qualidade de Assistente, transitado em julgado o despacho de admissão de constituição de assistente, este não pode este ser alterado posteriormente, uma vez que não se verificou a superveniência de factos que se repercutam na legitimidade atribuída.

  2. Há caso julgado formal do despacho que admitiu o Recorrente como Assistente, tendo este legitimidade para requerer abertura de instrução pelo crime de branqueamento.

  3. É admissível a constituição de Assistente no crime de branqueamento, havendo imediata e mediatamente identidade entre os bens jurídicos dos crimes de corrupção e branqueamento - realização de justiça.

  4. Acresce o facto da norma incriminadora do branqueamento de capitais constitui um co-fundamento da punição de uma incriminação comum.

  5. A realização da justiça é imediatamente um corolário da paz social e de uma sociedade justa pelo que é admissível a constituição de Assistente, quando é este o bem jurídico em causa, nos termos e para efeitos artigo 68° n° 1 al. e), do C.P.P..

Nestes termos e nos mais de direito, que V. Excelências, Venerandos Desembargadores do Tribunal da Relação doutamente suprirão, devem revogar o despacho ora recorrido, substituindo por outros que determine a legitimidade do ora Recorrente para requerer a abertura de instrução e, consequentemente, que determinem a admissão do requerimento de abertura de instrução.

Pois só assim se fará a costumada Justiça! O Ministério Público apresentou resposta, pronunciando-se pela improcedência do recurso com as seguintes conclusões: No requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente, é imputado a Manuel …, Francisco … e «…, SA» a prática, em co-autoria, de crime de branqueamento de capitais, p. e p. pelo art. 368°-A do Código Penal; Porém, o assistente carece de legitimidade para intervir nos autos pelo referido crime; Tal sucede por este não constar do elenco taxativo do art. 68° e) do Código do Processo Penal; Assim, como bem diz o Meritíssimo Juiz «a quo»: «Ora seguindo na esteira da jurisprudência amplamente citada e, afigurando-se que o requerente não tem legitimidade para intervir nos autos na qualidade de assistente, relativamente ao crime de branqueamento de capitais, que constitui o novo objecto dos autos, está-lhe igualmente vedada a possibilidade de requerer a abertura de instrução.» Pelo exposto e salvo melhor opinião, entende-se que o recurso não merece provimento, devendo manter-se o douto despacho recorrido.

O Mm.º Juiz de instrução sustentou o seu recurso.

A Ex.ma Procuradora Geral-Adjunta nesta Relação remete a sua posição para as alegações em 1.ª instância, posição também assumida pelo assistente na sua resposta.

*** II. QUESTÕES A DECIDIR Conforme jurisprudência constante e amplamente pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. Art.º 119.º, n.º 1; 123.º, n.º 2; 410.º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CPPenal, Acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/1995, publicado em 28/12/1995 e, entre muitos, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 25/6/1998, in BMJ 478, pp. 242, e de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271).

Tendo em conta este contexto normativo e o teor das conclusões efectuadas pela recorrente e pelo Ministério Público as questões em apreciação visam saber: (i) da qualidade de assistente do aqui recorrente e da manutenção da sua legitimidade nos autos para requerer a abertura de instrução e (ii) da admissibilidade da constituição de assistente nos crimes de branqueamento de capitais.

*** III. FUNDAMENTAÇÃO Tendo em conta o objecto do recurso importa atentar no conteúdo despacho de indeferimento recorrido.

“Fls. 2580 a 2584 - Tomei conhecimento do estado dos autos e, bem assim da douta promoção que antecede.

Os presentes autos de inquérito tiveram origem numa Averiguação Preventiva n.° …, baseada numa queixa apresentada pelo Professor Doutor ..., a denunciar factos susceptíveis de integrar crimes de associação criminosa e branqueamento de capitais, alegadamente praticados em território nacional, tendo como crimes precedentes, para além do mais, crimes de corrupção, burla e fraude fiscal, alegadamente praticados em Angola.

Por despacho proferido em 13/12/2012, admitiu-se a intervir nos autos na qualidade de assistente, o cidadão RAFAEL ... - ex vi do art° 68°-1,al. e)en°4do CPP.

Com efeito, apesar de o assistente assumir no processo penal português uma posição relevante em termos de política criminal, com direitos e deveres próprios, nem todos os crimes admitem a constituição como assistente.

Resulta da alínea a), do n.° 1, do art.° 68.° do CPP, para além das pessoas a quem leis especiais conferem esse direito, podem constituir-se como assistentes no processo penal, os ofendidos, considerando-se como tais os titulares dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação, desde que maiores de 16 anos.

Pode ainda constituir-se como assistente nos autos "qualquer pessoa nos crimes contra a paz e a humanidade, bem como nos crimes de tráfico de influência, favorecimento pessoal praticado por funcionário, denegação de justiça, prevaricação, corrupção, peculato, participação económica em negócio, abuso de poder e fraude na obtenção ou desvio de subsídio ou...

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