Acórdão nº 9400/06.1TBCSC-A.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelPIMENTEL MARCOS
Data da Resolução09 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa I Por apenso à execução que a Caixa Geral de Depósitos, SA move contra Jo…, veio o Instituto da Segurança Social, I.P. – Centro Distrital de Segurança Social de Lisboa reclamar € 76 228,73, relativos a dívidas a contribuições à Segurança Social, bem como os respectivos juros de mora.

Veio ainda o Ministério Público, em representação da Fazenda Nacional reclamar € 2 071, 23, provenientes de IMI e juros, relativos às fracções “B”, “E” e “F” penhoradas nos autos.

Finalmente veio Maria….., quanto à fracção “E”, reclamar um crédito no montante de 99.759,58, dizendo em síntese: - que celebrou com a executada um contrato promessa de compra e venda duma fracção autónoma; - que a promitente vendedora marcou mais do que uma vez data para celebração da escritura, a última das quais para 27 de Janeiro de 2006, mas que nunca compareceu no cartório notarial; - que, desde esta data, o gerente da ré sempre se recusou a ser contactado pela ora requerente; - que a falta de comparência, mais do que uma vez, para a realização da escritura, e a recusa em contactar a promitente compradora, consubstanciam, da parte da promitente vendedora um incumprimento definitivo: - que o incumprimento definitivo sempre se verificaria com a penhora agora realizada; -que, em virtude deste incumprimento definitivo, goza do direito de retenção nos termos do artigo 759.º do CC, o qual prevalece sobre a penhora e sobre hipoteca; - que ainda não dispõe de título executivo contra a executada; - que, sendo titular de um direito de crédito sobre a executada, gozando de garantia real sobre a fracção penhorada, pretende instaurar acção declarativa para obtenção daquele título; Razão pela qual, não podendo reclamar desde já o seu crédito nos presentes autos de execução, vem por este meio requerer que: - nos termos do n.º 1 do artigo 869.º do CPC, a graduação dos créditos relativamente à fracção em causa, abrangida pela garantia da requerente, aguarde a obtenção do título executivo em falta; - nos termos do n.º 2, com as consequências previstas no n.º 3, ambos do mesmo artigo e código, seja a executada notificada para se pronunciar sobre a existência do crédito ora invocado.

Exequente e executado foram notificados, nos termos dos artigos 866º, nº 2 e 869º, do CPC, tendo sido deduzida oposição pela exequente quanto ao crédito reclamado por Maria….

Por despacho de 05/03/10 (fls. 100) (dada a falta de oposição pela executada), foi considerado “formado título para reclamação” nos termos do citado artigo 869.º Como se disse, a exequente impugnou o crédito reclamado pela referida Maria, proveniente do direito de retenção, concluindo que a reclamação de créditos deve ser julgada improcedente e, em consequência, não ser reconhecido o crédito reclamado, dizendo, em síntese: - A ser verdadeiro o que a reclamante alega, a promitente vendedora não teria cumprido o prazo para a realização da escritura, pelo que se teria constituído em mora; - Para que a mora se transforme em incumprimento definitivo é necessário que o credor perca o interesse que tinha na prestação; - A reclamante não alega que deixou de ter interesse no cumprimento da prestação, pelo que, perante os factos alegados, a promitente vendedora estará, quando muito, em mora; - Sendo que a simples mora apenas permite ao credor exigir os danos que lhe tenham sido causados, nos termos do artigo 784.º do CC, e nunca o recebimento do sinal em dobro.

- A reclamante não alega ter tido a posse da fracção, limitando-se a dizer que o gerente da executada lhe entregou as chaves; - Com os factos ora alegados pela reclamante – que é o que apenas releva nesta instância - não é possível reconhecer-lhe a titularidade do direito de retenção que se arroga.

Foi proferido despacho saneador, com fixação dos factos assentes e da base instrutória, e realizou-se a audiência de discussão e julgamento, tendo sido dados como provados os seguintes factos: 1. Encontram-se penhoradas as fracções autónomas referidas a fls. 123 (Alínea A) da Factualidade Assente); 2. A executada não efectuou o pagamento de € 48 730,17 de contribuições devidas à Segurança Social (Alínea B) da Factualidade Assente); 3. A executada não efectuou o pagamento de IMI, que incide sobre o artigo matricial U…, da freguesia da Parede, referente à 1ª prestação do ano de 2005 e inscrito para cobrança no ano de 2006, nos valores de € 786,50, relativo à fracção “B” e € 883,85, relativo à fracção “E” (Alínea C) da Factualidade Assente); 4. Em 19 de Maio de 2003, a reclamante, na qualidade de promitente compradora, celebrou com a executada contrato de compra e venda da fracção ”E” correspondente ao 2º andar, letra A, do prédio urbano sito no lote 104 da Rua…, aludida em 1., tendo entregue a título de sinal e princípio de pagamento a quantia de € 49.879,79 ao representante legal da executada, Joaquim (Resposta ao Quesito 1º) 5. Em data não apurada do ano de 2004, o representante legal da executada entregou à reclamante as chaves da fracção autónoma prometida vender (Resposta ao Quesito 2º); 6. A escritura de compra e venda do prédio dos autos foi desmarcada no dia 27 de Janeiro de 2006 (Resposta ao Quesito 3º).

Na parte que agora importa considerar foi decidido não se verificar o crédito reclamado por Maria… «com base no direito de retenção e relativo à fracção “E”» Inconformada, apelou a reclamante, formulando as conclusões que se transcrevem: 1ª) Vem o presente recurso interposto da decisão proferida nos presentes autos (de apenso de Reclamação de Créditos), da parte em que julgou “não verificado o crédito reclamado por Maria….”, e bem assim como, da decisão de graduação de créditos constante da mesma sentença.

  1. ) Por apenso aos presentes autos de Execução, a ora Recorrente apresentou Reclamação de Créditos, requerendo o reconhecimento do seu crédito sobre o Executado, e bem assim como, a graduação do seu crédito em relação aos demais credores.

  2. ) Alega a Recorrente ter direito a receber da sociedade Executada, o valor correspondente ao dobro do sinal por si prestado aquando da celebração de contrato-promessa de compra e venda, pelo facto do referido contrato ter sido, definitivamente, incumprido.

  3. ) Mais alegou a Recorrente, gozar de um direito real de garantia, o direito de retenção sobre a fracção prometida vender, por ter obtido a tradição da mesma, directamente do promitente-vendedor, direito que lhe confere (nos termos do disposto no nº1 do artº 759º do CC) o direito a ser paga com preferência aos demais credores.

  4. ) Ora, entende a Recorrente que, na sentença recorrida não se encontra devidamente especificada e fundamentada a razão pela qual a M.ª Juiz a quo não considerou verificado o crédito da Reclamante, ora Recorrente.

  5. ) Na verdade, refere a sentença recorrida que a não verificação do direito de retenção “determina a não verificação dos créditos reclamados” – raciocínio com que não podemos, com o devido respeito, concordar: a não verificação do direito de retenção, não pode determinar a não verificação do crédito.

    Aliás, a verificação da existência de um crédito (“resultante do não cumprimento imputável à outra parte” – al.f do artº755º), é precisamente, um dos requisitos da verificação e reconhecimento do direito de retenção ao beneficiário da promessa de transmissão de direito real… Assim como não podemos concordar com a afirmação constante da sentença recorrida de que a Recorrente reclamou o seu crédito “com base no direito de retenção”.

  6. ) No entendimento da recorrente, a sentença recorrida demonstra uma clara falta de fundamento, de facto e de direito, que justifique a decisão de considerar não verificado o crédito da ora Recorrente.

  7. ) Acresce que uma realidade é o crédito que a Recorrente reclama, e outra, diferente, é o direito real de garantia sobre esse crédito – o direito de retenção. Realidades que têm, inclusivamente, pressupostos e requisitos distintos. No entanto, ao longo da sentença recorrida, a análise parece sempre ser feita (erradamente) em conjunto… 9ª) Pelo que, entende a Recorrente verificar-se uma situação de não especificação dos fundamentos de facto e de direito, que justifiquem a decisão de considerar o crédito da Recorrente como não verificado, o que consubstancia a nulidade da sentença proferida.

  8. ) Por outro lado, a sentença recorrida considera que “a mera entrega das chaves do prédio ou da fracção ao promitente-comprador, não é suficiente para que se dê por verificada a tradição para efeitos de invocação do direito de retenção”; e bem assim como, que “apenas se mostra provado a entrega das chaves à reclamante, a qual, como se viu não é suficiente para que se dê por verificada a tradição para efeitos de invocação do direito de retenção.” 11ª) No entanto, entende a Recorrente que constam do processo documentos e outros meios de prova que, só por si, implicariam, necessariamente, que a decisão da M.ª Juiz tivesse sido outra.

  9. ) O próprio contrato-promessa celebrado entre a ora Recorrente e o Executado – cuja celebração foi dada como assente nos presentes autos – determina (na cláusula 7ª) que o promitente-vendedor “autoriza a habitação da fracção ora prometida vender, antes da efectivação da Escritura Pública de compra e venda, sendo da responsabilidade do Segundo Outorgante todas as despesas com a referida ocupação”.

  10. ) Encontram-se juntas aos autos, cópias de várias actas de reuniões da assembleia de condóminos do prédio da fracção, que demonstram que a ora Recorrente, habitava a fracção prometida vender, que foi desde logo nomeada Administradora do Condomínio, e que esteve presente em todas aquelas assembleias.

  11. ) Encontram-se igualmente juntos aos autos, diversos documentos que demonstram que a ora Recorrente tinha celebrado contratos de abastecimento, em seu nome, para a fracção dos autos, nomeadamente: Facturas de consumo de Gás (de Janeiro a Março de 2006), contrato de abastecimento celebrado com a EDP (em 30-04-2004), Facturas de...

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