Acórdão nº 77/15.4T8LSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelSOUSA PINTO
Data da Resolução19 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


I – RELATÓRIO “S, Lda”, veio, ao abrigo do disposto no art. 17º-A do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, intentar o presente processo especial de revitalização.

Concluídas as negociações foi aprovado - por credores cujos créditos representam mais de dois terços da totalidade dos votos emitidos, correspondendo mais de metade a créditos não subordinados, sendo que votaram credores representando mais de um terço do total dos créditos relacionados com direito de voto contidos na lista provisória de crédito com as alterações decorrentes da decisão proferida em 12.05.2015 sobre as impugnações deduzidas (cfr. art. 212º nº 1 “ex vi” do art. 17º-F nº 2 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas) – um plano de recuperação conducente à revitalização da Requerente, que foi remetido ao Tribunal juntamente com a documentação mencionada no art. 17º F.

Foi assim declarado aprovado o plano de recuperação da “Stockash – Armazém de Stocks, Lda” junto aos autos a fls. 588 a 639.

Posteriormente, a credora “Organizações Ciage – Importação e Exportação, Lda.”, requereu a não homologação do plano, com fundamento na desigualdade de tratamento dos credores, em concreto das instituições bancárias e dos credores comuns, sendo que tal requerimento foi julgado improcedente.

Vieram ainda os credores ..... alegar que os valores constantes da relação de créditos do plano de recuperação não se mostravam conformes aos créditos por si reclamados e à decisão das impugnações proferida em 12.05.2015.

Já o Sr. Administrador judicial provisório, no requerimento com que juntou o documento escrito com o resultado da votação, chamava a atenção para esse facto, requerendo que a devedora fosse notificada para apresentar o plano de revitalização rectificado quanto aos valores, conformando-os com o despacho de 12.05.2015 que decidiu as impugnações.

Em 19/06/2015, o Senhor Administrador Judicial Provisório apresentou o Plano de Recuperação tendente à Revitalização da empresa, contendo o resultado da votação da sua aprovação por parte dos credores.

No âmbito de tal Plano o crédito do ISS seria pago em 150 prestações, sendo que tal instituição votou contra esse Plano.

Foi então decidido não existir fundamento para não homologar o plano aprovado (e, menos, para notificar a devedora para apresentar uma rectificação do plano que já se mostrava aprovado pelos credores).

Por decisão de 29/06/2015, homologou-se o Plano de Recuperação da empresa “S, Lda”, nos termos do art.º 17.º-F, n.º 5 do CIRE.

Inconformada com tal decisão veio o Instituto da Segurança Social, IP, recorrer da mesma, tendo apresentado as suas alegações nas quais verteu as seguintes conclusões: «1. O presente recurso vem interposto da Sentença que homologou o Plano de Recuperação com vista à Revitalização da devedora “S, Lda.”, porquanto a mesma viola o disposto nos art°s 195° e 215.º do CIRE, 190.º e sgts do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro (alterado pela Lei n.º 119/2009, de 30 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 140-B/2010, de 30 de dezembro, pela Lei n.º 55-A/2010) e n.ºs 2 e 3 do art.º 30.º da Lei Geral Tributária.

  1. O referido Plano Especial de Recuperação estabeleceu um deferimento de créditos públicos (da Segurança Social) sem expressa autorização desta, em violação do princípio da igualdade e da legalidade; 3.

    Face às alterações introduzidas pela Lei nº 55-A/2010, de 31/12 no artigo 30º da Lei Geral Tributária, a norma ínsita no nº2 do artigo 30 da Lei Geral Tributária (aprovada pelo Decreto Lei nº 398/98, de 17.12) prevalece sobre as disposições do CIRE Termos em que, no provimento deste Recurso deve revogar-se a decisão recorrida, seguindo o processo os ulteriores termos legais Com o que se fará JUSTIÇA!» A recuperanda, “S, Lda.

    ”, veio por seu turno apresentar contra-alegações, nas quais exibiu as seguintes conclusões: «1) Nas suas alegações o Recorrente não conclui de forma sintética pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração da decisão, não cumprindo assim com o ónus imposto pelo artigo 639º, nº 1 e 2, do CPC, ex vi artigo 17º do CIRE; 2) Também relativamente ao ónus a que se está obrigado quando se impugna a decisão quanto à matéria de facto, o Recorrente fá-lo de forma absolutamente deficitária, pois nos três pontos das suas conclusões não especifica, nos termos a que obriga a alínea a), do nº 1, do artigo 640º do CPC “os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados”; 3) A douta Sentença que homologou o plano de revitalização da Recorrida fez uma correcta interpretação e aplicação das normas legais, não tendo violado qualquer normativo legal, mormente os artigos 195º e 215º do CIRE, 190º e seguintes do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei nº 110/2009, de 16 de Setembro (alterado pela Lei nº 119/2009, de 30 de dezembro, pelo Decreto-Lei nº 140-B/2010, de 30 de dezembro, pela Lei nº 55-A/2010) e nºs 2 e 3 do artigo 30º da LGT, ao contrário do alegado pelo Recorrente; 4) Com efeito, conforme se deixará demonstrado, o Tribunal a quo esteve bem, quando decidiu homologar o plano de revitalização aprovado pela maioria dos credores; 5) Desde logo, porque “in casu”, como considerou a douta Sentença, “não existe fundamento para não homologar o plano aprovado”; 6) Além do mais, a eventual redução dos créditos da segurança social ao abrigo de um plano validamente aprovado, não viola os princípios da igualdade e da legalidade tributária, não estando por isso vedada pelo disposto no artigo 30º, nº 2, da LGT; 7) Sendo que o aditamento do nº 3 a este artigo 30º, não altera este raciocínio, pois do mesmo não resulta que o legislador tenha querido, por esta forma, inviabilizar a homologação de planos de insolvência/revitalização, não tendo revogado as normas correspondentes do CIRE; 8) Pois, a prevalecer a tese seguida pelo Recorrente ter-se-ia encontrado, por forma enviesada, através de uma disposição transitória na Lei do Orçamento de Estado, a maneira de inviabilizar todo o capítulo do CIRE dedicado ao plano de insolvência, na medida em que normalmente os créditos do Estado têm um grande peso no universo das dívidas do Insolvente resultaria na inviabilização de qualquer plano de insolvência e, por consequência, na revogação, ainda que não formal, de todo esse capítulo, defende sabiamente a Relação de Guimarães[1], entre outras[2]; 9) Ora, o legislador não alterou nenhuma das normas do CIRE com base nas quais a jurisprudência se vinha orientando uniformemente no sentido de que o plano aprovado que implicasse redução do valor dos créditos sobre a insolvência/revitalização, mesmo quanto aos créditos titulados pelo Estado, e ainda que fosse aprovado com os votos contra do Estado, poderia ser homologado; 10) Importa salientar que nos termos do disposto no artigo 196, nº 1 e 197º, do CIRE, estão previstas várias medidas com incidência no passivo da empresa devedora, podendo o plano afectar os créditos de todos os credores privados, mesmo que contra o voto destes; 11) Relativamente aos créditos do Estado, a jurisprudência foi-se também consolidando no sentido de que mesmo que o plano fosse aprovado com os votos contra destas entidades, poderia ser homologado, independentemente do disposto no artigo 215º do CIRE, com o fundamento nomeadamente no princípio da igualdade dos credores[3]; 12) Tanto mais que o recente DL nº 18/2015 de 7 de julho permite o alargamento das prestações para pagamento de dívidas à Segurança Social para 150, desde que verificados os requisitos previstos pelo legislador; 13) À cautela e ainda que assim se não considerasse, importa trazer aqui a interessante solução jurídica preconizada, desta vez, pela Relação de Évora[4], que embora seguindo a tese defendida pelo Recorrente, consegue ainda assim fazer respeitar a orientação que presidiu à criação do CIRE: “ (…) o plano de insolvência que preveja a redução dos ditos créditos não produz efeitos em relação ao Estado ou à Segurança Social; III- Tal ineficácia não impede que se homologue o plano mas tão só em relação aos demais credores” (sublinhado nosso); 14) Sendo a vontade da maioria dos credores que comanda todo o processo, como o legislador que aprovou o CIRE fez questão de salientar no preâmbulo do diploma[5], cabe a estes decidir o meio pelo qual serão pagos os seus créditos; 15) Pelo exposto, nada há a revogar na Douta Sentença recorrida proferida pelo Tribunal a quo.

    TERMOS EM QUE NÃO DEVE SER DADO PROVIMENTO AO RECURSO, MANTENDO-SE A SENTENÇA RECORRIDA, ASSIM FAZENDO V. EXAS. A COSTUMADA JUSTIÇA.» II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Cumpre apreciar e decidir as questões suscitadas pelo apelante, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas suas conclusões de recurso. A única questão que importa conhecer prende-se com o saber quais as consequências jurídicas para um PER que viu aprovado o diferimento dum crédito público (pagamento em 150 prestações segundo o plano) sem a anuência da própria instituição pública III – FUNDAMENTOS 1. De facto Com relevância para a apreciação do presente recurso temos a factualidade contante do Relatório supra.

  2. De direito A única questão que importa conhecer prende-se com o saber quais as consequências jurídicas para um PER que viu aprovado o diferimento dum crédito público (pagamento em 150 prestações segundo o plano) sem a anuência da própria instituição pública.

    Na jurisprudência esta questão não tem sido líquida, havendo quem entenda que as alterações introduzidas ao CIRE, com a introdução do processo especial de revitalização, pela Lei n.º 16/2012 de 20 de Abril, significaram uma notória tomada de posição por parte do legislador no sentido de promover e facilitar as situações passíveis de poderem conduzir à recuperação das empresas, que mostrassem um mínimo de potencial para serem recuperadas, ao invés de serem conduzidas...

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