Acórdão nº 2101-11.0TVLSB.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 30 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelCATARINA AR
Data da Resolução30 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I-RELATÓRIO: I – E..., C... e M..., intentaram acção declarativa de condenação com processo ordinário, contra as RR. C... Lda. e M... Lda., F... e A... S A, pedindo a condenação solidária para o autor M... a quantia de € 400.000,00 a título de danos não patrimoniais e patrimoniais e aos AA. E... e C... a quantia de € 350.000,00 a título de danos morais e patrimoniais.

Alegaram que ré acompanhou a gravidez da autora e não viu as malformações nas ecografias do M... Tiveram conhecimento das malformações no momento do parto, não puderam decidir pela interrupção voluntária da gravidez. A A... assumiu através das apólices que identificaram a responsabilidade civil pelos actos praticados pela Ré F...

Contestou a Ré F... impugnando os factos e, nomeadamente, que detectou as malformações e não as comunicou aos AA. E... e C..., nem as mesmas eram incompatíveis com a vida, não teve responsabilidade pelas malformações do M..., sendo certo que, não permitiam a interrupção voluntária da gravidez.

Contestou a A.., por impugnação, ainda que tivessem sido detectadas as malformações, estava afastada a possibilidade da A. C... suscitar a interrupção voluntária da gravidez, o que está subjacente à actuação da Ré F... é a prática de um acto médico de diagnóstico, meramente perceptivo e declaratório do estado de saúde do feto, como tal, sem qualquer interferência com a formação ou o estado de saúde deste, a actuação da Ré foi conforme à sua legis artis, Com dispensa da audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, fixou a matéria assente e controvertida, objecto de reclamação pela Ré F..., parcialmente deferida.

Após o julgamento absolveu a Ré F... da totalidade do pedido e julgou a acção parcialmente procedente contra a A... S A que condenou a pagar ao A. E... a quantia de € 10.000,00 e à A. C... a quantia de € 15.000,00, absolvendo-a de tudo o mais peticionado Não se conformando com a decisão interpuseram recurso os autores nas alegações concluíram:

  1. A Autora ao saber que ficara grávida, contou com os bons serviços da Ré F...

  2. Os Autores estavam felizes por ser o primeiro filho.

  3. A Autora ao saber que ficara grávida, contou com os bons serviços da Ré F..., que possui a sua responsabilidade transferida para a A..., SA.

  4. Durante o período de gestação, a Ré F... determinou a realização das ecografias nas datas: 28.02.2008 (ecografia de datagem); 18.03.2008 (ecografia do 1. ° trimestre); 20.05.2008 (ecografia do 2.° trimestre); 05.08.2008 (ecografia do 3.º terceiro trimestre), 25.08.2008 (ecografia com avaliação do perfil biofísico e fluxometria) e a 30.09.2008 (ecografia com avaliação do perfil biofísico e fluxometria).

  5. A 18.03.2008 a gestação da Autora era de 12 semanas e a 20 de Maio de 2008 a gestação era de 21 semanas.

  6. Os exames denominados de ecografias são exames que permitem estudar e avaliar detalhadamente a anatomia fetal, em especial os membros.

  7. Em sede de perícia, a 20.05.2008, ficou provado que à data em que fora realizada a ecografia do 2º trimestre, ou seja, momento em que a Autora tinha 21 semanas de gestação, a Ré F... não viu as malformações, podendo ver, fazendo uso da diligência normal.

  8. Os Autores País, viviam felizes, expectantes em ter um filho perfeito, pois, a Ré F... nada comunicara em contrário, isto é, a existência de qualquer malformação.

  9. E a felicidade determinou que os Autores mudassem de casa por causa do filho, pintaram-no e colocaram as respectivas mobílias.

  10. Após o parto os Autores foram informados que o M... nascera com o pé boto, sindactilia completa D2-D3, com fusão ungueal e falângica a nível F3, braço esquerdo mais fino e curto que o direito (falta de tendão) e mão esquerda sem dois dedos.

  11. Os autores ao receber semelhante informação ficaram em estado de choque, em especial a Autora C... que durante o internamento de 03.10.2008 a 8.10.2008, sofreu, chorou e manifestou preocupação em relação ao M....

  12. A preocupação persistiu no tempo e persiste conforme demonstrado pela prova testemunhal, apresentada, designadamente o testemunho transcrito de M..., que após o nascimento a C... "quando falava com ela começava logo a chorar...", e que "... na escola os miúdos se afastam dele, não querem brincar com ele".

  13. A ficha clínica da MAC, de fls. 391 e datado de 06.10.2008, refere que "Gravidez vigiada e investida. A informação acerca das malformações foi uma notícia não esperada pelo que mãe está a procurar integrar o choque que sentiu. Preocupada com o desenvolvimento do bebé e o sofrimento do mesmo resultado da pressão/avaliação do exterior (adultos e outras crianças).

  14. Para o Tribunal a quo, a falta de 4.9 e 5.9- dedos da mão esquerda do M..., impossibilita o mesmo de exercer profissões específicas, designadamente instrumentista de teclados.

  15. E pergunta-se apenas, aquela ou outras como agente policial, militar das forças armadas, basquetebolista, médico cirurgião, motorista e tantas outras profissões.

  16. A resposta certamente é negativa e não pode ser tão redutora quanto o tribunal a quo faz que crer.

  17. O tribunal a quo levou em conta que não existe tratamento para a falta dos alegados 4.2 e 5.9 dedos da mão esquerda, presentemente, todavia, poderá existir no futuro.

  18. No dia 20.08.2008, e conforme referem os peritos no relatório pericial, "o estudo morfológico realizado às 21 semanas, podemos considerar que o não diagnóstico de adactilia (ausência de dedos) de 2 dedos da mão esquerda e o pé boto, são erros de diagnóstico.".

  19. A Ré F..., da forma como agiu podia e tinha mesmo a obrigação de ter visto e comunicado à Autora a falta dos dois dedos da mão esquerda do M... e o pé-boto.

  20. Igual posição assumiu o colégio de peritos a fls. 510 e 511 dos autos.

  21. A Ré F..., não agiu de forma diligente, mas antes, de forma grosseira, com total descuido, até porque é uma pessoa experiente.

  22. Em face das malformações evidenciadas entende o Tribunal a quo, que não seria permitida aos Autores a interrupção voluntária da gravidez, ainda que detectada na ecografia morfológica das 21 semanas.

  23. Em primeiro lugar aos Autores nem sequer lhes foi dada essa possibilidade (IVG), por omissão da informação por parte da Ré F...

  24. E esquecido ainda que existe a liberdade de prestação de serviços em todo o espaço europeu, e, que na hipótese de os Autores saberem poderiam ter efectuado a IVG noutro país como seja, a Holanda onde a IVG vai até às 24 semanas.

  25. Os AA tinham direito a conhecer as malformações do M... antes do nascimento, porque sempre equacionaram que o filho seria perfeito.

  26. Em face da factualidade descrita, considera-se que os AA têm direito a ser indemnizados pela dor, sofrimento e angústia sofrida passada e futura.

    A

  27. Na fixação da indemnização, deve atender-se aos danos não patrimoniais que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito.

    BB) Esse montante deve ser fixado equitativamente pelo Tribunal atenta a culpa do agente, aqui Ré F..., a sua situação económica e dos lesados (aqui autores) e as demais circunstâncias que do caso o justifiquem (art.9s 496.2 e 494.9 ambos do código Civil).

    CC) Foram os referidos artigos, nomeadamente o n.2 3 do art. 496.9 do Código Civil que o Tribunal à quo, com o devido respeito, não deu a devida e mais correcta interpretação.

    DD) Na situação vertida, verifica-se que a Ré F..., é culpada pelos factos relatados, isto é, devia ter visto e comunicado as malformações e não viu, isto é, estamos perante um erro grosseiro, assente na negligência grave, até porque é uma pessoa experiente com longos anos de actividade ginecológica, conforme ficou demonstrado nos autos.

    EE) Podia de facto a Ré F..., efectuados outros exames, como sejam as ecografias tridimensionais e a amniocentese, este último, que permitiria corrigir as citadas malformações FF) Na fixação da indemnização deve levar-se ainda em conta, o momento pós parto e choque dos pais com a notícia, a qual persiste no tempo, situação para a qual os AA não foram nem estão preparados.

    GG) Não podem os AA aceitar o valor indemnizatório fixado, que não reflecte o desgosto, a ansiedade, vivida e que persiste no tempo, nem a letra e espírito da norma supra referida.

    HH) Defende a jurisprudência que "A indemnização por danos morais deve ter alcance significativo e não meramente simbólico, devendo o respectivo montante ser adequado à compensação do dano sofrido mediante satisfações derivadas da utilização do dinheiro."— AC RP 16.01.1997,BMJ, 463.9 -636.

    II) O STJ em acórdão do STJ de 6.01.2010, no âmbito, Proc. n.91234/06.OTASTS.PI.S1., que defende que "II - Danos não patrimoniais são os que são insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens, como a vida, a saúde, a perfeição física, a liberdade, a honra, o bom nome, a reputação, a beleza, que não se integram no património do lesado, apenas podendo ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo mais uma satisfação do que uma indemnização, assumindo o seu ressarcimento uma função essencialmente compensatória, embora sob a envolvência de uma certa vertente sancionatória.

    III -Para determinar o montante de indemnização por danos não patrimoniais, há que atender à sensibilidade do indemnizado, ao sofrimento por ele suportado e à sua situação socio-económica; e há também que tomar em linha de conta o grau de culpa do agente, a sua situação socio-económica e as demais circunstâncias do caso.

    IV-Equidade não é sinónimo de...

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