Acórdão nº 745/14.8TVLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelONDINA ALVES CARMO
Data da Resolução19 de Novembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I. RELATÓRIO MARTINS …, residente em ……, intentou, em 09 de Maio de 2014, contra ANDRÉ ….

, residente em ……, acção declarativa, sob a forma de processo comum, através da qual pede: a) se declare que é o legítimo proprietário do rés-do-chão direito do prédio sito na Rua Silva ……, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 1513/199…; b) se condene o réu a reconhecer aquele direito de propriedade e a restituir-lhe o andar livre e desocupado; c) se condene o réu a pagar-lhe € 300,00 mensais desde o mês de Abril de 2012 até à data da restituição, a título de indemnização pela ocupação indevida.

Fundamentou o autor, no essencial, esta sua pretensão na circunstância de ser proprietário do identificado imóvel, que foi dado de arrendamento a Costa …, pai do réu, o qual faleceu, caducando, por esse facto, o arrendamento, recusando-se o réu a restituir-lhe o imóvel.

Citado, o réu apresentou contestação, em 09 de Maio de 2014, arguindo a excepção de ineptidão da petição inicial por falta de causa de pedir. Invocou ainda que sempre viveu no local arrendado, em economia comum com a mãe e que o arrendamento se lhe transmitiu. Nega que o autor tivesse tido prejuízo, pelo que invoca o abuso de direito e a litigância de má-fé, por parte do autor.

O autor respondeu à contestação, nomeadamente ao pedido de litigância de má-fé deduzido pelo réu, invocando que à data do falecimento do inquilino a lei aplicável não previa a possibilidade de o arrendamento se transmitir a descendente nas condições invocadas pelo réu.

Foi realizada a audiência prévia, tendo sido elaborado despacho saneador, no qual se conheceu da invocada excepção de ineptidão da petição inicial por falta de causa de pedir, no que foi desatendida. Foi fixado o objecto do processo, deram-se como assentes os factos não controvertidos com relevo para a decisão e elaboraram-se os temas da prova.

Foi levada a efeito a audiência final, após o que o Tribunal a quo proferiu decisão, constando do Dispositivo da Sentença, o seguinte: Pelo exposto, decide-se julgar a presente acção parcialmente procedente por parcialmente provada: - declarando-se que o A. é o legítimo proprietário do rés-do-chão direito do prédio sito na Rua ……., descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 1513/199….; - condenando-se o R. a reconhecer aquele direito de propriedade e a restituir-lhe o imóvel; - condenando-se o R. a pagar ao A. € 300, 00 mensais desde Dezembro de 2012 inclusive até à entrega efectiva do imóvel, liquidando-se desde já a quantia devida em € 8 400, 00 e - absolvendo-se o R. do pagamento da quantia de € 300, 00 mensais entre Abril de 2012 e Novembro de 2012.

Custas por A. e R. na proporção do decaimento, que se fixam em 1/10 para o A. e em 9/10 para o R. (art.º 527.º/1/2 do C.P.C.).

Notifique e registe.

Inconformado com o assim decidido, o réu interpôs recurso de apelação, relativamente à sentença prolatada.

São as seguintes as CONCLUSÕES da recorrente: i. Desde 17 de Maio de 2012 o A. conhecia o facto de que o primitivo arrendatário tinha falecido e que era o R., que no locado vivia com a mãe, que pretendia continuar o arrendamento.

ii. O R. continuou a receber as rendas do R. até Novembro de 2012, inclusive, bem sabendo que era este a paga-las, apesar de passar os recibos em nome do falecido Costa.

iii. O facto do senhorio saber que o primitivo arrendatário pai do R. tinha falecido, que o R. queria que se lhe transmitisse o arrendamento e ter continuado a receber dele as rendas e a emitir recibos, se bem que em nome do pai do A., configura uma situação de reconhecimento do R. como inquilino.

iv. Ao receber rendas do R. e emitir recibos, o A. reconhece que o contrato de arrendamento sobreviveu ao primitivo arrendatário e aceita a sua transmissão para o filho deste, aqui R.

v. De resto, o R. está nas condições do previsto no artigo 1106º, 1, al. b), na redacção em vigor à data da morte do seu pai.

vi. O contrato de arrendamento em causa é de 1986, e o art. 57º da Lei nº. 6/2006, de 27 de Maio, não é aplicável tendo em atenção o previsto no artigo 59º, 3 da referida Lei. Com efeito, nada impede que as cláusulas respeitantes à transmissão do arrendamento sejam convencionadas pelas partes acrescentando outros beneficiários além dos previstos no regime legal, mantendo embora a ordem de preferência de transmissários neles contida e protegendo as classes aí previstas.

vii. Por outro lado, não pode haver lugar à condenação no pagamento de uma indemnização, pois não estão reunidos todos os requisitos da responsabilidade civil. Acresce que não tendo o A. invocado o enriquecimento sem causa, nem mencionado que existiu falta de pagamento das rendas, não podia a “juiz a quo” condenar o R. por motivo cimento torna o R. arrendatário. Tal situação torna a sentença nula nos termos do art. 615º, 1, al) b), c) e d) do C.P.C.

viii. De facto não houve prejuízo apurado, nem julgou provado que as rendas a partir de Novembro de 2012 não foram pagas.

ix. Para que haja lugar a responsabilidade civil tem de haver prejuízo, e aqui não se invoca qualquer prejuízo para o A., sendo que a sentença declara não se apurou que o Senhorio tivesse intenção de ceder o andar a terceiros (p. 5 da sentença, penúltimo paragrafo).

x. Não havendo prejuízo apurado, mas apenas o valor locativo do imóvel, não poderá haver lugar à condenação no pagamento de uma indemnização, pois não estão reunidos todos os requisitos da responsabilidade civil.

xi. Não tendo o A. invocado o enriquecimento sem causa, nem mencionado que existiu falta de pagamento das rendas, não podia a “juiz a quo” condenar o R. por motivo diferente do pedido. Toma assim conhecimento de questões de que não podia tomar conhecimento, sendo nula a sentença nos termos do art. 615º, 1, al.) in fine.

xii. Assim, deve cair a condenação do R. a pagar o valor indemnizatório.

xiii. A caducidade do arrendamento após a morte do arrendatário não opera ipso iure, mas deverá ser comunicada, considerando-se renovado o arrendamento se o pretendente a transmissário for tratado como tal, nomeadamente recebendo as rendas por si apresentadas e passando recibos.

xiv. Ora, não tendo o Inquilino entregue o locado findo o período a que se refere o artigo 1053º do C.C., o procedimento a que o senhorio deve deitar mão é a acção de despejo, e não a acção de reivindicação (Edgar A. M. Valente, Procedimento Especial de Despejo, Coimbra Editora, 2015, p. 30-31).

xv. Assim, tendo havido caducidade do contrato no entender do A., este usou um meio processual impróprio ao vir com uma acção comum.

xvi. O uso de meio processual impróprio conduz à absolvição da instância.

Pede, por isso, o apelante, que o recurso seja julgado procedente, e revogada a decisão recorrida, substituída por outra onde se reconheça o réu, como arrendatário, na decorrência de idêntico reconhecimento pelo autor, ou então, sendo o réu absolvido da instância por uso de meio processual inadequado, e em todos os casos não sendo o réu condenado a pagar ao autor qualquer quantia, uma vez que a falta de pagamento (base do prejuízo e do instituto da responsabilidade civil) não foi dada como provada, e o enriquecimento sem causa não foi alegado pelo R. nem os seus pressupostos não foram dados como provados.

O réu apresentou contra-alegações, em 09 de Junho de 2015, e não obstante não haja apresentado conclusões, propugnou que seja negado provimento ao recurso, confirmando-se, na íntegra, a sentença apelada.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. II. ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO Importa ter em consideração que, de acordo com o disposto no artigo...

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