Acórdão nº 14328/14.9T2SNT.L1.-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelONDINA CARMO ALVES
Data da Resolução12 de Novembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA.

I.

RELATÓRIO: BANCO, SA, com sede ….., intentou, em 22.07.2014, contra ALVES ….. e EMA ….., residentes na Rua ……, acção declarativa com processo comum, pedindo que seja decretada a ineficácia do contrato mediante o qual o réu vendeu à ré dois imóveis e que seja ordenado, à ré, a restituição desses imóveis, de modo a que a autora se possa pagar à custa dos mesmos, podendo executá-los no património do réu.

Fundamentou a autora, no essencial, esta sua pretensão da seguinte forma: 1.

Por Escritura Pública outorgada em 09-11-1999 o réu assumiu a qualidade de fiador e principal pagador dum crédito, no valor de 12.000.000$00, que a autora concedeu a António …. e, face ao incumprimento do contrato de mútuo, promoveu a instauração de acção executiva contra o mutuário e o fiador, ora réu, na qual se procedeu à venda do imóvel hipotecado, que foi insuficiente para pagar o crédito e juros devidos; 2.

Por Escritura Pública outorgada em 12.01.2011, o réu vendeu à ré, sua irmã, os dois imóveis de que era proprietário, ficando assim sem outros imóveis ou rendimentos conhecidos susceptíveis de penhora, tendo ambos os réus agido em conluio para que a autora não pudesse obter a cobrança do seu crédito e com consciência do prejuízo que causavam à autora.

Citados, os réus apresentaram contestação, em 23.11.2014, impugnando a factualidade alegada pela autora, e invocando que: 1 .

A ré desconhecia o contrato celebrado entre a autora, António e o réu, a instauração de execução para cobrança do crédito e a própria existência de um crédito da autora sobre o réu; 2.

Bastaria a impugnação da venda de um dos imóveis para garantir o pagamento do crédito reclamado pela autora; 3.

A autora actua com abuso de direito ao vir reclamar um crédito de € 74.347,44, quando apenas emprestou € 60.000,00 e já obteve a adjudicação do imóvel hipotecado em garantia do pagamento desse crédito pelo valor de € 43.350,00, muito abaixo do valor de mercado e da própria avaliação que fez do imóvel.

Em 14.01.2015, foi proferido despacho, dispensada a audiência prévia, efectuado o saneamento do processo, identificado o objecto do litígio e enunciados os Temas da Prova.

Foi levada a efeito a audiência final, após o que o Tribunal a quo proferiu decisão, em 07.04.2015, constando do Dispositivo da Sentença o seguinte: Pelo exposto julgo a ação improcedente, porque não provada, e, em consequência; A) Absolvo os réus do pedido; B) Condeno a autora no pagamento das custas do processo, aí se incluindo o pagamento das custas de parte devidas aos réus, calculadas em conformidade com o disposto nos artigos 25º e 26º, n.º 3, 4 e 5, do RCP e 533º, n.º 2 e 3, do C.P.C.

Inconformada com o assim decidido, a autora interpôs recurso de apelação, relativamente à sentença prolatada.

São as seguintes as CONCLUSÕES da recorrente: i.

Salvo o devido respeito que é muito, o Tribunal a quo julgou totalmente improcedente a acção de condenação intentada pelo recorrente, com o fundamento de que o Autor não logrou provar um dos pressupostos de procedência da impugnação pauliana, preceituado nos arts. 610º e ss. do Código Civil.

ii.

A questão em apreço nos presentes autos consistia em determinar se se encontram reunidos os pressupostos de procedência da impugnação pauliana, preceituado nos arts. 610º e ss. do Código Civil.

iii.

O Tribunal a quo deu como provada a existência do crédito da recorrente, deu também como provada a prática, pelos réus de um acto que não é de natureza pessoal, que provocou para a recorrente, a impossibilidade de obter a satisfação integral do seu crédito ou, pelo menos, o agravamento dessa impossibilidade, ou seja, as vendas tituladas pela escritura.

iv.

Os réus não lograram provar a existência de bens penhoráveis de valor igual ou superior ao crédito do recorrente.

v.

Deu-se como provada a anterioridade do crédito relativamente a esse ato.

vi.

Todavia, tendo em consideração que se tratava de um acto oneroso, o Tribunal a quo entendeu que o recorrente não logrou provar que ambos os réus agiram de má fé por terem consciência do prejuízo que tinham causado àquela.

vii.

Verifica-se erro de julgamento por parte do Tribunal a quo, pois o recorrente entende que, salvo o devido respeito, a matéria de facto foi incorrectamente apreciada e julgada.

viii.

Os meios probatórios constantes dos autos, onde se inclui a gravação do depoimento da testemunha Paulo ….., apresentada pelos réus impõem uma decisão diversa daquela constante da douta sentença.

ix.

Na verdade, em sede de audiência de discussão e julgamento foi contada uma história totalmente inverosímil e rocambolesca, em que os réus desempenharam o papel principal com a participação de um terceiro interveniente que prestou depoimento na qualidade de testemunha.

x.

Com efeito, este o depoimento, repleto de incongruências, demonstrou que os réus agiram de má fé, com consciência que estavam a prejudicar a ora recorrente.

xi.

Desde logo, as suspeitas surgem quando se percebe que o 1º réu Alves … dissipa o seu património, composto por dois bens imóveis, quando transmitiu para a 2ª ré, Ema, sua irmã, precisamente no mesmo ano em que a garantia hipotecária foi vendida judicialmente.

xii.

Essa transmissão foi efetuada para pagar uma alegada dívida que o 1º réu contraiu junto da 2ª ré, há quinze ou mais anos atrás.

xiii.

Com efeito, a história gira em torno de uma suposta dívida pessoal do 1º réu, que terá nascido há cerca de 15 anos atrás.

xiv.

Porém, rapidamente se percebe que estavam em causa dívidas a fornecedores, contraídas por uma sociedade em que os dois réus foram sócios, tendo a 2ª ré feito parte integrante da empresa.

xv.

Por outro lado, é importante reter a recambolesca, mas não menos curiosa transmissão incessante da titularidade dos bens imóveis entre os réus e o terceiro interveniente que prestou depoimento como testemunha, para pagamento de uma suposta dívida pessoal, quando na verdade se revelou tratarem-se de dívidas da empresa.

xvi.

Para além disto, vale lembrar que a 2ª ré foi citada numa morada onde supostamente já não é dela e onde não devia estar, porém foi onde o carteiro a encontrou no dia em que levou a carta de citação.

xvii.

Com efeito, o depoimento desta testemunha demonstrou claramente que os réus agiram com o intuito de prejudicar a recorrente, tentando pôr a salvo a todo o custo o património que terá sido construído pelos respetivos ascendentes.

xviii. Conclui-se assim que a prova produzida em sede de audiência de julgamento impunha que o Tribunal a quo desse como provada a matéria de facto discutida nos seguintes termos: - está provada a existência do crédito; - está provada a prática, pelos réus de um acto que não é de natureza pessoal, que provoca para a autora (credora), a impossibilidade de obter a satisfação integral do seu crédito ou, pelo menos, o agravamento dessa impossibilidade, ou seja, as vendas tituladas pela escritura. Note-se que teriam de ser os réus a provar a existência de bens penhoráveis de valor igual ou superior ao crédito do autor, o que não fizeram.

- está provada a anterioridade do crédito relativamente a esse ato.

- tratando-se dum ato oneroso, a autora logrou provar que ambos os réus agiram de má fé por terem consciência do prejuízo que assim causaram àquela.

Encontrando-se, assim, reunidos os pressupostos necessários à procedência do pedido de impugnação pauliana, a presente ação deverá proceder, deferindo-se o peticionado pela autora.

xix.

É assim que a douta sentença objecto do presente recurso padece de erro na apreciação e julgamento da matéria de facto e, como tal, resultando inevitavelmente, e salvo o devido respeito, em erro de julgamento por parte do Tribunal a quo, requerendo-se, deste modo, nos termos do disposto no nº 7 do artigo 637º do CPC a reapreciação da prova gravada, e devendo a acção ser julgada totalmente procedente, por provada.

Pede, por isso, a apelante, que seja concedido provimento ao recurso e revogada a sentença recorrida, com as legais consequências.

Os réus apresentaram contra-alegações, propugnando pela manutenção da decisão recorrida nos seus precisos termos, e formularam as seguintes CONCLUSÕES: i.

O douto tribunal a quo julgou a acção improcedente e absolveu os Réus do pedido por entender e bem que não se fez prova de um dos pressupostos necessários à procedência do pedido de impugnação pauliana: tratando-se de um acto oneroso era necessário que a Autora provasse que ambos os Réus agiram de má fé, com consciência do prejuízo que causavam à Autora, prova essa que a mesma não logrou fazer.

ii.

Carece de fundamento o presente recurso na medida em que a Autora não fez a prova que lhe incumbia, não...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT