Acórdão nº 596/13.7PZLSB.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução07 de Julho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) da Relação de Lisboa: I. RELATÓRIO: 1. Nos presentes autos de processo comum e sob acusação do Ministério Público, foi o arguido L .

submetido a julgamento, perante tribunal colectivo, na 1.ª Secção Criminal da Instância Central da Comarca de Lisboa.

No final, foi proferido acórdão Publicado e depositado em 18/02/2015.

, no qual se decidiu condená-lo «como autor material de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º1 al. d), da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena de 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano (cfr. art.50.º, n.º1 do C.P.)», sendo absolvido do crime de tráfico de estupefacientes de que estava acusado em co-autoria com outros arguidos.

*** 2. Inconformado com a decisão, recorreu o mesmo arguido, encerrando a motivação com as seguintes conclusões (transcrição): Na impugnação da decisão, na observância do disposto no n.º 2 e 3 do artigo 412.º do Código de Processo Penal, o recorrente está onerado a indicar as normas jurídicas violadas, o sentido em que, no seu entendimento, o tribunal recorrido interpretou cada norma ou com que a aplicou e o sentido em que ela devia ter sido interpretada ou com que devia ter sido aplicada; bem como, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e as provas concretas que impõem decisão diversa da recorrida; assim como, as provas que devem ser repetidas.

Assim, dir-se-à o seguinte: I – Dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados / Das normas jurídicas violadas: 1. Não podem ser dados como provados os seguintes factos constantes da matéria assente: - O taco de basebol que lhe foi apreendido, não possuíam qualquer uso definido, por não serem utilizados nos hábitos profissionais do arguido nem no seu uso doméstico ou desportivo, sendo susceptíveis de serem utilizados como armas de agressão.

O arguido L conhecia bem as características deste taco que possuía, nomeadamente a sua natureza contundente e que, por esse motivo e por não terem qualquer utilidade lícita conhecida nem o arguido possuir qualquer justificação para os deter, a sua detenção era proibida.

- Agiu, assim, o arguido L, de forma livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei.” (Note-se aliás que na matéria assente nenhuma referência se faz à utilização dos canivetes/navalhas – vd. motivações) 2.

Está verificada a insuficiência da matéria de facto para a decisão – pois, o thema probandum não foi devidamente escalpelizado e indagado pelo douto tribunal a quo.

Senão veja-se:

  1. Em relação à apreensão dos referidos canivetes (considerados como arma proibida) não existe qualquer referência quer no texto da decisão; quer durante a audiência de discussão e julgamento, qualquer referência ao tamanho da lâmina dos mesmos.

    Não sabemos pois se estamos perante canivetes com 3, 6, 10 ou 15 cm de comprimento?! Ou seja, temos uma decisão condenatória assente em matéria de facto insuficiente; já que, sem se conhecer – em sede de discussão da causa – sobre o tamanho e características dos referidos canivetes (que tanto podem ser de pequenas como de grandes dimensões, de um uso normal e regular quotidiano até representarem um qualquer perigo) condena-se o arguido.

    E tal situação verifica-se não só no âmbito da existência dos canivetes, como também na existência do referido taco de basebol (note-se que ambos os objectos foram confirmados pelo ora recorrente como sendo de sua propriedade).

  2. Também em relação ao taco de basebol não procurou de nenhuma forma saber o tribunal a quo, se o arguido teria na sua posse tal objecto a titulo da prática de desporto, como elemento decorativo ou até para puro divertimento pessoal – uma vez que estamos a referir-nos a um objecto que facilmente se encontra à venda em qualquer superfície comercial e até em lojas de brinquedos para crianças.

    1. Está pois, em nosso entender verificado o vicio a que se refere o artigo 410.º n.º2 al. a) do CPP, um dos vícios da matéria de facto, que consiste numa carência de factos que permitam suportar uma decisão dentro do quadro das soluções de direito plausíveis, e que impede que sobre a matéria da causa seja proferida uma decisão segura.

    2. O crime de detenção de arma branca (in casu, 3 canivetes e um taco de basebol), previsto no art. 86.°, n.º 1, al. d), da Lei 5/2006, de 23-02, apresenta uma descrição composta, pois à detenção do objecto classificado como “arma branca” acrescenta-se um elemento condicional, pois a detenção só será ilícita desde que «o portador não justifique a sua posse».

      (Vd em Proc. 1127/08 – 3.ª Secção, 23-04-2008 (STJ): “A não justificação da posse tem de ser pensada e caracterizada em relação aos fins, nas circunstâncias e no contexto da detenção do instrumento que pode ser usado como arma. Não pode, por isso, a ausência de justificação ser apenas uma espécie de “omissão branca”, devendo antes resultar da inexistência quer de explicação razoável para a posse quer de uma desadequação, segundo a experiência das coisas, entre a natureza do objecto, a actividade do sujeito, os usos comuns do objecto e as circunstâncias específicas da posse.” “De qualquer modo, a ausência de justificação para a posse de um instrumento que, pelas características, é de uso comum, e que é condição de verificação da ilicitude, tem pelo menos de ser referida enquanto elemento factual da construção complexa dos elementos da infracção na relação entre a tipicidade da detenção e a ausência de ilicitude, desde que a posse seja justificada.” 5. No caso, os factos provados, delimitados também pelo quadro factual que constava da acusação, referem apenas que: - Em busca realizada na residência do arguido L sita na Rua P., Lisboa foi ainda apreendido ao arguido: um taco de basebol; - e uma caixa em madeira, que continha no seu interior três canivetes com resíduos de canabis (resina), bem como pedaços deste produto, com o peso líquido de 1,794 gramas, tendo a amostra cofre o peso líquido de 1,523 gramas (…) - Os canivetes apreendidos ao arguido L eram, por si, utilizados para proceder ao corte da canábis.

      - O taco de basebol que lhe foi apreendido, não possuíam qualquer uso definido, por não serem utilizados nos hábitos profissionais do arguido nem no seu uso doméstico ou desportivo, sendo susceptíveis de serem utilizados como armas de agressão.

    3. Ora, esta conjugação de factos não permite a integração de todos os elementos do crime de detenção de arma, no que em concreto se refere quer aos canivetes quer ao taco de basebol – até porque, veja-se a final até se esquece a referência aos canivetes dizendo-se apenas: - O taco de basebol que lhe foi apreendido, não possuíam qualquer uso definido, por não serem utilizados nos hábitos profissionais do arguido nem no seu uso doméstico ou desportivo, sendo susceptíveis de serem utilizados como armas de agressão.

    4. A delimitação processual traçada, e tematicamente vinculada pelos termos da acusação, e os factos que o tribunal julgou provados dentro de tais limites, permitindo aceitar a tipicidade (detenção de um objecto com as características assinaladas), não são suficientes para a revelação externa da ilicitude (a não justificação da posse), nem a ausência de justificação se pode inferir, por presunção, de outros factos provados.

    5. Não pode ser considerado uma arma para os efeitos dos art.º 86.º, n.º 1 al.ª d), 2.º, n.º 1 al.ª f), 3.º, n.º 1 e 2 al.ª f) e 4.º, n.º 1, da Lei n.º 5/2006, de 23-2 (Regime Jurídico das Armas e Munições), por ser objecto comummente destinado á prática doméstica e usos habituais da população portuguesa em geral – um canivete / navalha - que é sem dúvida um objecto com aplicação definida, pois que arma não é.

    6. Não pode ser considerado uma arma para os efeitos dos art.º 86.º, n.º 1 al.ª d), 2.º, n.º 1 al.ª f), 3.º, n.º 1 e 2 al.ª f) e 4.º, n.º 1, da Lei n.º 5/2006, de 23-2 (Regime Jurídico das Armas e Munições), por ser objecto comummente destinado à prática de desporto, decoração, diversão – um taco de basebol - que é sem dúvida um objecto com aplicação definida, pois que arma não é.

    7. Mas mais, ainda sobre o vício mencionado, a verdade é que também relativamente a este facto assistimos ao emergir de uma contradição entre factos provados e não provados.

      Veja-se, diz a douta decisão nos factos dados como assentes: - Os canivetes apreendidos ao arguido L eram, por si, utilizados para proceder ao corte da canábis.

      - O taco de basebol que lhe foi apreendido, não possuíam qualquer uso definido, por não...

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