Acórdão nº 24004/09.9T2SNT.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 02 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelEZAG
Data da Resolução02 de Julho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I-Relatório: I - A, remeteu ao (extinto) Tribunal Judicial da Comarca da Grande Lisboa Noroeste – Sintra, Juízos de Média Instância Cível, o processo de expropriação litigiosa – relativo à parcela X, que é parte, e a desanexar do prédio inscrito na matriz predial rústica sob o art.º – Secção N e descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n.º , com as seguintes confrontações: Norte, com AL; Sul, com JM, LG da S P e RM; Nascente, com Estrada do (…) e Poente, com SF, referente à Expropriada, B.

Por despacho de folhas 160, 161, foi adjudicada ao Estado Português, para ser integrada no seu domínio público, a propriedade da referida parcela.

E ordenada a efetivação das notificações previstas no art.º 51º, n.ºs 5 e 6, do Código das Expropriações aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro.

Inconformada com a decisão arbitral – que fixou o valor de indemnização global relativo à parcela, em € 235.177,00 – dela recorreu a expropriante, a folhas a folhas 179-195, concluindo dever ser a indemnização a pagar pela expropriação da parcela em causa ser fixada no valor de € 120.000,00.

Nomeando perito para a imperativa avaliação.

A expropriada suscitou a questão da alegada falta de depósito de juros moratórios por parte da expropriada, correspondentes ao período, “em atraso”, calculados desde 31-12-2008 até ao dia da sua efetivação.

Ao que respondeu a expropriante, sustentando deverem ser considerados apenas 2 dias de mora, a que correspondem juros no valor de € 51,55.

Também a expropriada recorrendo da decisão arbitral, a folhas 231-245, propugnado pela fixação de um valor de indemnização “de € 524.290,60, ou caso assim se não entenda, no valor de € 453.593,10, tudo acrescido do valor das benfeitorias.”.

E indicando perito.

Mais vindo, subsequentemente, requerer a expropriação total, nos termos do art.º 55º do mesmo Código.

Por despacho de folhas 276, 277, foi, no tocante aos juros, e aderindo “aos fundamentos invocados pela entidade expropriante”, determinado “o depósito do montante em falta, no valor de € 51,55”.

Sendo admitidos os recursos e o pedido de expropriação total.

Ao qual a expropriante respondeu, concluindo pelo improcedência daquele.

Por sentença de folhas 323-331, foi julgado improcedente o pedido de expropriação total formulado pela Expropriada, e dele absolvida a expropriante.

Mais se ordenando a remessa dos autos ao Juízo de Grande Instância Cível da mesma comarca, para distribuição, julgado o competente para tramitar eventual recurso da decisão proferida, na circunstância de haver sido requerida a intervenção do Tribunal Coletivo.

Juízo aquele que não admitiu a intervenção do Tribunal Coletivo…declarando, “consequentemente”, a sua incompetência para conhecer da ulterior tramitação do processo.

Assim suscitado o correspondente conflito negativo de competência, que veio a ser decidido por despacho do Exm.º Presidente desta Relação, reproduzido a folhas 341 e v.º, declarando competente o Juízo de Grande Instância Cível, 2ª Secção, Juiz 4. E ultimada a diligência de avaliação, nos termos dos art.ºs 61º e seguintes, do C.E., foi apresentado pelos senhores Peritos o Relatório de folhas 381-387, concluindo que o valor indemnizatório global deverá ser no montante de € 350.435,50.

Sendo apresentadas sucessivas reclamações pela Expropriante, e pedidos de esclarecimento pela Expropriada, a que corresponderam outras tantas respostas e esclarecimentos dos senhores peritos, por último, e também na sequência de despacho reproduzido a 605 e 606, os de folhas 615-617.

E notificadas as partes para o efeito, apresentaram alegações tanto a Expropriante, a folhas 616-655 – sustentando dever fixar-se o justo valor da indemnização em € 120.000,00 – como a Expropriada, a folhas 664-683, contrapondo para aquela o valor de € 251.189,00.

Vindo a ser proferida sentença, a folhas 700-721, com o seguinte teor decisório: “Face ao exposto julgo parcialmente procedente o recurso interposto pelo Expropriante A, e improcedente o recurso interposto pela expropriada B e, em consequência, fixo o valor da indemnização que o Expropriante tem de pagar à expropriada pela expropriação da parcela de terreno identificada no ponto 6) dos factos provados, em € 213.746,70 (duzentos e treze mil, setecentos e quarenta e seis euros e setenta cêntimos), valor esse que deverá ser actualizado de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística relativamente ao local da situação da parcela, desde 12.05.2008 - data da publicação da declaração da utilidade pública - até à data da prolação da decisão final do processo.”.

Inconformada recorreu a Expropriante, formulando, nas suas alegações, as seguintes conclusões: “A.- A Sentença é nula por excesso de pronúncia, por ter condenado em factor superior ao peticionado pelos Expropriados e por violação do caso julgado (arts. 615º, nº 1, d. e e., e 619º do CPC): A.1- A natureza judicial e o trânsito em julgado dos acórdãos arbitrais nos processos expropriativos; A.2- A Expropriada, na sua petição de recurso do Acórdão Arbitral, não só não impugnou o índice fundiário previsto no art. 26º, nº 7, do Código das Expropriações utilizado pelos Senhores Árbitros (6,5%) como defendeu esse valor, pelo que a Sentença recorrida, ao adoptar o índice fundiário em causa indicado na avaliação pericial (8,5%), (i) violou o trânsito em julgado que se formou quanto a esta questão naquele Acórdão Arbitral, (ii) conheceu de questão que não podia conhecer e (iii) decidiu em mais do que os Expropriados peticionavam.

B.- A natureza meramente instrutória do Relatório dos Peritos e a autonomia e independência deste órgão de soberania face àquele relatório no cálculo da justa indemnização devida em expropriações por utilidade pública: o laudo dos peritos só deverá ser seguido pelo Tribunal se não existirem nos autos elementos de facto que contrariem os respectivos pressupostos ou conclusões, ou ainda, na ausência de formação jurídica por parte dos Senhores Peritos, quando as normas aplicáveis não impliquem diferentes qualificações técnico-jurídicas desses factos. Assim, (i) por mais complexas que possam ser as questões envolvidas e a decidir, o Tribunal não podem deixar de tomar posição fundada e consciente sobre cada uma das questões que lhes sejam submetidas a julgamento (estará assim de todo vedado ao julgador alhear-se dessas questões e remeter a respectiva decisão para os peritos – é o Juiz que preside à avaliação e é o Tribunal que decide); (ii) os Tribunais deverão sempre verificar a correcção e legalidade do discurso e método adotado pelos peritos: a justa indemnização devida aos Expropriados pode não ser a que estes entendem mas a que resulta de uma adequada interpretação e aplicação de todas as regras e princípios jurídicos ponderáveis, máxime, da Constituição.

C.- A arbitragem, a avaliação pericial e a Sentença recorrida que seguiu a metodologia daquelas avaliações padecem de uma ilegalidade grave que impede a sua manutenção na ordem jurídica – o art. 26º, nº 12, do Código das Expropriações não pode ser aplicado a esta parcela de terreno.

C.1- Não vem demonstrado por qualquer forma no processo que esta parcela, à data em que foi adquirida pela expropriada ou à data em que foi classificada como espaço canal pelo PDM de Sintra, tivesse alguma capacidade edificativa ou pudesse ser considerada solo apto para a construção, o que impede a aplicação deste regime do art. 26º, nº 12.

A interpretação do art. 26º, nº 12, do CE no sentido que o regime aí prescrito é aplicável a situações em que não se demonstre que a parcela expropriada, à data em que foi adquirida pela expropriada ou à data em que foi classificada como espaço canal pelo PDM, tivesse alguma capacidade edificativa ou pudesse ser considerada solo apto para a construção, é inconstitucional por violação dos princípios da igualdade, da proporcionalidade e da justiça indemnizatória (arts. 13º e 62º da Constituição).

C.2- O regime do art. 26º, nº 12, do Código das Expropriações pretende tutelar aquelas situações em que os proprietários dos terrenos expropriados tinham fundadas e legítimas expectativas de, não fosse a expropriação em causa, poderem desenvolver nos mesmos projetos edificativos, o que não é o que se passa na situação que nos ocupa, pois não é desta expropriação que resulta a incapacidade edificativa da parcela: não se pode construir na parcela pelo facto de, devido às suas características intrínsecas e vinculações situacionais, a mesma estar submetida a um regime jurídico-urbanístico que o impede e que já vigorava há diversos anos.

A interpretação do art. 26º, nº 12, do CE no sentido que o regime aí prescrito é aplicável às situações em que os proprietários dos terrenos expropriados não tinham fundadas e legítimas expectativas de, não fosse a expropriação em causa, poderem desenvolver nos mesmos projetos edificativos, é inconstitucional por violação dos princípios da igualdade, da proporcionalidade e da justiça indemnizatória (arts. 13º e 62º da Constituição).

C.3- A norma do art. 26º, nº 12, do código das expropriações foi especialmente concebida para aquelas situações em que se demonstre uma manipulação do planeamento urbanístico por parte da administração pública no sentido de condicionar intencionalmente um terreno para depois o expropriar por um menor valor.

C.4- A aplicação do art. 26º, nº 12, do código das expropriações, pressupõe que os expropriados hajam feito um determinado investimento na aquisição das parcelas expropriadas atendendo à sua capacidade edificativa, vindo mais tarde esse terreno a perder essa capacidade edificativa por efeito do plano (zona verde, espaço canal, etc.), o que não é o caso dos autos, em que esta parcela foi adquirida sem qualquer investimento, por doação.

A interpretação do art. 26º, nº 12, do CE no sentido que o regime aí prescrito é aplicável...

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