Acórdão nº 4852/12.3TCLRS-A.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelANABELA CALAFATE
Data da Resolução09 de Julho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes no Tribunal da Relação de Lisboa: I – Relatório: Os executados R... e C... deduziram oposição à execução para pagamento de quantia certa instaurada por Administração Conjunta do Bairro ... pugnando pela sua extinção, por invalidade e insuficiência do título executivo.

Alegaram, em síntese: - o mandatário da exequente estava impedido, nos termos da lei notarial, de certificar a fotocópia da acta da assembleia da exequente de 19/11/2006 apresentada como título executivo, pois interveio e acompanhou os trabalhos da perspectiva dos interesses da exequente, pelo que inexiste título; - os executados não foram convocados para a referida assembleia, pelo que são nulas as deliberações nela tomadas, por aplicação do art. 56º nº 1 al a) do Código das Sociedades Comerciais; - os executados nunca foram interpelados para qualquer pagamento; - a deliberação relevante para estes autos traduz-se no 3º ponto da ordem de trabalhos dessa assembleia, concretamente, «Ratificação das deliberações da Comissão de Melhoramentos e da Comissão de Administração da AUGI sobre comparticipação, para efeitos da sua cobrança judicial», a qual é nula por aplicação do art. 56º nº 1 al c) e d) do Código das Sociedades Comerciais; - pois os órgãos da administração conjunta que alegadamente terão tomado deliberações não tinham competência legal para deliberar sobre matérias de comparticipações em despesas da AUGI, estando tal competência reservada à assembleia de proprietários; - e não há há norma legal que permita ou exija que anterior deliberação da Comissão de Melhoramentos e da Comissão de Administração da AUGI seja ratificada e muito menos com efeitos retroactivos designadamente quanto a juros vencidos há décadas; - além disso, resulta da lei que as regras da comparticipação nas despesas com a reconversão da AUGI traduzem-se em critério de proporcionalidade ao interesse de cada proprietário, tendo em conta a área de construção que lhe é atribuída; - ora, o alvará de loteamento é de 19/11/2006 e na deliberação da Câmara Municipal de Odivelas que o aprovou foi logo fixado o valor de comparticipação de cada lote no custo de execução das obras e na caução, tendo sido fixado a cargo dos executados o valor de apenas 1.066,35 €; - assim, não poderia a assembleia de proprietários fixar o valor da comparticipação dos executados pelas obras de urbanização em 5.037,86 €, com 6.256,80 € de juros, sendo nula tal deliberação por violação da lei e da deliberação da CM de Odivelas; - acresce que é da competência da assembleia de proprietários a aprovação dos mapas e das fórmulas de cálculo que estão na base da fixação da comparticipação devida pelas despesas de reconversão, mas tal deliberação nunca foi tomada; - quando o art. 11º nº 5 da Lei das AUGI confere força de título executivo à fotocópia certificada da acta que contém a deliberação da assembleia que determine o pagamento de comparticipação, pressupõe que o pagamento tenha sido fixado, com base nos critérios legalmente estabelecidos, designadamente mediante a aprovação dos mapas, métodos e fórmulas de cálculo; - os executados apenas reconhecem ser devedores da quantia de 1.066,35 € conforme a deliberação camarária, mas nem para este valor a acta configura título executivo; - e nem existe título executivo para que seja reclamado qualquer montante por supostas despesas de legalização referidas no doc. 7 junto com o requerimento executivo; - mesmo que o capital fosse devido, sempre estariam prescritos os juros com mais de cinco anos; - a exequente reclama sem suporte ou justificação juros que alega serem devidos, em parte desde 30/06/1992, e em parte desde 01/05/2001 e 01/01/1994; - acresce que só 30 dias após a publicação da deliberação que tivesse aprovado os mapas e dos métodos e fórmulas de cálculo para a entrega das comparticipações é que poderiam ser exigidos juros, mas não foi publicada tal deliberação; - não tendo sido aprovados quaisquer mapas contendo os métodos e fórmulas de cálculo das comparticipações devidas, não pode a acta valer como título executivo, o que torna inexigível qualquer montante a título de juros e/ou capital.

* A exequente contestou pugnando pela improcedência da oposição., invocando, em resumo: - inexiste impedimento legal para o seu mandatário certificar a fotocópia da acta da assembleia; - caducou o direito dos executados impugnarem judicialmente as deliberações; - a comissão de administração da AUGI convocou validamente os executados; - a deliberação da acta nº 6, de 19/11/2006, configura uma “confirmação”, e não uma ratificação” como impropriamente ficou a constar na acta das deliberações de 1999, e por isso tem eficácia retroactiva, nos termos do art. 288º nº 4 do Código Civil; - como se comprova pela acta nº 1 a comissão de administração eleita – na qualidade de sucessora da comissão de melhoramentos - escudou-se numa deliberação da assembleia constitutiva para efeitos de fixação/confirmação das comparticipações pedidas antes de constituída a administração conjunta; - uma coisa são as comparticipações para as despesas de reconversão e outra é o montante da caução de boa execução das obras em falta à data da emissão do alvará; - em termos gerais esses valores deveriam assemelhar-se mas neste caso, grande parte das obras foram realizadas antes da emissão do alvará e até antes da constituição da administração conjunta e o dever legal dos comparticipar dos executados estende-se ao conjunto das obras e não apenas àquelas que faltavam executar e só a estas últimas se refere o montante da caução fixado pela Câmara; - a deliberação de 2006 contém as fórmulas do cálculo respectivo, aplicadas subsequentemente a cada lote; - conforme resulta das deliberações da assembleia e da liquidação da dívida feita pela exequente no requerimento executivo, o termo inicial do prazo de fixação de juros para as despesas de infra-estruturas é o dia 01/03/1994 e não o que os executados referenciam; - os juros não prescreveram pois aplica-se o disposto no art. 318º nº 1 al c) do Código Civil.

* Realizada audiência final, foi proferida sentença em que se decidiu: «Pelo exposto, julgo os presentes Embargos de Executado procedentes, por provados, pelo que absolvo os Executados R... e C... do peticionado em sede de acção executiva pela Exequente “Administração Conjunta do Bairro ...”, e, em consequência, determino a extinção da instância executiva».

* Inconformada, apelou a exequente, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões: A)- Em 6.II dos factos provados, sobre o teor da proposta de acta nº 6 dá-se por reproduzido que o Regulamento do Bairro foi aprovado em “16 de Janeiro de ano que se desconhece”. Apesar do texto estar parcialmente coberto pelo carimbo da autenticação, é legível “em 26 de Janeiro de 1992”. Deve portanto ser o texto rectificado nos termos do art. 712º CPC (art. 662º NCPC). (doc. 1).

B)- Expende a douta sentença recorrida que resulta da Lei 91/95 que a comparticipação para as obras de urbanização da AUGI só é exigível após a emissão do alvará de loteamento, pois só então será possível determinar o valor absoluto e a quota de cada lote nesse valor.

Ora, nem tal resulta da lei, nem são verdadeiras as restantes inferências de que o tribunal “a quo” daí extrai.

C)- Antes da publicação da Lei 91/95 de 2 de Setembro, já há muito os municípios, em conjunto com associações de moradores e comissões eventuais, vinham executando as obras de urbanização dos “bairros clandestinos”, o que a própria Lei 91/95 acautela (art. 18º nº 2 alínea a) - e nº 3 e art. 55º da Lei das AUGI).

D)- A mesma Lei das AUGI prevê que as obras de infraestruturas aprovadas no decurso do seu procedimento possam ser executadas antes da emissão do alvará de loteamento (art. 25º nº 6).

E)- A tese do tribunal “a quo” é sustentada apenas na jurisprudência “contra legem” do douto acórdão da Rel. de Évora de 9/10/2008, in dgsi.pt, que considera não ser líquido que o projecto de reconversão da AUGI seja aprovado, donde resultaria que só após preenchida essa condição se constituiria o direito de cobrança das comparticipações para as obras.

F)- É que trata-se de uma impossibilidade legal que o projecto de reconversão da AUGI não seja aprovado. Uma coisa é essa inevitabilidade, outra bem diversa, mas que ao caso não vem, é de se saber se a reconversão acolhe todas as espectativas dos interessados, os quais, de qualquer modo, estão vinculados a cumpri-la (arts. 1º nº 2 e 7, 3º nº 2 e 20º nº 5 da Lei das AUGI).

Acresce que, G)- O montante da caução de boa execução das obras de urbanização (arts.26º nº 2 e 3 e 27º da Lei das AUGI) não pode constituir critério de fixação das comparticipações para as despesas com as obras de urbanização, não só porque aquela cobre apenas as obras que faltam executar à data da emissão do alvará, como pode também cobrir o valor das taxas municipais cujo pagamento possa ser diferido para depois da sua emissão e que não incluem aquele valor (art. 29º c) .

H)- Aliás, a caução prevista na Lei das AUGI (lei excepcional), apenas difere da lei geral (RJUE), quanto à possível forma de prestação (hipoteca legal) e à não solidariedade entre os lotes por ela abrangidos. No mais constitui uma garantia (real ou bancária) de que o município se socorre para se substituir ao promotor na execução das obras em falta, mas só em caso de incumprimento deste.

I)- Por outro lado, mesmo para as obras cobertas pela garantia, o valor dos orçamentos que serve de base à fixação da caução pode ser diverso do contratado pela administração conjunta com o empreiteiro, sobretudo em casos, como o presente, de compressão do mercado, podendo, por isso, o valor da empreitada e, por conseguinte, da comparticipação, ser inferior ao valor da garantia.

J)- O regime das comparticipações para as despesas de reconversão acha-se, ao invés, regulado pelas normas da...

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