Acórdão nº 1223/12.5TBMTJ.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelANABELA CALAFATE
Data da Resolução09 de Julho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa: I – Relatório: L... instaurou acção declarativa em 21/05/2012 contra D... e M... pedindo que os RR sejam condenados a pagar-lhe as seguintes quantias: a) 51.350,00 € acrescida de IVA à taxa legal de 23% referente à parte das despesas e honorários que não foram pagos; b) 4.291,81 € a título de juros vencidos até à data da instauração da acção, bem como juros vincendos, calculados à taxa legal desde a data da citação até efectivo e integral pagamento; c) Todas as despesas com o presente processo e a providência cautelar apensa, nomeadamente, taxas de justiça e honorários do seu mandatário que se estimam em valor não inferior a Euros 4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros).

Alegou, em síntese: - no exercício da sua actividade profissional de advogado, prestou serviços jurídicos ao R. marido no âmbito de processo crime que culminou com a sua absolvição; - tais serviços jurídicos prestados encontram-se descriminados na nota de despesas e honorários que remeteu ao R. marido por carta datada de 05/02/2009; - os RR. nunca questionaram esses serviços; - depois de receber a referida nota de despesas e honorários o R. marido deu conta que estava com dificuldades financeiras e pediu ao A. para aguardar algum tempo e posteriormente manifestaram-lhe o propósito de efectuar o pagamento em seis prestações mensais até Julho de 2010, o que o A. aceitou, vencendo-se a primeira no último dia do mês de Fevereiro de 2010; - os RR apenas pagaram a quantia de 40.000 €; - os RR são casados no regime de comunhão de bens adquiridos, andavam angustiados com a possibilidade de uma condenação civil e penal; com a absolvição do R. ambos deixaram de ter receio de o seu bom nome ser colocado na praça pública.

* Contestaram os RR, invocando, em resumo: - o crédito do autor já prescreveu; - a R. mulher é parte ilegítima; - o valor de honorários reclamado pelo autor – Euros 91.530,00 – foi repudiado pelos réus, logo em Fevereiro de 2009 e é excessivo; - não é possível determinar, a partir da “nota de honorários e despesas” o fundamento das “despesas de expediente” e “despesas gerais.

Concluíram pela absolvição do pedido.

* O A. apresentou réplica, pugnando pela improcedência das excepções arguidas e concluindo como na petição inicial.

* Foi oficiosamente solicitado laudo de honorários ao Conselho Superior da Ordem dos Advogados, que veio a ser elaborado.

* Na audiência prévia foi admitida a ampliação do pedido, formulada pelo A. por forma a incluir na quantia peticionada o IVA calculado à taxa actualmente em vigor, a incidir sobre o valor total da nota de honorários e despesas (Euros 91.530,00) e não apenas sobre a quantia não paga pelos réus; relegou-se para final a decisão sobre as excepções de ilegitimidade passiva e prescrição, identificou-se o objecto do litígio e enunciou-se os temas da prova.

* Realizada audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que julgou improcedentes as excepções de ilegitimidade e de prescrição e julgou parcialmente procedente o pedido condenando-se os RR a pagar ao A: «

  1. A quantia de Euros 46.800,00 (quarenta e seis mil e oitocentos euros) a título de honorários, acrescida de IVA (imposto sobre o valor acrescentado) à taxa legal.

  2. Juros de mora sobre a referida quantia de Euros 46.800,00 (quarenta e seis mil e oitocentos euros), à taxa legal de juros civis, sendo os vencidos nesta data no montante de Euros 5.282,63 (cinco mil duzentos e oitenta e dois euros e sessenta e três cêntimos) ao que acrescem os vincendos até integral e efectivo pagamento.

  3. O montante de IVA à taxa legal sobre a quantia de Euros 40.000,00 (quarenta mil euros) de honorários já paga.

  4. A quantia que em incidente de liquidação posterior se apurar como tendo sido o valor das despesas incorridas pelo autor com a execução do mandato judicial em causa nestes autos e respectivo IVA, até ao limite de Euros 4.730,00 (quatro mil setecentos e trinta euros) mais IVA.

  5. Juros de mora, sobre o valor das despesas assim apuradas, à taxa legal de juros civis, desde a sentença de liquidação até integral pagamento.

    II. Julgar, na restante parte, improcedente o pedido formulado pelo autor L...

    e do mesmo absolver os réus D... e M...».

    * Inconformados, apelaram os RR, terminando a alegação com as seguintes conclusões: I - Está em causa o valor que a Justiça dos Tribunais Portugueses pode ou deve, ou não pode e não deve, condenar os Recorrentes a pagar ainda mais ao Recorrido L... pelos serviços discriminados na “Nota de Despesas e Honorários” que constitui o documento de fis. 19 a 26; pagos que foram já exorbitantes €40.000,00.

    II - Existem nos presentes autos os necessários elementos concludentes para determinar a correcta decisão da Justiça pela improcedência total dos pedidos.

    III - São absolutamente tangíveis ao senso comum as razões para qualificar de abusiva a quantia total de € 91.530,00 a título de despesas e de honorários constantes do mesmo documento de fls. 19 a 26, como se retira da sua análise crítica no segmento de págs. 13 a 19 destas alegações de Apelação.

    IV - A Sentença recorrida denegou a Justiça no caso concreto dos autos, omitindo toda e qualquer pronúncia sobre a inadequação do valor dos honorários cobrados pelo Recorrido aos Recorrentes - questão que foi taxativa e incompreensivelmente 'posta de lado' pelo Mmo. Tribunal a quo, não obstante estar elencada na alínea c) dos Temas da Prova para Audiência de Julgamento, a fls.

    V - Tendo-se demonstrado nos autos que o Recorrente D..., entre Junho de 2010 e Julho de 2011, pagou ao Recorrido L... a quantia total de €40.000,00 (quarenta mil euros) a título de honorários e despesas pelas despesas e os serviços discriminados na 'Nota de Despesas e Honorários' que constitui o documento de fls. 19 a 26; VI - E tendo o Conselho Superior da Ordem dos Advogados consignado, por unanimidade, que só seria concedido laudo por honorários no caso vertente se os mesmos tivessem originariamente sido de «montante nunca superior a 30.500,00 € acrescido do atinente IVA» [decisão esta constante do Acórdão CSOA de 5 de Abril de 2013 e reforçada pelo Acórdão do mesmo CSOA de 7 de Junho de 2013 (fls.163 a 170 efls.194 a 198]; VII - Deverá o tribunal julgar improcedentes os presentes autos de condenação, in totum, sob pena de conferirem eficácia a um documento que atenta contra as normas profissionais da advocacia e notoriamente contra a Boa-Fé.

    VIII - O facto do advogado ter liquidado em certa quantia os honorários por serviços que prestou a cliente não torna indiscutível a obrigação de pagar tal quantia. [Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, Proc. n° 7101/09.8TBBRG.G 1, 11110/2011].

    IX - Verificando-se litígio quanto aos honorários devidos, e não tendo havido ajuste entre as partes nem havendo tarifas profissionais ou usos a levar em linha de conta, é ao tribunal que compete decidir, segundo juízos de equidade, acerca dos honorários que o cliente tem de pagar. [Idem] .

    X - Nos dados deste caso concreto e ainda que possa ter o Mmo. Tribunal a quo ter dado por demonstrado um 'acordo' obtido pelo Recorrido sobre o Recorrente quanto ao pagamento dos honorários após a apresentação a pagamento do documento de f1s. 19 a 26 (acordo obtido abusivamente e no desconhecimento do Recorrente acerca das práticas da advocacia): i) Tal não oblitera os vícios de que enferma o documento de fls. 19 a 26; ii) Tal não retira a natureza ilegal e abusiva dos exorbitantes honorários que o Recorrido pretende cobrar por via dos presentes autos; iii) Tal não configura necessariamente que assista ao Recorrido a faculdade de exercer o seu direito de crédito abusivamente e atentando contra os deveres impostos pela Boa-fé, em violação do disposto no art. 334º do Código Civil.

    XI - Pelo contrário, tendo-se apurado nos autos que o advogado nunca deveria ter pedido mais de € 30.500,00 de honorários acrescido do atinente IVA - por meio de laudo da Ordem dos Advogados, de fls. 163 a 170 e fls. I 94 a 198 - e tendo-se apurado que lhe foram já pagos € 40.000,00 [Facto Provado nº 17J].

    XII - Deveria o Mmo. Tribunal a quo ter julgado que o exercício de um 'direito de crédito' para além dos já pagos € 40.000,00 atenta contra os limites impostos pela Boa-fé e contra o Direito vigente, em decorrência do art.334º do Código Civil.

    XIII - O nº 2 do art. 1158º do Código Civil que, se o mandato for oneroso, a medida da retribuição seja determinada pelas tarifas profissionais; e que, na falta destas, seja determinada pelos usos; e que na falta de todas seja determinada por juízos de equidade.

    XIV - Ora deste quadro normativo resulta que a fixação de honorários de advogado implique um juízo discricionário que tem necessariamente de se inserir na boa fé e nos procedimentos e normas da profissão da advocacia.

    XV - Assim sendo, é manifesto o alcance decisivo do Laudo da Ordem dos Advogados, elaborado por profissionais do foro, a quem não se pode negar a autoridade quanto ao domínio das tarifas, dos usos profissionais e da equidade específica da advocacia.

    XVI - A acção de honorários a advogado implica a emissão de um juízo com uma certa componente de discricionariedade, já que, para além da ponderação dos elementos do art.

    65º do EOA, impõe que se atente no laudo da Ordem e se considerem critérios de equidade.

    [Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. 07B4673, Unanimidade, 27- 05-2008].

    XVII - Embora o laudo emitido pela Ordem dos Advogados se encontre sujeito ao principio geral da livre apreciação do tribunal (…) não pode negar-se-lhe o valor informativo de qualquer perícia nem de todo o modo arredar-se o respeito e atenção que o mesmo deve merecer, dada a especial qualificação de quem o emite. [Idem].

    XVIII - Neste sentido, não deve o Tribunal condenar no pagamento de montantes de honorários que excedem os constantes do Laudo da Ordem dos Advogados, dado que este é o melhor critério para estabelecer os limites da Boa-fé.

    XIX - É ilegítimo o...

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