Acórdão nº 54/12.7PARGR.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelVASCO DE FREITAS
Data da Resolução17 de Junho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa: I- RELATÓRIO: Na Instância Local, Secção Criminal, J l, da Comarca dos Açores, Ribeira Grande , em processo comum com intervenção de juiz singular, foram submetidos a julgamento os arguidos R.M., L.M., E.M., N.C.. e N.L. devidamente identificados nos autos, tendo no final sido proferida sentença, na qual se decidiu absolver este último e condenar, os arguidos R.M., L.M. e E.M. pela prática em co-autoria material e na forma consumada, um crime de furto qualificado, previsto e punível pelos arts. 203.°, n.° 1, e 204.°, n.° 2, al. e), ambos do CP., na pena de 2 anos e 2 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, e acompanhada de regime de prova assente em plano individual de readaptação social que preveja a inscrição dos arguidos no Centro de Emprego, e ainda a obrigação de prestarem 200 horas de trabalho a favor da comunidade em instituição adequada a definir pela DGRS, nos termos dos artigos 52.°, 53.° e 54.°, do Cod. Penal e o arguido N.C.. pela prática de 1 crime de receptação p. e p. pelo art.° 231.°, n.° l, do mesmo diploma, na pena de 100 dias de multa taxa diária de 6,00 €, o que perfaz um total de € 600,00 (seiscentos euros), substituindo-se a mesma por 100 (cem) horas de trabalho a favor da comunidade, ao abrigo do disposto no artigo 48.° do CP.

Inconformados com a sentença, dela interpuseram recurso os arguidos, R.M., L.M., E.M. e N.C., pugnando pela sua absolvição do crime pelos quais foram condenados, ou caso tal não se entenda, a atenuação especial da pena através da aplicação do regime especial para jovens, para o que apresentaram as seguintes conclusões: 1. A sentença de que se recorre condenou os Arguidos com base unicamente, nas declarações prestadas pelo agente da PSP. P.S. e nos autos de apreensão juntos aos autos, por se ter entendido que tais conversas integram as diligências de investigação, e como tal, são admissíveis como prova; 2. Com todo o respeito, não podemos concordar com tal entendimento, pois estamos sem qualquer dúvida perante uma "conversa informal'" entre o agente da PSP e arguido R.M. e nunca uma diligência de investigação, pelo que tais declarações não são admissíveis como prova nesta parte; 3. Na verdade, as declarações do agente reproduziram uma conversa informal que o mesmo terá tido com o arguido R.M. não vertida em auto e em momento anterior à constituição como arguido daquele; 4. Tais declarações não são, por isso, admissíveis como prova, nos termos do disposto no artigo 356°. n.° 7 e 357°, n.° 2, ambos do CPP; 5. Este é o entendimento da Jurisprudência maioritária, vide Acórdão proferido pela Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães, em 2011/04/11, no âmbito do processo n.° 625/2007. disponível em www.dgsi.pt: "...Se a conversa do requerido, com os órgãos de polícia criminal, ocorre antes de ter sido constituído arguido por maioria de razão não poderão tais conversas ser usadas como meio de prova. Usá-las com tal fim violaria, flagrantemente, tal estatuto. O arguido só fala se quiser, quando quiser e perante quem quiser. Admitir as conversas informais seria (ainda que provenientes de uma fase em que não tivesse sido constituído arguido) o mesmo que estar a obrigar o arguido a falar contra a sua própria vontade..."; 6. E ainda conforme o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, de 2010/05/31, proferido no âmbito do processo n.°670/2007, disponível em www.dgsi.pt: "«...O princípio da legalidade do processo e o estatuto do arguido (cf, v.g., os arts. 2. °. 56. °e ss., 262. °e ss., 275. °, 355. ° a 357. °, com especial destaque para o n." 7 do art. 356. ° e n.° 2 do art. 357. °), impedem que sejam consideradas como prova depoimentos de órgãos de polícia criminal, encarregados de actos de investigação, referindo declarações do arguido (ou de alguém que devesse ser constituído como tal - cf arts. 58.° e 59." do C.P.P.), mesmo que sob a forma de conversas informais, a esses órgãos de polícia criminal encarregados de actos de investigação, quando essas declarações não forem reduzidas a auto.

Entendimento contrário implicaria que pudessem ser tomadas em conta, para efeitos de prova, declarações do arguido que não o poderiam ser se constantes de auto cuja leitura não fosse permitida em audiência nos termos dos art. 357.°..".

  1. Por seu turno, quanto aos autos de apreensão, nada provam, na medida em que os Arguidos não residem sozinhos nas suas habitações, pelo que os objectos podem ter sido trazidos por qualquer pessoa que aí resida.

  2. A posse de alguns dos objectos furtados não permite concluir, per si, que foram os Arguidos R.M.. L.M. e E.M. os autores do furto.

  3. E muito menos que o Arguido N.C.. tenha adquirido a bicicleta que lhe foi apreendida.

  4. Aliás, seria impossível aos Arguidos ter transportado 5 conjuntos de patins em linha e 23 bicicletas do local onde ocorreu o furto até às suas residências (cerca de 8 Km).

  5. A decisão recorrida retira conclusões não susceptíveis de o serem, tanto por falta de provas, como por não caber no domínio da livre convicção do Tribunal, em Processo Penal, a presunção daquilo que não se encontra provado: 12. Nenhuma prova havendo que permita concluir com certeza que os Arguidos praticaram os factos que lhes são imputados, impõe-se a sua absolvição, em nome do princípio do in dúbio pro reo.

  6. Sem prescindir, na determinação da medida concreta da pena a aplicar aos arguidos, a Meritíssima Juiz do Tribunal "a quo" decidiu pela não aplicação aos arguidos do regime penal especial para jovens delinquentes, constante do Decreto-Lei n.° 401/82. de 23 de Setembro, nem fundamentou a razão pela qual não aplicou aos arguidos tal regime especial para jovens: 14. Na data dos factos, os Arguidos tinham entre 18 e 20 anos de idade, e eram todos primários (a condenação do Arguido E.M. constante do seu registo criminal foi por factos praticados em momento posterior ao dos presentes autos), pelo que a sua ressocialização tem de ser prioritária na determinação da pena e sua medida, sendo, por isso, de aplicar o regime especial para jovens, e por via disso, ver a pena de prisão que lhes foi aplicada ser atenuada, nos termos dos artigos 72.° e 73.° CPenal.

  7. Por outro lado. a condição que foi imposta aos arguidos como condição de suspensão de execução das penas de prisão aplicáveis aos referidos Arguidos, nomeadamente, a prestação de 200 horas de trabalho a favor da comunidade, é manifestamente exagerada e desproporcional.

  8. A ser aplicada pena de prisão aos Arguidos, a mesma não deve ser sujeita a tal condição, aliás, nem a Meritíssima Juiz do Tribunal "a quo" fundamentou a razão para impor tal condição; 17. Da mesma forma, deve o Pedido de Indemnização Civil ser julgado improcedente, por não provado.

  9. A sentença de que ora se recorre violou o disposto nos artigos 356°, n.° 7. 357°, n.°2 e 127°, todos do CPP e artigo 9º CP e o disposto na Lei n.°401/81, de 23 de Setembro, nomeadamente, os artigos 1º, n.°2 e 4º.

    Por todo o exposto, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, revogar-se a decisão recorrida, absolvendo-se os arguidos dos crimes que lhe foram imputados e do pedido de indemnização civil, caso não seja esse o V. entendimento, deverá ser aplicado aos arguidos R.M., L.M. e E.M., o regime especial para jovens, e ser a pena especialmente atenuada, e em relação ao arguido N.C.., a pena de multa ser reduzida, da mesma forma, não deverá ser imposta condição de suspensão da execução da pena de prisão.

    A V. Exas. caberá melhor decisão, como é de JUSTIÇA.” * * Na resposta, o MºPº defendeu a confirmação da sentença recorrida e a consequente improcedência do recurso, defendendo a inexistência de valoração por parte do Tribunal de qualquer depoimento proibido, da inaplicabilidade do regime especial para jovens e da justeza da medida das penas aplicadas.

    * Nesta Relação, o Ex.mo Procurador-geral Adjunto emitiu parecer no nos seguintes termos: 1. Recorrem os arguidos R.M., L.M., E.M. e N.C.. da sentença condenatória de fls. 188-199v.º que os condenou, os três primeiros, pela prática de um crime de furto qualificado, na pena de 2 anos e 2 meses de prisão, suspensa na sua execução com regime de prova, e o último, pela prática de um crime de receptação, numa pena de multa substituída por trabalho a favor da comunidade.

  10. Nas conclusões do recurso, que delimitam o seu objecto sem prejuízo dos poderes de conhecimento oficioso deste tribunal (artigo 410.º do CPP), os arguidos suscitam a questão da valoração do depoimento do agente da PSP ouvido como testemunha, com base no facto de este ter obtido conhecimento dos factos através de uma conversa informal com o arguido Rúben Medeiros, e a questão da não aplicação do regime penal dos jovens adultos, que o tribunal não conheceu nem fundamentou, e questionam ainda a condição imposta para a suspensão da execução da pena de prisão.

  11. O recurso foi interposto em tempo, a decisão é recorrível e não se mostra presente motivo de ordem processual que obste ao seu conhecimento.

  12. À data da prática dos factos (27.1.2012), o arguido R.M. tinha 19 anos de idade, o arguido L.M., 20 anos, o arguido E.M., 18 anos e o arguido N.C.., 20 anos.

  13. Vista a sentença recorrida, verifica-se que esta não se pronunciou sobre a aplicação do regime penal dos jovens adultos, instituído pelo Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro.

  14. De acordo com o disposto no artigo 9.º do Código Penal, aos maiores de 16 anos e menores de 21 anos são aplicáveis normas fixadas em legislação especial, que são as que constam do Decreto-Lei n.º 401/82.

  15. Nos termos do artigo 379.º, n.º 1, al. c), a sentença é nula quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.

  16. A omissão da pronúncia sobre a aplicação do regime penal dos jovens adultos, que é obrigatória, constitui uma nulidade da sentença subsumível à previsão deste preceito, de conhecimento oficioso ou mediante...

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