Acórdão nº 2063/07.9TVLSB.L2-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelTERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução17 de Junho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I-Relatório: I - “Café de S. Lda.” intentou em 27/4/2007, a presente acção declarativa sob a forma de processo ordinário, contra o Município de Lisboa, pedindo: - a condenação do R. a realizar as obras necessárias a manter o locado nas condições requeridas para o fim a que se destina e indispensáveis para manter em funcionamento o estabelecimento comercial da A. que funcionava no mesmo; -pagar-lhe indemnização pelos danos de natureza patrimonial que lhe causou com a sua conduta dolosa, no valor de € 269 633,17; -pagar-lhe indemnização pelos danos de natureza patrimonial futuros que a sua conduta vier a provocar-lhe, a liquidar posteriormente em incidente de liquidação; -pagar-lhe juros de mora sobre a indemnização pelos danos de natureza patrimonial causados, desde a data da citação até integral pagamento.

Alegou que o R. enquanto proprietário de determinada loja sita nos Restauradores lha cedeu em data anterior a Agosto de 1988 para explorar um estabelecimento de leitaria, bebidas, tabacos, vinhos por grosso e a retalho, tendo a R. desenvolvido a sua actividade comercial exclusivamente nesse estabelecimento. Refere ainda que desde 1988 que o arrendado necessita de obras – de reparação de estrutura, saneamento e isolamento - cuja realização a A., desde então, vem insistentemente pedindo ao R. que, não obstante por vezes as ter prometido, não as chegou a realizar, com a consequente e progressiva degradação do locado.

Até que, por falta de condições de permanência naquele espaço, a A. se viu forçada a encerrá-lo, mantendo desde então – 3/7/2001 – a sua actividade comercial suspensa, circunstância que comunicou à R. e às Finanças. Tal encerramento causa-lhe e causar-lhe-á prejuízos de natureza patrimonial, porque, não obstante ter suspendido a sua actividade comercial, continuou e continua a ter encargos inerentes e resultantes da mesma. Assim, fez despesas para pôr termo aos contratos com a EPAL, a EDP e a PT, tendo pago para esse efeito, respectivamente, os valores de € 153,28, € 267,85 e de € 95,75 e, como deixou de ter receptáculo de correio, pagou junto destes pelos serviços de reexpedição da correspondência, os valores € 24,94 em Julho 2001, € 59,86 em Dezembro de 2001, € 62,88 em Dezembro de 2002 e os valores de € 24,94 e € 72 para reconhecimento das assinaturas dos seus gerentes para aqueles pedidos. Pagou para vedar a loja de modo a que evitar que terceiros aí entrassem, a quantia de € 94,77. Pagou desde 3/7/2001 até Dezembro de 2006 as rendas devidas no valor global de € 4.086,46. Porque com o encerramento do estabelecimento deixou de ter rendimento para pagar a um técnico oficial de contas para tratar dos assuntos fiscais da sociedade, bem como deixou de ter rendimentos para aceder à Internet, viu devolvidas as Declarações de IRC Modelo 22 que enviara por correio, e viu serem-lhe aplicadas coimas por esse motivo no valor de € 762,42. Deixou de poder cumprir com as suas obrigações fiscais, sendo que, em 28/9/2006, o valor da sua divida referente a IRC referente aos anos de 2000 a 2004 e juros de mora, ascendia a € 3.057,06 e, tendo deixado de pagar aos seus gerentes as respectivas remunerações, deve a cada um deles € 21.337,50 por referência a Dezembro de 2006, e ainda o valor de € 5.064,64 referente às refeições diárias que lhes deixou de fornecer.

Acresce que em consequência do encerramento do estabelecimento comercial deixou de poder pagar as contribuições para a Segurança Social referentes às remunerações – declaradas e não pagas - dos seus gerentes, sendo que tal dívida ascende a € 29.968,92 (€ 14.984,46 *2). Mais alega que no ano de 2000 teve receitas de € 20.189,69 e deduzindo 55% para despesas, obteve rendimentos de € 9.085,36, pelo que recebia em média diariamente pelo exercício da sua actividade comercial no locado o valor médio de € 24.89, pelo que, no período entre 3/7/2001 até Dezembro de 2006, deixou de ter receitas no valor de € 50.006,82. Em consequência do referido encerramento perdeu toda clientela, estimando essa perda em € 10.000,00. Vista a localização privilegiada e a valorização da zona em que se situa o estabelecimento, sofreu danos na valorização e progressão do negocio, que estima em valor de € 100.000,00, e, em consequência do encerramento, perdeu credito junto dos seus fornecedores e das instituições de crédito, que estima no valor de € 5.000,00. Perdeu, graças às infiltrações, todo o mobiliário e equipamento necessário ao funcionamento do estabelecimento e, em consequência e vai ter que adquirir equipamento novo. Situa os danos para o reinício da laboração no valor de € 18.000,00.

Conclui que a R. a deverá indemnizar pelos prejuízos já causados, pelos futuros já previsíveis, e pelos benefícios que deixou de obter, no valor pedido de € 269.633,17, sendo que estando em causa danos continuados, requer a sua posterior liquidação.

O R. contestou, defendendo-se por prescrição, e impugnando o carácter excessivo dos prejuízos invocados. Referiu ainda que, foi porque a A. confeccionava refeições no locado quando tal actividade não constava do objecto do contrato e porque procurou satisfazer este desiderato da A. que a realização de obras atrasou, tendo depois vindo a concluir não ser possível proceder à exaustão de fumos. Mais referiu que sempre se propôs proceder a obras, só não o tendo feito pela persistência do inquilino em preparar e servir refeições no local.

A A. replicou, pugnando pela improcedência da excepção e mantendo o por si alegado.

Foi decidida a incompetência material do tribunal cível, decisão que foi revogada por esta Relação, tendo vindo a ser proferido despacho saneador no qual foi julgada improcedente a excepção de prescrição e foi seleccionada a matéria de facto.

Após realização de prova pericial no âmbito da contabilidade, teve lugar o julgamento, vindo a ser proferida sentença em que a acção foi julgada parcialmente procedente, sendo o R. condenado a proceder a obras no espaço cedido à A. da forma seguinte: Reparando os buracos na laje do pavimento da loja e declive; colocando a viga que suporta a laje superior na posição inicial; reparando a cobertura do edifício de modo a impedir infiltrações, assinaladamente provenientes da zona entre a muralha de S...D... e a fachada do edifício; reparando as brechas nas paredes de um pilar de sustentação da loja; colocando revestimento junto às duas últimas janelas exteriores da loja; reparando a estrutura de ferro que sustenta a cobertura do edifício e reparando os azulejos partidos no lambrim e nos mosaicos do pavimento; e condenado o R. a pagar à A. € 94, 77, acrescidos de juros de mora à taxa de 4% ao ano, desde a data da citação até pagamento, sendo o mesmo absolvido do pedido remanescente.

II – Do assim decidido, apelou a A. que concluiu as respectivas alegações do seguinte modo: 1ª A Sentença do Tribunal a quo não se pronunciou quanto à matéria de facto constante de 21º-B da base instrutória, violando o disposto no artigo 608º/2 CPC, o que constituí causa de nulidade da Sentença nos termos do disposto no artigo 615º/1 alínea d) CPC, nulidade esta que expressamente se invoca.

  1. A Sentença do Tribunal a quo na fundamentação da decisão quanto à matéria de facto constante de 51º e 52º da base instrutória, é obscura, o que torna ininteligível a decisão quanto a essa matéria de facto e fere a Sentença de nulidade, nos termos do disposto no artigo 615º/1 alínea c), 2ª parte CPC, nulidade esta que expressamente se invoca.

  2. A Sentença do Tribunal a quo não especifica os fundamentos que justificam a decisão de ter considerado como não provada a matéria de facto constante de 53º da base instrutória, violando o disposto no artigo 607º/3 CPC, o que constituí causa de nulidade da Sentença nos termos do disposto no artigo 615º/1 alínea b) CPC, nulidade que expressamente se invoca.

  3. A Sentença do Tribunal a quo considerou a factualidade constante de 55º, 56º e 57º da base instrutória, simultaneamente como provada (vide pág. 11, ponto 72) e também como não provada (vide pág. 16), sendo por isso contraditória e ambígua, o que torna ininteligível a decisão quanto a essa matéria de facto e fere a Sentença de nulidade, nos termos do disposto no artigo 615º/1 alínea c), 2ª parte CPC, nulidade que expressamente se invoca.

  4. A Sentença do Tribunal a quo não especifica os fundamentos que justificam a decisão de ter considerado como não provada a matéria de facto constante de 58º da base instrutória, violando o disposto no artigo 607º/3 CPC, o que constituí causa de nulidade da Sentença nos termos do disposto no artigo 615º/1 alínea b) CPC, nulidade que expressamente se invoca.

  5. A Sentença do Tribunal a quo na fundamentação jurídica, na parte em que qualifica o contrato de arrendamento celebrado pela Autora, como sendo contrato de arrendamento para habitação, é obscura e ininteligível e consequentemente nula, nos termos do disposto no artigo 615º/1 alínea c), 2ª parte CPC, nulidade que se invoca.

  6. A Sentença do Tribunal a quo na fundamentação jurídica, na parte em que qualifica as obras peticionadas pela Autora, como sendo obras de conservação extraordinária não indica nem especifica os fundamentos que justificam essa qualificação, violando o disposto no artigo 607º/3 CPC e sendo por essa razão nula, nos termos do disposto no artigo 615º/1 alínea b) CPC, nulidade esta que aqui expressamente se invoca.

  7. A Autora formulou pedido de condenação no cumprimento da obrigação genérica de realização pelo Réu de obras de conservação e a Sentença do Tribunal a quo condenou-o na execução de específicas e determinadas obras, o que constitui condenação em objeto diferente do que foi pedido e violou as regras que restringem o seu conhecimento às questões que foram suscitadas pelas partes (608º/2 CPC) e proíbem a condenação em objeto diferente do que lhe foi pedido (609º/1 CPC), inquinando a decisão com o vício da nulidade, nos termos do disposto no artigo 615º/1...

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