Acórdão nº 1769/13.8TJLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelFARINHA ALVES
Data da Resolução29 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Viagens, Lda intentou contra TAP e Companhia de Seguros, SA, todas identificadas nos autos, a presente ação declarativa de condenação com processo comum, pedindo que as rés fossem solidariamente condenadas a pagar-lhe a quantia de €18.461,91, que corresponde ao montante de €14.203,00, despendido com os seus clientes, a que acrescem os juros de mora desde 30/07/2012 até pagamento, contabilizando em € 1 258,91 os vencidos até 16/09/2013, e ainda à quantia de € 3000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vincendos, contados desde a citação até pagamento.

Alegou para tanto, em síntese: No âmbito da organização de uma viagem solicitada pelo Grupo Coral de Professores de Coimbra, reservou e pagou viagens de Lisboa para Roma, tendo ficado estabelecida a partida de Lisboa às 7H10 e a chegada a Roma às 10H55.

Após o que o grupo iria prosseguir para Catânia, em dois voos reservados e pagos, com saída prevista de Roma às 15H30 e 16H20.

A autora procedeu ainda à reserva de alojamento e de duas visitas guiadas, em Pompeia e em Roma.

Consubstanciando uma viagem organizada.

O voo TAP com destino a Roma apenas foi iniciado pelas 11H59 e chegou a Roma por volta das 16H00.

O que deu causa à perda dos voos de ligação para Catânia e tornou necessária a aquisição de novos bilhetes, com o custo de € 14203,00.

Que foi suportado pela autora no dia 30-07-2012.

Esta situação foi amplamente comentada no circuito profissional da autora e entre os seus clientes, prejudicando o bom nome, a imagem, prestígio e reputação da autora.

A autora celebrou com a ré Fidelidade um contrato de seguro de responsabilidade civil de agências de viagens, mediante o qual transferiu para esta a responsabilidade decorrente da sua atividade.

Citadas, as rés contestaram.

A ré TAP, opôs, em síntese: O voo, previsto sair às 7H10 acabou por sair apenas às 11H55, com um atraso de 4h e 28 minutos.

Atraso que ficou a dever-se, em grande parte (2h e 25 minutos) à greve dos agentes de handling em Itália, e, no mais, a uma avaria técnica verificada na aeronave que deveria realizar o voo.

Situações que se enquadram no conceito de “circunstâncias extraordinárias” previsto no art. 5.º n.º 3 e no considerando (14) do Regulamento 261/2004.

Nada tendo a ré contribuído para esse atraso.

A autora tem direito ao reembolso dos bilhetes que não foram utilizados.

A ré Companhia de Seguros, SA, opôs, em síntese: Não estamos perante uma viagem organizada, mas perante a prestação de dois serviços independentes.

Pelo que a autora não estava obrigada a suportar os encargos com a aquisição de novas passagens aéreas.

E o contrato de seguro apenas garante a responsabilidade civil da autora decorrente de ações ou omissões suas, dos seus representantes ou mandatários, no âmbito da atividade segura.

Os danos invocados não resultaram de qualquer ato ou omissão dos representantes da autora ou seus mandatários.

Procedeu-se a audiência prévia, após o que os autos prosseguiram para julgamento.

Que findou na sentença onde a ação foi julgada improcedente, com a absolvição das rés do pedido.

Inconformada, a autora apelou do assim decidido, tendo apresentado alegações, rematadas por conclusões que adiante se transcreverão, fazendo-se a partir delas a delimitação e a apreciação do objeto do presente recurso.

As apeladas contra-alegaram, defendendo a confirmação do julgado.

Cumpre decidir, o que, nos termos já referidos, se fará a partir das conclusões, tendencialmente agrupadas pelas questões suscitadas.

Conclui a apelante:

  1. O nº 4 do art. 607º do CPC e o art. 154 do CPC impõe ao julgador o dever de fundamentar a sentença, nomeadamente especificando os fundamentos decisivos para a formação da sua convicção.

  2. No entanto, ao contrário do que impõem estes dispositivos legais o tribunal a quo, na decisão sub judice deu por provados factos relevantes à decisão da causa, sem explicitar a razão de ciência inerente à valoração dos depoimentos prestados.

  3. Através da adopção deste critério arbitrário é impossível à Autora averiguar qual o raciocínio que a primeira instância utilizou para julgar a matéria de facto nos termos em que o protagonizou. Pelo que, salvo melhor opinião, a decisão sub judice pelas razões que se apontaram na motivação deste recurso é nula e de nenhum efeito. Nulidade que expressamente se invoca para todos os devidos e legais efeitos.

    A apelante começa por impugnar a decisão sobre matéria de facto, em relação aos seguintes pontos: hh) Parte desse atraso (7h10 às 10h45) deveu-se à greve dos agentes de handling da ré em Itália.

    ii) E outra parte a uma avaria técnica na aeronave com a matrícula CSTTS, que estava programada efectuar esse voo detectada às 10h45.

    nn) A autora procedeu a reservas de alojamento em Pompeia e Roma e a visitas guiadas e transfer com referência a 27 participantes”.

    Pretendendo ver julgados não provados os dois primeiros pontos e retificada a resposta ao terceiro.

    E, preliminarmente, invoca a nulidade da decisão sobre matéria de facto, por não explicitar as razões por que julgou provada a existência da greve referida em hh), sem fazer qualquer apreciação dos depoimentos prestados pelas cinco testemunhas que identifica e de que transcreveu excertos dos quais, em seu entender, resulta que essa greve não existiu.

    Ou seja, vem questionada a insuficiência da fundamentação da decisão sobre matéria de facto. O que, a verificar-se, daria lugar a que fosse determinada nova fundamentação, nos termos do art. 662.º, n.º 2 al. d) do CPC.

    Mas, admitindo-se que a decisão recorrida podia ter feito melhor na apreciação dos meios de prova produzidos em relação à existência da questionada greve, designadamente, explicitando porque é que não considerou os depoimentos ora invocados pela apelante, julga-se que não se justifica determinar a renovação dessa fundamentação.

    Desde logo, porque, isso não é decisivo para o resultado da ação. Afigurando-se, antes, que o sentido da decisão recorrida deve ser alterado no sentido da procedência, mesmo julgando provada a existência da greve e da avaria da aeronave, nos termos em que esses factos foram alegados na contestação da ré TAP.

    Depois, o que está efetivamente em causa é a impugnação da decisão sobre matéria de facto, para o que o processo contém todos os elementos necessários.

    E, no fim, porque se percebe que a decisão recorrida confiou nos depoimentos prestados pelas testemunhas indicadas pela ré, em especial pelas testemunhas Ana e António, que declararam que parte do atraso verificado naquele voo se ficou a dever a uma greve dos agentes de handling no aeroporto de Roma, ocorrida entre as 10H00 e as 14H00, admitindo-se que terá desconsiderado, por não a considerar verosímil, a hipótese, para que apontavam os depoimentos ora invocados pela apelante, de a greve ter sido falsamente invocada pela TAP para justificar parte do atraso daquele voo.

    Para além de que estas testemunhas, chegadas a Roma cerca de duas horas depois do termo da suposta greve, já não teriam tido a oportunidade de sentir os seus efeitos, e apenas tinham sido informados de que não tinha ocorrido qualquer greve.

    É certo que nada disto foi referido na decisão recorrida, mas é o que parece resultar dela.

    E, como quer que seja, afigura-se que não existe efetivo interesse no reenvio do processo para nova fundamentação da decisão.

    Desatendendo-se, assim, a arguição desta nulidade.

    Prosseguem as conclusões: d) No que respeita concretamente à responsabilidade da TAP, a decisão sub judice deu por provado que o atraso de 4h28 minutos, que obrigou à compra de novas viagens para a Catânia, se deveu em parte à greve dos agentes de handling da ré em Itália, facto que não corresponde à verdade.

  4. Para fundamentar a prova deste facto, o tribunal a quo apenas levou em consideração o depoimento das testemunhas da Ré, todas elas funcionárias da TAP, que prestaram depoimentos indirectos, ignorando o depoimento das testemunhas da Autora.

  5. Ora, o tribunal a quo tinha o dever de valorar a razão de ciência dos conhecimentos das testemunhas, ou seja, o modo como os factos chegaram ao seu conhecimento, o que não aconteceu e não podia olvidar que foram as testemunhas da Autora que vivenciaram a situação, tendo o Aeroporto de Roma informado que não tinha existido, naquele dia, qualquer greve de Agentes de Handling.

  6. Como tal, as cinco testemunhas (…..), verificaram a inexistência de greve quer pelas informações que lhe foram prestadas pelos funcionários dos balcões no Aeroporto de Roma, como pelo normal funcionamento e/ou movimento daquele Aeroporto e pelo facto de mais nenhum voo da TAP para Roma, naquele dia 18/07/2012, sair atrasado, inclusivamente o voo das 9h30.

  7. Pelo que, se mais não houvesse e há, os depoimentos destas testemunhas imporiam sempre uma alteração à matéria de facto dada como provada, no que à questão da greve respeita.

    Está aqui em causa saber se não pode ser julgado provado o que consta do ponto hh) do elenco da matéria de facto assente, a saber, que parte do atraso verificado (7h10 às 10h45) se deveu a uma greve dos agentes de handling da ré em Itália, tendo-se em vista, o aeroporto de Roma. Mais exatamente, a apelante defende que não pode ser julgada provada a existência da referida greve.

    Avaliada toda a situação, julga-se, antecipando a conclusão, que deve ser reconhecida razão à apelante, e julgada não provada a ocorrência da questionada greve.

    Desde logo, relembra-se que a ré se limitou a alegar, a este respeito: O voo, previsto sair às 7H10 acabou por sair apenas às...

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