Acórdão nº 255/12.8TVLSB-A.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução29 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I- Relatório.

M...

, residente na Rua Amadeu Sousa Carlos, n.º18, em Azeitão, intentou a presente ação declarativa, na forma ordinária, contra A..., com sede na Rua Viriato, n.º8, Lisboa, F...

e F..., ambos residentes na Rua ..., pedindo que seja declarada nula a convocatória da assembleia geral levada a efeito pelo 2.º R., por manifesta falta de poderes e legitimidade para o fazer e, em consequência, deve ser declarada a inexistência da pretensa assembleia geral, sendo declaradas nulas ou inexistentes as deliberações tomadas na pretensa assembleia geral de 23.12.2011 e, caso assim não se entenda, nos termos do disposto no art.º 176.º e 177.º do Código Civil, sejam anuladas ou declaradas nulas as deliberações tomadas na pretensa assembleia geral de 23.12.2011 por serem manifestamente ilegais e contrárias à lei.

Para o efeito alegou, resumidamente, ser associado fundador e Presidente da Direção da 1ª Ré, associação sem fins lucrativos e tendo por objeto apoio educativo a crianças e jovens, apoio à família, educação e formação profissional dos cidadãos e proteção dos cidadãos na velhice e invalidez, o 2.º Réu, invocando a qualidade de presidente da Assembleia-geral da 1ª Requerida, convocou ilegalmente, uma assembleia-geral para 23/12/2011, convocatória que é nula por falta de poderes. Acresce que em 22/11/2011, reuniu a direção da 1.ª R. com a presença do respetivo presidente da Direção aqui A., o 3.º R. como vogal e a Sra Dra. C..., como vogal, encontrando-se presente a totalidade dos membros da direção, reunião na qual, ao abrigo do artº 8º dos estatutos da associação, foi deliberado por maioria dos diretores relativamente ao ponto 6 da respetiva ordem de trabalhos admitir 27 novos associados, todos melhor identificados nessa deliberação. O 3º Réu esteve presente naquela reunião da direção, e a quem foi entregue uma cópia da respetiva ata.

O 3º Réu requereu a suspensão dessas deliberações da direção, mas o seu pedido foi liminarmente indeferido. Pelo que em 13/12/2011, data em que o 2.º R. convocou a assembleia geral a associação contava com mais 27 associados que não foram convocados, tendo sido apenas convocado o aqui A. Até 23.12.2011, nunca o 2.º R. apresentou uma proposta para ser admitido como associado, nem nunca houve qualquer deliberação da assembleia geral ou da Direção a admitir o 2.º R. como associado, fossem quais fossem as condições, pelo que o 2.º R. estava impedido de participar na assembleia na qualidade de associado, por não o ser, e muito menos votar as deliberações de 23.12.2011. Não obstante essa realidade, o 2.º R. participou nas deliberações, tendo o seu voto sido determinante para formar a maioria por ele desejada.

Citados, contestaram os 2º e 3º Réus, sustentando que conforme consta no Aviso Convocatório da Assembleia Geral, cujas deliberações o A. pretende impugnar, a convocação da reunião foi feita a “... pedido do associado fundador F........”, defendendo ainda que a assembleia geral realizou-se com todos os associados – o Autor e os 2.º e 3.º Réus, tendo havido uma deliberação de revogação das deliberações tomadas na Assembleia Geral de 01.09.2010.

Negam que o Autor tenha a qualidade de Presidente da Direção à data da interposição desta ação, porque na assembleia geral do dia 23.12.2011, cujas deliberações pretende impugnar, foi eleita uma nova Direção, que tomou posse naquele mesmo dia, para a qual não foi eleito o Autor. Tal como consta a ata da Assembleia Geral de 01.09.2010 os membros dos órgãos sociais não foram “eleitos” mas designados. A Assembleia Geral de 23.12.2011 foi convocada por meio de aviso postal, expedido para cada associado com a antecedência mínima de oito dias, do qual constava o dia, hora e local da reunião e a respetiva ordem de trabalhos, estando, assim preenchidos os requisitos estabelecidos no art.º 174.º n.º 1 do C. Civil. E nessa assembleia participaram todos os associados, tendo o Autor votado todas as deliberações sobre cada um dos pontos da ordem de trabalhos, ainda que com voto contra. O próprio Autor assinou, no final, a mesma ata, que leu e aprovou. E concluíram pela improcedência da ação.

Foi requerida a intervenção principal espontânea ativa por parte de L.., a qual foi admitida.

Foi proferido saneador sentença, julgando-se procedente a ação e “declarado nulas as deliberações da assembleia geral da 1ª Ré no dia 23/12/2011”.

Desta sentença veio a 1.ª Ré interpor o presente recurso e, após as respetivas alegações, formulou a seguintes conclusões: I.

A ré não pode deixar de manifestar a sua aberta discordância com a sentença objeto do presente recurso.

II.

A sentença objeto de recurso enuncia e pronuncia-se sob as seguintes questões instrumentais relativamente à questão de fundo, isto é: (i) Determinar se o Segundo Réu, F..., é associado da Primeira Ré, A...; (ii) Determina se o Segundo Réu, na qualidade de Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Primeira Ré, independentemente da sua qualidade de associado, poderia validamente convocar a Assembleia Geral de 23.12.2011, a pedido do Terceiro Réu, F...; (iii) Aferir da validade da deliberação tomada em 22.11.2011, no que se refere à admissão de novos associados; (iv) Determinar se na convocação da Assembleia Geral de 23.12.2011 foi omitida a convocação de associados.

III.

No que concerne às duas primeiras questões supra enunciadas, é isento de qualquer censura a fundamentação e decisão plasmada na sentença, face, quer à matéria de facto apurada, quer aos argumentos aduzidos na sentença.

IV.

O mesmo não se dirá quanto às duas últimas questões, relativamente às quais se considerou que “não foram convocados todos os associados, pois que nenhuma convocação foi dirigida aos 26 novos associados admitidos pela direção em 22/11/2011, sendo que incumbia ao presidente da mesa da assembleia ao decidir convocar uma assembleia geral a solicitação de um associado assegurar-se junto da direção relativamente à identificação de todos os associados, em ordem a que a todos convocasse”.

V.

Atenta a factualidade assente, e sob uma perspetiva cronológica, temos que: (i) Em 22 de Julho de 2010, foi constituída a A..., tendo por associados fundadores o Autor e o 3º Réu; (ii) Em 1 de Setembro de 2010, a Assembleia Geral da A..., reuniu com a totalidade dos seus sócios (Assembleia Universal), deliberando e/ou fazendo consignar a admissão de um novo sócio (o 2º Réu) e expressamente a alteração dos estatutos da sociedade, designadamente do seu artigo 8º, que disciplina a admissão e exclusão de sócios; (iii) Em 22 de Novembro de 2011, reuniu a Direção da A.., tendo deliberado a admissão de 26 novos sócios; (iv) Em 13 de Dezembro de 2011, a pedido do associado F... (3º Réu), o Presidente da Mesa da Assembleia Geral, F... (2º Réu) procedeu à convocatória da Assembleia Geral de 23 de Dezembro de 2011; (v) Em 13 de Dezembro de 2011, foi outorgada a escritura de alteração dos estatutos da A..., nos termos deliberados na Assembleia Geral de 1 de Setembro de 2010.

VI.

No que concerne à validade da deliberação da Direção da Associação, de 22 de Novembro de 2011, verifica-se que, na data em que a mesma foi tomada, embora já tivesse sido deliberado pela Assembleia Geral a alteração do artigo 8º dos estatutos, a escritura de alteração dos estatutos ainda não havia sido outorgada, pois que apenas o foi em 13 de Dezembro de 2011.

VII.

Em tal data, e previamente à alteração legislativa introduzida pela Lei 24/2012, de 9 de Julho, dispunha o nº 1 do artigo 168º do C.C. que “O ato de constituição da associação, os estatutos e as suas alterações devem constar de escritura pública, sem prejuízo do disposto em lei especial.” VIII.

Face ao constante em tal disposição legal, dúvidas não subsistem, e tal é reconhecido na própria sentença, que a outorga de escritura pública de alteração dos estatutos constitui uma “formalidade ad substantiam imposta pelo artigo 168º, nº 1, do Código Civil”.

IX.

Já o nº 3 da citada disposição legal consagrava que “O ato de constituição, os estatutos e as suas alterações não produzem efeitos em relação a terceiros, enquanto não forem publicados nos termos do número anterior”.

X.

Aquando da deliberação da Direção da A..., isto é, em 22 de Novembro de 2011, não tinha ainda sido outorgada a escritura pública a consagrar tal alteração.

XI.

A outorga de tal escritura pública a natureza de uma formalidade ad constitutionem, a sua preterição conduzirá à nulidade de declaração que não observe tal forma, nos termos do disposto no artigo 220º do C.C., que prescreve que “a declaração negocial que careça da forma legalmente prescrita é nula, quando outra não seja a sanção especialmente prevista na lei”.

XII.

Sufragando tal entendimento veja-se designadamente, o posicionamento assumido por Pires de Lima e Antunes Varela, no comentário ao artigo 364º do C.C., onde se pode ler “A regra é a de que os documentos escritos, autênticos, autenticados ou particulares, são exigidos como formalidades ad substantiam. Daí o princípio da nulidade consagrado no artigo 220º. Só quando a lei se refira, pois, claramente à prova do negócio, é que lhe é aplicável o regime do nº 2 deste artigo. Entre os dois regimes há uma diferença considerável. No primeiro caso – formalidade ad substantiam – o negócio é nulo, salvo se constar de documento com força probatória superior; no segundo – formalidade ad probationem – o ato não é nulo, mas só pode provar-se por confissão expressa, judicial ou extrajudicial, devendo neste último caso constar de documento de igual ou superior valor probatório”.

XIII.

No mesmo sentido, e quanto à necessidade de publicação da alteração dos estatutos como condição de eficácia da mesma veja-se o parecer da Direção Geral dos Registos e Notariado, onde consta: “1- Compete ao notário, no exercício da sua autonomia funcional, perante cada situação concreta de constituição de associação ou de alteração dos seus estatutos, determinar o...

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