Acórdão nº 294/08.3TALNH.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Janeiro de 2015
Magistrado Responsável | FERNANDO ESTRELA |
Data da Resolução | 22 de Janeiro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam na 9.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I.
No processo n.º 294/08.3TALNH da Comarca de Lisboa Norte/Lourinhã 1.
Por sentença de 9 de Janeiro de 2014, foi decidido julgar improcedentes, por não provados, a acusação pública bem como o pedido de indemnização cível e, em consequência absolver o arguido F.
-
E por despacho de 30 de Abril de 2014, foi decidido “não admitir a constituição como assistente de A.” II – Inconformado, o assistente A interpôs recurso, da decisão absolutória, formulando as seguintes conclusões: 1. O presente recurso tem por objecto matéria de facto e matéria de direito.
-
Contesta-se a matéria factual dada como provada e como não provada.
-
Nos pontos 1.6. a 1.26 da fundamentação, procedeu-se à transcrição da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, na parte julgada relevante, a partir do respectivo registo.
-
Nos pontos 1.27 a 1.51 indicam-se as provas que impõem decisão diversa da recorrida. São elas resumidamente: o arguido insistir que os factos ocorreram dentro da sua propriedade que é vedada, omitindo a existência do caminho adjacente ao seu prédio, propriedade de outra pessoa, onde ocorreram os factos e só depois de serem pedidos esclarecimentos reconhecer o caminho adjacente, a 'calha', referindo-se àquela "coisinha"; inicialmente dizer que o Sr. A "estava a pintar de facto", depois que estava no meio do caminho e que havia indícios que estava a pintar; mentiu dizendo: "Senhora Doutora eu nunca fiz mal a ninguém. Nunca bati a ninguém. Nunca tive situações nenhumas. (6:01) "; consta dos autos, no CRC de fls. 129, que foi condenado, em 2011, por um crime de ofensa à integridade física; os depoimentos do demandante e da testemunha, ao contrário do que é referido na Sentença, não enfermam de contradições, foram credíveis, espontâneos e coesos; quanto ao facto do demandante não se ter apercebido do tractor, referido na sentença, não é o que consta no depoimento, o Sr. A refere ter ouvido o tractor (minuto 05:22) e "pensava que ele ia lá para o trabalho dele, para a fazenda. Quando chegou aqui ao meu endireito, e/e vinha com o tractor devagar, eu estava de cabeça baixa. Nunca esperava que ele fizesse aquilo"; aliás, a Meritíssima Juiz a quo, em sede de julgamento foi a própria a concluir que (16:30): "Já percebemos e ele já explicou. Ele ouviu o tractor a trabalhar só que foi surpreendido de repente, porque como estava a pintar, pura e simplesmente, não pensou que o senhor fosse levar o tractor para a calha. O senhor já explicou Senhora Doutora." 5. É, por isso, inaceitável que, na fundamentação da sentença, o Tribunal a quo vá contra aquilo que concluiu em sede de julgamento e agora refira que o Sr. André "não se apercebeu de nada (ou seja, que o tractor conduzido pelo arguido vinha na sua direcção)" e estranhe que "o demandante apenas se tenha apercebido da presença do veículo quando o mesmo foi imobilizado a centímetros da sua cabeça'; entre outras afirmações idênticas a estas, indicadas na sentença.
-
O depoimento da C é consentâneo com o do Sr. A e os dois depoimentos por ela prestados, em sede de inquérito e de julgamento, são coincidentes, quer o local quer os factos, a distância a que se encontrava e as expressões proferidas.
-
De acordo com o artigo 127.º do CPP prova é apreciada segundo as regras da livre apreciação e a convicção da entidade competente.
-
Verifica-se a existência de erro notório do Tribunal na análise do conteúdo e sentido do que disseram as testemunhas.
-
O tribunal a quo parte de premissas erradas e em absoluta contradição com os factos apurados em sede de julgamento e com aquilo que ele próprio concluiu, também em sede de audiência.
-
O Tribunal tem como verdadeiras apenas as declarações do arguido, mas não procedeu a prova por acareação das testemunhas e poderia tê-lo feito.
-
Confrontando a factualidade dada como provada e não provada com a fundamentação da convicção do tribunal, através do exame das provas acima transcritas, conclui-se ter havido errada apreciação da prova produzida em sede de audiência, com violação do artigo 127.º do CPP.
-
Deve por isso, ser alterada a matéria de facto dada como provada e como não provada. Não nos parece necessária a renovação da prova. A ocorrer todavia, implicaria a nova audição das testemunhas de acusação, com a deslocação ao local onde foram praticados os factos.
-
No ponto 2.1. contestou-se a absolvição do arguido quanto ao pedido cível, nos autos estão todos os elementos necessários que permitem uma decisão rigorosa para a apreciação do pedido de indemnização cível, nos precisos termos em que ele foi formulado.
-
Por isso, a Sentença recorrida, nesta parte, violou o disposto nos artigos 71.º e 74° do C.P.Penal, donde a mesma deverá ser substituída por decisão que condene o arguido nos precisos termos em que o pedido de indemnização cível foi formulado.
-
O arguido praticou factos que são típicos, integram a prática de um crime de ameaça, p. e p. pelo artigo 153°, do C. Penal; praticou-os com dolo, sabendo que a sua conduta era prevista e punida por lei, não tendo ocorrido qualquer causa que justificasse a sua actuação.
-
A sentença recorrida viola os artigos 127.º, 374°, n.° 2, 379.º, n.º 1, alínea c) e 410 nº 2, al. c) do C.P.P. e o artigo 153 do C.P..
Requer, em consequência, seja declarada inválida a Decisão recorrida e substituída por outra que condene o arguido pelo crime de ameaça e, consequentemente, o condene no pagamento da totalidade da indemnização peticionada no pedido de indemnização civil.
Termos em que dando provimento ao recurso assim se fará JUSTIÇA! III – Ainda inconformado, o assistente A interpôs recurso do despacho que não o admitiu a intervir como assistente, formulando as seguintes conclusões: 1. Vem o recurso interposto do Despacho que indeferiu o pedido de constituição como assistente, formulado pelo ofendido/lesado, por intempestividade.
-
O ofendido apresentou queixa, contra o arguido, por factos subsumíveis à prática de um crime de ameaça, p. e p. pelo art. 153° do Código Penal; o arguido foi acusado pelo Ministério Público; o ofendido/lesado apresentou pedido de indemnização civil; realizou-se a audiência de discussão e julgamento e o arguido foi absolvido.
-
O ofendido/lesado foi surpreendido com a absolvição do arguido, interpôs recurso da sentença e requereu, conjuntamente, a sua constituição como assistente.
-
Fora das fases de debate instrutório e de julgamento, a lei permite a constituição de assistente a todo o tempo.
-
Tem sido entendimento, na doutrina e na jurisprudência, ser admissível o ofendido requerer a sua constituição como assistente simultaneamente com a interposição do recurso da sentença final. Fez-se referência às fontes doutrinais e jurisprudenciais nos pontos 15. a 17. da motivação do recurso.
-
A Lei n.° 59/98, de 25 de Agosto veio admitir, expressamente, a intervenção dos assistentes no caso dos artigos 284° e 287°, n.° 1, alínea b), "no prazo estabelecido para a prática dos respectivos actos" (artigo 68°, n.° 3, alínea b)).
-
As razões e os argumentos que estiveram subjacentes àquela solução legislativa são aplicáveis ao presente caso.
-
O ofendido que quer intervir no debate instrutório ou na audiência de julgamento terá de requerer a sua constituição como assistente até cinco dias antes da respectiva data de início; no geral poderá fazê-lo em qualquer altura do processo e, designadamente, no prazo previsto na lei para a prática do acto visado, neste caso no prazo para o recurso da sentença.
-
Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 68°, n.° 1 alíneas a), b) e d) e n.° 3 alínea b), artigo 69°, n.° 2, alínea c), artigo 284°, artigo 287°, n.° 1 alínea b) e artigo 401°, n.° 1 alínea b) e n.° 2 do CPP, é admissível a apresentação simultânea, pelo ofendido, do pedido de constituição como assistente e do requerimento de interposição de recurso da sentença penal que o afecte, desde que respeitado o prazo para o recurso.
-
Entendimento diverso é ilegal e inconstitucional, violando o disposto nos artigos 20° e 32°, n.° 1 da Constituição e 68°, n.° 3, 69°, 399°, 401°, n.° 1, alínea d), 402° e 411 ° do CPP.
Requer, em consequência, seja dado provimento ao recurso, revogando-se o despacho recorrido, com a sua substituição por outro que admita o ofendido a intervir nos autos na qualidade de assistente.
Termos em que dando provimento ao recurso assim se fará JUSTIÇA! IV – Em resposta ao recurso do despacho de não admissão do assistente veio o Ministério Público na 1.ª instância dizer, formulando as seguintes conclusões: 1. Por despacho proferido em 30 de abril de 2014, a Mma. Juiz do Tribunal "a quo" indeferiu a constituição do ora recorrente como assistente, uma vez que o requerimento foi apresentado depois de ter sido depositada a sentença proferida nos autos.
-
O recorrente, não se conformando com a decisão de indeferimento, recorreu, apresentando como fundamento o facto de o ofendido poder requerer a sua constituição como assistente "em qualquer altura do processo e, designadamente, no caso previsto na lei para a prática de ato visado, nomeadamente no prazo para o recurso da sentença", nos termos dos artigos 68.°, n.°s 1, alíneas, a), b) e d), 3, al. b), 69.°, n.° 2, al. c), 284.° e 287.°, n.° 1 al. b), todos do Código de Processo Penal.
-
Determina o artigo 68.°, n.° 3 do diploma legal referido que "Os assistentes podem intervir em qualquer altura do processo, aceitando-o no estado em que se encontrar, desde que o requeiram ao juiz: a) Até cinco antes do debate instrutório ou da audiência de julgamento e b) nos casos do art. 284.° e da alínea b) do n.° 1 do artigo 287. º, no prazo estabelecido para a prática dos respetivos atos. " 2 Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 29/06/2009, relator Desembargador Fernando Monterroso, disponível em www.dgsi.pt.
-
É entendimento dominante na jurisprudência que a preposição "desde que" aponta inequivocamente para a fixação de um...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO