Acórdão nº 597/04.6TCSNT.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Março de 2015
Magistrado Responsável | ONDINA CARMO ALVES |
Data da Resolução | 26 de Março de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I.
RELATÓRIO CONCEIÇÃO …..
,residente na Rua ……. intentou, em 08.03.2004, contra COMPANHIA DE SEGUROS …….
, com sede na ……., em Lisboa, acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, através da qual pede a condenação da ré a pagar-lhe: a) a quantia de € 82413,16; b) a quantia a liquidar eventualmente em fase executiva, a título de indemnização dos danos patrimoniais em consequência da incapacidade permanente parcial que vier a ser-lhe reconhecida, logo que seja dada como clinicamente curada; c) a quantia a liquidar eventualmente em fase executiva, relativa aos danos morais sofridos.
Fundamentou a autora, no essencial, esta sua pretensão da forma seguinte: 1.
Foi vítima de acidente de viação, no dia 15 de Janeiro de 2002, tendo embatido com o seu veículo 00-00-EP” na viatura pesada de matrícula L-14…, que era conduzido por Agostinho …. mas por ordem da sua entidade patronal, que era a proprietária do pesado de passageiros.
2.
O embate deveu-se ao facto do motorista do pesado não ter parado no stop que se encontrava na estrada onde circulava, antes de mudar de direcção.
3.
Ao cortar a via de sentido de trânsito da autora o pesado ocupou a via toda no preciso instante em que esta aí circulava.
4.
Confrontada com a manobra ainda tentou travar, a fim de evitar o acidente, mas não conseguir evitar o acidente indo embater na lateral direita do veículo pesado.
5.
O motorista do pesado foi o responsável pelo acidente, violando as regras do código da estrada. A responsabilidade emergente de acidentes de viação estava transferida para a ré, assumindo esta a obrigação de responder perante a autora pelos danos sofridos em consequência do acidente.
6.
A ré já indemnizou a autora pela perda da viatura no valor de €3000,00, bem como pagou a factura de €5549,55, relativa a uma das intervenções cirúrgicas, aceitando pagar à autora, a título provisório, a quantia de €500,00 a ser deduzida na indemnização.
7.
Em consequência do embate a viatura ficou praticamente destruída.
8.
A autora esteve uma hora para ser desencarcerada da viatura, tendo sofrido um desmaio momentâneo e quando acordou pensou que tinha levado o filho consigo e como não o ouvia, pensava que estava morto, só descansando quando os bombeiros lhe disseram que estava sozinha na viatura.
9.
A autora sofreu fractura exposta do fémur direito, fractura da cabeça da tíbia esquerda, com lesões no menisco interno e lesão do ligamento cruzado posterior acompanhado de lesão do ligamento lateral interno e traumatismo do tórax.
10.
Foi submetida a duas intervenções cirúrgicas, sendo a primeira de encavilhamento do fémur direito e aplicado material de osteossíntese na tíbia esquerda com placa e parafusos e a segunda de extracção da cavilha do fémur direito e da placa da tíbia, tendo, no mesmo acto, sido objecto de uma artroscopia para regularização da lesão, o que veio a confirmar a lesão total do ligamento cruzado posterior.
11.
Apesar de todo o esforço a autora não está em condições de retomar a sua vida activa, continuando ao invés impossibilitada de trabalhar.
12.
A autora era jovem, atleta, e sentia grande prazer na profissão que tinha - monitora de aeróbica, o que já é certo que nunca mais pode voltar a ser, profissão que exercia com tanto gosto.
13.
Sente-se inibida de frequentar praias, piscinas, ginásios ou outros locais públicos onde as mazelas, cicatrizes e deformidades que a desfeiam e de que é portadora ficam expostas à vista e à curiosidade alheia.
14.
Tais danos acarretam grave prejuízo de afirmação pessoal e grave dano moral.
15.
A autora antes do acidente era monitora de aeróbica em três locais diferentes auferindo mensalmente a quantia de €1005,00 a que acresce €650,00 que auferia na empresa Oliveira …., onde trabalhava como estafeta.
16.
A autora em consequência do acidente não pode mais trabalhar nas actividades que fazia antes do acidente, tendo um filho de dois anos.
17.
A aeróbica sempre foi uma predilecção para a autora, sendo sua ambição dedicar-se a tal actividade, o que não pode mais fazer em consequência do acidente.
18.
A autora enviou vários recibos de despesas médicas que foi tendo que não foram ainda reembolsadas, tendo apenas sido reembolsada de €5549,55 relativo a uma intervenção cirúrgica e €3000,00 como adiantamento, estando ainda em dívida a quantia de €800,68.
19.
Em consequência do sinistro, a autora sofreu várias fracturas, feridas, traumatismo torácico e contusão cervical; foi submetida a cirurgia, levou transfusões de sangue, tendo desde o acidente deixado de amamentar o seu filho de oito meses. Em consequência do seu internamento hospitalar e dos medicamentos que tomou teve de deixar de amamentar e o filho passou a ser alimentado a biberão.
20.
A autora sofreu porque viu-se afastada do seu filho; teve dores por causa dos peitos estarem cheios de leite e pelo facto do filho até se adaptar ao leite em pó, ter passado fome.
21.
Acresce que quando teve alta o filho não a reconheceu, tendo rejeitado a mãe, nos primeiros tempos.
22.
Após ter alta hospitalar andou de cadeiras de rodas mês e meio e depois passou a utilizar o andarilho e canadianas, abandonando este apoio em Junho de 2002.
23.
Fez também sessões de fisioterapia e praticou natação e ginástica a conselho médico.
24.
Como sequelas das fracturas sofridas, ficou com alterações degenerativas dos membros afectados que lhe causam edema do joelho, dor e dificuldade de mobilização; não se consegue ajoelhar, não consegue correr nem fazer esforços; sofre de cervicalgias e parestesias dos membros superiores, portadora de cicatrizes da face anterior de ambos os joelhos e coxa direita; sensação de incapacidade para as tarefas diárias, tem dificuldades em lidar com a nova situação que a impede de fazer uma vida normal e sente-se incapacitada para o exercício da profissão o que lhe provoca ansiedade e revolta.
25.
A autora esteve com incapacidade total para todo e qualquer serviço durante dois períodos – um de 45 dias entre 15.01.01 e 28.02.02 e outro de 30 entre 3.12.2012 e 01.01.03.
26.
O restante do tempo esteve com incapacidade parcial de 40% para a sua actividade diária sendo que para a sua profissão a sua incapacidade é total desde o dia do acidente.
27.
A autora teve danos morais pelo susto, dores, angústia que continua a sentir, a que acresce o desgosto pela perda definitiva do prazer do exercício como profissão para que estava vocacionada, o que desde já reclama cerca de €40.000,00, relegando-se para final os demais danos morais relativos às dores, angústia e demais sofrimentos que a autora ainda irá sentir em resultado das intervenções cirúrgicas a que venha a submeter-se, dos relativos aos prejuízos de afirmação pessoal, dos de natureza estética e dos inerentes à IPP de que a autora vier a ser portadora.
Citada, a ré apresentou contestação, em 25.06.2004, impugnando a versão do acidente carreada pela autora, alegando, em síntese, que: 1.
A autora conduzia a uma velocidade excessiva, de mais de 90km/h, tendo contribuído, de forma decisiva, para o embate.
2.
Se circulasse a velocidade de 40km/h teria conseguido imobilizar a viatura no momento em que o pesado se encontrava a ocupar a via onde circulava a autora.
3.
O acordo efectuado pelas partes em sede de arbitramento de reparação provisória não dispensa a autora de alegar e provar o direito que invoca, sendo certo que tais pagamentos não constituem a R na obrigação de indemnizar.
Proferido que foi o despacho saneador, foi elaborada, em 09.10.2006, condensação com a fixação dos Factos Assentes e a organização da Base Instrutória.
Por despacho de 20.11.2006, foi deferida a realização da perícia médico-legal, na pessoa da autora, ao Instituto Nacional de Medicina Legal, tendo sido remetido ao Tribunal, o respectivo relatório pericial, em 20.01.2013.
Foi pedida a comparência dos peritos na audiência de julgamento para aí prestarem esclarecimentos, o que foi deferido, por despacho de 02.04.2013, consignando-se que os mesmos seriam ouvidos por videoconferência.
Em 24.07.2014, a autora veio ampliar os pedidos já formulados na petição inicial, na sequência dos mesmos já se encontrarem liquidados, em resultado de um relatório médico de avaliação médico-legal que juntou aos autos, relativo a um exame solicitado pela autora e realizado em 06.02.2014, procedendo à liquidação da parte do pedido não liquidada, ampliando-o em mais € 110,000,00.
Alegou, para tanto, que: 1.
Para além da actividade de monitora de aeróbica que deixou de poder exercer a de estafeta também não consegue exercê-la como o fazia, porque não consegue deslocar-se em passo apressado para fazer o giro comercial de entregar ou recolher mercadorias.
2.
Em Fevereiro de 2014, foi de novo avaliada tendo-lhe sido atribuída uma incapacidade permanente de 13 pontos e um dano futuro de 3%, diferentemente do que consta no exame médico realizado em 2007.
3.
A autora viu-se obrigada a abandonar as suas actividades às quais se dedicava, e passou a exercer as funções de esteticista, obtendo habilitação profissional para o efeito.
4.
Porém nesta actividade também tem limitações que advêm das sequelas que ficou portadora que a não deixam manter na mesma posição muito tempo, demorando-se assim mais tempo a executar as tarefas e não mais auferindo os rendimentos que até então auferia, o que causa frustração pessoal e profissional, para além das dores constantes.
Propugnou, assim, a autora, que o dano patrimonial futuro, tendo em conta a idade da autora à data do acidente, a incapacidade que padece, os rendimentos que auferia à data e a esperança média de vida deve ser fixada em €100.000,00 a indemnização a que tem direito.
No que concerne aos danos não patrimoniais, a autora alega que ainda hoje continua a ter dores físicas e de grande frustração pessoal e profissional, pedindo, em complementado do constante da petição inicial, a quantia de €10.000,00.
A ré veio responder, pugnando pelo...
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