Acórdão nº 153/13.8TVLSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DA CONCEI
Data da Resolução10 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa.

I- Relatório: Veio a A, em 25.1.2013, propor contra Banco ..., S.A.

, e ..., SGPS, S.A.

, acção declarativa de condenação sob a forma ordinária, pedindo a condenação solidária dos RR. no pagamento da quantia global de € 2.300.000,00, com juros acrescidos desde 26.1.2009 até integral pagamento, computando os já vencidos em € 510.876,00. Invoca, para tanto e em síntese, que, no início de 2008, dois funcionários do B que veio a dar origem ao Banco ..., S.A., a aconselharam a aplicar os rendimentos de que então dispunha num produto financeiro com uma boa taxa de rentabilidade, com prazo de retorno de um ano menos um dia, com toda a segurança, o que era, como sempre foi, pressuposto das aplicações financeiras da A. dados os fins que prossegue. Referiram os mesmos que tal produto correspondia à emissão de papel comercial de uma entidade que integrava o grupo empresarial de que fazia parte o B, a C, S.A.. Mais refere que foi assegurado pelos ditos funcionários que o B se responsabilizava pelo retorno no prazo do vencimento, garantindo o reembolso do capital e dos juros através do seu depósito na conta da A., não comportando a aplicação qualquer risco. Alega ainda que tendo a A. subscrito o dito produto, na data do vencimento respectivo, em 26.1.2009, a sua conta não foi creditada pelo montante do capital investido (€ 2.300.000,00), vindo apenas a receber os juros contratualizados em Fevereiro, Março e Abril de 2009. Refere que a dita C, S.A. foi, entretanto, declarada falida, e que a A., apesar da reclamação deduzida no competente processo, não veio a ser ressarcida do seu crédito. Sustenta, por fim, que a 2ª Ré, ..., SGPS, S.A., é co-responsável com a 1ª Ré pelo pagamento reclamado na causa em virtude de, à data dos factos, embora sob a designação de S, S.A., deter o domínio do B e ser também detentora do capital social da P., SGPS, S.A., a qual, por seu turno, era detentora da totalidade do capital social da C, S.A..

Contestou a 2ª Ré ..., SGPS, S.A., impugnando a factualidade alegada e suscitando a sua ilegitimidade, uma vez que embora sob a denominação de S, S.A., detivesse, antes da nacionalização do Banco, a totalidade do capital social do B, e fosse também titular de 100% das acções da P., SGPS, S.A., a titularidade do capital social da C, S.A. não pertencia na totalidade a esta última, pelo que não existe responsabilidade solidária nos termos do art. 501 do C.S.C.. Conclui pela procedência da excepção e improcedência da causa no que a si respeita.

Contestou, igualmente, o 1º R. Banco .., S.A., impugnando, no essencial, os factos alegados na p.i. e defendendo que o reembolso do capital subscrito e juros cabia à C, S.A., a entidade emitente do papel comercial subscrito pela A.. Mais refere que jamais foi garantido à A. o reembolso pelo Banco daquelas aplicações e a valorização e/ou taxas de juro que lhes estavam associadas, apenas lhe tendo sido comunicado que a credibilidade e segurança do produto financeiro em causa lhe era conferida pelo simples facto da sua emissão provir de uma empresa que integrava o grupo do próprio Banco. A A., por outro lado, não podia ignorar o tipo de aplicação financeira em causa e os termos da sua emissão constante da nota informativa que foi disponibilizada aos balcões do B e transmitida à A., sendo certo que, aquando da sua comercialização, o B desconhecia, e não tinha como saber, a real situação financeira da C, S.A.. Pede a improcedência da acção.

Em réplica, a A. respondeu à matéria de excepção deduzida por cada um dos RR., defendendo que a responsabilidade da Ré ..., SGPS, S.A. sempre resultaria da mesma deter, à época, o domínio total do B, através do B, SGPS, S.A., cujo capital pertencia na totalidade à S, SGPS, S.A., pelo que aquela 2ª Ré é parte legítima. Conclui como na p.i. ou, subsidiariamente, pedindo a condenação da dita 2ª Ré por responsabilidade acessória.

Foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a arguida excepção de ilegitimidade, sendo no mais conferida a validade formal da instância. Procedeu-se ainda à selecção da matéria de facto com organização da base instrutória.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença, em 22.4.2014, nos seguintes termos: “(...) julga-se a presente acção procedente por provada e, em consequência, condenam-se solidariamente os Réus a pagarem à Autora a quantia de € 2.3000.000,00 acrescida de juros de mora à taxa legal vencidos desde 26.1.2009 e até à data da propositura da acção no valor de € 510.876,00 e vincendos a partir de então e até integral pagamento.

Custas pelos Réus.” Inconformados, recorreram ambos os RR.

da sentença.

O 1º R., Banco ..., S.A.

, culmina as alegações por si apresentadas com as seguintes conclusões que se transcrevem: “ 1. A decisão recorrida fez errada interpretação e aplicação do disposto nos arts. 220º, 232º, 236º e 595º e ss. e 628º do C.C., 17º e 19º D.L. 69/2004 de 25/02 e 324º do Código dos Valores Mobiliários e 102º do Código Comercial e, bem assim, fez errado julgamento sobre a matéria de facto considerada como provada.

  1. Entende o Banco Recorrente que deveria ter sido dada como não provada a factualidade constante dos pontos 7) e 17) da base instrutória (alíneas EE) e NN) da matéria de facto provada na sentença.

  2. Deveria ainda ter sido dado como provado, relativamente ao ponto 8) da base instrutória (alínea ff) da sentença), apenas o seguinte: “Mais os representantes do Banco informaram a Autora na citada reunião que o produto era idêntico a um depósito a prazo.” 4. Deverá também ser considerado como não provado o facto constante do ponto 13) da base instrutória (alínea JJ) da sentença).

  3. Entende ainda que deveriam ter sido considerados provados os seguintes factos (recorrendo à numeração constante da sentença): 7) Nos balcões do Banco Réu, incluindo no Balcão onde estava domiciliada a conta da Autora, havia exemplares da Nota Informativa a que se alude em 11) relativa a este produto.

    11) O então Ministro das Finanças e o Governo acharam por bem não aprovar tal plano, optando antes por decretar a nacionalização da totalidade das acções representativas do capital social do banco ora réu, por via da Lei nº 62-A/2008, 11.11.

    12) Assim “retalhando” o denominado Grupo S, deixando de fora da operação de nacionalização todas as empresas que não o B, aqui o banco réu.

    14) À data em que a Autora subscreveu o papel comercial C, S.A., era de todo imprevisto e imprevisível que a entidade emitente do referido produto deixasse de ter qualquer ligação com o banco ora réu.

  4. Tudo pelas razões e fundamentos que se encontram expressos nas alegações e que aqui se dão por integralmente reproduzidas, por brevidade e economia.

  5. A alteração da matéria de facto dada como provada nos termos acima descritos terá como consequência necessária a absolvição do banco recorrente do pedido, uma vez que toda a alegação do Autor nos presentes autos assenta na existência de uma garantia adicional que acompanharia a comercialização do papel comercial C, S.A. por parte do Banco recorrente.

  6. Ainda que a matéria de facto não seja alterada pela forma peticionada, a solução de direito a dar aos presentes autos nunca poderia ser aquela que consta da aliás douta sentença recorrida.

  7. A falta de entrega à Recorrida da nota informativa não constitui qualquer falta da Recorrente, uma vez que essa nota apenas tinha que ser divulgada, como o foi, nos termos dos arts. 17º e 19º do D.L. 69/2004 de 25/02.

  8. A ser verdade o que é afirmado pelo Tribunal a quo, a vontade da Recorrida foi erigida com base em erro, que terá sido determinado pelo Recorrente.

  9. Tal porém não permite que se conclua, como o fez a sentença recorrida, considerando que o Banco Recorrente se vinculou com a Recorrida, enquanto subscritora de Papel Comercial C, S.A., co-assumindo a obrigação de reembolso do capital subscrito e respectivos juros.

  10. Qualquer discrepância entre a vontade negocial e a conjectural só pode ter eficácia destrutiva do negócio. Ou seja, o negócio celebrado em qualquer putativo erro não pode surtir os efeitos pretendidos pelo declarante, como se a sua vontade não tivesse sido viciada. A declaração do funcionário do intermediário não pode valer com o sentido que o investidor – declaratário normal – lhe atribuiu, nos termos do art. 236º CC, porque na realidade não houve da parte do Banco recorrido qualquer intenção de prestar uma garantia ou assumir uma obrigação, assim sendo não se verifica o acordo de vontades que o art. 232º CC exige para ser concluído o negócio.

  11. Uma tal conduta do Recorrente, indutora do erro da Recorrida, daria apenas lugar à obrigação do Banco Réu indemnizar a Autora, o que não poderia ser conhecido no presente processo, atento o pedido e a causa de pedir do presente processo e a inerente carestia de factos alegados e provados que permitam concluir pela responsabilidade civil do intermediário financeiro. Logo, está a presente acção condenada ao insucesso.

  12. Ainda que assim não se entenda, o que é certo é que a alínea EE) da matéria de facto provada constitui uma fiança e não uma co-assunção de dívida, como consta da sentença recorrida.

  13. É indício disso mesmo a circunstância de, ao ser afirmado o que consta da alínea EE) da matéria de facto provado, não estar certamente na mente do Banco Recorrente prescindir do direito de ficar sub-rogado nos direitos do credor, por qualquer pagamento que porventura fizesse em prol do emitente do papel comercial. É que essa assunção de dívida alheia como se fosse própria, não era inócua nas contas do Banco Réu, uma vez que, ao contrário da Ré ..., SGPS, S.A., aquele não consolidava contas com a C, S.A., já que esta não era uma sociedade sua filha! 16. Pela mesma ordem de razões, não se vislumbra que o Recorrente pudesse ter qualquer interesse real, directo e objectivo próprio no cumprimento dessa obrigação pois, apesar de integrar o mesmo grupo, a...

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