Acórdão nº 100/13.7TVLSB.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelMANUEL MARQUES
Data da Resolução10 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I. A A, instaurou contra Banco B e G-SGPS, S.A., a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a condenação solidária das rés no pagamento da quantia de €100.000,00, acrescida de juros, à taxa para as dividas civis, desde 26.l.2009.

Alegou, em síntese, que é uma entidade jurídica canonicamente erecta e que os fundos que dispõe destinam-se a ser aplicados nas obras de evangelização e outras; que o Banco B resulta da fusão no Banco P, com transferência global do património deste; que o BANCO P foi nacionalizado, vindo depois a lei estabelecer as condições da sua privatização; que foram adjudicadas ao banco réu a totalidade das acções representativas do BANCO P, detidas pelo Estado, sendo esse réu a entidade que integra os direitos e obrigações do ex-BANCO P; que a 2.ª ré tinha anteriormente a denominação S...-SGPS, S.A., a qual à data detinha o domínio total de um grupo empresarial do qual fazia parte como sociedades dominadas, o BANCO P, a C-S.A. e o Banco E; que em finais de 2007, administrador provincial da autora foi visitado pelo gestor do cliente do BANCO P, para apresentação de oportunidades de aplicação de disponibilidades monetárias, tendo o mesmo ficado ciente que a autora só pretendia confiar as suas disponibilidades mediante a certeza da sua restituição em capital e juros; que o mesmo convidou a autora a colocar cem mil euros numa aplicação que dizia de toda a confiança já que o banco garantia o respectivo reembolso do capital na data do vencimento bem como o pagamento de juros; aquele gestor referiu que se trava de emissão de papel comercial de uma entidade do grupo, a C-S.A., e por isso era de toda a confiança porque o banco se responsabilizava pelo retorno; que confiada que a aplicação não comportava risco, a autora subscreveu 100 mil euros desse papel comercial pelo prazo de 364 dias, não tendo então sido entregue à autora a nota informativa a que se refere o § 17 do DL 69/2004, de 25 de Março; que as declarações do gestor de cliente estavam em sintonia com a nota interna do BANCO P, da qual constava que a entidade que garantia a solvabilidade do papel emitido era o BANCO P ou Banco E; que os balcões do BANCO P e respectivos funcionários estavam instruídos no sentido de informarem os investidores de que o capital investido estava garantido pelo próprio banco; que aquando dos preliminares do contrato e na altura da celebração, os funcionários asseguraram a garantia do retomo do investimento e juros, o que se não veio a verificar, pois na altura do vencimento não creditaram à autora os 100 mil euros, tendo sido pagas quantias apenas atinentes a juros; que entretanto a C-S.A. foi declarada falida, mas tendo os créditos reclamados pela autora sido graduados como comuns, nada restará da massa falida para o pagamento; e que a responsabilidade da 2.ª ré assenta no art.501.º n.º 1 do CSC.

Os réus contestaram.

O 1º réu alegou em suma que, à data, embora existisse uma relação de grupo havia autonomia de gestão face à gestão de outras empresas cujo capital era dominado pela 2.ª ré; que foi na execução de uma estratégia de grupo que foi decidida a emissão de papel comercial pela C-S.A. e respectivas condições de emissão, sendo solicitado ao banco que ajudasse o Banco E na colocação do produto em causa, aproveitando a rede de balcões; que da integração do banco no grupo da sociedade emitente não resulta que deva ser responsável pelas obrigações das demais e mesmo a responsabilidade da S...-SGPS. S.A., a existir, é meramente acessória, pelo que, não tem fundamento o pedido de condenação solidária; que nunca o banco garantiu o reembolso dos montantes investidos nem o podia fazer, apenas ajudou a colocar o produto no mercado, não existindo nenhuma responsabilidade contratual perante a autora, tendo o papel comercial sido adquirido pela autora de forma livre esclarecida; que o banco réu é alheio à situação económica da C-S.A. cujas responsabilidades ficaram de fora do plano de nacionalização, estando, também, por demonstrar que a C-S.A. juntamente com a 2.ª ré estejam impossibilitadas de pagar as quantias correspondentes à subscrição de papel comercial pela autora.

A 2ª ré G-SGPS. S.A. alegou, em síntese, que detinha indirectamente a totalidade do capital social do BANCO P, e é titular de 100% do capital da sociedade P, mas o capital social da C-S.A. não pertenceu na totalidade a esta P, pois parte das acções pertencem aos accionistas AN e mulher, pelo que, não existe responsabilidade solidária da G-SGPS. S.A..

A autora replicou, tendo a 2ª ré treplicado.

Em sede de audiência prévia foi proferido o despacho saneador e fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença, na qual se decidiu julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenar as rés, solidariamente, a pagar à autora a quantia de €100.000,00 (cem mil euros), acrescida de juros vencidos desde 24.1.2013 e vincendos até integral pagamento, à taxa legal de 4%.

Inconformada, vieram as rés interpor recursos de apelação, tendo apresentado as respectivas alegações.

A ré G-SGPS. S.A. formulou as seguintes conclusões: 1 ° - A douta decisão recorrida contempla juízos com os quais a recorrente não pode concordar.

  1. - Contrariamente ao entendimento do douto Tribunal a quo, in casu não tem aplicação o regime jurídico disciplinador estabelecido entre as sociedades totalmente dominantes e dominada, que se rege pelo artigo 501 ° ex vi do artigo 491 ° ambos do Código das Sociedades Comerciais e que conduz à existência de responsabilidade solidária.

  2. - Pressupõe o artigo 491 ° do Código das Sociedades Comerciais a existência de uma relação de grupo de domínio total, o que nunca existiu, quer indirecta quer directamente, entre a 2° ré G-SGPS SA e a sociedade C-S.A. e entre esta última e a sociedade P.

  3. - Ora, foi dado como provado, que “A P era detentora, pelo menos, de 75% do capital da C-S.A. " (Vide n° 7 dos factos provados).

  4. - E não ficou provado que a P, à data dos factos, era a detentora do domínio total da C-S.A. (Vide n.º 3 dos factos não provados).

  5. - O que significa que, não existe, nem nunca existiu, uma relação de grupo traduzida pela detenção de 100% do capital social C-S.A. - por parte da P e por parte da 2° ré G-SGPS SA.

  6. - Ficou provado que a P, detida 100% pela recorrente G-SGPS. S.A. nunca adquiriu a totalidade do capital social da C-S.A..

  7. - Nunca a recorrente, indirecta ou directamente, deteve a totalidade do capital social do C-S.A..

  8. - Consequentemente, não existe, in casu, responsabilidade solidária da aqui recorrente, G-SGPS. S.A., por serem inaplicáveis em relação à recorrente as disposições previstas nos artigos 491° e 501° a 504° do Código das Sociedades Comerciais.

    SEM PRESCINDIR, SEMPRE SE DIRÁ AINDA QUE, 10° - A existir responsabilidade solidária, directa e ilimitada da ré G-SGPS. S.A., o que não se admite e só por mera hipótese de raciocínio se concede, tal responsabilidade só existe como excepção e em determinados casos específicos, sendo necessário provar que a recorrente teve culpa ou influência na existência da divida.

    11 ° - Ora, não foi produzida qualquer prova testemunhal e/ou documental neste sentido.

  9. - Não existe nos presentes autos sequer prova indiciária de qualquer culpa ou influência na existência da divida por parte da aqui recorrente, G-SGPS. S.A..

  10. - Pelo que, como não foi alegado nem dado como provado que a recorrente tivesse tido culpa ou influência na existência da divida, foram violados o artigo 483° do Código Civil e o artigo 501°, n.º 1 do Código das Sociedades Comerciais.

  11. - A douta Sentença condenou, ainda, a ré aqui recorrente, G-SGPS. S.A., solidariamente com o BANCO B ao pagamento de juros de mora à taxa legal.

  12. - Ora, a obrigação de juros, depois de constituída, é uma obrigação autónoma (princípio da autonomia de juros), pelo que está sujeira ao regime geral das obrigações, designadamente quanto à culpa do devedor, 16° - Culpa esta da recorrente que, reafirma-se, não consta da matéria de facto dada como provada, pelo que foram violados os artigos 561 ° e 806°, do C. Civil.

  13. - Por isso, a decisão agora posta em crise violou os artigos 491°, 501 ° a 504º do Código das Sociedades Comerciais 483°, 561 ° e 806° do Código Civil.

    Termina pedindo seja o presente recurso julgado procedente por provado e, consequentemente, ser a decisão do Tribunal a quo revogada, absolvendo assim a aqui recorrente.

    E o réu Banco B apresentou as seguintes conclusões de recurso: I. O recorrente não pode concordar com a apreciação da matéria de facto, nomeadamente com as respostas de provado dadas aos factos vertidos sob os números 9, 11, 15 e 29 da matéria de facto dada como provada.

    II. Discorda a recorrente da expressão "não tinha risco" constante do ponto 9 da matéria dada como provada e da expressão "…e que a aplicação não comportaria risco..."constante do ponto 11.

    1. O que se resulta dos depoimentos acima transcritos é que o produto foi apresentado, não como isento de riscos, mas com riscos que se assemelhavam a um depósito a prazo pelo facto da empresa emitente do papel comercial pertencer ao mesmo grupo do Banco Recorrente.

    2. Entende assim o recorrente que os pontos 9 e 11 deveriam ter a seguinte redacção: 9.Nessa altura o referido gestor propôs a aplicação de cem mil euros em papel comercial, referindo que se tratava de uma emissão de papel comercial de uma entidade que integrava o grupo de que fazia parte o BANCO P, e que por isso era de toda a segurança, equivalente a um depósito a prazo e tinha o risco semelhante a um depósito a prazo pelo facto da empresa emitente do papel comercial pertencer ao mesmo grupo do Banco P.

      1. Nessa sequência, confiando no que lhe havia sido dito por RC e que a aplicação comportaria o risco descrito no ponto 9, a autora veio a subscrever papel comercial da C-S.A., no valor de cem mil euros, com início no...

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