Acórdão nº 344/12.9GBCLD.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelVASCO FREITAS
Data da Resolução18 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I – RELATÓRIO No âmbito do Processo Comum com intervenção do Tribunal Singular que corre termos no 3º Juízo do Tribunal Judicial das Caldas da Rainha com o nº 344/12.9GBCLD, no decurso da audiência, foi requerida pelo arguido JORGE uma nova perícia à sua caligrafia por outra entidade e uma perícia lofoscópica, tendo as mesmas sido indeferidas por despacho judicial.

No final do julgamento foi proferida sentença que condenou o arguido JORGE, pela prática de dois crimes de difamação qualificada, ilícito p. e p. nos termos das disposições conjugadas dos art.°s 180.°, n.°1, 182 e 183.°, n.°1, al. a), todos do Código Penal, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de 8,00€ por cada um, e em cúmulo jurídico, na pena única de 160 dias de multa à taxa diária de 8,00€, num total de 1.280,00€.

Mais decidiu em julgar parcialmente procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pela demandante Mónica e, em consequência, condenar o arguido/demandado a pagar à demandante a quantia de 2.500,00€ a título de ressarcimento pelos danos morais que nesta provocou, acrescidas dos juros de mora vencidos e vincendos contados desde a data da citação até efetivo cumprimento e calculados à taxa legal de 4%.

O arguido interpôs recurso do despacho judicial que lhe indeferiu a realização das perícias citadas, pretendendo a sua revogação e substituição por outro que as autorize, concluindo nos seguintes termos: 48. O douto despacho violou o artigo 158 nº 1 – b) do C.P.P. na medida em que, confrontado com outras provas credíveis e relevantes para a descoberta da verdade e com a inexatidão do laudo pericial no que respeita ao teste do número de telemóvel, indeferiu não apenas a realização de nova perícia à caligrafia do arguido a cargo de outra entidade como a perícia lofoscópica.

  1. O referido preceito deve ser interpretado no sentido de que sempre que existam circunstâncias que permitam duvidar do rigor técnico da perícia ou, do mesmo modo, sejam carreados para os autos outros factos que, em confronto com a perícia, ponham em crise o valor e a relevância probatória da mesma, deve a mesma, sem prejuízo de ser livremente apreciada, ser ainda objeto de renovação ou repetição por outra entidade de modo a assegurar a imparcialidade do relatório pericial.

  2. A repetição da perícia já efetuada e a realização de outra perícia de diferente alcance não é impertinente nem dilatória face aos princípios da descoberta da verdade material e da proibição da indefesa, ambos com acolhimento no artigo 32 nº 1 da Constituição da República Portuguesa, os quais com a p...ação do presente despacho foram de igual modo violados pelas razões supra aduzidas.

    Termos em que e nos melhores de Direito e sempre com mui douto suprimento de Vossas Excelências deverá o douto despacho que indefere a realização de ambas as perícias ser revogado e substituído por outro que defira as referidas diligências probatórias com o que se fará Justiça!” De igual modo e por estar inconformado com a sentença condenatória, dela veio o arguido interpor recurso, apresentando as seguintes conclusões: 152. Nos termos do artigo 410 nº 1 – a) e c) do C.P.P., constituem motivos de recurso da sentença a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e o erro notório na apreciação da prova.

  3. No primeiro caso, a única prova concludente acerca da culpabilidade do arguido é, de facto, a prova pericial mas a contradição da conclusão do relatório pericial (demasiado sucinta e sem explicitar o iter lógico-dedutivo como, aliás, era expetável num exame desta natureza) com o teste do Quadro (fls. 70) respeitante ao número do telemóvel suscita muitas dúvidas acerca do rigor e exatidão do referido exame.

  4. Deveria, portanto, o Tribunal ter deferido o pedido de realização de nova perícia.

  5. Não o fazendo, violou o artigo 158 do C.P.P. e o artigo 32 nº 1 da C.R.P. na vertente dos seus co...ários, os princípios da descoberta da verdade material e proibição da indefesa.

  6. No segundo caso, o Tribunal deveria ter analisado a prova no seu conjunto com a perspicácia das regras da experiência comum e constatado que o arguido tem um padrão de comportamento normal, está socialmente inserido, tem um bom enquadramento afetivo numa família de padrões normais e é benquisto no seu local de trabalho, nada constando em seu desabono como cidadão.

  7. Noutras palavras, o perfil do criminoso autor dos crimes em análise teria que ter “encaixado”, passe o aforismo, no arguido, ou, melhor dizendo, teria de haver um mínimo de correspondência entre a personalidade e o caráter do arguido e o autor do crime.

  8. Na perspetiva de um cidadão médio, o bonus pater famílias, seria admissível que este arguido fosse capaz de cometer este tipo de crime? O relatório social, as dez testemunhas de acusação e a ausência de testemunhas oculares dizem-nos que não.

  9. O Tribunal concordou em desvalorizar o depoimento da testemunha ISABEL que destilou ódio e rancor contra o arguido, sendo este depoimento unicamente relevante para a caraterização e cômputo dos supostos danos morais sofridos pela assistente.

  10. Da mesma forma, não foi tido em conta o facto de, apenas nove dias após a inquirição e o exame pericial, terem sido encontrados novos bilhetes obscenos cuja autoria se veio a imputar ao arguido, levando-nos a crer que este tinha reincidido e, ainda por cima, no mesmo local onde a esposa e a cunhada trabalham.

  11. Do conjunto destes factos, provas e circunstâncias seria legítimo extrair conclusões que nos levassem a duvidar da responsabilidade do arguido pelos crimes de que vem pronunciado.

  12. Nestes termos, deverá a douta sentença condenatória ser revogada e substituída por outra que defira a realização de uma nova perícia à letra do arguido a realizar por uma entidade diferente da inicial.

  13. E, independentemente da renovação dessa prova, deverá ser feita uma análise crítica do conjunto das provas, factos e circunstâncias constantes dos autos de modo a aquilatar se o perfil do criminoso autor dos crimes em análise tem alguma correspondência com a pessoa do arguido.

  14. A perspicácia das regras da experiência comum só nos pode levar à conclusão que não foi o arguido o autor dos crimes de quem vem pronunciado.

    Da nulidade dos depoimentos e intervenções impercetíveis: 165. O arguido suscitou perante o tribunal de primeira instância a arguição da nulidade dos depoimentos em que as intervenções da Senhora Procuradora-Adjunta, dos advogados e do arguido estão impercetíveis e, nessa medida, a sindicância da análise da prova encontra-se irremediavelmente prejudicada.

  15. Nesta conformidade, tendo o tribunal recorrido apenas deferido a repetição do depoimento da assistente, vem o arguido invocar a nulidade dos restantes depoimentos identificados no requerimento de interposição de recurso por violação dos artigos 363 e 364 do Código de Processo Penal e recorrer do indeferimento parcial do despacho de fls. 271, pugnando pela repetição dos mesmos.

    Da condenação em multa processual de 3 UC’s 167. Da mesma forma, o arguido vem recorrer do despacho de fls. 318 na parte em que o condena no pagamento de 3 UC’s pelo desentranhamento da cópia da queixa-crime apresentada contra uma das depoentes, depoimento esse ofensivo a atentatório da honra, bom nome e consideração social que lhe são devidos.

  16. Entende o arguido que nenhuma norma do Código de Processo Penal impede tal junção e que o documento em causa era relevante para a boa decisão da causa na medida em que permitiria melhor conhecer a posição do arguido relativamente a tais declarações que foram permitidas pelo Tribunal.

  17. Não sendo proibida, e estando o seu conteúdo diretamente relacionado com um dos depoimentos autorizados pelo Tribunal, inexistem razões de fundo que justifiquem a condenação em multa.

  18. Ao condenar o arguido em multa, o douto despacho violou o princípio da proporcionalidade, que é um dos co...ários do princípio da igualdade plasmado no artigo 13 da Constituição da República Portuguesa, e, ao mesmo tempo, os princípios constitucionais da legalidade e do Estado de Direito previstos nos artigos 2 e 20 nº 1 da mesma Lei Fundamental pelo facto de, não sendo tal junção a priori proibida pela lei processual penal e dada a conexão existente com o thema decidendum, não se descortinarem razões para a sanção processual aplicada.

  19. Deve, portanto, ser igualmente revogada a decisão de condenação em multa.

  20. E assim se fará JUSTIÇA!” * Os recursos foram admitidos * Em resposta o Ministério Público na 1ª instância sustentou o acerto quer do despacho quer da decisão recorrida e a improcedência dos recursos, defendendo a extemporaneidade do recurso relativamente à eventual deficiência de gravação de prova, bem como do despacho judicial proferido a fls. 318 e que não admitindo a junção aos autos de um documento apresentado pelo arguido, condenou este pelo incidente na multa de 3 Uc’s * A Assistente, Isilda, de igual modo apresentou resposta aos recursos, sustentando a sua improcedência e terminando nos seguintes termos: “1-O Arguido não alegou qualquer facto que colocasse em crise a Perícia efetuada nos autos, limitando-se a negar a autoria dos Bilhetes dos autos e a afirmar que procedeu a uma " réplica " perfeita destes.

    A prova pericial dos autos é clara e inequívoca " Muitíssimo provável ", o grau máximo de certeza que a ciência pode chegar e não teve em conta, somente os bilhetes apresentados, mas outros escritos solicitados ao Arguido.

    Assim a realização de nova perícia é um ato processual manifestamente desnecessário.

    2 - No que se refere aos novos cartões, encontrados nove dias após o interrogatório do Arguido e " convite " ,a este, para realização de prova pericial há que dizer que em momento algum do processo ficou provado como e quando os cartões foram colocados no local onde foram encontrados.

    3 - A arguição de não gravação de depoimentos por parte do Arguido é nulidade sanável...

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