Acórdão nº 1331/11.0TVLSB-L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA TERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução05 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO: I – M. e H. intentaram, em 15/6/2011, a presente acção declarativa de condenação com processo comum na forma ordinária, contra J. e contra L. ambos Advogados, pedindo a condenação destes a pagarem-lhes a quantia de € 200.000,00, por prejuízos morais e materiais que lhes causaram com a sua conduta profissional negligente.

Alegam que os RR., a quem conferiram mandato para os representar em acção de anulação de transacção que tivera lugar em acção de demarcação que lhes fora intentada pela Quinta da Marinha, não obstante terem logrado a anulação da referida transacção, não cuidaram subsequentemente de interpor recurso de revisão da sentença que homologara a transacção, com o que agiram com negligência na execução do mandato, pois que, no mínimo, estavam obrigados a informarem os AA. dos riscos que corriam pela respectiva não interposição. Em consequência a Quinta da Marinha intentou contra os AA. acção executiva para prestação de facto que após várias vicissitudes – entre elas a dedução sem êxito de embargos pelos AA – veio a ser julgada procedente, implicando o cravamento de marcos e mais tarde a consequente demolição da moradia que os AA. tinham implantada em parte do terreno pertença daquela sociedade. Alegam ainda que os RR, ao invés de os informarem que nada mais poderia ser feito para alterar a linha de demarcação definida - como não podiam deixar de saber dada a sua qualificação profissional – os levaram a intentar acções contra a Quinta da Marinha que, à partida, estavam condenadas ao insucesso, estando nessa situação uma acção executiva para fazer valer a sentença que anulara a transacção, a qual veio a ser julgada extinta pela procedência de embargos opostos pela Quinta da Marinha, e uma acção pedindo o reconhecimento judicial do seu direito de propriedade e a restituição da parcela de terreno que lhe havia sido retirada pela transacção que acabara subsistindo, acção esta, que à data da instauração da presente acção se achava a aguardar a prolação de saneador. Entendem os AA. que os RR. não podiam desconhecer a inviabilidade destas duas acções em função das decisões já transitadas proferidas nos autos de execução para prestação de facto e na acção executiva que tinham interposto, não usando, com o seu procedimento, de lealdade para com eles, levando-os a perderem tempo, dinheiro e tranquilidade, empenhados em esconderem a realidade da imodificabilidade do já decidido. Referem ainda estarem no momento da interposição desta acção a serem demandados pelos RR. numa acção de honorários por serviços prestados nos processos atrás referidos como inviáveis.. Referem ainda que os RR. poderiam ter explorado a via da aquisição em termos de acessão imobiliária industrial, por terem sido tidos na acção de anulação da transacção como possuidores públicos, pacíficos e de boa fé, via que veio a ser utilizada por um advogado posterior numa providência cautelar, cuja instauração implicou suspensão da execução na acção de demarcação e demolição, mas que acabou por não produzir efeito útil face à demolição da moradia ocorrida dois dias depois. Terminam pedindo que os RR. sejam condenados, em função da sua conduta profissional negligente e omissa, a indemniza-los dos prejuízos materiais e morais sofridos, no valor de € 200.000,00.

Os RR contestaram, por excepção, alegando que ao 1º R. - Dr J.- apenas lhe foi conferido mandato pelos AA. por procuração outorgada muito mais tarde e tendo o mesmo substabelecido meio ano depois, se mostra alheio aos factos invocados, sendo parte ilegítima na acção. Invocam ainda a prescrição e também a excepção de litispendência/caso julgado, uma vez que na acção de honorários que interpuseram aos AA. – onde já foi proferida sentença de condenação - estes invocaram a sua má prática profissional. Em sede de impugnação alegam que o 1º R. foi contratado para patrocinar os AA. num litígio que desde a aquisição do terreno os opunha a família Champalimaud, proprietários confinantes, e que todos os procedimentos judiciais mereceram a concordância destes, sendo inclusive o A. acompanhado pelo seu filho também Advogado. A respeito do recurso de revisão, invocam que à data – 1991 – não era conhecida qualquer decisão judicial publicada que se pronunciasse sobre tal necessidade, sendo pelo contrário defendida pela doutrina a sua desnecessidade. Impugnam ainda os danos invocados pelos AA., quer por estes não residirem na moradia demolida, quer pelo seu valor não corresponder à realidade, referindo ainda que o terreno sem a moradia se valorizou, terminando a contestação pela dedução de reconvenção, pedindo a condenação dos AA. a pagarem-lhes uma indemnização no valor de € 10.000,00 por danos morais.

Requereram a intervenção principal provocada da A. Companhia de Seguros, alegando beneficiarem do seguro de responsabilidade civil profissional que a Ordem dos Advogados contratou para os seus associados.

Na réplica os RR. defenderam-se das excepções, alegando quanto à ilegitimidade, que o 1º R já colaborava em data anterior com o seu pai, referindo não se verificar a excepção de litispendência/caso julgado por não existir identidade de pedidos e de causas de pedir, impugnando ainda os factos alegados na reconvenção e invocando a litigância de má fé dos RR., por inverterem a verdade dos factos e fazerem um uso manifestamente reprovável do processo.

Admitida a intervenção principal provocada, a interveniente invocou a inexistência do contrato de seguro por o mesmo ter cessado em 31/12/2011, só tendo o sinistro em causa sido participado em 09/03/12. Alega ainda que o limite do capital seguro é de apenas € 150.000,00, e em sede de excepção, invoca a prescrição do direito dos AA. sobre os RR. Em sede de impugnação exclui a ilicitude e/ou culpa do 2ª R quanto à opção pela não interposição do recurso de revisão, por a mesma não ter suporte doutrinário no momento e invoca a responsabilização da Companhia de Seguros B. com quem a Ordem dos Advogados celebrou novo contrato de seguro.

Na sequência da dedução pelos AA. da intervenção principal provocada da Companhia de Seguros B., esta excepcionou a ineptidão da petição inicial, por falta de alegação dos factos constitutivos do direito que se arrogam, bem como a sua ilegitimidade passiva, por a primeira reclamação deste sinistro ter sido feita no ano de 2011 perante a A. Companhia de Seguros, não sendo ela seguradora nessa altura. Alega ainda a prescrição do direito indemnizatório dos AA., e que a demolição sempre ocorreria por falta de licença para a realização das obras de construção, alegando que não está demonstrado o nexo causal entre o dano e a actuação dos RR.

Os AA replicaram relativamente às excepções deduzidas pelos intervenientes, impugnando-as.

Foi proferido despacho saneador, nos termos do qual não foi admitida a reconvenção deduzida pelos RR., foram indeferidas as excepções de ineptidão da petição inicial, de ilegitimidade passiva do 1º R., bem como as excepções de litispendência e caso julgado, sendo relegado para final o conhecimento da excepção da prescrição.

Seleccionada a matéria de facto, veio a ter lugar o julgamento, tendo sido proferida sentença que, julgando improcedente a excepção da prescrição, julgou a acção também improcedente, absolvendo os RR. e as intervenientes do pedido, bem como do pedido de condenação por litigância de má fé.

II – Do assim decidido apelaram os AA. tendo concluído as suas alegações do seguinte modo: a) – A causa de pedir na presente acção não se confina à não interposição do recurso extraordinário de revisão mas a toda uma conduta profissional negligente dos RR, designadamente do 1º R, no tratamento da questão relacionada com a fixação da linha de demarcação da propriedade dos AA. na Quinta da Marinha face ao vizinho confinante.

  1. Posteriormente à não interposição do recurso extraordinário de revisão e estando já decidida por Acórdão do STJ transitado em Outubro de 2001 a questão do cravamento dos marcos, o 1ª R., em representação dos AA., instaurou em juízo, em 2005, uma acção contra a Quinta da Marinha que correu termos no 1º Juízo Cível do Tribunal de Cascais sob o nº 3379/05.4 para pedir o reconhecimento judicial do seu direito de propriedade e a restituição da parcela de terreno que lhes havia sido retirada na transacção que embora tivesse sido anulada, subsistira por não ter sido interposto o recurso extraordinário de revisão.

  2. – Os RR tinham obrigação de saber que esta acção era manifestamente inviável dado existir uma decisão transitada em julgado do STJ que manteve o cravamento dos marcos, sendo, consequentemente, inatacável, estando a causa do dano precisamente nesta actuação profissional negligente de esconder durante anos aos AA. a inalterabilidade da questão do cravamento dos marcos e propor acções à partida condenadas ao insucesso.

  3. Na verdade, ao actuarem desta forma, os RR, e designadamente o 1º R., mais não estavam senão a ocultar dos AA. a inalterabilidade da faixa de terreno no extremo Norte da propriedade dos AA., não podendo tomar-se como diligência as acções propostas por serem absolutamente infundadas como, aliás, ficou provado.

  4. – Persistindo numa acção de demarcação anos após esta se ter tornado definitiva, para além de terem instaurado uma execução sem título executivo, nunca o problema essencial da demolição da moradia dos AA. poderia ser resolvido, o que em nada abona na salvaguarda dos interesses dos seus clientes, não tendo sequer ensaiado a solução possível do direito dos AA. à acessão industrial imobiliária.

  5. – Toda esta actuação censurável dos RR concorreu, no entanto, para salvaguardar a confiança dos AA. no seu trabalho que, sublinha-se, jamais foram informados sobre a questão da inalterabilidade do cravamento dos marcos, que por isso mais defraudados e abatidos ficaram com a perda da casa a que tinham direito com a acessão da extrema.

  6. – Os RR foram negligentes e omissos na condução dos...

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