Acórdão nº 2168/10.9 IDLSB.L1 -5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelVIEIRA LAMIM
Data da Resolução24 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa: I° 1. No Processo Comum (Tribunal Singular) n°2168/10.9IDLSB, da Comarca de Lisboa Norte, Loures- Inst. Local - Secção Criminal- J4, o Ministério Público acusou PC... e "S...,Lda. - em liquidação'', imputando, à arguida PC..., a prática de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. nos termos do art. 105.°, n.°s 1, 2, 4 e 5 do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei 15/2001, de 5 de Junho, e à sociedade arguida, idêntica infracção, atento o disposto no art. 7.°, 11%1 e 3 do mesmo diploma legal.

O tribunal, após julgamento, por sentença de 9Set.14, decidiu:

  1. Condena a arguida PC... pela prática, em autoria material, de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pela interpretação conjugada dos arts. 6.

    °, n°1, 7, n°3 e 105, n.

    3s 1, 2, 4 e 5 do R.G.I.T. (Regime Geral das Infracções Tributárias), aprovado pela Lei n°15/2001, de 5 de Junho, na pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de prisão: B) Suspende a execução da pena de prisão, cominaria à arguida PC..., a que é feita referência em A), pelo período de 5 anos, sob condição de a arguida, nesse lapso de tempo, proceder ao pagamento à administração fiscal da prestação tributária em dívida (no montante global de € 174.300,00 (cento e setenta e quatro mil e trezentos euros) e acréscimos legais; C) Condena a arguida "S...,Lda. - em liquidação" pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pela interpretação conjugada dos arts. 6.

    °, n.

    ° 1, 7.°, ns.° 1 e 3 e 105.°, n.'s 1, 2,4 e 5 do R.G.I.T. (Regime Geral das Infracções Tributárias), aprovado pela Lei n.° 15/2001, de 5 de Junho, na pena de 600 dias de multa, à taxa diária de € 15,00 (quinze euros), o que perfaz o montante global de € 9.000,00 (nove mil euros).

  2. … …". 2. Desta decisão recorre a arguida PC..., tendo apresentado motivações das quais extraiu as seguintes conclusões: 2.1 As motivações de recurso da recorrente centram-se na total desconsideração, na decisão a qua, do regime de IVA por conta do adquirente, regime em que se encontrava aquela empresa de construção civil no ano e trimestre dos factos, ou seja em 2007, 4° trimestre; 2.2 Tal matéria foi discutida durante o julgamento tendo sido explicitamente objecto dos depoimentos de todas as pessoas ouvidas, nomeadamente da arguida, ora recorrente, das testemunhas de acusação e de defesa; 2.3 Para além de ter sido objecto dos supra referidos quatro depoimentos gravados, também existiu unanimidade na conclusão chegada: a de que durante o ano em causa, 2007, o IVA que aquela empresa cobrava aos seus Clientes corria por conta do adquirente ente ou seja por conta dos Clientes.

    2.4 Tal resultou de imperativo legal criado pelo diploma publicado em 29 de Janeiro: o Decreto-Lei n° 21/2007, diploma que instituiu para o sector da construção civil do sistema da inversão do sujeito passivo.

    2.5 O diploma em causa alterou o artigo 2° do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, aprovado pelo Decreto-Lei n.

    °394-B/84, de 26 de Dezembro, abreviadamente designado por Código do IVA e nos termos do artigo 2, alínea j) de tal Código o IVA passou a correr por conta dos adquirentes em todos os serviços de construção civil, reparação, manutenção, conservação e demolição.

    2.6 Passaram a ser os Clientes da empresa "Sociedade de Construções Ilidio Cabral e Filhos, Lda", de que a ora Recorrente era gerente, que tinham a obrigação de entregar o IVA ao Estado.

    2.7 Nestas situações uma eventual censura não merece qualquer tutela penal através do crime de abuso de confiança fiscal, independentemente da eventual dívida civil que tal não entrega de IVA ao Estado naturalmente pode gerar.

    2.8 É que esse IVA não chega a estar na posse de quem factura o serviço, esse montante não chega a entrar na esfera jurídico-patrimonial da empresa, daí que também não se possa dar como provado que foi utilizado para este ou aquele fim, em qualquer caso alheio ao destino específico do imposto em questão.

    2.9 Assim sendo, nunca se poderia considerar que a arguida preencheu o crime de abuso de confiança fiscal.

    2.10 Mas mesmo se apenas se tivesse olhado para as contas bancárias da empresa, para os movimentos financeiros com as Clientes daquela e para a respectiva facturação ter-se-ia concluído hialinamente que o IVA em causa nem sequer alguma vez foi entregue pelos Clientes da empresa, co-arguida nestes autos, nem a esta nem ao Estado, isto ainda que se pudesse concluir ser o mesmo devido.

    2.11 A totalidade das pessoas ouvidas - arguida, testemunhas de acusação e de defesa - referiram ou reconheceram o facto central de a sociedade estar no período dos autos sujeita ao regime de IVA por conta do adquirente, nas duas sessões de julgamento que tiveram lugar, uma em Junho e outra em Julho de 2014.

    2.12 Os documentos também o comprovam.

    2.13 Deixa-se consignada a matéria factual que o tribunal a quo deu erradamente como provada a qual consta do capítulo II, Fundamentação, pontos 14, 15 e 17 da matéria de facto dada como provada.

    2.14 Com efeito, da discussão da causa não resultou provado que a arguida, em representação da sociedade arguida, se tivesse apropriado da quantia de 174.300€ para outros fins.

    2.15 O dinheiro, desde logo, não entrou na sociedade 2.16 Não resultou também provado que a arguida actuou da forma descrita bem sabendo que os valores respeitantes ao IVA e efectivamente entregues pelos clientes não lhe pertenciam e que deviam ser entregues à Administração Fiscal.

    2.17 Os valores não lhe foram efectivamente entregues pelos seus clientes/adquirentes nem tinham legalmente de o ser.

    2.18 Finalmente, como consequência natural dos primeiros dois factos impugnados, não resultou igualmente provado que a arguida, em representação e no interesse da sociedade arguida, actuou de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era prevista e punida por lei. 2.19 As provas que impunham e impõem uma decisão diversa já estão supra elencadas, resultando da conjugação dos depoimentos de todas as testemunhas, sem excepção, do depoimento da arguida e da prova documental, com destaque para as declarações periódicas de IVA.

    2.20 Em cumprimento do comando legal constante do artigo 412, nº 4, in fine, do Código de Processo Penal, a recorrente indica concretamente as passagens em que funda a sua impugnação da matéria de facto supra referida, o que faz nos pontos 53 a 61 desta motivação.

    2.21 Por outro lado, mesmo uma teórica conservação incólume de toda a factualidade não deixará de impor a conclusão de que existe na decisào a quo o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

    2.22 E que o tribunal a quo nunca deu como provado que a empresa co-arguida recebeu efectivamente dos seus clientes no 4o trimestre de 2007 a quantia de 174.300C referente ao IVA liquidado.

    2.23 O tribunal nunca dá como provado que a empresa teve alguma vez esse dinheiro na sua posse, na sua esfera jurídica, fosse numa conta bancária ou noutro local qualquer.

    2.24 Tal prova de recebimento efectivo de IVA, independentemente da questão civil que a dívida subjacente pode representar, era e é essencial para o preenchimento do crime...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT