Acórdão nº 158/11.3GDMTJ.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO FERREIRA
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 9.

a Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Lisboa: I - RELATÓRIO.

No âmbito do processo supra identificado, da Comarca de Lisboa- Barreiro-Inst.Central- 3º.Sec.Inst.Criminal, o assistente P…. deduziu acusação particular contra o arguido J….., imputando-lhe a prática do crime de difamação p.p. pelo artigo 180 do C.P. (o Mº.Pº não acompanhou esta acusação).

Por sua vez o (também) assistente J…… deduziu acusação contra o arguido P………., imputando-lhe a prática de um crime de injuria p.p. pelo artigo 181 do C.P. (o Mº.Pº. não acompanhou esta acusação).

O Mº.Pº. deduziu ainda acusação contra o arguido G…… imputando-lhe a prática de um crime de ameaça p.p. pelo artigo 153 e 155- 1 a) do C.P. e um crime de ofensa à integridade física p.p. pelo artigo 143 do C.P.

O arguido P……, discordando daquela acusação particular (que o Mº.Pº. não acompanhou), requereu a abertura de instrução.

Admitida a instrução, seguiram-se as diligências e respectivo debate, e, a final proferiu-se decisão, a qual se transcreve na parte que interessa ao conhecimento do recurso “Nesta conformidade, e pelos motivos supra expostos: I – Ao abrigo do disposto nos art.

os 283.º, n.º 3 al. b), aplicável ex vi do art. 285.º, n.º 3, 120.º, n.

os 1 e 3 e 122.º, todos Código de Processo Penal, declaro nula a acusação particular deduzida a fls. 305 a 310 pelo assistente P……, na qual imputa ao arguido J……, a prática do crime de difamação, p. e p. pelo art. 180.º do Código Penal e, em consequência, determino o arquivamento dos autos quanto a este arguido; II – Ao abrigo das disposições conjugadas dos art.

os 283.º, n.º 3 al. b), 120.º, n.

os 1 e 3 e 122.º, todos Código de Processo Penal declaro parcialmente nula a acusação deduzida pelo Ministério Público a fls. 346 a 349, na parte em que imputa ao arguido G…… a prática do crime de ameaça, p. e p. pelos art.

os 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1 al. a) do Código Penal, determinando, nesta parte, o arquivamento dos autos.

III – Pronuncio, a fim serem julgados, em processo comum, perante Tribunal Singular: * P…….., filho de ..…… e de …….., natural da freguesia de …………, concelho do Montijo, nascido a 02/09/1976, divorciado e residente na Av…………, e G……….., filho de ………. e de ………, natural da freguesia e concelho do Montijo, nascido a 03/05/1983, casado, residente …… Porquanto: 1.º No dia 20 de Junho de 2011, pelas 19:30, o assistente J…. encontrava-se sentado na esplanada no café XPTO, sito em Pegões, quando ali chegou o arguido P……..

  1. Este dirigiu-se aos presentes, cumprimentando-os, após o que estendeu igualmente a mão ao assistente. Ao agarrar a mão deste, puxou-o para si dizendo-lhe “tu nunca mais vais falar no P…, que o P….. te deve”, ao mesmo tempo que empunhava na outra mão uma garrafa de cerveja, que o assistente agarrou com receio de ser agredido.

  2. Entretanto o assistente dirigiu-se ao interior do café, tendo sido seguido pelo arguido P….., que voltou a dirigir-se-lhe em tom de voz exaltado, perguntando: “O P……. deve-te alguma coisa?”, ao que o assistente respondeu: “Deve, sim senhor!”.

  3. Nessa sequência, assistente e arguido envolveram-se numa troca de palavras, no decurso da qual o arguido, dirigindo-se ao assistente, o apelidou de “filho da puta” e “cabrão”.

  4. O arguido, ao proferir expressõesreferidas em 4.º, fê-lo com o propósito de ofender o assistente na sua honra e consideração.

  5. Agiu livre, deliberada e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

    * 7.º Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, estando P…. envolvido em discussão com o assistente J…., o arguido G….. (filho do assistente) dirigiu-se ao arguido P….. e, sem que nada o fizesse prever, desferiu-lhe uma pancada que o atingiu na cabeça, usando para isso a coronha da arma de serviço que, enquanto militar da GNR, trazia consigo.

  6. Em consequência da conduta do arguido G…. caiu ao chão, sangrando, tendo sido auxiliado por populares que o conduziram até ao seu veículo automóvel.

  7. Posteriormente, nesse mesmo dia, P….. foi assistido no Hospital do Barreiro, tendo-lhe sido diagnosticado traumatismo craneo-encefálico com perda de conhecimento e ferida no couro cabeludo, que lhe causou dores e mal-estar.

  8. A conduta do arguido G….. foi causa directa e necessária das lesões sofridas por P……, e de oito dias de doença, dois dos quais com incapacidade para o trabalho.

  9. O arguido G…… sabia ser a sua conduta adequada a atingir a integridade física de P….. e não se coibiu de actuar da forma descrita, com o propósito de alcançar tal resultado, o que conseguiu.

  10. Agiu livre, deliberada e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.

    * Incorreram: - o arguido P……..

    na prática, em autoria material, de um crime de injúria, p. e p. pelo art. 181.º, n.º 1 do Código Penal; e - o arguido G…..

    na prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo art. 143.º, n.º 1 do Código Penal.” * Consta ainda da decisão instrutória, como questão prévia, o que a seguir se transcreve: Procedeu-se à realização do debate instrutório com observância do legal formalismo.

    É, pois, o momento de ser proferida a decisão instrutória, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 307.º do Código de Processo Penal.

    * O Tribunal é o competente.

    * Questões Prévias Dispõe o art. 308.º, n.º 3 do Código de Processo Penal que na decisão instrutória o juiz começa por decidir das nulidades e outras questões prévias ou incidentais de que possa conhecer.

    Quanto a esta matéria, é meu entendimento que o conhecimento de nulidades ou questões prévias na fase de instrução não pode limitar-se àquelas que foram suscitadas ou constituíram fundamento e objecto do requerimento de abertura da instrução.

    Ou seja, o conhecimento do juiz de instrução, no respeitante a nulidades ou questões prévias não se encontra limitado à parte da acusação que é posta em crise pelo requerimento de abertura da instrução, impondo-se que conheça de todas as demais excepções que possam obstar ao conhecimento do mérito da causa ou ao prosseguimento dos autos.

    Outra não poderá ter sido a intenção do legislador, ao estabelecer no art. 311.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, uma limitação aos poderes de cognição do juiz de julgamento.

    Mediante aquele normativo, e a contrario, o legislador vedou ao juiz de julgamento a possibilidade de rejeitar a acusação por manifestamente infundada, quando tenha havido instrução, não distinguindo os casos de a mesma ter ou não sido requerida pelo arguido contra quem foi deduzida.

    Nessa medida, não pode deixar de caber ao juiz de instrução, a apreciação e decisão de nulidades ou questões prévias que possam afectar as acusações deduzidas, independentemente de a instrução ter ou não sido requerida pelos arguidos contra quem o foram.

    Afigura-se-me, aliás, que de outra forma não pode ser lido o disposto no art. 307.º, n.º 4 do Código de Processo Penal, que prevê que a circunstância de ter sido requerida apenas por um dos arguidos, não prejudica o dever de o juiz retirar da instrução as consequências legalmente impostas a todos os arguidos.

    Por essa razão se conhecerá das nulidades a seguir apreciadas.

    Da nulidade da acusação particular deduzida por P………. contra o arguido J………, nos termos do art. 283.º, n.º 3 al. b) do Código de Processo Penal Dispõe o art. 283.º, n.º 3 al. b) do Código de Processo Penal, que “A acusação contém, sob pena de nulidade, (…) a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada”.

    Na verdade, o processo penal tem estrutura acusatória, sendo o seu objecto fixado pela acusação, que assim delimita a actividade cognitiva e decisória do Tribunal. Esta vinculação temática do Tribunal tem a ver fundamentalmente com as garantias de defesa, protegendo o arguido contra qualquer alargamento arbitrário do objecto do processo e possibilitando-lhe a preparação da defesa no respeito pelo princípio do contraditório.

    Deduzida acusação, o arguido fica a saber qual o objecto do processo, quais os factos que lhe são imputados.

    Não pode, por isso, transferir-se seja para o arguido, violando as respectivas garantias de defesa, seja para o Tribunal, com desrespeito pelo princípio do acusatório, a missão de compor uma acusação a partir da interpretação dos factos ou outros elementos documentais que constem dos autos.

    É a acusação que define e fixa, perante o tribunal, o objecto do processo, na sua dimensão objectiva e subjectiva, apenas podendo o tribunal conhecer e decidir nos estritos limites do objecto...

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