Acórdão nº 4113/10.2TTLSB.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelALDA MARTINS
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam do Tribunal da Relação de Lisboa: 1. Relatório 1.1. AA intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra BB S.A., pedindo a condenação desta a reconhecer a existência dum contrato de trabalho entre as partes e a ilicitude do despedimento de que foi alvo, bem como a pagar-lhe os créditos laborais daí advenientes. Subsidiariamente, peticiona o pagamento de comissões alegadamente devidas e não pagas, caso o tribunal venha a entender que se trata de um contrato de agência.

Na audiência de partes que foi realizada, frustrou-se a conciliação entre o Autor e a Ré (fls. 198/199).

A Ré contestou (fls. 208 e ss.), impugnando a qualificação do vínculo, sustentando a existência dum contrato de agência e não dum contrato de trabalho, e excepcionou a incompetência do tribunal do trabalho para conhecer o pedido relativo ao contrato de agência.

Proferido despacho saneador (fls. 363 e ss.), em que, além do mais, foi julgada procedente a excepção dilatória da incompetência do tribunal em razão da matéria quanto ao pedido subsidiário, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, tendo no final sido proferida decisão sobre a matéria de facto (fls. 461 e ss.).

Seguidamente, pela Mma. Juíza a quo foi proferida sentença, que terminou com o seguinte dispositivo (fls. 480 e ss.): «O Tribunal, considerando a acção improcedente porque não aprovada, absolve a Ré de todo o pedido formulado.

Valor da causa: 69.510,97€.

Custas a cargo do Autor, atento o integral decaimento.

Registe e Notifique.» 1.2. O Autor, inconformado, interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões (fls. 509 e ss.): (…) 1.3. A Ré apresentou resposta ao recurso do Autor, formulando as seguintes conclusões (fls. 614 e ss.): (…) 1.4. O tribunal recorrido proferiu despacho a admitir o recurso como apelação, com efeito meramente devolutivo (fls. 634).

1.5. Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se, em parecer, no sentido da improcedência do recurso (fls. 645/646).

1.6. Colhidos os vistos (fls. 650), cumpre decidir.

  1. Objecto do recurso Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, verifica-se que as questões que se colocam à apreciação deste tribunal são as seguintes, por ordem de precedência lógica: 1.ª – modificação da decisão sobre a matéria de facto; 3.ª – se entre as partes foi ajustado e executado um contrato de trabalho; 4.ª – em caso afirmativo, se o Autor foi despedido pela Ré e quais as consequências jurídicas daí decorrentes. 3. Fundamentação de facto (…) 4. Apreciação do recurso 4.1. Cumpre conhecer em 1.º lugar da impugnação que o Autor faz da decisão sobre a matéria de facto.

    (…) 4.2. Posto isto, importa apreciar a questão do ajuste e vigência entre as partes de um contrato de trabalho, como defendido pelo Recorrente, sendo certo que a Recorrida sustenta que o que vigorou foi um contrato de agência.

    Estando em causa uma relação jurídica mantida entre Autor e Ré desde pelo menos Dezembro de 2003 até 2 de Novembro de 2009, verifica-se que aquela questão é susceptível de recondução, sucessivamente, ao Código do Trabalho de 2003, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto de 2003, entrado em vigor em 1 de Dezembro do mesmo ano, e ao Código do Trabalho de 2009, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro de 2009, entrado em vigor em 17 desses mês e ano.

    Nos termos do art. 1152.º do Código Civil, contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta.

    Idêntica noção consta, com ligeiras alterações, dos acima mencionados Códigos do Trabalho, que, todavia, vieram introduzir uma presunção de laboralidade em determinadas situações.

    Sendo certo que nem sempre é fácil distinguir o contrato de trabalho de outras relações jurídicas, a doutrina e a jurisprudência são, porém, unânimes no entendimento de que o critério de distinção reside na subordinação jurídica, que consiste numa relação de dependência necessária da conduta pessoal do trabalhador na execução do contrato face às ordens, regras ou orientações ditadas pelo empregador, dentro dos limites do mesmo contrato e das normas que o regem.

    Nos termos do regime geral de repartição do ónus da prova, cabe ao autor fazer a prova dos elementos constitutivos do contrato de trabalho, isto é, demonstrar que presta uma actividade remunerada para outrem, sob a autoridade e direcção do beneficiário (art. 342.º, n.º 1 do Código Civil), tendo os Códigos do Trabalho, contudo, como se disse, vindo introduzir uma presunção de existência de contrato de trabalho nas condições aí indicadas.

    Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz e apenas tem de provar o facto que lhe serve de base, cabendo à parte contrária ilidir a presunção legal mediante prova em contrário, salvo se a lei o proibir (art. 350.º do Código Civil). Isto é, a presunção legal que pode ser ilidida por prova em contrário – presunção juris tantum –, como é o caso da estabelecida pelos Códigos do Trabalho de 2003 e 2009, importa a inversão do ónus da prova (art. 344.º, n.º 1 do Código Civil). Já se o autor não demonstrar o preenchimento dos requisitos ali previstos, de modo a beneficiar da presunção de existência dum contrato de trabalho, terá de, nos termos do citado art. 342.º, n.º 1, do Código Civil, fazer a prova cabal dos seus elementos constitutivos, a saber, que desenvolve uma actividade remunerada para outrem, sob a autoridade e direcção do respectivo beneficiário.

    Sucede, contudo, que a suposta presunção de laboralidade, nos termos em que ficou estabelecida no Código do Trabalho de 2003, quer na versão inicial, quer na introduzida pela Lei n.º 9/2006, de 20/03, mais não é do que a reprodução dos elementos integrantes da noção de contrato de trabalho, ou do que a exigência de verificação cumulativa de diversos indícios de laboralidade, sem qualquer utilidade prática, o que deixou de se verificar apenas com a publicação do Código do Trabalho de 2009.

    Na verdade, diz o n.º 1 do art. 12.º deste último diploma que presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a pessoa que presta uma actividade e outra ou outras que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características: a) A actividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado; b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da actividade; c) O prestador de actividade observe horas de início e de termo da...

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