Acórdão nº 30/12.0SWLSB.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelADELINA BARRADAS DE OLIVEIRA
Data da Resolução14 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Relatório.

1 – Nos presentes autos em que é arguido A, veio o mesmo interpor recurso da sentença que o condenou pela prática, em autoria material e sob a forma tentada, de um crime de ofensa a integridade físicas qualificada, previstos e puníveis pelos artigos 143°, n.° I e 145°, n.° 1, alínea a) e n.° 2, com referência ao art.° 132°, n.° 2, alínea h e 22°, n.° 1 e 2, alínea h,, todos do Código Penal, na pena de dezoito (18) meses de prisão, suspensa na sua execução por idêntico período e acompanhada de regime de prova.

Requereu o arguido que seja o presente recurso julgado em audiência, a fim de se debater todos pontos da motivação (art 410ºdo CPP).

Apresentou para tanto as seguintes conclusões em síntese O Tribunal a quo incorreu em clara violação dos artigos 127.°, 374.°, 410.°.°, todos do Código de Processo Penal, e ainda do art.° 32.° n.° 2 da Constituição da República Portuguesa, razão pela qual a sentença proferida é nula e o recorrente deverá ser absolvido.

De acordo com o recorrente, são três os pontos em que incide o recurso:

  1. Erro notório na apreciação da prova-vício do art.° 410.°, n.° 2, al. c) do C.P.P., o qual resulta do próprio texto da decisão; b) Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, e; c) Erro na qualificação jurídica.

    Para tal, refere que dos depoimentos do próprio recorrente (que nega os factos imputados), do ofendido (que não reconhece o recorrente como tendo sido a pessoa que o tentou agredir), da testemunha António Inocêncio, bem como dos senhores agentes da PSP que não presenciaram os factos, das discrepâncias destes depoimentos, não se deveria dar como provada a matéria que consta na acusação, mais precisamente os pontos 2, 3 e 4 da sentença recorrida; havendo desta forma erro notório na apreciação da prova.

    Mais refere que, face às provas produzidas em audiência de julgamento, bem como as restantes dos autos, deveria o ora recorrente ter sido absolvido do crime por insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

    Mais refere que, ainda que se considerasse a versão da testemunha agente da PSP como verdadeira, jamais o ora recorrente deveria ser condenado por um crime de ofensa à integridade física mas apenas por um crime de detenção de arma proibida, tendo havido, desta forma, erro na qualificação jurídica.

    *** Em primeira instância o MP pronunciou-se da seguinte forma: - Conclusões:

  2. Na sentença ora recorrida não foram manifestadas quaisquer incertezas, dúvidas, por mais leves que fossem, de que o arguido tivesse praticado os factos que constavam da acusação, bem como que o mesmo teve intenção de os praticar b) De igual forma não existe insuficiência para a decisão da matéria de facto provada. e; c) Relativamente ao alegado erro na qualificação jurídica, muito bem esteve o Tribunal a quo quando concluiu que o arguido praticou um crime de ofensa a integridade física qualificada na forma tentada, previstos e puníveis pelos artigos 143°, n.° I e 145°, n.° 1, alínea a) e n.° 2, Von referência ao art.° 132°, n.° 2, alínea 11) e 22°, n. I e 2, alínea b), todos do Código Penal.

    Nestes termos e pelos expostos fundamentos, deverá negar-se provimento ao recurso e confirmar-se inteiramente a douta decisão recorrida.

    Contudo, V. EXAS farão. como sempre JUSTIÇA! *** Da decisão recorrida resulta o seguinte: III — Fundamentação Factos provados Com interesse para a boa decisão da causa, resultaram provados os seguintes factos: 1. No dia ..., no Mercado da Ribeira, na Avenida 24 de Julho, em Lisboa decorreu uma festa organizada pelo ofendido B, mas aberta a qualquer pessoa, mediante pagamento de ingresso.

    1. Nesse local, cerca das 4 horas e 15 minutos, o queixoso B abordou o arguido, censurando-o por aquele ter urinado no hall de entrada do espaço, ordenando-lhe, a si e aos indivíduos que o acompanhavam, que abandonassem as instalações.

    2. Nesse contexto acompanhou o arguido e os referidos indivíduos ao portão de saída do Mercado, sendo que, no momento em que tentava trancá-lo, o arguido empunhou uma navalha aberta, que trazia oculta e que impulsionou na direcção do tronco do queixoso.

    3. Fê-lo, o arguido, visando atingir o tronco do queixoso B, o que só não conseguiu porque este se afastou a tempo, esquivando-se, evitando assim ser ferido.

    4. A navalha em causa tinha 9 cm de lâmina e um espigão pontiagudo com 8 cm de comprimento.

    5. O arguido agiu com intenção de atingir o ofendido na sua integridade física, querendo causar-lhe dores e lesões, o que previu, quis e não conseguiu fazer apenas por razões que foram em tudo estranhas à sua vontade.

    6. Fê-lo bem sabendo que o ofendido não esperaria que guardasse uma navalha consigo, o que, pela surpresa causada, diminuía a sua capacidade de reacção.

    7. Fê-lo através de um objecto cortante susceptível de causar ferimentos graves.

    8. Agiu o arguido deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punível por lei penal.

    9. O arguido trabalha esporadicamente em empresa de mudanças, auferindo rendimentos não concretamente apurados.

    10. Reside com a sua companheira, um filho de 4 anos e a sua mãe, que os sustenta.

    11. Tem o 9o ano de escolaridade.

    12. O arguido tem os seguintes antecedentes criminais: a. Um crime de detenção de arma proibida, cometido em 08-08-2008. Pena de 200 dias de multa. Sentença de 16-12-2010, transitada em julgado a 28-01-2011. Pena já declarada extinta pelo pagamento.

  3. Um crime de desobediência, previsto e punível pelo art.° 348°, n.° 1, alínea a), do Código Penal, com referência ao art.° 152°, n.° 1, alínea a) e n.° 3, do Código da Estrada, cometido em 23-07-2012. Pena de 90 dias de multa e pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados por 5 meses. Sentença transitada em julgado a 23-07-2012.

    c. Um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelos artigos 21°, n.° 1 e 25°, alínea a), do DL n.° 15/93, de 22 de Janeiro, cometido em 13-10-2011. Pena de 1 ano de prisão suspensa por idêntico período. Sentença transitada em julgado a 08-01-2013.

    Factos não provados 1. O arguido impulsionou a navalha na direcção do rosto do queixoso.

    1. O arguido usou a navalha nos termos descritos após ponderação.

    Motivação Os factos supra descritos foram dados como provados com base numa análise conjunta e crítica da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, designadamente nas declarações do arguido, na prova testemunhal e documental. Recorri igualmente a presunções judiciais e regras de experiência comum.

    O arguido prestou declarações, negando a prática dos actos constantes da acusação. Confirmou a sua presença no local, acompanhado de mais 3 amigos, referindo que nada se passou. Relatou que, ao abandonarem o local, foram abordados pela polícia já na rua, que lhes perguntou se tinham estado envolvidos numa confusão ocorrida no interior do estabelecimento, ao que respondeu negativamente. Negou ter participado em qualquer confusão e ter a posse de qualquer navalha. Confrontado com a fotografia de fls. 30, referiu não reconhecer tal objecto.

    Muito diversa foi a versão trazida pelo queixoso, B. Referiu que ocorreram desacatos no interior do estabelecimento e que, chamado ao local, verificou que o arguido estava envolvido. Convidou-os a sair, momento em que um dos indivíduos empunhou uma faca e o tentou atingir na zona do tronco, o que não conseguiu porque se desviou e fechou o portão. Referiu que ainda assim o indivíduo continuou a brandir a faca através das grades do portão. Mais tarde, indicou à polícia qual dos indivíduos tinha a faca, embora não se tenha conseguido recordar, neste momento, se seria o ora arguido ou outro dos indivíduos que o acompanhavam.

    O depoimento do queixoso foi prestado de modo objectivo e coerente, não me tendo merecido reservas. Foi ainda corroborado pelo depoimento da testemunha António Inocência, que se encontrava no mesmo local e assistiu aos factos, relatando-os de modo essencialmente coincidente. Dado o conhecimento directo evidenciado por esta testemunha e a ausência de interesse no desfecho da causa, conferi-lhe credibilidade.

    Foram ainda inquiridos os agentes da PSP Rui …, Ricardo … e Paulo …, os quais foram chamados ao local. Não obstante algumas discrepâncias na parte relativa ao modo como chegaram ao local — que não me parecem relevantes, atento o tempo já decorrido — prestaram depoimentos coincidentes e isentos, que me mereceram credibilidade. Relataram que se deslocaram...

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