Acórdão nº 392/10.3JAFUN.L1 – 5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelFILIPA MACEDO
Data da Resolução26 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


CORDAM EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA: I – RELATÓRIO: 1.

– No processo supra referido do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de St.ª Cruz, Madeira, foi proferido Acórdão, a fls 322 a 342, em 14/06/2013, que decidiu: ( … ) I. Condenar o arguido E. como autor de um crime de abuso sexual de crianças agravado p.p. nos artigos 171 n° 2 c 177 n° 1 - a) do CP, na pena de 5 (cinco) anos de prisão, cuja execução fica suspensa pelo período de 5 (cinco) anos a contar do trânsito em julgado do presente acórdão, mediante regime de prova assente num plano de reinserção social com imposição das seguintes regras de conduta: i. não acompanhar, alojar ou receber as menores S. (ofendida nos autos) e F., filhas do arguido e da testemunha T.; ii. frequentar um programa de prevenção de risco de reiteração de crimes sexuais contra crianças; iii. submeter-se a uma avaliação de risco, médico psicológica, que lhe for indicada pelos serviços de reinserção social, mediante o seu consentimento prévio e a prévia informação das finalidades da avaliação e das consequências da recusa de consentimento, que devem ter lugar na fase de execução da pena. ( … ) É do seguinte teor, tal Acórdão: ( … ) 1. Segundo a acusação do Ministério Público, aos arguidos E. e M. é imputada a prática, como autores, de um crime de abuso sexual de criança, na modalidade agravada, p.p. nos artigos 26,171, n°s 1 e 2, e 177 n° 1 - a), do CP (Código Penal).

  1. Os arguidos contestaram.

  2. Realizou-se o julgamento com observância do formalismo legal.

  3. Cumpre proferir sentença.

  4. Não há questões prévias ou incidentais que obstem ao conhecimento do mérito.

    Factos provados: Da acusação: 6. No dia 21/2/2010, o arguido introduziu um dedo no ânus da menor S. (doravante também ofendida menor ou menor) e tocou na região ano-genital da menor, provocando-lhe uma cicatriz ao nível do grande lábio esquerdo.

  5. Estes factos ocorreram durante uma visita da menor ao arguido, no interior da residência deste.

  6. Depois destes acontecimentos, ao regressar à companhia da mãe, a menor mostrou-se agitada e urinou no vestuário que trajava.

  7. A menor ofendida nasceu no dia 9/2/2006 e tinha à data dos factos 4 anos e 12 dias de idade.

  8. Os factos acima descritos provocaram na menor repercussões traumáticas, não só pelos actos em si, como pelo facto dos mesmos advirem do seu próprio pai e de alguém com quem mantinha uma relação próxima, produzindo alterações no seu comportamento, nomeadamente, tornando-a uma criança pouco comunicativa e com dificuldades na interacção e em estabelecer relações de confiança com adultos, demonstrando reacções ansiosas.

  9. A menor ofendida é filha do arguido e da N. O arguido e a N. mantiveram entre si uma relação amorosa tendo-se separado em meados de 2007.

  10. Após a separação do casal a menor ofendida ficou a residir com a mãe e passou a visitar o pai algumas vezes aos fins-de-semana tendo sido neste contexto que ocorreram os factos acima descritos.

  11. O arguido reside no Edifício A, Machico, onde também reside a sua companheira, a arguida M. .

  12. Ao praticar os factos descritos, o arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, com o intuito de manter um contacto íntimo e de cariz sexual com a menor, não obstante ter conhecimento da idade da ofendida e dos laços de filiação que o uniam à mesma.

  13. O arguido sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.

    Da contestação: 16. Em 18 de Fevereiro de 2010 o arguido e a mãe da menor chegaram a acordo quanto à regulação das responsabilidades parentais das duas filhas menores que têm em comum.

  14. A mãe das menores ficou insatisfeita com o valor dos alimentos constante desse acordo por considerar que a pensão de alimentos de 100,00 euros mensais para ambas as menores, era insuficiente.

  15. Até então o arguido tinha procurado entregar 150,00 euros mensais de alimentos para as duas menores.

  16. Entre a separação dos progenitores e o acordo de regulação das responsabilidades parentais, o arguido visitou as menores algumas vezes.

  17. Após o acordo acima referido, o arguido teve as menores consigo pelo menos duas vezes, uma delas no dia 21/2/2010 e outra em Agosto de 2010. No dia 21/2/2010 as visitas ocorreram na presença da arguida e de outros familiares do arguido - a irmã, o cunhado e a mãe do arguido, que se encontravam na mesma residência.

  18. Depois de Agosto de 2010 a progenitora das menores opôs-se a que o arguido levasse as menores consigo para casa.

  19. Depois de instaurados os presentes autos o arguido viu as menores algumas vezes aos fim-de-semana, em locais públicos, nomeadamente num bar, perto da casa das menores, na presença da avó destas, com o consentimento da progenitora das menores, por períodos de duas a três horas.

  20. Actualmente o arguido não visita as menores.

  21. Os arguidos mantêm entre si uma relação amorosa desde 2009.

  22. A mãe das menores e o arguido têm tido uma relação conflituosa pelo facto do valor da pensão de alimentos às menores ter sido reduzido, pelo menos desde a data do acordo de regulação das responsabilidades parentais acima mencionado.

    Relativos aos antecedentes criminais e situação pessoal do arguido: 26.O arguido não tem antecedentes criminais.

  23. O arguido nasceu em 24/9/75. Tem actualmente 37 anos de idade. É natural da Venezuela onde completou o ensino secundário. Em 2000 veio viver para a Madeira. Iniciou a carreira profissional como desportista num clube. Manteve um relacionamento afectivo com a N. até Julho de 2007. Desse relacionamento nasceram duas filhas, a menor S., nascida em 9/2/2006 e uma outra menor chamada F., nascida em 28/5/2008. Quando nasceu a menor F. a relação afectiva entre o arguido e a mãe da menor já tinha terminado. A gravidez foi fruto de um relacionamento sexual ocasional que não implicou reconciliação.

  24. O arguido mora num apartamento T3 pertencente aos seus pais.O agregado familiar é composto pelo arguido e a companheira, pela irmã do arguido, o companheiro desta e um filho de ambos. Cada um dos núcleos familiares faz uma vida independente embora partilhe o espaço da habitação.

  25. O arguido trabalha actualmente como pintor estucador. Tem um vínculo de trabalho estável com uma empresa de construção civil. A companheira trabalha regularmente. Contribuem ambos para as despesas domésticas. Entre o arguido e a companheira existem laços de afecto.

  26. Perante os factos de que vem acusado a atitude do arguido é de negação e inconformismo. Deixou de visitar as filhas quando as visitas foram condicionadas à presença de uma pessoa de confiança das menores (a avó materna) e confinadas a um local público (um café ou a proximidade da Igreja nas imediações da casa da progenitora das menores), por considerar que dessa forma não tem privacidade nem um ambiente propício.

    Relativos aos antecedentes criminais e situação pessoal da arguida: 31. No que diz respeito à arguida, uma vez que das deliberações do colectivo não resulta a necessidade de lhe aplicar uma pena ou medida de segurança, o Tribunal Colectivo não procede à leitura do relatório social nem do certificado de registo criminal juntos aos autos. Pelo que não se pronuncia nesta parte sobre os factos respeitantes à arguida.

    Factos não provados.

    Da acusação: 32.A arguida introduziu um dedo no ânus da menor e roçou os dedos na vagina da menor.

  27. Os arguidos passaram os dedos pelo nariz da menor, dizendo-lhe que cheirava mal.

  28. O eritema da região vulvar e a presença de escassa leucorreia esbranquiçada, encontrados na menor ofendida, foram devidos à actuação dos arguidos.

  29. Em Agosto de 2010 o arguido bateu na menor.

    Da contestação: 36. A progenitora da menor ofendida chamou puta e gorda à arguida e disse-lhe que as filhas não iam ter outra mãe.

  30. Os parágrafos da acusação e da contestação, não mencionados nos factos provados ou não provados, são conclusivos, puramente instrumentais ou contêm alegações de direito.

    Provas que serviram para fundamentar a convicção do Tribunal: 38. Na apreciação critica da prova o Tribunal seguirá de perto os ensinamentos e a experiência constantes da doutrina " O registo das audições dos menores vítimas de abusos sexuais: primeiros indicadores de avaliação da experiência de Bruxelas" Paul Somers e Damien Vandermeersch, Infância e Juventude, N° 1/98 Janeiro - - Março.

  31. Os arguidos negaram a prática dos factos. Nas suas declarações reconhecem a generalidade das circunstâncias apuradas, relativas às visitas das menores e ao conflito entre os progenitores agudizado por causa da diminuição da prestação de alimentos. Esclarecem que as menores (a ofendida e a irmã) nunca dormiram na casa onde moram os arguidos. Reconhecem que no 21/2/2010 ambas as menores passaram o dia na residência dos arguidos com os restantes familiares do arguido que aí moram. Em Agosto de 2010 estiveram com as menores apenas da parte da manhã. Referem que nesse dia a menor ofendida se magoou numa máquina existente no café onde estavam. A mãe da menor telefonou para saber o que se tinha passado. Negam ter batido na menor ou ter-lhe puxado as orelhas.

  32. Das suas declarações extrai-se que a animosidade existente entre o arguido e a progenitora das menores é recíproca.

  33. O arguido referiu que, se a menor foi abusada não foi na sua casa nem foi ele o autor. A arguida, por seu lado, disse que a menor não dormiu a sesta no dia 21/2/2010. Só a irmã mais nova da menor, a F. é que dormiu. As suas declarações, ao quererem afastar a hipótese da menor ter estado no quarto do arguido nesse dia, não merecem credibilidade, pois estão em contradição com o depoimento da testemunha ML., irmã do arguido, que estava presente no dia 21/23/2010 na mesma casa, e que afirmou ter deitado a menor F. no seu quarto e que a menor S., aqui ofendida, foi para o quarto dos arguidos, a seguir ao almoço.

  34. Sobre a questão da agressão à menor em Agosto de 2010, a mãe da menor, a testemunha N., quando ouvida, disse que a menor se queixou de ter sido a arguida quem lhe puxou uma orelha, quando...

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