Acórdão nº 2828-13.2YLPRT.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelTERESA PRAZERES PAIS
Data da Resolução07 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa -RELATÓRIO: Tiveram início os presentes autos com o procedimento especial de despejo proposto no Balcão Nacional do Arrendamento (B.N.A.) por F...e C..... contra V. ...LDA., visando a resolução do contrato arrendamento celebrado entre as partes sobre o imóvel sito na Rua ...., em Lisboa.

Fundamentaram a sua pretensão, em suma, na denúncia do contrato, validamente efectuada pelas Requerentes, e na circunstância de a Requerida não ter entregue o locado no prazo para o efeito concedido, o que fundamenta o consequente despejo.

Na sua oposição, a Requerida defendeu-se invocando o seguinte conjunto de fundamentos: inaplicabilidade do procedimento especial de despejo ao contrato de arrendamento em causa; erro na forma de processo; ilegitimidade activa; ineficácia da denúncia do contrato, designadamente, por caducidade do acto de aprovação do projecto de arquitectura e falta de envio, à Requerida, dos documentos concernentes ao licenciamento do invocado projecto de remodelação/restauro profundo; impugnação da demais factualidade subjacente ao requerimento de despejo.

As Requerentes tiveram oportunidade de responder, o que fizeram.

* Os factos apurados A-O F...é proprietário, por aquisição à C..., do prédio urbano sito na Rua ....Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa com o nº/s ... da freguesia de.... (cf. cópia da certidão a fIs. 105 e ss.

B-O F...é proprietário, por aquisição à C... do prédio urbano sito na Rua....freguesia de.... Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa com o n.º... (cf. cópia da certidão a fls. 107 e ss.

C-Por escrituras públicas datadas de 12.01.1937 e 13.02.1969, foi acordada entre a então proprietária e a requerida a cedência, mediante retribuição da loja sita nos nº/s ... do prédio urbano sito na Rua .... como da sobreloja direita com entrada pelo n.º 72 do prédio urbano sito ..., freguesia de... Lisboa - cf. Fls. 51 e ss.

D-Mediante notificação datada de 07.03.2013, a requerente comunicou à requerida a denúncia do contrato de arrendamento referido em c., com os fundamentos expostos no documento de fIs. 95 a 100, solicitando a desocupação e entrega do locado até ao dia 30.09.2013.

E-Em tal comunicação, a requerente juntou: cópia do pedido de licenciamento do projecto a executar; cópia dos despachos que aprovaram e deferiram o projecto; termo de responsabilidade do técnico autor do projecto de obra, no qual declara que a obra projectada obriga, para sua execução, à desocupação do locado.

F -O procedimento administrativo com vista ao licenciamento do projecto a executar foi recebido na Câmara Municipal de Lisboa em 17.05.2011.

G- O pedido de licenciamento foi objecto de parecer favorável e despacho de aprovação de 17.10.2011.

*** Para a boa decisão do objecto do litígio, importa ainda atentar no seguinte, atento o teor dos documentos de fls 96 a 98, que não foram impugnados: “...Os Prédios constituem a totalidade do quarteirão...., tendo sido objecto de um pedido de licenciamento de alteração –alterações exteriores, que constitui um procedimento de controlo prévio, consubstanciado no projeto destinado a realizar uma operação urbanística com a finalidade de neles instalar uma unidade hoteleira. o qual foi apresentado na Câmara Municipal de Lisboa em 17 de MaiO de 2011 (documento nº 5, adiante junto , que aqui se dá por integralmente reproduzido )e aprovado e deferido por despachos de 17 do Outubro de Z011 e de 26 de Fevereiro de 2013 {documentos nº/s 6 e 7 adiante juntos...).

...Desta forma, os Prédios serão sujeitos a uma nova organização funcional e estrutural, ou seja, serão completamente reformulados, adaptados e afetos à instalação dê uma unidade hoteleira.

Tudo quanto vem mencionado nos parágrafos anteriores resulta dos documentos que instruem o procedimento camarário ,melhor identificados nos anexos ....,que correu os seus termos na Câmara Municipal de Lisboa.

...A operação urbanística em causa,que terá por objecto os prédios implicará execução de obras de reconstrução com demolições, remodelação e restauros profundos, as quais obrigam a uma total desocupação de todos os espaços, divisões, frações ,andares e lojas que se que se encontram OU venham a encontrar ocupados e/ou arrendados nos prédios ,onde se inlui o espaço arrendado a Vª Excelências.

Quanto ao Espaço Arrendado a V.Exas" para além do seu uso futuro não corresponder ao atual, pois, espaço arrendado … será promovida uma demolição integral dos actuais revestimentos tetos e de algumas paredes. serão removidos os pavimentos, será feito um reforço das correspondentes estruturas, será feito o assentamento dos pavimentos ,todas as infraestruturas existentes {água, eletricidade, telecomunicações, esgotos águas pluviais, Climatização, etc.) serão totalmente removidas ...

Assim, tal como todos os espaços, divisões, fracções ,andares e lojas situados nos prédios, incluindo o espaço arrendado a V.Ex será objecto da referida da operação urbanística cujo resultado final se Traduzirá na perca da sua autonomia funcional e com profundas alterações ao nível da sua área, dimensão e estrutura,não mantendo qualquer característica equivalente às que existem actualmente “ ************* A final foi proferida esta decisão: Pelo exposto, julgo procedente o pedido de despejo relativo à sobreloja sita no n.º 72 da Rua...., freguesia de ..., Lisboa.

Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 15º, n.º 7 da Lei n.s 6/2006, de 27.02, na redacção conferida pela Lei n.º 31/2012, de 14.08, confere-se autorização para entrada no domicílio, para fins de execução do despejo...“ *************** É esta decisão que a requerida impugna, formulando estas conclusões ,em síntese: 1-Da inaplicabilidade do disposto pelo NRAU/RJAU à presente relação contratual de arrendamento 2-O presente procedimento especial de despejo não se aplica ao arrendamento em apreço.

3-Com efeito, o contrato de arrendamento foi celebrado em 12.01.1937.

4-Às relações de arrendamento em prédios urbanos para fins não habitacionais de duração indeterminada aplicavam-se, até 1990, as regras estabelecidas pelo Código Civil, designadamente o disposto pelos arts. 1095.°, 1096.°, 1097.° e 1100.°, que remetia para legislação especial, no tocante às obras para ampliação, prevista pela Lei n." 2088, de 03.06.l957.

5-Com a publicação do RAU, em 1990, passaram tais contratos de arrendamento a estar sujeitos à nova legislação, salvaguardados, porém, os regimes de excepção - cfr. art. 3.° do DL 321-B/90, de 15.09.

6-O RAU dispunha, no art.º 113º - disposição específica para arrendamentos não habitacionais - que nos casos de cessação por denúncia do senhorio (arts. 68.° e segs do mesmo RAU), haveria lugar ao pagamento de uma indemnização calculada nos termos do disposto pelo art. 67.°, acrescida de uma compensação em dinheiro.

7-Mais previa o RAU que a denúncia pelo senhorio só era possível nos casos previstos na lei e pela forma nela estabelecida - ou seja, " ... 0 senhorio pode denunciar o contrato para o termo do prazo ou da sua renovação nos casos seguintes: ... c) Quando se proponha ampliar o prédio ou nele construir novos edifícios por forma a aumentar o número de locais arrendáveis e disponha do respectivo projecto de arquitectura, aprovado pela Câmara Municipal ... d) Quando o prédio esteja degradado e não se mostre aconselhável, sob o aspecto técnico ou económico, a respectiva beneficiação ou reparação e esteja aprovado pela Câmara Municipal o respectivo projecto de arquitectura." - art. 69.°, 1, c) e d) do RAU - os sublinhados são nossos; 8- Mais cabendo fazer tal denúncia obrigatoriamente por" ...

acção judicial, com a antecedência mínima de seis meses relativamente ao fim do prazo do contrato, mas não obriga ao despejo enquanto não decorrerem três meses sobre a decisão definitiva ... " - cfr. art. 70.° do RAU, que correspondia exactamente ao anterior art. 1097.° do Código Civil (o sublinhado é nosso).

9-De qualquer forma, a denúncia pelo senhorio relativa a obras sempre dependeria de legislação especial - cfr. art. 73.° do RAU, o que, no caso do presente arrendamento remetia, em 1990, para o disposto pela Lei 2088 de 03.06.1957.

10-A Lei 2088 de 03.06.1957 veio a ser alterada pelo DL 157/2006, de 08.08, diploma que aprovou o regime jurídico aplicável à denúncia pelo senhorio para demolição, ou obras de remodelação ou restauro profundos (art. 1.0, 1, a)).

11-Atentos o objecto e a data do contrato de arrendamento em apreço no presente procedimento, tem-se por aplicável o disposto pelos arts. 23.° e 26.° do DL 157/2006, bem como o disposto pelos arts. 4.°, 5.°, 6.° e 8.° do mesmo diploma legal.

12-O DL 157/2006 foi alterado pelo DL 306/2009, cujos preceitos pertinentes para o caso vertente se mantiveram inalterados - designadamente, e entre outros, o dever de indemnização calculada com base em renda, acrescida de uma compensação por investimentos do inquilino no local arrendado (art. 6.°, n." 4), bem como da necessidade de a denúncia ser efectuada por acção judicial (art. 8.°, nº/s 1,2 e 3).

13-Os DL 157/2006 e DL 306/2009 vieram a ser alterados pela Lei 30/2012, de 14.08, a qual pressupõe a aplicação simultânea do disposto pela Lei 31/2012, da mesma data, que veio alterar o regime jurídico do arrendamento urbano (RJAU) - cfr. art." 6.° da Lei 30/2012, de 14.08.

14-A referida Lei 30/2012, de 14.08, omite e não revoga expressamente o regime especial transitório para a denúncia pelo senhorio para obras de remodelação e restauro profundo aplicável aos contratos de arrendamento não habitacional celebrados antes do DL 257/95, de 30.09, que as leis anteriores previam - designadamente pelo disposto conjugado pelos arts. 73.° do RAU, Lei 2088, de 03.06.1957, DL 157/2006 e DL 306/2009.

15-Aliás, a referida Lei 30/2012 não confere qualquer auxílio ao intérprete, na medida em que não dispõe de preâmbulo que permita aferir do espírito da Lei, desconhecendo-se, por isso, se as...

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