Acórdão nº 865/13.6TBPDL.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelRUI MOURA
Data da Resolução17 de Dezembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam em conferência os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa: I - RELATÓRIO: A..., casada, residente ..., entretanto falecida na pendência da causa e substituída pelos herdeiros habilitados para tal no Apenso A, H..., A... e N...

- veio propor em 19 de Abril de 2013 acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum ordinário contra M... e V..., casados entre si, ambos residentes ,,,, pedindo a condenação dos Réus na restituição da quantia de € 92.544,43, acrescida de juros de mora vencidos, no montante de € 3.397,52, e vincendos, à taxa legal para os juros civis, e até efectivo e integral pagamento, alegando, para o efeito, em suma, (i) que é única e universal herdeira de M...; (ii) após o óbito desta, a Ré se apropriou indevidamente da verba correspondente ao saldo bancário pertença daquela, aproveitando-se da circunstância de ser co-titular dessa conta; (iii) a Ré em 14 de Maio de 2012 entregou-lhe parte da verba em questão - mais precisamente € 92.544,43 -, mas permanece em poder da quantia peticionada a título de capital (portanto, que integra a herança), embora tenha sido intimada a devolvê-la.

A Autora demanda o Réu, esposo da Ré, porquanto, por via do regime de casamento de ambos – comunhão de bens adquiridos -, o Réu tem proveito da verba peticionada.

Junta procuração e documentos.

Citados, os Réus contestaram, excepcionando.

Alegam ter a falecida doado na véspera de Natal de 2009 à 1ª Ré todos os valores presentes e futuros da dita conta, dos quais o 2º Réu nada beneficiou. Alega que a Ré aceitou – artigo 21º da contestação. Materializaram o cumprimento da vontade da falecida alterando no dia 2 de Dezembro de 2009 a ficha de assinatura do contrato de abertura de conta.

(Alegam ainda, em contradição com o referido, que a falecida a incluiu como co-proprietária dos valores ali depositados – artigo 18º. Retiram daqui que o saldo da conta não pertencia em exclusividade à falecida, na data da morte desta – artigo 48º - mas sim em compropriedade com a Ré – artigo 49º).

De acordo com a defesa assente na doação do saldo positivo presente e futuro, retiram que o saldo bancário da referida conta, após o falecimento da M..., não integra(va) o acervo hereditário.

Impugna o alegado no artigo 10º da petição inicial, segundo o que a Ré tenha efectuado a transferência para a conta da Autora inicial de sensivelmente metade do valor levantado por si, “após inúmeras insistências da Autora, explicando que na verdade procedeu à transferência de metade do valor por “forma livre” – artigo 44º da contestação -, como “liberalidade” – artigo 49º da contestação .

Concluem os Réus pela improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.

Juntam procurações e um documento.

Responde a Autora, pugnando pela improcedência da excepção peremptória, mantendo os termos da petição inicial.

Com a entrada em vigor das alterações introduzidas ao CPC pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, o processo passou a seguir a tramitação agora determinada para o referido diploma adjectivo. Foram juntos documentos – fls. 34-verso a 37-verso. A Autora posiciona-se em relação a eles- fls. 40.

Foram pela Autora juntos documentos – fls. 48 a 68 – e a Ré, notificada, nada disse.

* Foi dispensada a realização da audiência prévia.

Foi fixado o valor à causa.

Saneou-se o processo.

Identificou-se o objecto do litígio.

Enunciaram-se os temas da prova.

Teve lugar audiência final, com gravação dos trabalhos.

Na sentença foi proferida decisão sobre a matéria de facto provada e não provada, motivadamente.

* Na 1ª instância dão-se como provados os seguintes factos: Da petição inicial: 1.M... (doravante designada apenas por M..., por melhor facilidade de exposição) faleceu no dia 30.04.2012, na Rua ..., no estado de solteira; 2.A falecida M... não deixou ascendentes vivos, descendentes, testamento ou qualquer outra disposição de última vontade; 3.A falecida Autora A... (doravante designada apenas por A..., por melhor facilidade de exposição) era parente em quarto grau da linha colateral da falecida e sua única e universal herdeira; 4.Em 12.07.2005, a falecida M... constituiu a conta bancária nº 30753541, junto do BANIF, balcão da Av. Antero de Quental, nº 30, Ponta Delgada; 5.Em 02.12.2009, a dita conta bancária passou a ter a 1ª Ré como segunda titular; 6.Em 30.04.2012 a dita conta bancária apresentava, o saldo no montante de € 1.278,66 em depósito à ordem, e o saldo no montante de € 186.554,12 em depósito a prazo; 7.Nunca a 1ª Ré depositou qualquer verba na dita conta bancária; 8. Em 02.05.2012, a 1ª Ré transferiu o montante de € 185.696,58 da dita conta bancária para a conta bancária nº 000984064543010, de que é titular no BANIF; 9.Em 11.05.2012, a 1ª Ré transferiu o montante de € 4.512,29 da dita conta bancária para a conta bancária indicada em 8., ficando a primeira, nessa data, com saldo a zero; 10.Em 14.05.2012, a 1ª Ré transferiu para a conta bancária titulada por A... o montante de € 92.544,43; 11.Os Réus casaram em 25.09.2004 sem convenção antenupcial; Da contestação 12.M... quis beneficiar a 1ª Ré doando-lhe os valores existentes ou a existir na dita conta bancária, o que esta aceitou; 13.Nesta decorrência, a 1ª Ré passou a ser a segunda titular da dita conta bancária nos termos referidos em 5., à qual ambas, nessa data, lhe atribuíram a natureza solidária; 14.No dia 04.12.2009 foi constituído o depósito a prazo referido em 6. com o montante de € 147.000,00.

Proferiu-se decisão de mérito que, a final, julgou a acção improcedente por não provada e, em consequência, absolveram-se os Réus do pedido.

As custas ficaram pelos Autores habilitados.

Inconformados, recorrem os Autores habilitados, recurso admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos, e efeito meramente devolutivo.

Conclusões de recurso dos Autores: Os Autores habilitados concluem assim a motivação da sua apelação: 1.Vêm os A.A., ora Apelantes, interpor recurso por não se conformarem com a decisão proferida pelo Tribunal a quo, que julgou improcedente a acção objecto dos presentes autos, por não provada e, consequentemente, absolveu os R.R. do pedido.

2.Os Recorrentes entendem que o Tribunal a quo, além do mais, fez uma incorrecta apreciação da prova, nomeadamente do ponto 12, 13 e 14 da matéria considerada assente, conclusão esta que resulta claramente dos depoimentos das testemunhas, das declarações de parte dos A.A., dos suportes documentais junto aos autos e da conjugação de ambos; 3.

As questões a dilucidar nos presentes autos são: a) Saber se os montantes existentes à data da morte na conta bancária titulada pela falecida foram por si doados em vida à 1ª. R. (pontos 12 e 13 da matéria de facto considerada assente); b) Da insuficiência da matéria julgada (ponto 14); c) Da omissão de pronúncia relativamente a factos instrumentais; d) Por cautela de patrocínio: a validade da doação e e) Ainda por cautela de patrocínio: Da validade da doação de bens futuros.

4.O Tribunal a quo decidiu a matéria de facto nos termos constante do ponto 4 das presentes alegações, que dão por reproduzido; 5.Quanto aos pontos 12. e 13. dos factos provados, os ora Apelantes entendem que os R.R. não provaram, como era seu ónus, que os montantes existentes à data da morte na conta bancária titulada pela falecida M... lhe foram, por esta, doados em vida, pelo que impugnam a resposta aos identificados pontos (Art. 640º. do C.P.C.); 6.Resposta que requerem seja alterada, porquanto do processo constam todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre tais factos; 7.Não obstante o Tribunal a quo ter respondido aos pontos 12. e 13. com base no depoimento das testemunhas A..., M..., M..., M... e nas declarações da R., M..., entendem os Apelantes que dos mesmos não pode resultar uma resposta positiva quanto a esta matéria; 8. Relativamente às relações de proximidade entre a falecida G... e a M... por um lado, e a falecida A..., por outro, as mesmas não fugiam ao normal das relações familiares, com momentos mais próximos e outros menos, sendo que isso em nada abala o sentimento que nutrem umas pelas outras.

(…) 12.Já quanto ao relacionamento da R. M... com a M..., o Tribunal considerou que a convivência entre ambas era permanente e quase diária e os laços de afecto eram fortíssimos, com base nos depoimentos de A..., M..., M..., M..., nas declarações da R. M... e numa carta de A... para a sua tia I...; 13.Com o que os Apelantes discordam, pois entendem que o Tribunal se limitou a retirar conclusões das conclusões aventadas pelas testemunhas, já que estas não apontaram qualquer facto donde efectivamente o Tribunal pudesse concluir por tal tipo de relação (por ex., que passassem férias juntas, que festejassem qualquer período festivo, que viajassem, saíssem, tomassem refeições, etc.); (…) 19.Ao concluir que os laços entre a G... e M... eram fortíssimos e era permanente a convivência entre elas, o Tribunal a quo fez uma incorrecta análise da prova; 20.Quanto a saber se o dinheiro que a M... tinha na conta bancária à data do óbito, foi, ou não, objecto de doação à M..., o Tribunal firmou a sua convicção de que existiu uma doação no depoimento das testemunhas identificadas em 9. desta alegação, e tendo por pano de fundo o contexto relacional entre ambas; 21.A propósito do contexto relacional, dá-se por reproduzido o já alegado quanto às respostas aos pontos 12 e 13, sendo que o Tribunal recorrido fez uma incorrecta apreciação da prova e uma incorrecta subsunção dos factos ao direito; 22.Quanto à alegada doação, também aqui os depoimentos são meramente conclusivos e contraditórios, as testemunhas nem têm conhecimento da existência de conta bancária, salvo a S..., mas que apresentou um depoimento totalmente “construído”, sem identificar qualquer conta em concreto; 23.Ao invés, as testemunhas referem que a M... apenas geria/administrava o dinheiro da G..., atentas as suas dificuldades de mobilidade – que foram sobejamente faladas – pois já nem...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT