Acórdão nº 245/13.3GATVD.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelCALHEIROS DA GAMA
Data da Resolução17 de Dezembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 9a Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Lisboa: I – Relatório 1. No âmbito do processo comum n.º 245/13.3GATVD, da Comarca de Lisboa Norte – Torres Vedras - Inst. Local – Secção Criminal – J2, foi submetida a julgamento, com intervenção de Tribunal Singular, a arguida AA , (…), acusada da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de burla simples, previsto e punido pelo art. 217.°, n.º 1, do Código Penal.

Realizado o julgamento veio a arguida (que não contestou, não arrolou testemunhas nem esteve presente na audiência) a ser condenada, por sentença proferida e depositada em 20 de março de 2015, pela prática do crime pelo qual estava acusada na pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), no total de € 275,00 (duzentos e setenta e cinco euros), convertível em caso de incumprimento voluntário ou coercivo, como previsto no art. 49.°, n.º 1 do Código Penal, em até 33 (trinta e três) dias de prisão subsidiária.

Mais foi a arguida, enquanto demandada cível, condenada a pagar à demandante, a ofendida BB, a título de danos patrimoniais a quantia de € 67,00 (sessenta e sete euros).

  1. A arguida, inconformada com a mencionada decisão, interpôs recurso extraindo da sua motivação as seguintes conclusões: "1ª – Por factos ocorridos em 3, 4 e 5 de Março de 2013, a queixosa BB apresentou queixa contra a arguida AA no dia 30 de Setembro de 2013.

    1. – Desde os dias 4 e 5 de Março de 2013 que a queixosa tinha conhecimento da identificação da arguida, nomeadamente, do seu nome, do seu número de telemóvel, do seu número de identificação bancária e do seu endereço da rede social facebook.

    2. – A prova produzida em Audiência, quer a documental (auto de notícia/ queixa/elementos comprovativos do negócio/pagamentos) quer a testemunhal (depoimento da queixosa) comprovam o pedido, a data em que foi feito, a data de pagamento, a identificação do vendedor, o seu N.I.Bancário, contacto telefónico e contacto da rede social.

    3. – Não existiu qualquer causa impeditiva para o exercício do direito de queixa antes de 30 de Setembro de 2013.

    4. – Atento o disposto no nº 1 do artigo 115º do Código Penal, o exercício do “direito de queixa extingue-se no prazo de 6 meses a contar da data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores “. Aliás, “O requisito do conhecimento do agente estará dado logo que seja possível ao ofendido individualizar a pessoa presumivelmente culpada, sem que se torne necessária uma indicação completa dos dados identificadores” Ac. fixação de jurisprudência STJ publicado em DR, I SÉRIE, Nº 98, 21 DE MAIO DE 2012, P. 2624 6ª - O direito de queixa tinha que ser exercido até ao dia 6 de Setembro de 2013, pelo que a queixa apresentada somente em 30 de Setembro de 2013 é extemporânea.

    5. – A arguida foi julgada e condenada por factos, relativamente aos quais o direito de queixa tinha caducado.

    6. – A douta sentença cometeu erro notório na apreciação da prova e simultaneamente na aplicação do Direito: impunha-se a declaração de extinção do direito de queixa, por caducidade e não a condenação da arguida.

    7. – Foi violado o disposto no nº 1 do artigo 115º do Código Penal.

    Pelo que e salvo o devido respeito, deverá ser revogada a douta sentença condenatória, substituindo-se por outra que declare extinto, por caducidade, o direito de queixa, assim se fazendo Justiça !" (fim de transcrição).

  2. Foi proferido despacho judicial admitindo o recurso, como se alcança de fls. 167.

  3. Respondeu o Ministério Público extraindo da sua motivação as seguintes conclusões: "1.º A arguida veio recorrer da sentença proferida nos presentes autos e que a condenou pela prática de um crime de burla simples por entender que o tribunal "a quo" incorreu em erro notório na apreciação da prova e aplicação do Direito por não ter considerado intempestivo o exercício do direito de queixa da ofendida.

    1. O marco inicial para a contagem do prazo para o exercício do direito de queixa é a data do conhecimento do facto criminoso pelo ofendido e não a data da consumação do crime.

    2. Só a partir do momento em que a ofendida tem a noção de que poderá estar a ser vítima de um crime é que poderá contabilizar-se o prazo para o exercício do direito de queixa, pois só aí ele se revela como um facto criminoso.

    3. Se a ofendida foi informada que após o pagamento as encomendas demorariam até 30 dias a serem entregues, só após o decurso desse período (e sem que a entrega seja feita) é que a ofendida poderia ter noção de que estaria a ser vítima de um crime de burla.

    4. Se o último pagamento ocorreu a 5 de Março de 2013, o prazo de 30 dias para a entrega terminou a 5 de Abril de 2013 e só a partir desta data é que a alguém poderia ter noção de que estava a ser vítima de um crime.

    5. Quando a queixa foi apresentada (em 30 de Setembro de 2013) ainda não estavam decorridos seis meses desde 05 de Abril de 2013 (data em que deveriam ter sido entregues as encomendas).

    6. Assim, o direito de queixa da ofendida foi exercido tempestivamente e a sentença do Tribunal "a quo" não incorreu em erro notório na apreciação da prova e aplicação do Direito, nem violou o art. 115.°, n." 1 do Código Penal.

    7. Pelo exposto, deverá confirmar-se, na íntegra, a sentença condenatória e, consequentemente, negar-se, por completo, o provimento ao recurso interposto pela arguida.

    Assim decidindo, farão V.ªs Ex.ªs. a costumada Justiça!" (fim de transcrição).

  4. Subidos os autos, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta nesta Relação apôs o seu visto e emitiu parecer, pronunciando-se no sentido da improcedência do recurso interposto pela arguida, aderindo à posição assumida pelo Ministério Público na primeira instância (cfr. fls. 183).

  5. Foi cumprido o preceituado no art. 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (doravante CPP), não tendo havido resposta.

  6. Efetuado o exame preliminar foi considerado não haver razões para a rejeição do recurso.

  7. Colhidos os vistos legais, cumpre agora apreciar e decidir.

    II – Fundamentação 1.

    Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respetiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objeto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer (cfr., entre outros, os Acs. do STJ de 16.11.95, de 31.01.96 e de 24.03.99, respetivamente, nos BMJ 451° - 279 e 453° - 338, e na Col (Acs. do STJ), Ano VII, Tomo 1, pág. 247, e cfr. ainda, arts. 403° e 412°, n° 1, do CPP).

    As questões suscitadas pelo recorrente, que deverão ser apreciadas por este Tribunal Superior, são, em síntese, as seguintes: - a sentença do tribunal a quo incorreu em erro notório na apreciação da prova e aplicação do Direito por não ter considerado intempestivo o exercício do direito de queixa da ofendida e, consequentemente, declarado extinto o procedimento criminal por falta de queixa, absolvendo a arguida.

  8. Passemos, pois, ao conhecimento das questões alegadas. Para tanto, vejamos, antes de mais, o conteúdo da decisão recorrida, no que concerne a matéria de facto:

    1. O Tribunal a quo declarou provados os seguintes factos (transcrição): 1. No dia 04 de Março de 2013, pelas 00h 11 m, a ofendida BB, após pesquisa na internet (facebook), através do link "LL", existente na página do facebook da arguida acedeu, através do site: http://www.facebook.com/Loja----, à loja online, na qual é publicitada, pela arguida, a venda online de roupas, calçado, e outros artigos e acessórios.

  9. Acreditando no seu conteúdo, e pretendendo adquirir algumas peças de vestuário a aqui...

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