Acórdão nº 74/14.7T8LSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelROQUE NOGUEIRA
Data da Resolução08 de Setembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1 – Relatório: Na 1ª Secção Cível da Instância Central da Comarca de Lisboa, A., ACE, S., S.A. e M., S.A., requereram providência cautelar não especificada contra P., S.A. e BANCO C., S.A., alegando que celebraram com a 1ª requerida um contrato de construção (empreitada) e que a 2ª requerida, a pedido das requerentes, prestou à 1ª requerida uma garantia bancária no valor máximo de € 5.171.728,86, destinada a garantir o bom e integral cumprimento das obrigações assumidas pelas requerentes no referido contrato de empreitada.

Mais alegam que, subsequentemente, invocando a ocorrência de defeitos na obra, a 1ª requerida notificou a requerente ACE da sua intenção de acionar a aludida garantia bancária, invocação essa que, no entender das requerentes, é falsa, e accionamento esse que, a concretizar-se, acarretará prejuízos sérios e dificilmente reparáveis.

Concluem, pedindo que se decrete a abstenção de a 1ª requerida executar aquela garantia bancária e de a 2ª requerida pagar a mesma garantia à 1ª requerida, se esta lho solicitar.

Dispensado o contraditório e feita a produção de prova, foram dados como provados os seguintes factos:

  1. O req.te é um agrupamento complementar de empresas, constituído pelas sociedades S., S.A., M., S.A. e pela sociedade de direito espanhol S., S.A.U., nas percentagens respectivamente de 70%, 20% e 10% (cf. doc. junto sob o n.º 5 e aqui se dá por integralmente reproduzido).

  2. Em 23 de Agosto de 2007, o req.te, através das sociedades suas constituintes, que assumiram a obrigação de ceder aquela sua posição contratual ao ora req.te (cf. doc. que se junta sob o n.º 6 e aqui se dá por integralmente reproduzido) logo autorizada pela 1.ª req.da, celebrou com esta última o contrato de construção junto como doc. n.º 2.

  3. O objecto do contrato de construção consistiu na construção de um estabelecimento de piscicultura (cultura de rodovalhos) na Praia de Mira.

  4. O referido estabelecimento de piscicultura caracteriza-se por ocupar uma área aproximada de 57 hectares, estar dividido em dois módulos de produção autónomos, com sistemas hidráulicos independentes para captação de água (captação 1/Fase 1 e captação 2/Fase 2).

  5. Cada captação é constituída por um poço de captação que faz a ligação entre a unidade de engorda localizada em terra e um túnel em betão com uma extensão de aproximadamente 1500 metros, com um diâmetro interior de 3 metros, dividido em tubos de 4 m, que foi colocado no subsolo e na direcção do mar pelo processo de cravação denominado “pipe-jacking”.

  6. Aquele túnel em betão está, no caso da captação 1, que é a que importa para a presente providência, ligado a uma caixa também em betão, chamada caixa pantalon, e que está afundada a uma profundidade da ordem dos 20 metros e a cerca de 900 metros da costa.

  7. Daquela caixa pantalon e na direcção contrária à da costa saem dois tubos ou condutas em polietileno de alta densidade (“PEAD”), compostos por três tramos de 433 metros cada, e dois na extremidade mais afastada, cada um com 2 tubagens verticais (raisers de captação), todos ligados entre si, com uma extensão total da ordem dos 1350 metros, com um diâmetro exterior de 2 metros, paralelos, colocados em vala e que têm na respectiva extremidade um conjunto de 4 chaminés, chamadas “raisers”, cada uma com 4 metros de altura e 1,40 de diâmetro, que captam a água do mar a cerca de 2 metros acima do fundo e que, por sistema de vasos comunicantes, chega aos poços de captação, onde depois é bombeada para a unidade de engorda.

  8. O projecto de construção foi da exclusiva e inteira responsabilidade da req.da que o encomendou à sociedade de direito espanhol I., S.A., que, também, desempenhou as funções de fiscal da obra, em nome da req.da, e que acompanhou todo o processo de construção e instalação dos tubos de PEAD da captação 1.

  9. Os trabalhos relativos à construção da captação 1, incluindo a colocação dos tubos de PEAD, ficaram concluídos em 26 de Junho de 2009.

  10. No entanto, porque a 1.ª req.da quis reforçar a estanquicidade da junta entre os dois tubos do túnel de betão que ligava a caixa pantalon ao poço de captação, a obra só foi recebida provisoriamente em 19.04.2010 (cf. doc. junto sob o n.º 7 que se dá por integralmente reproduzido).

  11. Na acta de recepção provisória, datada de 7 de Julho de 2010, mas retrotraída a 19 de Abril de 2010, foi declarado pela 1ª req.da e pela fiscal da obra, também autora do projecto de execução, a sociedade I., S.A., que os «trabalhos se encontram em condições de ser recebidos pelo dono da obra, para todos os efeitos expressos no contrato iniciando-se, assim, o prazo de garantia da empreitada».

  12. De acordo com a cláusula 15 do Contrato “(…) se neste momento o consultor técnico ou a fiscalização detectarem deficiências ou imperfeições na obra, assim farão constar na Acta , estabelecendo-se o prazo que as partes considerem justo para sanar os mesmos .(…)”.

  13. A 1.ª req.da já havia iniciado a exploração da Fase 1 da instalação – e, portanto, da Captação 1 – em Maio de 2009.

  14. No passado dia 1 de Setembro de 2014, o req.te recebeu uma carta da req.da, datada de 29 de Agosto, que tem como assunto: “Execução de garantia bancária. Garantia bancária nº 125-02-1235192/1235209-Banco C., S.A.. Contrato de construção de 23 de Agosto de 2007 – Cláusula 17 –“Cfr- Doc. junto sob o nº3.

  15. Naquela carta, a 1ª req.da, invocando a cláusula 17 do Contrato, comunica que vai «proceder à solicitação ao Banco C., S.A. do pagamento à nossa sociedade do montante total da garantia de € 5 171 728,86 (cinco milhões cento e setenta e um mil setecentos e vinte e oito euros e oitenta e seis cêntimos), o qual é indispensável, na sua integralidade, para a concretização da reparação e eliminação dos defeitos existentes no emissário de captação 1».

  16. Na cláusula 17 do Contrato de Construção previu-se que o req.te entregasse à 1.ª req.da uma garantia bancária de valor igual a 5% do preço total do contrato para garantir: -as reparações por vício de obra, defeitos de material ou mão de obra, ou avarias imputáveis ao empreiteiro por defeitos das obras e instalações; -os danos nas obras e instalações que sejam imputáveis ao empreiteiro com ou sem recurso de um terceiro; -as penalizações acordadas no presente contrato; -as indemnizações por danos e prejuízos por incumprimentos contratuais; -quaisquer responsabilidades, indemnizações, multas ou sanções por qualquer tipo que resultem da actuação do empreiteiro e/ou das pessoa pelas quais se deva responsabilizar legal ou contratualmente, e que sejam consequência do contrato ou de quaisquer acções ou obrigações derivadas do mesmo, entre outras e sem pretensão exaustiva, as relativas à segurança e saúde no trabalho, ambiente e urbanismo, servidões e serviços de terceiros, navegação, as tubagens de polietileno, legislação marítima e quaisquer derivadas ou relacionadas com as obras. Consideram-se incluídas, para o efeito, as quantias reclamadas ao dono da obra judicial ou extrajudicialmente, ou por procedimento administrativo, se os factos forem imputáveis ao empreiteiro e/ou pelas pessoas pelas quais deva responsabilizar legal ou contratualmente …; -os gastos e honorários do advogado procurador, peritos e quaisquer outros profissionais cuja intervenção seja necessária ou conveniente para a defesa do dono da obra, perante reclamações judicias ou extrajudiciais, ou procedimentos administrativos instaurados contra o mesmo, se os factos forem imputados ao empreiteiro e/ou às pessoas pelas quais se deva responsabilizar legal ou contratualmente ….

  17. No cumprimento daquela obrigação, o req.te entregou à 1ª req.da , a garantia bancária nº 125-02-1235192/1235209, emitida pela 2ª req.da em 11 de Setembro de 2007 e válida até 16 de Outubro de 2019, bem como o respectivo aditamento de 20 de Abril de 2011 (cf. doc. n.º 1).

  18. Na carta de 29 de Agosto de 2014, a que se alude em N), a 1ª req.da diz que vai executar a referida garantia bancária, porque teria constatado, em Março de 2014, numa inspecção aos emissários da captação 1 um deficiente recobrimento com areia de parte dos respectivos tubos de “PEAD” norte e sul, mais concretamente: « – O tubo norte encontra-se tapado com recobrimento superior a 1,5 m na generalidade do perfil, mas o PK0+700 e o PK1+000 há zonas em que o recobrimento se reduz a valores da ordem de 0,5m; - o tubo sul encontra-se tapado com recobrimento da ordem de 1,5m até ao PK0+600, apresentando a partir do PK0+700 até ao fim (PK+350) zonas com recobrimento inferior a 0,5 m e mesmo zonas em que o tubo se encontra visível, sem qualquer recobrimento».

  19. Segundo a 1ª req.da, esse recobrimento com areia seria deficiente porque, (alegadamente), aqueles emissários teriam sido instalados pela req.te a uma cota superior àquela que constava do projecto de construção, facto que impediria a sua cobertura de forma natural e que não estaria a permitir que esse recobrimento atingisse os 2 metros.

  20. Ainda na mesma inspecção, ter-se-ia detectado que as estruturas metálicas que unem as duas partes dos lastros estariam, por falta de recobrimento com areia, “inteiramente expostas à corrosão” o que constituiria um factor de agravamento da instabilidade dos tubos de PEAD da captação 1.

  21. Aquelas duas situações (insuficiência do recobrimento com areia e corrosão das estruturas metálicas que unem as duas partes dos lastros) teriam induzido na 1ª req.da o receio de que os tubos de PEAD da captação 1 pudessem vir a soltar-se, o que prejudicaria a normal captação de água do mar para a unidade de engorda da Fase 1 do contrato de construção.

  22. O comunicado fundar-se-ia numa Nota Técnica, datada de 9 de Maio de 2014, elaborada pela sociedade C. a pedido da 1ª req.da (Nota Técnica NT 50-2, Adenda 2, que constitui o Anexo II à carta da 1.ª req.da de 29 de Agosto de 2014, junta como doc. n.º 3), que espelha apenas os resultados dos levantamentos batimétricos dos tubos de PEAD da captação 1, feita...

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